Capitulo 4

3020 Words
Ás 10 da manhã em ponto, estou devidamente vestida e maquiada, esperando pelo motorista de Lisa. Porém, meu dia não começou ás 10am. Levantei perto das 7am, mesmo tenho dormido bem tarde. Acontece que eu sou um pouco viciada em rotina. E minha rotina todos os dias começa nesse horário, para que eu tenha tempo de tomar um bom café da manhã, me arrumar devidamente, dar atenção para meu gato e sentar por 5 minutos, olhando pro nada, pensando sobre mais um dia. Peyton ainda está dormindo. Usei todo meu tempo para me arrumar, tentando parecer ao menos alguma parente distante daquela mulher. E claro, dei toda atenção possível para Harry, afinal, meu bichinho fez uma cirurgia de emergência na noite passada. Estou quase checando o horário pela terceira vez, quando um carro preto que reconheço ser o do motorista de Lisa, para do outro lado da rua. Ajeito minha bolsa e vou em direção ao carro. O motorista tem o vidro fechado, penso se não devo falar algo com ele, mas mesmo comigo parada na frente de sua janela, ele não abaixa o vidro e nem olha pra mim. Será que gente que trabalha pra rico também se acha inalcançável? Entro no carro. Assim que fecho a porta, o carro começa a andar. Um leve cheiro de carvalho entra pelas minhas narinas, um cheiro muito bom, me lembra o Canadá. Começamos a andar por lugares na cidade quase desconhecidos pra mim. E paramos, uma meia hora depois, em frente a um hotel. O irreconhecível "The Beverly Hills Hotel". — Chegamos. — O motorista me avisa. — Apenas diga na recepção que veio ver Lisa LeBlanc. Assinto. Seguro minha bolsa barata e falsificada perto do corpo e saio do carro. No momento que piso no chão, sinto meu estomago embrulhar. O bairro onde eu trabalho é chique. O próprio restaurante já foi visitado por celebridades, fica numa área nobre de Los Angeles, mas isso aqui? Esse lugar basicamente exclama riqueza e soberba. No restaurante vejo homens e mulheres ricos, vestidos nos melhores ternos já feitos, mas esse lugar tem aquele nicho de pessoas que não usa um terno caro. E sim, as roupas da última moda. Pessoas com corpos que a sociedade denomina como perfeitos e saudáveis. E claro, bronzeados. Caminho para o hotel, mesmo sabendo que minha calça jeans Wide e minha blusinha de alcinhas azul não pertencem a esse lugar. Entro no Hall. Nem me atrevo a analisar o lugar, ou sei que vou cair em depressão, pensando que esse lugar existe na mesma cidade em que meu apartamento. Vou até a recepcionista, vestida num uniforme vermelho e com um coque na cabeça impecável, sem nenhum fio fora do lugar. Ela tem a pele bronzeada, olhos castanhos e o cabelo da mesma cor. Parece jovem, e abre um sorriso quando me aproximo. — Seja bem vida ao Beverly Hills Hotel, me chamo Chalie, como posso ajuda-la hoje? — Ela diz num tom de voz calmo e firme. — Lisa LeBlanc está me esperando. — Aviso. Ela olha para a tela do computador, e depois volta sua atenção para mim. — Ah, sim. Olá, Alison, deixe-me acompanhar até a suíte da senhora LeBlanc. Charlie, a recepcionista, passa por detrás do balcão e se junta a mim no Hall. Ela faz um gesto com o braço, indicando que eu prossiga e me encaminha até o elevador. Entramos no até espaçoso compartimento de metal e Charlie aperta o último botão. Não tenho tempo de discernir qual botão é, pois ela se vira pra mim. — Sua mãe é uma mulher tão bonita e forte, você deve ser muito orgulhosa dela. Pisco algumas vezes antes de me lembrar do motivo de eu estar aqui. —Ah, sim, claro. Ela é sim...digo, eu sou sim. — Faço uma careta assim que Charlie se vira para a porta. Esse é o nível de atuação que eu vou entregar? Desse jeito serei pega antes de começar. —Ela, na verdade, é uma mãe muito atenciosa, sabe? Lembro que uma vez, tirei nota vermelha em Química. Minha professora ficou furiosa e tentou me dar uma bronca na frente da minha mãe. E sabe o que ela fez? Charlie tem os olhos atentos sobre mim, o que é engraçado, pois ela é bem mais alta que eu e tem que baixar um bocado sua cabeça para me olhar. — Nem consigo imaginar. Ela brigou com a professora? Ela parece do tipo que se exaltaria pra defender