BLAKE
Ficamos paralisados um preso no olhar do outro. Engulo em seco tentando frear a velocidade dos meus pensamentos. É ela, a garota do hospital e a Lara, minha amiga de infância, são a mesma pessoa.
Só posso estar vendo alucinações. O plantão de hoje foi pesado e sinto que a qualquer hora, entrarei em um sono profundo. Mas quando ela me encara e um sorriso tímido brota em seus lábios, meu coração salta no peito e sim, é ela. A garota risonha, cabelos loiros e olhos castanhos claros que conheci na minha infância.
Ela se afasta minimamente como se estivesse saindo de um transe. Desvia seu olhar dos meus e afasta um longo fio loiro do rosto.
— É bom vê-lo novamente, Blake. — Sua voz suave sussurra através dos seus lábios perfeitos.
Demoro alguns minutos avaliando-os mais do que o normal. Rosados, carnudos, com um arco proeminente. Ela morde o lábio inferior involuntariamente e sei que pelo seu olhar indecifrável, devo estar parecendo um lunático.
Lara tornou-se uma mulher muito linda, atraente e por mais que eu me esforce não consigo olhá-la diferente. Meus olhos continuam vagueando por seu corpo como se gravasse cada pedaço dele. Cada curva, traço, tonalidade alva como a mais delicada porcelana.
Celina pigarreia chamando minha atenção.
Corro as mãos pelo meu cabelo com um meio sorriso.
— É bom vê-la também, Lara. — Concordo.
Celina me envolve em um abraço, assim como Jorge. Apesar de não termos os mesmo laços sanguíneos, os sentimentos continuam. Sempre que posso, venho visitá-los, mas nesses últimos dias, não tenho feito como gostaria.
— Está vindo ou indo para o hospital, filho?— Jorge pergunta.
— Na verdade, estou voltando de um plantão exaustivo e hoje dormirei na casa dos meus pais. Sabe como é, dona Melissa quer todos os filhos debaixo da sua saia — Murmuro e Lara sorri suavemente, seus olhos brilhando quando menciono o nome da minha mãe.
— Entendo ela, filho. Nada melhor que termos nossos filhos bem pertinho de nós — Vó Celina sussurra com um sorriso triste.
Abraço-lhe pelo quadril deixando um beijo casto em sua bochecha.
Por mais que tenha se passado muito tempo eles ainda sentem saudades do filho.
— Vó, vô, foi um prazer revê-los, mas agora tenho que ir. Prometo voltar em breve. - Lara os abraça com a promessa de sempre visitá-los.
Meu coração salta novamente no peito adorando ter essa informação.
Ela caminha em minha direção com os lábios curvados em um sorriso gracioso.
— Até mais, Blake — Sussurra me abraçando e deixando um beijo rápido em minha bochecha. Fecho os olhos inalando seu cheiro doce.
— Filho, você poderia levar Lara até sua casa? — Jorge sugere e Lara arregala os olhos, constrangida.
— Vô, não precisa. Estou de carro. — É rápida em responder.
— Bem, nesse caso me sentiria mais tranquilo se ele fosse, mas já que está de carro, tudo bem.
Lara sai praticamente correndo da sala nos deixando atordoados.
— Ela é um pouco arisca, mas não desistirei dela — Celina murmura com um sorriso.
— O que achou dela, filho? — Pergunta me pegando de surpresa.
Reflito por alguns segundos e continuo em um estado de êxtase. Quando criança, sonhava com esse momento. De reencontrá-la novamente. Ensaiava frases para serem ditas para ela. Conforme o tempo foi passando, meu sonho ficou cada vez mais distante. Ao vê-la outra vez, algo renasceu aqui dentro, algo grandioso, que não sei explicar.
Ela é simplesmente… Maravilhosa!
Acabo pensando alto demais a última parte.
Celina e Jorge esboçam um sorriso estranho nos lábios.
Trocam olhares e sussurram entre si.
