Encontramos com Jacob na escada. Assim que ele vê Emily, é possível ver seu semblante relaxar completamente. Mas logo muda para uma carranca brava.
— Para casa. Agora. — Ele diz entre os dentes.
Emily apenas vira de costas pra ele e começa a ir em direção a saída.
— Ela está bem. — Digo a Jacob.
Ele balança a cabeça.
— Ela não está bem. Quer carona?
Eu devo deixar Kim e Jenifer sozinhas nessa festa? Bom, elas já são grandinhas e parecem ter ao menos um pingo de juízo.
— Sim, por favor.
Caminho com Jacob para fora, mas antes, vejo o grupinho de Kim e Jenifer. Aviso Jacob que vou falar com elas e dou uma corridinha até elas.
— Já vou indo. Jacob vai me dar uma carona, vocês vão ficar por aqui mesmo?
Kim assente.
— Sim, vamos mais tarde.
— Prazer em conhecê-los! Até a próxima! — Digo aos amigos de Kim e Jenifer.
Recebo acenos e sorrisos. Menos de Violet, ela não parece muito feliz em me vez saindo com Jacob, o que me dá vontade de ficar ainda mais próxima dele. E pela minha experiência com ler as pessoas durante uma improvisação num palco, Jacob parece ter percebido.
— Eu tava com saudade. — Ele fala quando estamos bem afastados de todos, e então para.
Eu não sei o que responder. Não posso dizer que eu também estava, nunca o conheci. E francamente, Alison o viu pela última vez quando ainda frequentava um pediatra. Do que exatamente ela estaria com saudade? Na minha frente, tem uma pessoa provavelmente completamente diferente da que ela conheceu. Se passaram 7 anos. Ninguém é o mesmo após 7 anos.
— De que exatamente você tinha saudades? — Pergunto. Faço uma voz manhosa.
Jacob me dá um sorriso divertido, sem mostrar dentes, e me olha com um olhar tão divertido quanto.
— Tenho saudade da minha melhor amiga. — Ele faz uma pausa. — Da sua companhia, dá sua voz doce quando eu estava triste, de como você me fazia sentir alguém a ser visto.
Respiro.
Respiro, pois, eu estava prendendo a respiração sem saber. Pois o que Jacob falou me pegou. Eu não sei como é ter alguém como ele descreveu, mas eu sei o que é querer ter isso. Eu também sinto falta disso, mas ao contrário dele, eu sinto falta de algo que nunca tive.
— Sabe, não quero te decepcionar, mas eu mudei muito desde aquela época.
Ele assente, mas ainda mantém o sorriso.
— Eu sei. Eu vejo. Eu era a pessoa que mais te conhecia no mundo e hoje, mas te reconheço. — Ele diz.
Sinto meu coração palpitar. Será que vou estragar tudo? Será que Jacob suspeita de algo?
— Bom, a França me mudou muito...
Jacob balança a cabeça.
— Não foi a França. — Ele diz de repente e se aproxima. — Foi sua mãe, né?
Lisa?
— Minha mãe?
— Eu lembro de tudo, Alison. E você também. O jeito que ela tratava você...eu odeio aquela mulher com todas as minhas forças e acho que quando você finalmente se libertou dela, você pôde ser quem você realmente é. E eu gosto muito, muito mesmo da nova você.
Eu não esperava isso. Fico curiosa para saber o que Lisa fez com Alison e cada vez mais preocupada, mas sinto meu coração quentinho. Jacob acabou de falar que gosta muito da nova eu. Isso não teve a ver com a Alison verdadeira.
E sim, comigo.
Sinto que devo falar algo, então, seguro sua mão.
— Você também mudou, e eu gosto muito. — Digo a ele, o fazendo desviar o olhar para esconder um rubor quase imperceptível. — Vamos?
Ele assente. Ando na sua frente, por segurança.
Vamos até perto de onde Kim estacionou. Emily está escorada em um carro preto. Jacob tira uma chave do bolso e destrava o carro, para que Emily entre.
E agora eu vejo direito o carro de Jacob. Não é só um carro esportivo de rico. É um Maserati.