a filha. — Ela fez melhor. Minha mãe, calmamente apontou meu boletim escolar para a professora e disse a ela num tom de voz bem firme e calmo: "Poderia me explicar como uma aluna que tira A+ em todas as matérias, tira nota vermelha em química? Claramente algo aconteceu e não tem a ver com a capacidade de absorver informações da minha filha, ela segue tirando nota máxima, mas você, como posso ver pela fila de pais esperando pra falar com a senhora, segue distribuindo notas baixas." Charlie levou as mãos a boca. — Alguém mais ouviu isso? — Ela pergunta. — Uma boa parcela de pais que se juntaram para exigir que o diretor da escola investigasse as aulas da Sra. Wilson. Acontece que nos alunos já havíamos denunciado a Sra. Wilson ao diretor, a mulher dava aulas de qualquer jeito e colocava coisas na prova que nunca tínhamos visto. Mas nada acontecia, até minha mãe fazer isso e finalmente verem o absurdo que Sra. Wilson fazia conosco. Charlie balançou a cabeça admirada. O elevador para e abre suas portas, revelando um belo corredor. — Ela é mesmo incrível. Minha mãe nunca enxergaria uma nota vermelha como falha de qualquer outra pessoa a não ser eu. — Ela diz andando na minha frente agora. Paramos em frente a uma porta. — Bom, é aqui. Foi um prazer te conhecer, Alison LeBlanc. Charlie se retira. Alison LeBlanc. O nome estranhamente se encaixa na minha cabeça. Penso sobre a história que acabei de contar. A história de como minha tia fez com que minha professora fosse demitida, e não Lisa. Foi mais fácil assim, apenas substituindo a imagem da minha tia na minha cabeça enquanto contava a história, fez com que ela parecesse realmente mais verídica. Dou duas batidas na porta. Não demora até que eu ouça um clique e a porta de abra. Lisa está atrás da porta entreaberta, vestida num robe que eu diria ser a exata cor de um bom vinho. Não que eu conhecesse bons vinhos. Ela solta um pequeno bocejo educado e abre a porta completamente. — Entre, por favor. Eu ainda não consegui me acostumar com a semelhança. Ela larga a porta e some adentro do quarto. Então, entro e deixo a porta fechar atrás de mim. A verdade é que chamar esse local de quarto, é errado. Isso não é uma casa de hotel, é maior que meu apartamento inteiro. Logo de cara, me deparo com uma espécie de sala. As paredes são de um marrom claro, no meio da sala há um sofá em forma de "C", com as extremidades arredondadas e incontáveis almofadas em cima. Uma mesinha de centro no meio e mais próximo, uma poltrona verde água que foi feita para uma rainha sentar de tão linda e cheia de detalhes. Consigo ver que há uma varanda enorme com uma mesa e cadeiras mais a frente, e um outro cômodo com uma mesa de jantar redonda. Tem duas portas enormes entreabertas que levam ao quarto. E consigo ver apenas uma cama desarrumada com diversos travesseiros ao redor. A decoração é bem praiana e chique. Como se a própria rainha Elizabeth viesse passar as férias aqui tomando um sol e uma água de coco. Lisa caminha até o sofá, joga algumas almofadas no chão e faz sinal para que eu me junte a ela. Então eu faço isso. Sento ao seu lado, ainda sem palavras com a tamanha soberba e riqueza desse lugar. Saber que existe algo assim, que pessoas vivem assim, me deixa com um sentimento r**m na boca. Algo que reconheço como uma pontada de inveja, mas também, repulsa. — Então. 25 mil dólares agora, e o resto quando terminar o mês. — Lisa começa a falar sem nem ao menos me cumprimentar. Ela pega o próprio celular. — Você aceita transferência? Ou somente dinheiro? Pisco. — Transferência está bom. — Digo. Ela assente. Digita algo no celular e então se vira pra mim. — Meu assistente vai fazer a transferência. Pode checar sua conta até meio dia. Então, negócios? Já? Assim? Eu já recebi o dinheiro? Algo me diz que se eu tivesse cobrado mais que 50 mil, ela aceitaria. E, obviamente, isso não é um bom sinal. — Então, sinto que esse trabalho vai ser mais complicado do que você faz parecer. Lisa assente. Ela respira fundo e então pega um Ipad, que só agora percebi que estava ali em cima da mesa de centro. — Vamos lá, primeiro vou te apresentar a família. Tudo