— Sim, ela é! — Concordam.
Converso algumas amenidades com eles e também me despeço, hoje o dia foi cansativo e tudo que desejo é a boa comida da minha mãe e cama.
Estou saindo da mansão quando vejo Lara debruçada contra o volante do seu carro, um Fiat branco, resmungando sem parar em uma tentativa de ligá-lo.
Aproximo-me da janela e bato suavemente chamando a sua atenção. Ela baixa o vidro com suas bochechas se tornando um vermelho vivo adorável.
— Posso ajudá-la?
Ela faz uma nova tentativa de ligar o carro e falha.
Bate a testa no volante e sussurra contra ele.
— Parece que sim!
Ela abre a porta do carro e desce torcendo os lábios em uma linha fina.
— Olha, não entendo nada de mecânica como meus irmãos, mas posso levá-lo na oficina do meu pai e lá resolveram o problema. Enquanto isso, garanto que Jorge não se importará de lhe entregar algum carro disponível da sua garagem.
Ela balança a cabeça discordando.
— Não. Eu posso ligar para Emma, minha colega de quarto, e pedir para ela vir me buscar.
Percebo pela sua expressão que fui infeliz na sugestão. Como Celina mesmo afirmou, Lara é arisca e não é acostumada com esse tipo de regalia.
Enfio minhas mãos nos bolsos frontais do meu jeans e a observo.
— Tudo bem.
De repente um estalo me vem à mente e fico tentado a lhe oferecer uma carona.
O máximo que pode acontecer é outra recusa da sua parte.
— É… Posso lhe oferecer uma carona, se for do seu agrado.
Ela começa a contornar o carro, abre o porta-malas e pega algumas bolsas e se aproxima parando a centímetros de mim.
— Certo, eu vou com você. — Obrigada!
Concentrei-me em suas sardas, sete em cada lado do rosto e não em seus lábios que a cada palavra sussurrada soava como um maldito convite.
Começo a me arrepender de tê-la convidado.
O que há de errado comigo, oras?
Estou agindo como um psicopata aleatório.
E ficar em um pequeno espaço ao seu lado, sentindo seu cheiro não ajuda muito.
Grunho baixinho.
A guio para meu carro, um Fusion preto.
Após pedir para Léo, o chefe da segurança cuidar para que alguém leve o carro de Lara a oficina do meu pai, passamos pelos grandes portões da mansão, escutando ela suspirar, como se estivesse aliviada por deixar o local.
— Esse universo te assusta? — Pergunto de soslaio.
Ela solta uma risada baixa e sinto seus olhos em mim.
— Qual universo? Uma vida repleta de luxo e riqueza? — Sua voz murmura calmamente.
Aproveito que o sinal fechou e me viro em sua direção.
Ela arqueia uma sobrancelha e ergue os cantos dos lábios segurando o riso.
— Não. É… eu só não me vejo nela.
— Entendo. — Coloco uma mecha de cabelo atrás da sua orelha e ela engole em seco. Nossos olhares se encontram e sinto uma pontada no peito. Seus olhos caem sobre meus lábios e inalo profundamente me inclinando em sua direção, saboreando seu cheiro adocicado de frutas vermelhas.
Sua respiração quente roça a minha pele. Estamos tão perto e… somos interrompidos por uma sessão de buzinas ensandecidas atrás de nós. A névoa em que estávamos envolvidos foi dissipada. E um clima estranho se instaurou no pequeno espaço.
Lara se afasta sem me olhar nos olhos com o rosto virado para a janela do carro. Os próximos segundos fluíram com um silêncio ensurdecedor.
— Então, como é estar de volta à cidade após terem se passado dezoito anos? — Sou o primeiro a quebrar o nosso silêncio.
Ela suspira com um sorriso triste. — Não é nada como gostaria.
Me amaldiçoou mentalmente.
