QUADROS NAS PAREDES

1345 Words
 Eu acordei cedo, tomei um banho para curar a minha ressaca e me coloquei em pé finalmente. Tomei o meu café da manhã com pressa, eu não sabia o que o meu dia estava me reservando, eu podia ficar o dia todo cuidando de questões da favela, ou eu podia embarcar para algum lugar do mundo para fazer algum negócio, ou até mesmo me ocupar do meu negócio legal de engenharia. Era f**a o meu dia a dia, ele me matava aos poucos todos os dias, levava um pouquinho da minha alma com ele sempre que podia. Os  funcionários já haviam recebido a minha encomenda, e eu sabia do que se tratava. Eu não mostrei muita animação, apesar de sentir o meu corpo queimar por dentro. Eu não via a hora de ver os quadros pendurados em meu quarto especial. Eu o chamava assim por que absolutamente ninguém entrava lá, tinha apenas alguns troféus antigos, uma escrivaninha, uma poltrona e o meu cofre pessoal.  - Bom dia Sr. Victor...Chegou... - Eu interrompi, eu sabia que havia chegado, não havia necessidade de perder tempo.  - Eu sei o que é, a sala no final do corredor.. Quero todos os quadros colocados lá. - Eu falei sem olhar o rosto do funcionário direito, eu não queria que ele me questionasse os motivos. Ou percebesse o meu nível de ansiedade enquanto eu falava.  Papéis para assinar, fuga de cadeia, pessoas a chantagear, mais uma manhã normal na minha vida, me irritei por que eu fui claro quanto aos meus compromissos mas quando eu finalmente consegui me livrar... Eu não tinha outra coisa em mente a não ser voltar a p***a do jornal, eu esperaria o tempo que fosse necessário para que ela enfim saísse. Eu só queria observar, eu só queria olhar para os olhos dela de perto. Só mais uma vez, eu disse a mim mesmo, aquela fixação tinha que acabar! Talvez se eu a visse eu a esqueceria de vez, notaria talvez algum traço que não me agradasse, e podia seguir com a p***a da minha vida só com os malditos quadros.  Saí sem avisar ninguém, era o único jeito de me não ter que atender mais a nenhuma questão. Fiquei parado na frente daquele jornal imundo por algumas horas. O meu telefone tocou, e eu fui obrigado a atender. - ¿Hijo? - Habla mamá - ¿Va todo bien por ahí? Llamé a la sala de la oficina y no estabas. - Estoy resolviendo algunos asuntos, y ¿por qué estamos hablando en español? ¿Le han prohibido hablar en su lengua materna?  Tradução: - Filho?- Fale mãe- Está tudo bem por aí? Liguei na sala do escritório e você não estava.- Estou resolvendo algumas questões, e por que estamos falando Espanhol? Ficou proibida de falar em sua língua natal? - Ah me desculpa, é força do hábito... Eu só preciso te avisar que logo vamos fazer aquela festa aqui em casa, Melissa está maluca para te ver! - A animação dela me enjoava.  - Eu sei mãe, tá bom. - Tá bom o que Victor? Você vem não é? Meu filho você precisa acabar com a fixação maluca pelo Ivan, eu já te disse que não há nada nessa história!  - Por favor mãe, não me faça te desrespeitar! Ok? Não fale sobre esse assunto, ainda mais defendendo esse imundo! E mais uma coisa, eu vou... Mas eu tenho a impressão de que eu vou acompanhado!  - Acompanhado de quem? - Ela perguntou curiosa. - Eu tenho que desligar, você vai saber quando eu chegar aí! - Me despedi e desliguei, se eu deixasse ela iria infernizar o meu juízo. A minha mãe nem disfarçava o favoritismo em cima da Melissa, que para mim, apesar de gostosa, era um amiga apenas. Não tínhamos nenhum envolvimento romântico, apenas tomamos muitos porres juntos. Saí do carro para desanuviar a minha mente, acendi um cigarro e fiquei parado, olhando fixamente para a entrada. E quando eu acabei de fumar eu a vi saindo... Eu nem consegui descrever o meu sentimento.  