P.O.V - LILY
Terminamos tudo aquilo e ficamos um tempo ainda nos tocando, ele me beijou mais naquele dia do que em todos os anos de casamento, bom, era um exagero... mas ao menos um exagero não tão absurdo da minha parte.
- Lily, meu amor... eu preciso tirar um cochilo agora, se não eu não consigo acompanhar você a noite... - eu dei um beijo nos lábios dele e ofereci um sorriso já me levantando da cama com o meu roupão.
- Dorme Ben, eu vou ir lá para baixo para não atrapalhar você... beber uma taça de vinho, talvez um livro... – eu torcia tanto para que ele me tirasse dos meus devaneios, que ele se levantasse e dissesse
“Nada de vinho, me chupa agora” - mas isso nunca sairia da boca do Benjamin, ele jamais ofenderia a sua fé cristã e a sua casinha da Barbie onde tudo cabia no lugar certo.
- Você está com um sorriso lindo no rosto, eu não via ele a muito tempo... bom, talvez eu estivesse sendo um marido péssimo mesmo! – ele não era péssimo, eu é que tinha o fogo de mil infernos dentro de mim, ele fazia o que ele podia para me fazer sorrir, e mesmo assim, nunca era suficiente.
- Que bom que você conseguiu consertar - disse com humor - dorme, você não pode dormir no meio de Freddie, é um ultraje! Então descansa Ben! – eu disse com um sorriso parcialmente falso apontando no meu rosto.
Ele jogou mais um beijo no ar e logo se aconchegou nos cobertores para descansar, eu apaguei as luzes do quarto, fechei as cortinas e saí.
Para ser sincera eu precisava da taça de vinho de um pouco de paz e das janelas para espiar a vizinhança, como todas as moradoras daquele bairro de bacana. Eu Desci as escadas, e eu estava estranhamente relaxada... feliz... esquisita por não estar sempre assim, mas aceitando minha condição, a de fofoqueira da casa do lado, a mulher que leria mil romances mas viveria entremeios.
O sol parecia brilhar forte lá fora, mesmo no final da tarde... os pássaros cantavam.
Minha campainha tocou? - eu disse me tirando do meu devaneio
Abri a porta com um sorriso quando vi uma figura estranha na minha porta, uma mulher baixinha de óculos... a quem eu nunca tinha visto mais magra na minha vida.
- Olá... - disse afetuosa
Ela parecia um pouquinho chocada ao me ver, o que me deixava um pouco mais desconfortável do que o normal, fiquei olhando o rosto dela também para ver se ela desembuchava finalmente.
Ela parecia estar engasgada com alguma coisa, parecia me conhecer a mil anos, por que não era possível que alguém mantivesse um olhar tão julgador assim para alguém que acabou de conhecer.
- Olá... - falei de novo um pouco mais firme – tudo bem com você?
- Ah desculpa... eu sou... Anne...eu... sou a vizinha ali da frente, eu só gostaria de conhecer alguém do bairro que não fosse uma mulher com um vestido muito colorido - ela parecia caótica, e sincera... e tão esquisita... e eu a amei quando coloquei os olhos nela. Era diferente ter a companhia de alguém que não parecia ter saído direto de um comercial de absorvente.
- Ah, então entre, bem vinda ao bairro... - eu disse sorrindo e fiz sinal para ela entrar em casa - você disse que é a vizinha da frente? Então Sra...
- Não, eu não sou senhora... embora eu seja velha demais, eu sou senhorita... soa até m*l né? tem algum uísque por aqui? – ela disse com um sorriso estranho.
Eu servi logo, mas cara aquela figura me fazia sentir em casa, mesmo sem eu ter conhecido ela profundamente, não era esquisito pensar nisso? Eu a conhecia tinha pelo menos três minutos e ela me fazia sentir dentro de uma bolha segura. Entreguei o colo na mão dela e me colei a uma garrafa de vinho, sem cerimônias ela se sentou no meu sofá, ou melhor, se jogou no meu sofá.
- E então você é o que do moço ali da frente?
Ela me olhou de cima abaixo, como se soubesse que a minha curiosidade era imunda, e de fato era, eu estava obcecada, mas eu precisava arriscar.
- O Lucio é o meu irmão, um parceiro de vida... viemos do mesmo lugar distante daqui, não tínhamos família... ou uma casa... e resolvemos que iriamos ficar juntos tipo para sempre? - ela deu uma risada forçada – então somos família, nada demais, por que a curiosidade? Gostou dele? – ela disse em um tom debochado.
Eu desconversei.
E a história deles parecia com a minha, de um modo que fiquei assustada.
- Entendi, ele disse mesmo que não era casado - droga, eu não deveria ter falado aquilo, o que importava se o cara era casado ou não? o que importava para mim? uma mulher muito bem-casada que tinha um marido médico que transou enlouquecidamente com ela na parte da tarde e estava dormindo com direitos ali em sua cama? - desculpa, eu nem deveria ter dito algo assim.
