ELE
“Minha!”
Disse em voz alta, incrédulo, pois nunca sequer conseguiu sonhar que um dia diria essa frase do fundo do coração. Ele era Ares, O Alfa Maldito, temido até mesmo por seu povo.
Um dos lacaios de Deanera a olhou de soslaio e ela indicou que ele cumprisse o seu trabalho. Ele, então, correu para abrir a cela e dar passagem ao poderoso Alfa. Ninguém desejaria ficar no caminho do magnífico predador e a sua presa.
“ Vem até mim, minha fêmea!”
O Alfa ordenou, e ela instintivamente obedeceu, mas ficou parada na frente dele, com os seus belos olhos verdes fixos no seu olhar.
— Sua, Alfa Ares? Mas ela é humana, como pode uma humana ser uma Luna? — Deanera questionou, confusa e desconfiada.
Havia a possibilidade de Ares estar apenas interessado numa fêmea para aquecer a sua cama, e nada mais fácil do que uma humana fraca e sem valor. Ninguém se importaria com uma humana o suficiente para ir contra o Alfa mais forte em existência.
“ Minha!”
A sua fera repetiu, e Deanera compreendeu que testemunhava uma cena histórica, pois a terceira forma não mente.
Atrás dele, na outra cela, o seu general recitou a mesma palavra, reconhecendo o seu companheiro humano, que lutava contra ele, fedendo a medo e a rancor. A fêmea de olhos verdes estremeceu e desviou o olhar de Ares para o humano, o que fez a sua fera rosnar de ciúmes internamente.
Ares sentiu-se vazio ao deixar de ser o foco da atenção da sua fêmea.
O general, furioso com a rejeição, gritou que marcaria o humano ali mesmo se ele não se rendesse, pois não aceitaria a rejeição da sua alma gêmea. Ares sentiu o cheiro da excitação do general, cuja natureza estava a ponto de dominar o macho humano e montar nele, para impor o domínio sobre ele, como mãos fazem na vida selvagem. Notando o horror da sua companheira ao testemunhar o macho humano ser marcado, Ares, sabendo que ela era incapaz de compreendê-lo, a puxou para junto de si, num abraço desajeitado, para que ela não pudesse ver o que fatalmente aconteceria se o macho humano insistisse em rejeitar o general.
— Deanera, a minha fêmea não compreende a nossa língua.
— Se a marcar, ela compreenderá, Alfa, é o seu direito. Ela é apenas uma humana, não precisa do consentimento dela. Lembre-se de que ela não sentirá o vínculo como sentimos.
Ares fora rejeitado por todos na sua existência, até mesmo o seu pai o renegou, disposto a deixar a sua herança para Alaor em vez do filhote e atentou humilhá-lo publicamente. Ele sabia que uma humana não sentiria o vínculo, mas não poderia machucá-la para forçá-la a aceitá-lo.
— Você tem o dom de línguas, pagarei pelo seu segredo!
Deanera sorriu, satisfeita, antes de tirar um fraco de dentro do alforje pendurado no seu cinturão.
— Faça-a beber isso quando voltar para a sua terra, para que ela compreenda o seu idioma. No entanto, Alfa, ela terá que beber por vontade própria.
Ares aceitou o frasco sem nem perguntar o quanto ela cobraria. Não importava, ele pagaria o valor que fosse justo. Nada seria caro demais para a sua fêmea, ela era o seu tesouro, uma frágil humana que lhe fora dada pela própria deusa. A sua redenção estava nela, a sua própria existência era um sopro de luz no seu coração escuro.
A humana gritou mais uma vez, apavorada, quando o general fez menção de despir o macho humano.
— General Igor, controle-se, não permitirei que complete a conexão contra a vontade do humano!
A voz de Ares estava ainda mais poderosa e autoritária, com a junção da sua natureza, que concordava com ele. A sua Luna teria ainda mais medo dele se testemunhasse a brutalidade de um dos seus generais ao dominar o humano e montá-lo.
