— Venha, Gama, vamos para o outro lado, tem uma coisa ali que quero te mostrar…
— Esmeralda! Espere! — Ela segurou o meu braço e me parou. — Acho que não me ouviu, humana.
Claro que ouvi, sua pulguenta, não sabe quando querem te evitar não?
— Oh, querida! Desculpa, nem notei que estava falando comigo. Como você mesmo disse, sou humana. Os nossos ouvidos são tão ruins, não ouço quase nada, acredita?
Valha-me Deus, não consegui escapar.
A Beta é bonita a beça, com um forte ar de superioridade e altivez, o que só piora a minha implicância.
Quer dizer, implicância não, intuição feminina!
— Sem problemas, não precisa se desculpar comigo, eu compreendo perfeitamente. O que está fazendo por aqui, está perdida?
— Não, estou só dando uma volta com o Gama, mas, já estávamos voltando para casa, né, Gama?
O bobão ficou me olhando com cara de espanto e nada de confirmar.
— Antero, eu nem tinha te visto. Quem diria que você seria o general Gama desse clã…
— É, foi uma surpresa! — Ele respondeu.
Apesar do peito estufado de orgulho, notei que o seu belo sorriso simpático desaparecera.
— Não me surpreendeu quando soube que a nossa futura Luna é uma humana. Nada mais adequado do que um mestiço para unir as raças, não é mesmo?
Impressionante a capacidade dela de proferir palavras amargas de duplo significado com o sorriso mais meigo e encantador no rosto.
Notei que o corpo do Gama enrijeceu um pouco ao ouvir a palavra “mestiço”. Se não fosse tão lerdo, teria confirmado o que eu disse já dando no pé, mas agora temos que reforçar a fuga com muita cara de p*u.
— Então, querida, ótimo te ver, vamos marcar qualquer dia? Eu te ligo! Vamos, gama, hora de ir para casa! — Disse afastando a mão dela do meu braço.
— Sim senhora, Luna!
Até que enfim ficou esperto!
— Antero, pode ir andando, eu levo a nossa amiga para casa, temos tanto para conversar, Esmeralda!
Ela sorriu para mim e fez um gesto com a mão na direção do Gama como se estivesse a espantar uma mosca e já ia segurar o meu braço de novo. Desviei habilmente da sua mão pegajosa e agarrei o braço do Gama.
— Antero tem que ficar do meu lado o tempo todo, Beta, ordens do Alfa, sabe? E como sou uma companheira muito submissa e obediente, cumpro sempre as vontades dele.
Acho que o Gama se engasgou com o pão dele, pois começou a tossir. Eu, muito prestativa que sou, deu um tapa nas costas dele.
Ela aproveitou a oportunidade e agarrou a minha mão.
— Ah, entendo, Ares sempre foi muito cuidadoso, especialmente com os mais fracos e desvalidos. Deve se sentir insegura e desconfortável por aqui, não posso nem imaginar como me sentiria inferiorizada…
— Na verdade, sinto-me bem paparicada por aqui. Olha só você, uma Beta lindíssima tão feliz em me ver, não quer nem soltar a minha mão.
— Ah, que bom que tenho esse efeito em você, Esmeralda. Quero que saiba que pode sempre contar comigo quando precisar!
— Viu só, quanto paparico? Sinto-me uma rainha, ainda mais com um General Gama tão valente como Antero ao meu lado e Uma Beta me oferecendo suporte! Aliás, tenho uma dúvida, na cultura de vocês, hierarquicamente falando, quem é superior, uma Beta ou um General Gama?
Engole essa, amostrada!
O sorriso falso da lambisgoia tremelicou, ela respirou fundo e se virou para o Gama, que a olhava sorridente e com um brilho divertido nos olhos.
Eu gosto dele, sabia? Antero me passa uma ótima energia.
— Tecnicamente, um General Gama é superior na hierarquia. — Ela respondeu a contragosto.
— E na força física também. — Completou o Gama com a voz firme. Ao reconhecer a Luna de nascimento, nosso corpo se modifica a cada dia, ficando mais forte e resistente. Após a cerimônia de união entre a senhora e o Alfa, a minha potência corporal será equiparada com a de um alfa.