Fiquei vidrado olhando para ela, e mais ainda quando eu a vi se encostando a uma parede, ela estava chorando. Senti o meu coração se apertar, eu sabia o motivo. E a culpa era toda minha!  E foi quando aconteceu, ela me viu também ... Os olhos ficaram vidrados nos meus assim como os meus olhos ficaram vidrados nela. Ainda mais bonita do que na minha lembrança ela estava ali, tão perto de mim, e ao mesmo tempo tão longe.  Eu tinha que  chegar mais perto perto, era necessidade mesmo. Como um viciado tem de usar drogas, minha mente estava embaralhada, e eu não sabia como eu poderia me recompor. Era a minha  nova droga preferida bem ali na minha frente, como eu podia evitar de pelo menos chegar perto?  E então, eu fiz o que estava acostumado a fazer... Agi no ataque.  Eu caminhei até ela, com calma, para não assusta-la mais do que eu havia feito.  - Olá... - Eu disse tentando parecer firme.  - Oi. - Ela disse olhando para o chão, para depois colocar os olhos fixos nos meus. Os olhos dela eram julgadores, eu vi logo de cara. Ela estava altiva enquanto me olhava, não era medo no olhar dela, era algo entre raiva e desejo.  - Você é Laura Bernessi correto? - Eu sabia exatamente quem era ela, mas eu tinha que começar de alguma forma. - Sim... eu sou. -  Ela disse isso e mordeu os lábios, eu queria morder os lábios dela também, e quase me deixei levar... Só fui interrompido quando notei o olhar irritado dela para mim, então eu recuperei a minha consciência e deixei sair da minha boca as ameaças que eu fui criado para dizer.  - Um aviso, se afasta dessa história, E nunca mais volta na p***a do morro pra espionar, se eu te pegar lá de novo você não sair com vida, compreendeu? -  Eu falei chegando perto, sentindo o perfume delicioso dela invadir as minhas narinas, eu sabia que aquele perfume ficaria marcado na minha memória para sempre.  - Você é o chefão então? Foi você que pediu minha cabeça? - Ela falou aquilo e eu nem acreditei, ela estava mesmo me questionando? Eu queria sorrir, mas isso acabaria com a minha postura, ela me irritava de uma forma nova naquele momento, o tom de voz dela foi um pouco mais rude, ela queria se impor diante da minha figura intimidadora.  - Por enquanto foi o seu emprego, se continuar vai perder mais coisas. Eu ia atirar na sua cabeça, mas não é que você é gostosinha? Tá avisada! - Eu falei isso e a deixei sozinha com os pensamentos dela.  Mesmo que ela estivesse invadindo os meus.  Mesmo que depois disso eu tenha ido para casa, me sentar em frente aqueles quadros enormes de seu rosto e tenha ficado a tarde inteira assim.  Não era o suficiente para mim, depois de observar as expressões que ela fazia quando ficava acoada, ou brava, eu não conseguia parar de pensar nisso. A voz dela era firme, ela falava com a calma e a frieza de alguém que tinha tudo sob controle em sua vida. Mesmo que eu soubesse que era só fachada para as pessoas verem.  E mesmo  com todos os papéis, todos os fatos sobre ela eu não consegui de jeito nenhum desvenda-la como eu gostaria, ela era diferente de todas as outras.  Enquanto eu a encarava no meu maior quadro me ocorreu a ideia de que ela talvez ficasse pensando em mim também, mas provavelmente da maneira assustadora, que foi como me apresentei.  O problema é que eu não havia aprendido a ser gentil, eu apenas aprendi a entender uma ordem e executar, a ser sempre sincero e sempre justo em meus julgamentos. E quando se vive em um mundo tão hostil... Essa qualidade me dava o que era preciso para ser o maior.  Mas quando se tratava de Laura... era ineficaz. E isso me tirava a p***a do juízo! 
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