O lobo de Igor não teve escolha a não ser acatar a ordem do Alfa, e parou de rasgar as estranhas vestimentas do humano. A fêmea, ainda assustada, viu o general pegar o humano desacordado nos braços e segurá-lo contra o peito, cheio de alegria e de orgulho.
O humano estava marcado, e embora a natureza do general ardesse por possuí-lo o mais rápido possível, admirar a sua marca no pescoço do companheiro serviu para apaziguar os seus instintos momentaneamente.
Ares afastou a humana, segurou o seu rosto entre as mãos, os belos olhos verdes o fitavam, lacrimejantes.
— Dois humanos, um companheiro de um general de primeira patente e uma fêmea Luna de nascimento. Teremos um banquete para celebrar essa data tão feliz!
— Não preciso de banquete.
— Faz parte do costume, Alfa. Já sabe como as coisas funcionam por aqui, Alfa Ares…
Deanera comentou sorridente, calculando o seu lucro para aquela noite. Se o valor da alma gêmea de um general já era uma pequena fortuna, o preço de uma Luna de nascimento era incalculável.
— Sei muito bem como as coisas funcionam por aqui, Elfo! Adianto que o meu povo não é moeda de troca e não sairei daqui sem os humanos!
Deanera fechou a cara, irritada, pois o Alfa tinha adivinhado que ela pretendia exigir alguns machos para lhe servirem como guardas, e, por que não, sexualmente.
— Beta Alaor, pague um valor justo a elfo!
Ares pegou a humana nos braços, ela reagiu, gritando assustada, tentando fazer com que a soltasse em vão.
— Esse não é o nosso costume, Alfa! Espere! A cerimônia de união deve ser feita em minhas terras! — Deanera correu atrás do Alfa que levava a sua fêmea para fora.
— Estou pouco me fodendo para os seus costumes, Elfo! Não são os costumes do meu povo, vocês não obedecem a grande Deusa!
Vários guardas de Deanera cercaram os lobisomens com lanças nas mãos.
— Você deveria se envergonhar de tratar almas gêmeas como mercadoria, essa não é a lei dos deuses! Como sacerdotisa de Arádia, não devia ser tão mercenária.
— Não tem o direito de julgar como eu sirvo a Deusa, quando é um maldito para a sua amada Hecate! A Cerimônia de união é muito apreciada pelo meu povo, é de praxe que os seus acompanhantes nos sirvam!
Ares estacou, os seus lobos fizeram silêncio, receosos da reação do Alfa.
— Nenhum dos meus homens vai te servir para te emprenhar, Deanera, mas se faz questão de satisfação carnal. — Ares fez sinal para Alaor e disse: — Beta, dê algumas moedas de ouro a mais para ela pagar algum demônio que aceite f***r com ela!
O que paralisou Deanera não foram as palavras cruas de Ares, mas a aura que emanava dele enquanto falava. A terceira forma se fez presente nos olhos dele, com a promessa de uma morte lenta e dolorosa que ela preferia evitar.
Ao sair da mansão da sacerdotisa Elfo, Ares olhou mais uma vez para a fêmea humana que ainda se debatia nos seus braços. Ele queria poder falar com ela, explicar quem ele era e o que eram um para o outro, mas aquele não era o momento adequado para marcá-la. Cansado da incessante rejeição dela, ele tocou a área sensível da sua clavícula com dois dedos e a fez perder os seguidos com um golpe simples e certeiro.
Ele olhou para o céu, onde a Lua banhava a noite, e perguntou a grande Deusa a razão de desprezá-lo tanto. Ele sabia que não era digno de ser amado por ninguém, mas uma companheira loba teria o vínculo para compartilharem, no entanto, dar-lhe uma fêmea humana, incapaz de sentir qualquer conexão, era como torturá-lo ainda mais.