Pipoca

1388 Words
Tereza dormiu até tarde, quando acordou já passava do meio dia. O dia anterior havia sido massivo e ela sentia seus pés doloridos. Desde que começou a viver só, Tereza se limitou a sair bem pouco, sabia que o ex estava sempre em seu encalço e queria evitar confusão. Precisava de roupas novas e um novo sapato para trabalhar, aquele que ela usava diariamente estava machucando seus pés pois a sola já estava fina. Colocou uma roupa quente pois fazia frio, pegou seu cartão e foi para o centro da cidade. Passou em algumas lojas populares na tentativa de economizar o máximo possível. Já era tarde quando finalmente conseguiu comprar o que queria. Não era muita coisa mas serviria e seria bem usado durante um bom tempo até ela conseguir verba para comprar outras coisas. Lembrou do que dona Marieta falava logo que ela havia chegado na pensão simples: ‘’mais vale uma roupa confortável do que as bonitas e desconfortáveis’’. Era assim que ela pensava também. Nada do que usava era de grife mas tudo era muito confortável. Resolveu então fazer uma visita para a senhora. Pegou um ônibus e foi o caminho inteiro pensativa e em certo momento adormeceu. Acordou na parada exata em que deveria descer. Quando entrou pelo portão avistou a velha senhora varrendo o corredor. _ Oi dona Marieta.. A velha lhe deu um sorriso largo. Por mais que Tereza fosse teimosa e inexperiente, Marieta sempre teve um carinho pela menina que hoje era uma mulher. Sabia das dificuldades e das desilusões amorosas que a vida poderia colocar em seu caminho, e por isso achava Tereza uma mulher doce, mesmo que já tivesse tido o coração despedaçado. _ Querida, a quanto tempo.. As duas se abraçaram. O abraço da senhora era quente e acolhedor. Tereza lembrava das vezes em que a mãe e o pai a acolhiam em seus braços nas noites frias ou em situações complicadas, sentia falta deles, muita falta.. Entraram e foram em direção a cozinha, lá fizeram um café forte e fumegante e trocaram confidências. Tereza contou mais detalhes sobre o ex, sobre as ameaças e até mesmo falou sobre o vizinho que demonstrava um enorme carinho por ela. Falou também sobre o novo objetivo que era cursar um ensino superior e Marieta ficou feliz por ela não desistir, apesar das dificuldades. Marieta confidenciou a Tereza sobre um novo morador que estava no antigo quarto dela, disse que o homem era enorme e fechado e que pagou três meses de aluguel adiantado. Disse também que ele até tentou puxar assunto mas a maneira que ele olhava era assustadora. Por um momento Tereza temeu pela vida de sua amiga, Marieta já era uma senhora de idade e poderia facilmente ser rendida. Naquela pensão a maior parte das pessoas ficavam fora o dia inteiro e aqueles que permaneciam lá eram os idosos. _ Você tem meu número, se precisar me ligue ou chame a polícia. _Não se preocupe querida, vou ficar bem. O assunto foi prolongado, as duas pareciam que tinham uma vida inteira para contar uma à outra. Quando Tereza levantou da mesa já era quase meia noite. Marieta insistiu, mas ela resolveu arriscar. Esperou um tempo no ponto de ônibus e nada. Nem mesmo táxi estava passando naquele horário. O percurso até sua casa era um pouco demorado então ela resolveu apertar o passo. Na metade do caminho Tereza teve a sensação de estar sendo vigiada. Parou e olhou para todos os lados, não havia ninguém. Seguiu seu rumo e na esquina de casa alguém chamou seu nome. Não era a voz de Thiago, na verdade não era a voz de ninguém conhecido. A única coisa que ela reconheceu foi o cheiro do perfume que a leve brisa da noite levou até suas narinas. Aquele mesmo que ela havia conhecido naquele dia no consultório. Quando se virou teve certeza de quem era. _ Você ? .. Tereza estava confusa. Será que os pensamentos que ela havia tido com ele atraíram aquele homem ? _ Não é meio tarde para andar por aí desprotegida ? Tereza ainda raciocinava a loucura da situação. _ Desculpa mas … como sabe meu nome ? _ Sabendo. _ Ah .. e o que faz aqui ? Ele pigarreou um pouco e passou a mão no cabelo. _ Decidi trabalhar aqui.. Roma parece mais interessante. _ Ah, legal. Bom.. vou indo.. _ Eu acompanho você, vamos. Ele nem esperou que ela respondesse, sem contato físico a acompanhou até a porta do prédio. Tereza ficou quieta, a situação toda era estranha e atípica. _ Bom, agradeço a companhia. Boa noite. Tereza deu as costas ao estranho _ Espera! A voz do homem parecia mais grossa a cada fala, o tamanho e o sotaque carregado indicava que ele pertencia a outro país. _ Sim? Ele parou e a olhou durante um tempo, parecia querer dizer algo mas Tereza teve a impressão de que ele estava relutante. _ Nada. Boa noite. O homem virou as costas e saiu andando como se nada tivesse acontecido. Tereza esperou um tempo até que ele estivesse totalmente fora de seu campo de visão. Tudo naquela noite soava atípico. A brisa leve, o céu parecia estar mais estrelado e o coração de Tereza batia tão forte que ela podia senti-lo saltar no peito. O frio a pegou de jeito e só então ela entrou. Enquanto abria a porta do apartamento Christian apareceu pois ouviu o barulho da fechadura da vizinha. As portas naquele lugar não eram silenciosas e rangiam muito. _ Oi .. fiquei preocupado, você nunca fica fora até tarde. Disse ele com uma leve carranca no rosto. _ Estava visitando uma amiga, não precisa se preocupar. Christian reparou nas sacolas que Tereza carregava. _ Comprou algum presente pra mim? Perguntou ele com tom divertido. _ Não, você tem cara de mimado, nem que eu quisesse saberia o que lhe dar ! Disse ela em tom de deboche. Os dois riram. Tereza reparou que o sorriso dele não era feio, mas nada se comparava às feições do homem de perfume marcante. _ Quer assistir um filme ? Comprei pipoca. Perguntou ele. Tereza sentiu-se tentada a negar, era muita i********e para se ter com um vizinho. _ Não negue, sei que se você ficar sozinha vai apenas deitar e dormir. Não vai fazer nada de interessante.. _ Deitar e dormir é bem interessante. Disse ela rindo. Ela pensou durante uns instantes. _ Tudo bem, vou só tomar um banho. _ Ta, vou esperar você. É só entrar, a porta vai ficar aberta. Disse ele sorrindo. Tereza sentia que deveria manter a distância, até porque envolver-se justamente com o vizinho poderia acarretar alguns problemas, sem falar que aquele homem era estranho o suficiente. Tomou um banho demorado, tinha a esperança de Christian acabar pegando no sono. Quando saiu no corredor o cheiro de pipoca tomava conta. A barriga dela roncou. _ Licença .. Quando entrou no apartamento viu que ele era um homem organizado e limpo. _ Pode trancar a porta. Gritou ele do quarto. Tereza viu que não havia muito espaço e notou que o barulho da TV vinha justamente de onde ele estava. Sentiu um calafrio, fazia tempo que não ficava com nenhum homem assim, a sós. Tereza seguiu até o quarto. _ Pensei que não fosse mais vir. Disse ele. Christian estava esparramado na cama com um balde de pipoca sob o peito nu. Enquanto isso Tereza usava um conjunto de moletom surrado que era do seu ex. _ Impossível fugir de você. Disse ela em tom divertido. _ Qual filme quer assistir ? Perguntou ele enquanto analisava cada parte do corpo totalmente coberto dela. _ Ah, qualquer um. Disse Tereza enquanto sentava em um canto da cama. Christian colocou um filme de terror. Ela detestava esse tipo de filme mas não falou nada. Só queria que acabasse logo para ir dormir. Comeu a pipoca com vontade, o estômago estava vazio e o sono estava cada vez mais forte. Tereza se viu puxada para perto de Christian quando adormeceu sentada. Ele sabia que ela estava com vergonha mas o sono era tão forte que ela nem ligou. Dormiu ali, deitada sob o corpo quente do vizinho, mas seus sonhos pertenciam somente a um homem, aquele cujo nome ainda era um mistério.
Free reading for new users
Scan code to download app
Facebookexpand_more
  • author-avatar
    Writer
  • chap_listContents
  • likeADD