que você precisa saber, tudo que minha Alison saberia. — Ela começa a abrir uma galeria de fotos e se aproxima, para que eu veja também. — Essa é minha mãe. Mary LeBlanc. É ela que você mais precisa enganar. Essa mulher é uma cobra velha, astuta, eu não me arriscaria se Alison não tivesse visto ela pela última vez em 7 anos. Tusso. — Faz 7 anos que Alisson não vê o resto da família? — Sim, foi o que eu disse. Você realmente está prestando atenção? Talvez eu não devesse mais me surpreender do número 7 aparecer tanto na minha vida. — Eu estou prestando atenção. Continua, por favor. Lisa faz uma careta. — Vou te fazer uma introdução rápida e te passar um arquivo sobre cada um. Esse é meu pai. — Ela mostra a foto de um homem que parece ser mais velho do que Mary. Ele tem os cabelos bem grisalhos, quase totalmente brancos, tem o rosto comprido, olhos castanhos e algumas manchinhas na pele. — Phillip LeBlanc. Ele é inofensivo. A verdade é que você tem que tomar cuidado com as mulheres da minha família. Lembro de ter lido uma matéria numa revista sobre a empresa LeBlanc. A empresa é comandada pelas mulheres da família e parece que o nome LeBlanc veio de Mary, e não de Phillip. — Como o nome LeBlanc foi passado por tantas gerações? — Pergunto a ela. Lisa dá de ombros. — Parece que as mulheres LeBlanc tem um fraco para homens passivos, e homens passivos tem um fraco para mulheres LeBlanc. Meu pai ficou com o sobrenome da minha mãe após o casamento, assim como meu ex-marido...E o marido da tia Anne. E claro, isso resultou em primos com mesmos sobrenomes. — Alison tem primos? — Pergunto. Eu sei que ela não tem irmãos, porém sei que jovens LeBlancs aparecem em revistas de fofoca. — Não de primeiro grau. Tem os filhos dos meus primos Archie e Eric. Cada um deles tem 2 filhos. — Ela então me mostra a foto de duas garotas. — Jenifer e Kim, filhas do Archie. — Ela então me mostra um homem e uma garota. — E Emily e Jacob, filhos do Eric. Emily e Jacob são muito parecidos, apesar da diferença de idade que os dois parecem ter. Emily é bonita, jovem, cabelos castanhos, pele num tom bronzeado natural, e não naquele tom horripilante que as mulheres tentam chegar com procedimentos. Ela tem olhos claros, é pequena e magra. E tem Jacob. Agora eu o reconheço de uma matéria sobre os playboys ricos da cidade. Por um segundo, antes de eu lembrar de Jacob, pude suspirar por sua beleza. Ele tem a pele um pouco mais escura que a da irmã. A barba feita, um cabelo num corte perfeito. Olhos tão claros quanto o da irmã e longos cílios, o que dá a aparência dele de homem adulto de negócios, um pouco de sutileza e simpatia. Lisa bate com a mão na testa. — Jacob! Oh meu Deus, como pude esquecer de Jacob? Alison não vê os primos há 7 anos, eu não esperava que eles lembrassem dela, mas Jacob se casou com Alison. Pisco algumas vezes. — Alison é casada com o primo?— Pergunto e não consigo esconder o espanto na voz. Lisa balança a cabeça. — Quando crianças. Os dois eram tão próximos e todos sabíamos que eles se gostavam. Eles fizeram um casamento de mentira quando tinham 7 aninhos. Foi tão fofo, logo antes da Alison se virar contra mim. Suspiro aliviada. Ser esposa de alguém não estava incluso nos 50 mil. Eu nunca tive esse tipo de i********e com alguém na infância, mas tive amigas que tiveram. Que "casaram" com amigos na infância, mas hoje em dia, nem se lembram um do outro. Não acho que seja um problema. — Ele parece inofensivo, e além do mais, eu não vou ver tanto toda essa gente, né? O plano todo é por Mary. Lisa faz que não. — Aí que você se engana. Minha mãe e tia Anne prezam a família a qualquer custo. Todos os dias, você vai se esbarrar em pelo menos 4 LeBlancs. — Quatro?! — Exclamo. — Tem 2 anos que eu não vejo nem uma pessoa da minha família e você tá dizendo que vê pelo menos 4 parentes por dia? Ela balança a cabeça lentamente. — Acredite, eu me mudei pra essa cobertura há um mês. Eu ainda os vejo todos os dias. Suspiro. — Agora eu entendo a dificuldade desse trabalho. Mas acho que precisamos ir ao principal. Como Alison é? — Ela é bem revoltada. Quando criança, era uma fofa, um