A cascacu revirou os olhos.
— Um Alfa comum, é claro, um Alfa como o nosso Ares não tem réplica.— Ela ripostou, com um suspiro.
Que mané nosso é esse? Teu é o caramba!
E de onde está saindo essa minha possessividade?
— Tive uma ideia! — Ela sorriu, parecendo mais uma vez empolgada por estar conosco. — Que acham de irmos para o escritório do meu irmão, para escolhermos os convites para a próxima cerimônia saturnal?
— O que é uma cerimônia Saturnal? — Perguntei, genuinamente curiosa.
Mas o sorriso c***l nos lábios da Beta fez eu me arrepender da pergunta….
— É uma cerimônia muito importante e frequente na nossa cultura, vários clãs a praticam. Louvamos os nossos deuses com uma festividade onde temos música, dança, banquete e os machos cortejam as fêmeas.
A ideia não me pareceu de todo má.
— Como um baile humano, eu acho.
— Duvido muito que humanos possam ter algo similar ao que fazemos. Os nossos machos podem caçar ou lutar entre si para mostrar a sua virilidade e cortejam aquelas que consideram mais adequadas em força e valor. Quanto mais forte a fêmea, mas machos a cortejam.
Não estou gostando nada da direção em que a fala dessa ratazana está se encaminhando. Como se adivinhasse a minha desconfiança, o Gama decidiu acrescentar um pouco de informação.
— Os membros que já encontraram os seus companheiros aproveitam para cortejar a alma gêmea. O Alfa Ares cortejará certamente a senhora.
A Beta riu, fingiu estar contendo o riso, mas era obvio que estava de deboche!
— Isso vai depender da natureza dele, Gama, não esqueça que nós, as fêmeas da nossa espécie, entraremos no cio e é muito difícil para um lobo não marcado resistir a fêmea mais valorosa.
Ela estava tentando me provocar, mas tive outra preocupação.
— As mulheres não têm o direito de escolher quem elas querem ou não quererem ninguém?
— Claro que sim, Luna, após a dança de a******a, as fêmeas se oferecem para os machos que desejam, só então eles escolhem as mais atraentes dentre elas.
— A maioria das fêmeas se oferece para Ares, não as culpe, Esmeralda, ele é o melhor de todos, é normal atrairmo-nos pelo melhor espécime na exposição.
— Luna, Beta Estela, você deve respeito a Luna Esmeralda e não para de chamá-la sem o título.
— Ela ainda não ascendeu ao trono, Gama!
Pronto, agora estão a falar de mim como se eu não estivesse aqui
— Luna Esmeralda é uma Luna de nascimento, não depende de trono algum para o título.
A Beta respirou fundo para manter o controle e finalmente decidiu olhar para mim, e eu a olhei de volta, com o meu mais belo sorriso no rosto.
— Você não se importa, né, amiga? Eu te chamo de Esmeralda e você me chama de Estela, não precisamos dessa formalidade Luna/Beta.
Ela sorriu para mim, o sorriso ainda mais açucarado do que o meu.
Ela é boa nisso, eu quase acreditei e a abracei chamando-a de “BFF”!
— Na verdade, eu prefiro te chamar de Beta, é mais curtinho, sabe? Beta, Luna, parece mais amigável, acessível. Compara só: Es-me-ral-da… Muito grande e pomposo, mas se você dó dia Luna, olha que curtinho, que fofo!
— Se você diz, “Luna”. que seja assim então. Bem, já que vocês estão ocupados, eu mesma mandarei os convites para os Alfas. A gente se vê mais tarde… Luna.
— Isso, a gente se esbarra por aí, pode deixar que eu te ligo!
*****
— Uh, que ódio, viu! Eu odeio essa humana!
— O que houve agora, Estela?
— Essa humana que Ares diz ser companheira dele. Ela é patética, uma vergonha para o nosso clã ter uma Luna tão insignificante, um símio sem pelos, é o que ela é! Uma macaca pelada, devia estar trepando em árvores e não copulando com um Alfa lobo!