— Uau. — Solto sem nem pensar sobre. — Você tem uma Maserati.
— Lindo, né? É um Maserati Granturismo V8. Ano 2020.
Sem palavras. Eu não conheço muito de carro, mas conheço o básico. Assim como sei que esse carro é muito caro.
— Quanto você pagou nele?
Jacob faz sinal para que eu entre no carro.
— Uns 210 mil. — Ele diz quando nos dois entramos.
Eu não sei explicar o que é o lado de dentro desse carro. Eu confesso, estou extremamente impressionada com o carro, e Jacob está gostando disso.
Ele dá partida no carro e se vira para Emily no banco de trás.
— Eu estou bravo com você, mas se segura, vou mostrar pra Alison o que meu bebê pode fazer.
— Perai, o que? — É só o que eu tenho tempo de dizer antes de Jacob arrancar.
Meu corpo cola no banco com a velocidade, procuro qualquer coisa que dê para segurar forte com as mãos e trinco os dentes. Sinto um frio na barriga r**m. E então vejo Jacob como eu deveria ver.
O dia de hoje me deixou deslumbrada. Algo que eu queria evitar desde o começo. Lojas caras, casas enormes, carros de luxo. Por um momento, eu esqueci o porquê eu odiava tudo isso. O porquê eu odiava essas pessoas. Por um momento, eu me perdi de mim.
Mas agora, após cinco minutos com Jacob andando pela cidade como se fosse sua própria pista particular, eu me lembrei.
Porque foi alguém exatamente como Jacob que matou meu pai.
— Jacob, para esse carro. — Digo, quando finalmente sinto minha voz. Ele não me escuta, está concentrado na direção irresponsável que está fazendo. — Jacob! Para o carro!
Dessa vez eu quase grito. Uma ansiedade sobe no meu peito quando ele olha pra mim ainda sem desacelerar o carro.
— Por quê? — Ele pergunta apenas, mantendo a velocidade.
— Para esse carro agora ou eu vou pular dele, e eu juro que pulo, pois prefiro me estraçalhar toda, a ficar mais um segundo nesse carro com você.
— Pare o carro! — Agora Emily insiste, tão nervosa quanto eu.
E Jacob pisa no freio. Um cheiro forte de pneu queimado sobe quando o carro para completamente e eu abro a porta.
— O que aconteceu? — Ele me pergunta.
— O que aconteceu? Sério? Você anda a 120Km/h numa via que permite 60Km/h, sem se importar com quem está em volta! Você não sabe se tem um pai passado por perto que você vai atropelar, fugir e deixar uma menina órfã.
— Eu não...isso não é verdade. — Ele fala com a voz mais grave.
— Como você saberia? A pessoa de lado de dentro do carro de luxo nunca sabe, Jacob. E eu tenho nojo de gente que nem você. — Sinto um peso sendo tirado de mim e ao mesmo tempo, uma vontade imensa de chorar.
— Você não está sendo justa comigo, Alison. — Ele continua com a voz grave e eu consigo ver claramente a decepção em seu rosto.
— Justiça? Sério garoto rico num carro de 200 mil reais, você quer falar de justiça? — Olho para os lados. — Aposto que não gosta tanto da nova eu agora, né?
Bato a porta do carro e vou em direção a um taxi que vi agora pouco. Por sorte, o carro estava desocupado e lembrei ao menos o endereço da casa Le Blanc.
O taxista me cobra uma fortuna para entrar em Bel Air. E eu dou meus últimos centavos da carteira pra ele. Preciso passar num caixa eletrônico para sacar. Eu não tenho um cartão de crédito como os ricos.
Chego na casa Le Blanc e torço para não encontrar ninguém. Por sorte, consigo ir direto para o quarto de Alison. Me jogo na cama, fazendo Harry, que estava tirando um cochilo de barriga pra cima lá, tomar um susto e miar.
Eu sei que fiz m***a.
Eu sei que tive um surto e saí do personagem.
E eu agora, mais que nunca, estou com medo de Jacob descobrir e me entregar.
Vou ter que me desculpar com ele.
