Uma semana muito intensa

1395 Words
            Apesar de ter sido encaixada para a realização de todas as provas no horário inverso, era óbvio, e ela sabia, que não estaria totalmente livre dos olhares curiosos: todos os seus colegas e ex colegas pareciam ter coincidentemente encontrado alguma coisa para fazer na escola naquela tarde, o que a deixou um pouco nervosa, inicialmente, mas não chegou a ser desconfortável, até porque, ela estava se sentindo totalmente irada no carro da namorada de Ben: um antigo Opala totalmente original, preto fosco e com um som incrível, mesmo considerando que ela estava com movimentos restritos, ainda podia sentir-se bem por ser descolada e original - ou ao menos por andar com pessoas descoladas e originais.             Voller correu para encontra-la e a levou até a sala onde ela faria as provas, desejando "boa sorte" tantas vezes quanto era possível uma pessoa dizer e a outra aguentar sem querer esmurrar a cara da primeira - mentira, no sungo "boa sorte" eu já quis esmurrar ele, mas não seria capaz, não aquele par de olhos azuis brilhantes me encarando.              Coloquei o máximo da minha concentração naquele teste de Matemática e por sorte, tudo parecia fresco em minha mente, eu podia ver claramente em minha memória o que eu havia estudado, na minha cabeça ecoava a voz de Voller dizendo-me o que fazer e onde deveria ter atenção para não me confundir. Fim do primeiro round, pausa para beber água e encarei o teste de linguagem, para esse, eu bem sabia, que eu não precisava de muito estudo.              Quando finalizei, Voller me esperava com Benjamin. Conversamos e eu logo fui para casa, estava me sentindo exausta - acho que por estar fora e por não estar mais acostumada a fritar o meu cérebro daquela maneira com frequência.              Durante a noite, eu queria mesmo era falar com Jorge, mas me contive: seria estranho enviar mensagens todas as noites, ainda mais por falar coisas bobas e depois do jantar, pedi a Ben se ele havia conseguido agendar horário com o terapeuta, sendo informada de que minha primeira sessão seria na segunda feira seguinte, assim que eu tivesse concluído minhas avaliações escolares. Não resisti, informação que merecia ser compartilhada: "Oi Jorge,      Tudo bem ai? Só quis aproveitar para contar que minha sessão se fisioterapia foi terrível depois do meu movimento rsrs, agora preciso forçar e repetir, para não "esquecer" dele, como se isso fosse possível. Sim, eu estou cuidando do outro lado também, tenho uma sessão com um novo terapeuta na próxima segunda feira, essa semana eu estou fazendo as avaliações escolares, é uma semana muito intensa, ainda mais para mim que pareço cansar mais do que o normal... Espero que esteja bem, sinto sua falta. Com carinho, Bri"           Jorge cochilava na cadeira do consultório do hospital de emergência: ele não era muito requisitado nos plantões, mas necessariamente deveria estar no local, aquela noite havia sido complicada com os alunos, muitas resenhas para corrigir e ele sentia-se exausto. Encarou a tela do smartphone alguns segundos, até receber a mensagem de Brianna, o que o fez sorrir imediatamente após ler.              Decidiu - mais por que não sabia o que dizer do que por outro motivo - deixar para responder a mensagem depois de um tempo, ele não queria parecer precipitado, aquilo não era certo, mas ele não sabia de verdade como lidar, pensava muito no caso dela e muitas coisas ainda não tinham sido esclarecidas, não o suficiente para deixa-lo sentindo-se um pouco mais seguro.  - Tá fazendo o que ai? - Collins, um traumatologista novato invadia a sala de Jorge.  - Checando os meus emails - ele responde - nada importante, mas...  - ... sempre tem um mas - riu-se o outro.  - Uma ex paciente - desabafa Jorge - deu entrada por aparentemente ter se jogado de um mirante da estrada, em um penhasco - ele deu ombros - nunca acreditei nessa versão.  - E a garotanão se lembra de nada? - pergunta Collins brincando com uma caneta. - Muito pouco - ele suspira - e parece não se empenhar muito, o que poderia significar uma negação, por saber que realmente tentou suicídio. - Complicado - o jovem médico encara Jorge - e você gostou dela?  - Ela tem dezesseis anos - ele suspira - acho que ela está tão perdida que eu sinto que eu ainda preciso fazer alguma coisa por ela, entende? - Sim - ri Collins, eu entendo sim - mas eu conheço essa fixação e ela pode ser perigosa.  - Não me diga - Jorge revira os olhos - não faço ideia do que eu devo fazer. - É recíproco? - pergunta o outro curioso.  - Não acredito que seja... Ela sente minha falta, mas eu era o terapeuta, apenas...  - E ela vai arrumar outro, ou já arrumou - Collins dá de ombros - porque ainda fala com você?              Ele ri e levanta-se, dizendo alguma cosia sobre jogos de futebol e cervejas, que Jorge já não ouviu mais, a mente dele travou na pergunta do novato "porque ela ainda fala com você?" e por quase uma semana inteira, essa pergunta martelou sem resposta na cabeça confusa do médico.              Tal como Brianna com a sua semana de avaliações escolares, Jorge também teve uma semana intensa. Enquanto ela dividiu o seu tempo entre sessões de fisioterapia, provas, estudo e exames, Jorge se viu embrenhado em um redemoinho de avaliações para corrigir, resenhas para ler, pacientes para analisar e ainda, sentimentos para compreender e estes últimos eram, sem a menor dúvida, a parte mais complicada na semana dele e quando a noite de sexta feira com folga finalmente chegou, a primeira coisa que Jorge pensava em fazer era enviar um email para Brianna, mas não foi necessário, porque assim que ele verificou, já havia uma mensagem dela:  "Olá,      Acho que já conseguiu encontrar outra paciente tão incrível como eu... Acordei com uma ideia louca hoje e isso não me sai da cabeça: encontrar o soldado que me resgatou me fez lembrar de flashes, e se eu for até o mirante? Será que consigo lembrar de mais alguma coisa?"             Jorge correu até o notebook digitando freneticamente: não podia permitir que ela fizesse aquilo, era muito arriscado: "Brianna       Espero que não tenha feito nenhuma loucura: ir até o mirante pode ajudar, mas também pode estilhaçar de vez a tua memória que já está frágil! Então, como médico, eu te digo: não vai, ainda não é o momento de se expor à um trauma tão grande. Existem outras alternativas, pede para o teu novo terapeuta avaliar, e caso ele concorde - o que eu duvido que aconteça e rezo para que ele não faça - ainda é muito recente, de verdade.      Sinto muito não ter respondido seu outro email, não foi por falta de vontade, eu apenas estava correndo demais, imagino que como você e as suas avaliações escolares, espero que tenha se saído bem... Sobre o seu cansaço, esgotamento seria a palavra mais adequada, além de dormir, precisa tentar "esvaziar" a cabeça, talvez meditação... Vamos tentar ficar em contato esse fim de semana, certo?"            Brianna encarava as paredes do quarto, deitada em sua cama: quase havia se esquecido como era bom estar em sua cama nos últimos dias... Mexia os pés, deslizando-os delicadamente pelo lençol, até ouvir a notificação de emails e pegar o celular para ler a resposta de Jorge.              "Tudo bem" - suspirou, pensando consigo mesma... Sabia que era uma péssima ideia, mas não admitiria ter dito aquilo para chamar a atenção. Queria fazer algo por suas lembranças, queria entender o que estava acontecendo... Adormeceu com o telefone na mão e sim, sonhou coisas estranhas, envolvendo Jorge Mendéz.              Acordou num sobressalto perto das duas da manhã: alguém tirara-lhe o celular das mãos e a cobrira, o que era mesmo que sonhava? Porque Jorge segurava a mão dela ao lado do mirante, dizendo que tudo estava bem, porque ele a beijava? Essa era a parte que nitidamente era um sonho, mas Brianna também havia tido flashes daquela noite: alguém realmente segurara a sua mão no mirante, ela quase podia sentir as mãos frias... Frias? A pessoa que estava com ela tinha mãos geladas, lisas, nenhum calo ou cicatriz, mãos bem cuidadas. Marco tinha mãos como aquelas... Tudo estava confuso demais, confuso até mesmo para voltar a dormir, e por isso, Brianna realmente tentou meditação guiada conforme a sugestão de Jorge. 
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