- Tudo bem, ele não é casado mesmo. Mas deixa o meu "irmão" m*l humorado para lá, como você suporta viver aqui? você chegou a muito tempo? – disse ela parecendo curiosa.
As mulheres daqui não sabiam nada da minha história, ela só queriam saber do meu status quo em meio aquele subúrbio, ninguém estava nem aí para a minha história real, será que eu tinha família? Já tinha algum filho? Eu tinha um pai ou uma mãe? Tudo o que interessava era o pequeno teatro romântico que o meu marido fazia ao contar que se apaixonou por uma indigente, sua paciente, no hospital memorial.
Ninguém queria saber sobre coisas cortadas da minha realidade, que eu mesma fazia questão de remoer sozinha.
- Complicado, na verdade minha história era complicada... - eu disse sendo evasiva - a sua dose, estás acabando?
- Não se incomode, o Lucio tem um estoque de Uísque em casa... olha... desculpa eu não perguntei o seu nome... - ela disse confiante
- Lily, Lily Baker...
- Lily Baker... nossa que nome imponente! Todos nós temos coisas a resolver, passado a desvendar e coisas no que pensar. O importante é sempre manter a mente aberta para o novo, para o futuro... você tem uma casa bacana, e pelo que vi seu marido também deve ser bem legal... então... É só manter tudo isso... – aquela era uma indireta? Ela parecia estar me dando um tipo de aviso, foi estranho como aquilo mexeu comigo de alguma forma.
- Entendi! – eu disse com um olhar meio perdido
- Sei lá, eu já fiz muita merda na vida sabe? eu só queria dizer isso... conhecer você... e dizer para ficar longe mesmo dessas suas vizinhas... vai por mim... não são boas pessoas! - ela se levantou - eu vou indo agora, muita coisa para arrumar nessa mudança, muita gente para agradar... morar com um irmão não é fácil, vejo você depois? – ela disse, mas os assuntos, as indiretas se misturaram ao que ela queria mesmo dizer.
- Claro, eu adorei te conhecer... Anne... - por que parecia que aquele não era o nome dela? parecia ter um complemento, foi como se tivesse despertado na minha cabeça um gatilho sobre isso, deveria ser alguma loucura com certeza.
- Também gostei de te ver Lily! - ela disse com um tom um pouco mais baixo, eu não sabia o motivo, mas aquela frase me pareceu tão estranha para alguém que tinha acabado de me conhecer - nos vemos por aí!
- Sim, com certeza...
Ela se foi e lá estava Vivian na porta da casa deles de novo, Anne olhou para trás e esboçou uma reação de nojo olhando para mim que me fez rir. Ele logo abriu a porta, e eu pude observar aquele pecado um pouco mais de perto. Sombrio como sempre ele me olhou diretamente antes de olhar para a pessoa que tocava insistente a campainha dele.
Sei lá por que mas quando ele me olhava eu me sentia um pouco nua, quase como se ele, com um olhar, tirasse as minhas roupas todas e me colocasse sob uma mesa de mármore.
Meu Deus eu precisava de algum tipo de terapia, e era urgente! p***a!
- Lily, quem era na porta amor? - disse Benjamin descendo bem a tempo de eu abandonar aquele meu devaneio i****a.
- Ah amor, a vizinha... a da frente... veio dar um oi! - eu sorri - Anne o nome dela, ela vive com o irmão Lucio aí na casa que era dos Harolds.
- Nossa, você recebeu uma vizinha dentro de casa? que coisa esquisita... - ele disse me olhando profundamente com um pouquinho mais de humor.
- Sim, acredita? mas ela é psicótica, problemática... que nem eu, isso não é demais? - eu me aproximei dele e ele me deu um abraço apertado
- Você é um problema que eu não quero resolver sabia? – ele disse carinhoso como sempre.
- Por que não? Sabe que poderia resolver se afastando da sua esposa louca e insatisfeita o tempo inteiro, faria até bem para você;
- E qual a graça de entender a minha esposa misteriosa? Perderia todo o sentido da vida...
- Um dia você vai me sacar, vai me resolver... eu sei disso Bem! – plantei um beijo na bochecha dele
- No dia que eu resolver você provavelmente vai embora da minha vida. E eu não vou saber lidar com isso Lily, eu te amo demais para ver você partir. – ele disse seriamente olhando em meus olhos enquanto segurava a minha cintura.
- Eu sei, eu não quero resolver também bem, eu também não quero – eu confessei ainda olhando em seus olhos sentindo o meu coração se desmantelar dentro de mim.
- Queria te entender, mas não sei se posso Lily!
- Não pode Ben, você não pode me entender!