Encontro às cegas

1436 Words
Savannah, Geórgia Abril de 2018                 Mais um dia de trabalho pesado: Ellie sentia-se cansada e a única coisa que a mantinha firme e forte até o fim do seu aparentemente interminável plantão eram copos de café a cada duas horas e Sam, que acabava chegando como um furacão entre um atendimento e outro: - Voltando ao assunto – a loira suspira – esse fluxo intenso de auto piedade e punição não funciona – ela suspira – precisa conhecer gente nova. - Não – suspira Ellie – eu não preciso, definitivamente, eu preciso de um banho quente, minha cama e pizza. - Hoje é sexta feira, não pode fazer de conta que é normal? – a outra ri – Só hoje? - Estou exausta – e era bem verdade – e quer saber? Eu não sou uma boa companhia, não sou nem mesmo interessante... - Como que não – Ellie protesta e grita para Matthew que caminha no corredor – Matt, vem cá – ela ri alto. - Oi? – ele sorri encarando as duas por um tempo – O que estão aprontando? - Nada – Ellie responde e esfrega o rosto com as mãos – não dê atenção à Sam. - Sim – Sam salta da cadeira, puxa Matthew para dentro e encosta a porta – preciso de ajuda. - O que houve? – ele pergunta. - Preciso tirar essa mulher de casa – Sam dramatiza – não estou aguentando, qualquer hora ela aparece aqui com uma almofada ao invés da bolsa... Vestida com cortinas... - Não seja exagerada – ri Ellie. - Acredito que preciso concordar com Sam – Matthew responde sério – essa coisa de viver para o trabalho não acaba bem... - Sim – Ellie revira os olhos – casos acabam muito bem... - Mas está julgando tudo por uma coisa que você mesma disse que não levava a sério? – Sam a encara. - Acho que eu levava – admite Ellie. - E porque é que não conversou sobre isso? – Matt a encara – Pelo amor de Deus, você tem medo de compromissos? - Tenho medo de demonstrar o que eu sinto – ela suspira.                 A conversa continua por longos minutos, até Sam descer correndo para uma emergência e Ellie saltar da cadeira para verificar seus pacientes, uma última vez, antes de fechar o turno.                 A oncologia era um ramo triste: muitas e muitas vezes, tudo o que o médico podia fazer, era apresentar uma solução paliativa, amenizando a dor do paciente e a ansiedade de uma família, muitas vezes, desesperada. Mas, no fundo, em muitas vezes, o médico sabia que nada daquilo seria uma solução e precisava conviver com a culpa de ter dado mais esperanças aos entes queridos daqueles que, inevitavelmente, não aguentariam mais uma sessão de quimioterapia.                 O telefone celular toca: era uma mensagem de Sam: “Celtic House Pub, 22:00, sem falta, tem um encontro hoje. Não deixe de ir”                 Ellie revira os olhos: detesta essas coisas, mas sabe que pode livra-se facilmente disso, sem ser desagradável com a sua amiga: é só ir e ser totalmente intragável, e disso ela entende muito bem, aparentemente.                 Assim que sai do hospital, pilota a sua moto encarando a noite estrelada, até ver um pequeno ponto movendo-se e por um segundo, pensa em parar a moto e fazer o pedido, mas logo ela ri sozinha e desiste, que bobeira, no fundo isso nunca deu certo!                 Em casa, conversa com Norah e fala sobre sair, ir ao pub encontrar com as amigas - sabe que a avó, tanto quanto ela, nem mesmo aprova esse tipo de coisas, e não que isso importasse, apenas não queria lhe causar nenhum tipo de preocupação. Em seu celular, mais de quinze chamadas negadas e mensagens não lidas de Thom, uma parte dela sentia uma certa culpa por ter simplesmente se afastado sem mais e nem menos, mas ele era um homem adulto, deveria saber o que havia feito de errado.                  Escolheu cuidadosamente a roupa: um vestido rose e uma jaqueta de couro, calçou coturnos e pegou seus sapatos de salto alto: definitivamente, precisava comprar um carro, ao menos quando as situações fossem mais "sociais" e formais. Pilotou cuidadosamente até o local indicado pela amiga e logo percebeu um rapaz sozinho em uma mesa:  - Boa noite - ele diz sorrindo - sou Jonah.  - Muito prazer - ela sorri de volta - eu sou a Ellie...  - Já ouvi falar bastante de você - ele diz - Sam, ela é minha amiga desde o colegial, então, é como se eu conhecesse você há tempos também.  - Ah claro - ela sorri, lembrou-se de menções ao "Jonah, vizinho da mamãe" em algumas conversas, e logo lembrou-se que essa menções vinham seguidas de algo como "sem graça" então, ela apenas suspirou e afundou-se na cadeira, o rapaz era educado, inteligente, mas nem um pouco envolvente.                  O encontro durou bastante para os padrões Ellie - não correu e nem fez o rapaz desistir, ele apenas foi embora porque precisava pegar um vôo cedo na manhã seguinte, combinaram de marcar algo novamente, e Ellie, ainda sentada na mesa depois da partida de seu acompanhante, pensou que talvez, ele nem fosse companhia tão r**m assim, mas então, ela percebeu alguém aproximando-se:  - Ellie - Thom senta em sua frente, ela não teria como escapar.  - Thom - ela suspira, alcoolizada o suficiente para encarar aquela conversa com maestria.  - Está fugindo de mim - ele diz sorrindo malicioso.  - Não - ela responde num suspiro - apenas fiz uma escolha.  - Que escolha? - ele pergunta confuso.  - Me afastar - ela responde.  - E porque fez isso? Não conversamos sobre isso - ele suplica - almoçamos juntos e dois dias depois você nem mesmo visualiza minhas mensagens. - Pensei que estivesse ocupado com a chefe da enfermagem da pediatria... - ela atira a verdad esobre ele.  - Certo - ele sorri - pensei que fosse isso. Eu sinto muito.  - Tudo bem - ela responde - pode esfregar seu p***o aonde julgar mais adequado.  - Não estou esfregando o p***o nela - ele ri - ela é minha sobrinha.  - Ah - ela parecia ter levado um soco no estômago - mas eu pensei que... - Éramos adultos o suficiente para não pensar e nem supor - ele pega a mão dela sobre a mesa - eu sinto muito se você pensou outra coisa, lamento não ter contado à você sobre minha sobrinha e mais ainda - lamento não ter sido, nenhuma vez, o cara dividindo a mesa com você nesse lugar.  - Por que diz isso? - ela pergunta.  - Passei de carro e vi sua moto, parecia que havia levado um soco quando vi você com outro cara: nunca saímos juntos, entende? - Entendo - ela suspira, um tanto derrotada - a culpa foi minha, eu que falei que não queria me envolver, mas...  - Pelo amor de Deus, Ellie - ele beija a mão dela sorrindo - estamos envolvidos... Eu encaro suas roupas no meu closet, todas as manhãs, ainda tomo chá com a sua avó nas quartas-feiras...  - Tá brincando? - ela ri alto.  - Não - ele responde sério - pergunte à ela, semana passada, nós fomos à um evento beneficente da igreja, tia Célie estava lá e todas aprecem desoladas com nosso afastamento, e dizem que você é cabeça dura.  - Eu não sabia - ela diz envergonhada.  - E nem deveria - ele suspira - esperei que você tivesse um momento de sanidade, por mais breve que fosse, e me atendesse, mas acho que o destino, ele queria que eu te encontrasse aqui...  - Será? - ela pergunta descrente.  - Tenho certeza que sim - ele sorri - me dá uma chance de fazer as coisas do jeito certo? Do meu jeito?  - Seu jeito? - ela pergunta rindo.  - Sim, do meu jeito, com encontros públicos e declarações escandalosas - ele ri - me deixe ser quem sou, de verdade, não apenas o cara que você gosta de ter na cama...  - Assim parece que eu apenas usei você esse tempo todo - ela ri.  - Bem, e foi mais ou menos isso - ele responde - mas eu não me importo em ser usado, só me deixe ser mais do que isso para você, Ellie.                  Agora, falamos sobre segundas chances: Ellie gostava de Thom, talvez não tanto quanto ela poderia gostar, ou não tanto quanto ele gostaria que fosse, mas ele era bom e sim, ela poderia aceitar um relacionamento sério, ao menos algo que fosse parecido com um... 
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