pouco desajeitada, mas nada que algumas dicas minhas não resolvesse. Mas de repente, ela se tornou uma pessoa amarga e começou a não escutar nada do que eu dissesse, mesmo sendo pro próprio bem dela. Levanto uma sobrancelha. — O que você dizia? Lisa dá de ombros. — Coisas simples. Nada demais, apenas algumas dicas. Mas Alison se tornou tão amarga que se eu dissesse para ela vestir um casaco pois vai esfriar, ela sairia de casa completamente nua. Algo no que Lisa diz não parece verdadeiro. Adolescentes não funcionam assim, eu sei, fui uma há pouco tempo. — Algo mais? — Pergunto? — Tem 7 anos que Alison não vê ninguém. E ela não tem redes sociais. Acho que depois de comprarmos roupas decentes pra você, qualquer personalidade que você assumir, vão aceitar. Tento não ofender por ela ter dito "roupas decentes" olhando pra minha roupa e torcendo o nariz. E sabe o pior? Eu coloquei minha melhor roupa casual. — Certo. E quando começamos? — Falei a todos que Alison chega essa noite. Então vamos comprar malas caras, roupas, sapatos e fingir que acabamos de vir do aeroporto. — Eu vou morar lá? Lisa faz uma cara de "dã?". — Onde mais você esperaria que minha filha ficasse? Num apartamento caindo aos pedaços? — Não, mas...meu gato! Eu não posso deixar meu gato, ele fez uma cirurgia ontem e precisa dos meus cuidados. Lisa revira os olhos. Achei que um gato doente poderia amolecer seu coração, mas acho que acabei esquecendo de com que tipo de pessoa estou lidando. — A gente passa pra buscar o gato fedido. E agora precisamos comprar uma bolsa pra ele. —Harry já tem uma bolsa de viagem. Lisa bufa. — Por favor, se é pra acreditarem que Alison tem um gato, ele não pode andar com uma bolsa de 10 dólares. Penso em retrucar, mas paguei 8 dólares pela bolsa de Harry. Se ela quer paparicar meu gato, eu não vou impedir. — Tá bom, tá bom. Podemos começar logo com isso? Lisa ergue a mão pra mim, e então a deixa cair com sutileza. — Espere. Vou me arrumar, então comemos um brunch e vamos as compras. Lisa não demorou pra se arrumar. Em pouco tempo ela voltou vestida numa roupa que ela diz ser casual, mas eu facilmente iria vestida assim num casamento de algum amigo. Ela soltou os cabelos, pôs um óculos escuro no rosto, colocou a bolsa debaixo do braço e saímos. Ao entrar no carro, recebo uma mensagem no meu telefone. Simplesmente meu saldo bancário é de 25.000 dólares. E é com essa noticia que o carro começa a andar até um dos restaurantes de brunch mais caros da cidade. E isso não é pouca coisa. O local é todo decorado como se fosse um jardim real. E ao nos sentarmos, prontamente uma garçonete muito bem arrumada vem nos atender, e Lisa pede "o de sempre". Não demora para que a mesa fique completamente cheia de comida. Todos os tipos de frios, pães, suco de laranja daqueles caros, doces diversos, ovos mexidos, uma variedade de cortes de bacon, canapés, patês, geleias, torradas de diferentes tipos, dentro outras coisas. E eu, claro, me empanturrei. Depois do brunch, fomos a um petshop enorme, quase tão grande quanto um supermercado, e Lisa começou a jogar coisas no carrinho. Harry ganhou uma cama de príncipe, com varia coroas. Brinquedos caros, petiscos, coleira, roupas, vasilhas de comida, uma variedade de coisas pra gato que ela viu numa seção e uma bolsa de viagem simplesmente incrível. Harry vai parecer um gato famoso assim. E logo após, começamos o meu banho de loja. Deixei que Lisa escolhesse a maior parte. Apenas me recusei a usar os terninhos Chanel. Ela me deixou escolher algumas peças e consegui entender por que Alison foi embora. A mulher simplesmente tem uma opinião sobre tudo, e como ela está me pagando para ser sua filha, resolvi cumprir o papel que filha querida e aceitei todas as críticas. Até mesmo as sobre meu corpo. Sim, eu tenho curvas, sou baixa e isso me deixa um tanto compacta, mas eu gosto. E por fim, já anoitecendo, Lisa me leva pra casa, onde eu faço minhas malas, com minhas malas chiques, coloco meu gato na bolsa chique dele e faço as malas dele também, me arrumo e volto ao carro, rumo a Bel-Air.
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