PARTE 3

2210 Words
 — Bom dia, prazer revê-los – cumprimenta Denise sorrindo ao encontrar Beatriz e Flávio na entrada da mansão — Nessa visita, preciso saber se a criança crescerá em um lar com estrutura adequada Denise caminha pela casa, mostrando ser uma pessoa rápida e objetiva. Olha cada cômodo da casa, jardim, piscina e a garagem.  — Essa casa pertence a vocês?– pergunta a assistente social.  — Sim– responde Flávio — Meus pais transferiram a casa para o meu nome já que decidi residir no Brasil.  — Ótimo –comenta Denise anotando em sua ficha — Onde será o quarto do filho de vocês?  — Por aqui – informa Beatriz apontando para o corredor. Ela abre a porta quase ao lado do quarto deles e mostra o quarto em tons pastéis para a assistente que entra admirada — Ainda vamos terminar de colocar as proteções da janela e no banheiro. Mas é esse aqui. Denise olha o cômodo todo e sai em direção à entrada da mansão sendo seguida pelo casal, cheio de expectativas.  — É uma casa bem espaçosa e pelo lado social, digo de antemão que o parecer será positivo – finaliza Denise — Agora só precisam aguardar o outro laudo. Beatriz segura forte na mão de Flávio, tentando não agarrar a assistente social, apenas estende a mão em agradecimento. Mas assim que Denise sai, os dois se abraçam e pulam de alegria.  — CONSEGUIMOS! Flávio chega a pular com Beatriz na piscina de felicidade.  — Conseguimos meu amor – comenta Flávio beijando Beatriz. **** Um mês depois...  — Como vocês lidarão com o passado dessa criança?– pergunta Carolina, a psicóloga que cuida do processo de adoção. Aquela é a primeira das três entrevistas que serão realizadas até o parecer final.  — Não vamos ignorar o passado dela. Vamos tentar deixar bem claro para o nosso filho que aquele passado aconteceu e nada vai mudar isso. Mas que a vida dele é essa agora e sempre estaremos ao lado dele – responde Flávio segurando na mão de Bee.  — Montaram o perfil da criança com relação a doenças e o histórico da criança? – pergunta Carolina — Vocês têm alguma ressalva, algo que não gostaria na criança.  — Pensamos muito e não temos problemas com crianças que possuam doenças tratáveis e nem com históricos de abusos. Nós estamos trabalhando muito para lidar com essas situações e temos todo um suporte para o nosso filho – explica Beatriz.  — Muito bom – diz a psicóloga — E como estão se preparando para a chegada dessa criança? Com a maternidade? Com a paternidade?  — Estamos lendo alguns livros sobre adoção – responde Beatriz olhando para Flávio.  — Vendo filmes, indo às palestras. Estamos lendo um livro muito bom – responde Flávio — “Conversando com crianças sobre adoção”, não lembro o nome da autora.  — É Lilian de Almeida Guimarães – comenta Beatriz — Estamos gostando muito... Tem mostrado bastante para gente a respeito dos efeitos de uma adoção tardia. Foi feito com base em entrevistas, não é amor?  — Sim, com três crianças que passaram por adoção tardia – explica Flávio — Sobre o quanto as crianças sentem a angústia dos pais adotivos e quão m*l pode fazer o sentimento de não pertencer totalmente à nova família. Que vai ser bem a realidade a qual vamos enfrentar.  — Excelente – diz Carolina — Já escolheram quem vai ser o primeiro a passar pela entrevista individual?  — Eu – responde Flávio, erguendo a mão.  — A segunda é com a Beatriz e a última os dois juntos. Aí darei o parecer final. Pode sair por gentileza Beatriz.  Flávio, vamos começar.  — Tudo bem – responde Flávio concentrado.  — Flávio, como é a sua família?  — Minha família é uma mistura de costumes brasileiros e britânicos, então acho que ficamos bem equilibrados. Acho que nós somos uma família bem unida.  — Como foi sua infância?  — Uma ponte aérea entre Brasil e Inglaterra, mas foi ótima. Foi na infância que eu conheci a Beatriz então... Não mudaria nada.  — Como é a relação com seus pais?  — Eu tenho uma ótima relação com a minha mãe. Minha mãe é minha melhor amiga... Com meu pai tenho respeito, mas não temos uma relação muito afetuosa... Mas isso é da família do meu pai.   — Quais as suas melhores lembranças?  — Meu primeiro beijo com a Beatriz, o nascimento dos meus irmãos, rever a Beatriz no ano novo, a viagem que fiz com a Beatriz... O pedido de casamento que fiz a Beatriz... O nascimento da Ashley... O nascimento da Sofia... E viver com a Beatriz... Ahaahahah Acho que as minhas melhores lembranças são com a Beatriz.  — Bom, deu para notar – diz Carolina — Já que entramos na questão Beatriz: Como é a relação de vocês?  — Eu amo a minha relação com a Bee. Somos amigos, Cúmplices e amantes. É uma relação sincera, somos honestos um com o outro... Eu realmente amo muito essa relação.  — Como você se sente com o casamento de vocês?  — Realizado... Sabe, eu olho para a Beatriz e ela é a razão da minha vida. Eu sinto que nasci para ela... Todo mundo fala que a relação muda com o casamento, mas com a Bee... Desculpa Beatriz é que eu a chamo de Bee...  — Pode chamar, sem problemas.  — Quando estou com a Bee... É como se eu sempre voltasse para aquele dia de sol... Para o vento das árvores... Para o nosso primeiro beijo... Eu ainda vejo aquela menina todos os dias dentro dos olhos dela... A Bee me leva ao céu todos os dias... Você tem de vê-la dormindo... É como se Deus tivesse deixado um anjo cair na terra sem querer e... Eu tive o prazer de conhecer aquele anjo... Se eu pudesse escolher uma forma de morrer, seria olhando para o rosto dela dormindo... Eu não consigo me imaginar sem ela... E hoje eu não consigo me imaginar sem ter um filho com ela.  — Nossa... Você realmente a ama – diz Carolina, surpresa.  — Como não amar? Ela é parte de mim, a minha parte mais bonita, ansiosa, inconsequente, risonha, desastrada e amorosa que eu tenho. **** A segunda entrevista foi feita com Beatriz, sobre a vida dela e todas as questões feitas para o Flávio. Na terceira entrevista, os dois entram de mãos dadas na sala observando Carolina.  — Qual o sonho de vocês para essa criança? – pergunta Carolina.  — Eu tenho o sonho de poder ensinar ao nosso filho como amar ao próximo. O respeito e a igualdade, a ser justo honesto e bom. Mesmo que nunca receba em troca –responde Flávio — Eu quero o melhor de mim para ele.  — Eu tenho o sonho que ele olhe para o seu passado e tenha certeza de que aquilo nunca mais se repetirá – responde Beatriz que olha para o marido — E que ele sempre se lembre de nós, mesmo que não estejamos mais fisicamente e que saiba que nós sempre estaremos com ele.  — Já escolheram um nome para o filho de vocês?  — Não vamos mudar o nome – dizem os dois ao mesmo tempo.  — Concordamos que trocar o nome dele seria apagar a sua história, quem é o nosso filho... Então ele terá o mesmo nome, só vamos colocar os nossos sobrenomes – explica Flávio.  — Ótimo – diz Carolina, sorrindo — Devo dizer que vocês dois me conquistaram, e saibam que o meu parecer é favorável. E tenham certeza que se tudo correr bem, o filho de vocês estará em casa antes do que imaginam. **** Um mês depois...  — Acho que vou mudar as cortinas, pois se ele tiver doze anos... Ele vai achar infantil, não acha? – pergunta Beatriz para sua mãe que a encara, misteriosa — Diz alguma coisa mãe?  — Você está me lembrando alguém – comenta Miranda, serena.  — Quem? – pergunta Beatriz, curiosa.  — Eu quando estava grávida de você – responde Miranda sorrindo — Eu me torturava tentando imaginar como o quarto ficaria mais perfeito...  — Com a enorme diferença que não estou grávida – resmunga Beatriz sentando na cama — Nem habilitada... A psicóloga disse que a essa altura já estaria tudo certo.  — Filha, você está grávida. Você está naquela fase em que seu corpo já disse que sim, mas você ainda não tem o exame provando. Não se preocupe você vai conseguir.  — Será, mamãe? – pergunta Beatriz, insegura.  — Dona Beatriz! Dona Beatriz! – grita Leninha do corredor. Ela entra no quarto correndo, Ela respira fundo sob o olhar curioso de Bee e continua — Tem... Um... Tem um homem... Da justiça... Ele quer... Falar... Com... A senhora. Beatriz desce correndo as escadas, com seu coração nas mãos. Assim que entra no saguão, o oficial de justiça sorri , estendendo um envelope em direção de Beatriz.  — Beatriz Gouvêa Wilkinson, assine que recebeu o envelope, por gentileza. Ela assina o documento e recebe o envelope. Caminha até a sala atordoada e então senta em seu sofá. Abre o envelope com toda calma do mundo e tira o documento de dentro. As lágrimas começam a rolar pelo rosto de Beatriz que abraça o papel, enquanto chora.  — Filha, está tudo bem? –pergunta Miranda, preocupada.  — Estamos... Nós estamos... Nós estamos habilitados! Nós entramos para a fila da adoção! ****  — Então... Em que posição nós estamos? – pergunta Beatriz olhando para Flávio que desliga o telefone tranquilo – Então?  — 135 – responde Flávio sob o olhar decepcionado de Beatriz. Ele segura o queixo da esposa— Ei, estar nessa posição, não significa nada. Não tem como prever quanto tempo esperaremos e você lembra o que disseram no grupo: Há grandes chances de nós esperarmos bem menos.  — Eu sei, mas quanto tempo, Flávio?– pergunta Beatriz, nervosa — Por quanto tempo nós teremos de esperar?  — O tempo que for necessário. Quanto mais esperarmos, mais pronto estaremos para o nosso filho. **** Um mês depois... Beatriz está terminando de analisar a pauta da reunião quando seu celular toca a fazendo atender rapidamente, sem olhar o número:  — Boa tarde, gostaria de falar com Beatriz Gouvêa Wilkinson.  — É ela, quem fala?  — Aqui é da Vara da infância, estou ligando para confirmar que vocês estão inscritos na Vara da Infância para adoção, certo?  — Sim.  — E vocês ainda já adotaram ou visitaram alguma criança?  — Não.  — Queria saber se vocês têm interesse em conhecer um menino de oito anos. Ele está em um abrigo no Rio de Janeiro e bate com o perfil que vocês escolheram. Beatriz fica paralisada com a ligação. Está acontecendo... Está acontecendo mesmo...  — Senhora Beatriz? Está na linha? – pergunta a jovem do outro lado da linha — Senhora Beatriz?  — Estou... Eu estou sim – responde Beatriz recuperando do choque.  — Vocês estão interessados...  — Sim, estamos! – grita Beatriz, empolgada — Desculpe-me e sim, nós estamos interessados.  — Eu volto a retornar dentro de trinta minutos para agendar dia e horário com a equipe técnica. Após um bom tempo, finalmente Beatriz desliga seu telefone. Uma chuva de emoções toma conta do corpo de Beatriz que não consegue se controlar e começa a rir e chorar ao mesmo tempo. Disca o número de Flávio que atende no terceiro toque:  — Oi, mô.  — Flá... Flá... Nós... Flá... Nós... A moça... Nós... Flá...  — Beatriz você está bem? – pergunta Flávio preocupado com os soluços da esposa. — Fala comigo.  — Nós estamos grávidos! – grita Beatriz — Acabaram de me ligar e vamos conhecer o nosso filho em breve.  — Ahhhhhhhhhhhh! Deus! Graças a Deus! – grita Flávio do outro lado da linha                     — Eu te amo, meu amor. E já amo o nosso filho.             — Eu também amo você demais! **** Carolina se aproxima com uma pasta amarela, Beatriz e Flávio sabem o que ela representa: Toda a antiga vida da criança.  — O objetivo dessa reunião é para que conheçam toda a história da criança e da família biológica que consta nos autos, desde a gestação até agora. Os pais adotantes têm que saber de tudo porque vocês serão os “guardiões” de tudo o que aconteceu com ele, até que ele tenha idade e maturidade para conhecer os detalhes de sua história. Depois de lerem, preciso que me digam se realizarão a primeira visita ao menino no abrigo. Beatriz recebe uma ficha e Flávio outra. No topo do papel vem escrito em destaque: MURILO. Eles abrem o arquivo e começam a ler em silêncio, em poucos minutos, lágrimas silenciosas escorrem pelo rosto de Beatriz. Ali está toda a vida de Murilo, pesada demais para uma criança da idade dele. A única coisa que preocupa Bee é se todo aquele sofrimento fez o garoto perder sua pureza e bondade, que toda criança traz consigo. Depois de alguns instantes, Bee ergue o rosto e fecha a pasta, entregando de volta para Carolina. Sendo seguida por Flávio que tenta disfarçar seu abalo por aquela história.  — Vocês desejam conhecer o Murilo? – pergunta Carolina, séria.  — Agora mais do que nunca – responde Flávio.
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