— Fala baixo, sua i*****l! Quer que alguém escute e conte para ele como a amiguinha dele e sente de verdade?
— Não tem ninguém nesse prédio, Alaor! Só você se enfiando no trabalho como sempre!
— Um de nos tem que trabalhar de verdade, já que você prefere ficar desfilando pelo território para exibir o r**o para o Alfa.
— Eu seria uma Luna bem melhor do que ela!
— Pena que não é uma Luna, maninha, se contente com quem você é!
— Não vejo a hora de desafiar essa filhote chimpanzé! Você já notou a cara dela? Não n**a que é descendente de uma símia!
— Não seja invejosa, Luna esmeralda é linda, perfeita! Eu a vi hoje, cantando com a voz de uma sereia, toda molhada e enrolada numa toalha. O meu p*u ficou duro só de vê-la.
— Estava me censurando agora a pouco, mas olha como fala da humana!
— Só estou dizendo a verdade, Estela, para ver se entra na tua cabeça. Esmeralda é linda, uma Luna de nascimento, a essência dela bastaria para excitar qualquer macho não marcado, soma-se a isso uma beleza sem igual.
— Não vai ficar tão bonita depois que eu arrancar a pele do rosto dela!
— Não vai fazer nada disso, Estela, Ares tem dona, acostume-se.
— Jamais! Assim que terminar a cerimônia de união, terei o direito de desafiá-la, é a lei!
— Ares vai te matar se você matar a fêmea dele!
— Não pretendo matá-la, só deformar aquela cara simiesca.
— Não vai fazer nada disso, já falei, Estela! Se não tem nada mais para dizer, cai fora, tenho que trabalhar!
— Eu vi aqui para trabalhar também, maninho. Tenho que preparar e enviar os convites para a cerimônia Saturnal.
— Convites? Ares vai chamar alguém de fora?
— Sim, ele quer todos os aliados do clã aqui.
— Hum… — Alaor levantou de sua cadeira, caminhou até a frente da sua mesa e apoiou as costas nela, com os braços cruzados sobre o peito. — Por que não se oferece ao Alfa dos Lobos Negros? Se conseguir conceber um filhote dele, pode ser nomeada a Luna de lá.
— Você não se importaria?
— Não mais do que te ver servindo o próprio Ares.
— Já tentei, sabe muito bem que não deu certo. Além disso, gosto do Ares, somos feitos um para o outro, o próprio Alfa Hermes disse que me queria na família.
— O velho maluco queria você para ele, e papai ia te dar numa bandeja se Ares não o tivesse aniquilado.
— Papai faria qualquer coisa para por um de nós dois no trono, até convencê-lo a usar magia para atar a alma do lobo de Ares a minha loba. Ei, maninho, acha que vai funcionar agora que a humana está aqui?
— Acho que não, embora esteja perdido, o lobo a reconheceu como companheira e a marcou, além disso, a terceira forma nunca permitiu que ele atasse ou emprenhasse a sua loba.
— Verdade… Talvez devesse tentar seduzir o Alfa Orium, ele é jovem e muito atraente.
— Orium é apaixonado pela general fêmea do clã, ele até confessou ao Ares que, se pudesse, romperia as leis e a faria sua Luna.
— Ele não quer encontrar a companheira dele?
— Não, diz nunca amará fêmea alguma além da namoradinha. Tenho pena da alma gêmea dele.
— Essa coisa de almas gêmeas é muito injusta, Ares deveria ser meu, Orium deveria ter o direito de se unir a fêmea que quisesse!
— Acha mesmo isso? Não se importa com o seu companheiro? — Alaor foi até a irmã rosnando baixinho, sua natureza furiosa por dentro.
— É… É claro que me importo, Alaor! Controle o seu lobo, sabe que tenho medo dele!
— Desculpa, Estela, mas sabe como ele odeia quando diz coisas assim!
— Eu sei, não falarei mais sobre isso, vamos trabalhar que é melhor!