*******
Acordo na Segunda-feira no meu horário rotineiro semanal. E tomo um susto ao chegar na mesa de café da manhã e toda a casa estar lá. Lisa, Mary, Phillip e Marc. Aparentemente, todos só são preguiçosos nos fins de semana. Agora estão todos falando quase ao mesmo tempo sobre a empresa.
— Olha quem já acordou! — Phillip diz.
— Bom dia a todos, como estão? — Pergunto me sentando.
— Estamos bem, querida. — Phillip diz.
— Como foi a noite? — Marc pergunta.
Como foi a noite? Desastrosa.
— Foi bem legal.
— Estávamos falando sobre a empresa. — Mariz diz da ponta da mesa. — Pensei em levar você lá, faz muito tempo e ela mudou bastante.
— Jacob trabalha hoje? — Pergunto.
Marc levanta uma sobrancelha para mim.
— Todos trabalhamos as segundas. Não lembra? As segundas sagradas dos Le Blanc. — Marc diz.
Droga. Lembrei agora. Li isso na matéria sobre as mulheres Le Blanc. Todas as segundas, de todas as semanas do mundo, os Le Blanc trabalham. Sempre, sem exceção. com certeza era algo que Alison deveria saber.
— É claro! Como sou boba. — Digo dando um sorriso sem graça. — Eu adoraria conhecer a empresa, vovó.
Mary bate uma palma.
— Maravilha!
Ás 7:30, saímos.
Dois carros como o que Lisa usa, estacionam na nossa frente.
Mary puxa a mim pra um dos carros. Marc está quase entrando no carro conosco, quando lisa entra na frente dele.
— Vai com o papai, por favor? — Ela pergunta ao irmão.
— Você odeia ir com a mamãe. — Ele sussurra, mas não baixo o suficiente.
Lisa dá um empurrão no irmão e se junta a mim e Mary.
Lisa fez isso para que eu não ficasse sozinha com Mary, provavelmente para me vigiar. Mas ela não teve nada com que se preocupar durante o caminho. Mary apenas falou da empresa. Em como os cosméticos Le Blanc cresceram nos últimos 7 anos.
Chegamos ao prédio. Relembro a primeira e última vez que estive aqui. Para uma audição. Péssimo dia. E enquanto estou passando pelo saguão, procuro a sala das audições e há uma placa lá.
Estão fazendo audições agora mesmo para um comercial.
Que ironia.
Mary me mostra toda a empresa pessoalmente. Me apresenta a todos como sua neta. E por fim, ela me mostra a direção da sala de Jacob. Fico mais alguns minutos com ela, então digo que vou ao banheiro e parto em direção a sala de Jacob. É toda de vidro, consigo vê-lo trabalhando ao fundo.
Vou entrando, até que uma moça vem correndo em cima de saltos e se põe na minha frente.
— Opa! Desculpa, precisa se identificar primeiro, vamos ali até minha mesa? — Ela diz atordoada.
Olho para sua mesa. É a secretária de Jacob, provavelmente.
— Muito prazer, Alison. — Digo a ela e estendo a mão. Quando ela me cumprimenta, completo. — Le Blanc.
O terror no rosto da mulher é inimaginável. Ela tem a boca entreaberta por alguns segundos e então aprece se dar conta.
— Mil perdões, pode entrar, senhorita Le Blanc.
Me sinto bem. É a primeira carteirada que dou na vida.
Abro a porta da sala de Jacob e o mesmo está sentado numa cadeira enorme e cara, mexendo em um notebook. Ele levanta os olhos da tela e me vê. Seu rosto vai de 0 a 100 em num segundo. Por um momento ele parece feliz, e em outro, parece lembrar do dia de ontem.
Me aproximo dele.
— Oi. — Digo apenas.
Jacob, ainda sentado, se afasta da mesa, me convidando para vir para perto dele.
Vou para seu lado e respiro fundo antes de falar. Ele me olha com curiosidade, mas não me apressa.
Agora, tenho a visão da parte de fora da sala de Jacob. E vejo ninguém mais, ninguém menos do que a própria Kiara Foster conversando com a secretária de Jacob.