— Desculpa. Sou um i****a, você perdeu sua mãe, então…
— Não, você não é — Sussurra olhando brevemente em meus olhos.
— Foi um infarto fulminante, não foi?
Ela assente e percebo seus olhos marejados.
Decido mudar o rumo da conversa para um mais alegre, arrancando alguns sorrisos tímidos dela.
— Aposto que deve ter uma legião de pacientes, para atender. Principalmente do sexo feminino. Imagina se elas perderiam a oportunidade de serem examinadas por você.
Paro em outro sinal vermelho e viro-me em sua direção com um sorriso malicioso.
Um rubor começa a se espalhar por seu colo e percorre seu pescoço, se concentrando em suas bochechas. Lara tem seus olhos vidrados nos meus e passo a língua nos lábios sentindo a garganta secar, a achando muito sexy.
O clima esquentou e sei que ela também percebeu isso.
— E porquê você pensaria isso?
Seus olhos dobram de tamanho e ela solta uma risada nervosa.
Coloca suas mãos sobre sua face murmurando:
— Esquece que eu disse isso, por favor!
Pego em seu joelho, ainda sorrindo quando sinto sua pele abaixo da minha. Uma descarga elétrica. Foi isso que eu senti quando a toquei. Sua expressão se torna séria e retiro rapidamente minha mão, não querendo prolongar essa sensação correndo por todo meu corpo.
O sinal abre e coloco o carro em movimento, roubando alguns olhares furtivos dela.
— Você está com alguém, Lara? — Quando dou por mim, já tinha pronunciado essas palavras.
Droga!
Rosno baixo.
Acabei de reencontrá-la, e já estou bancando o i****a, pela segunda vez.
Ela desvia seu olhar da paisagem lá fora e olha para o colo onde torce nervosamente suas mãos.
— Não. — E você, está com alguém?— Rebate e fico em silêncio enquanto procuro as palavras certas para lhe dizer.
Ela suspira e se ajeita no banco.
— Suponho que a resposta seja não — Murmura — Parece que sua vida é bem agitada para pensar em um relacionamento.
Suspiro.
Definitivamente, sou um maldito covarde.
Pois, me vejo concordando com suas palavras.
— Tudo bem. Você é jovem, bonito, logo pintará alguém legal para desacelerar essa sua rotina maluca. — Sorri e me vejo retribuindo seu lindo sorriso.
Suas sardas se espalham pelo seu rosto e me pego hipnotizado.
Embora, não me sinta confortável em deixá-la acreditar que não, tenho alguém.
Não sou homem de rodeios e nem meias-palavras, mas se tratando dela não sei como agir.
Ela bate levemente em meu joelho e aponta para um prédio de quatro andares.
— Eu moro nesse prédio.
Estaciono meu carro na calçada, em frente ao edifício Golden. Apesar de ser recém-reformado, não é muito seguro.
Apenas um guarda do lado de fora que mais dorme ao invés de ficar alerta. Tem o zelador, Jorge, um senhor de idade que já não possui cem por cento da sua audição. Celina e Jorge com certeza não ficariam contentes com a moradia da neta. Mas não é da minha conta. Lara é uma mulher adulta e responsável por si. Ela recolhe suas bolsas e a ajudo a descer do carro.
O ar frio da noite a faz estremecer e sinto uma bruta necessidade de abraçá-la e aquecê-la. Tudo fica pior quando seu cheiro delicioso alcança minhas narinas.
— Obrigada pela carona, Blake. — Agradece e se aproxima exatamente no momento em que viro o rosto quando ouço o som do alarme do meu carro disparando.
Seus lábios tocam suavemente o canto da minha boca me fazendo ofegar em surpresa.
Ela se afasta rapidamente com o rosto queimando de vergonha.
Mal tenho tempo de lhe dizer algo e me vejo parado em frente ao seu prédio, totalmente sozinho, respirando com dificuldade. Sentindo meu corpo febril com apenas o roçar dos seus lábios macios nos meus.