Karma

1616 Words
Finalmente livre! Antes de vir para o banho, contei os absorventes que sobraram, só dará para o próximo ciclo, como será que as lobinhas daqui lidam com a menstruação? Vou precisar perguntar a tal da Dófona sobre isso… Sim, eu já estou acostumando com a ideia de viver por aqui, estranhamente, sinto-me em casa nesse lugar cheio de criaturas estranhas. Síndrome de Estocolmo ou não, é a primeira vez que chamo um lugar de lar desde a morte da minha mãezinha. Durante todo o meu período, o Alfa não saía do meu lado, ainda desconfiado pelo sangramento durar quatro dias. De acordo com ele, lobas sangram por um ou dois dias no máximo. Tratou-me como se eu estivesse ferida, trazendo comida na cama, colocando a mão na minha testa para checar se estava com febre, e ainda dormiu de conchinha. Hoje ele saiu bem cedo, mas me acordou para avisar que tinha muito trabalho acumulado. Ele está aprendendo… Pelo menos não posso negar que está se esforçando, espero que a dedicação seja sincera o suficiente para ser ago permanente e não fogo de palha ou uma encenação como a de Amir durante o nosso curto noivado. Fechei o chuveiro, enrolei-me numa toalha enorme e sai do banheiro com o corpo ainda pingando água, do jeitinho que eu gosto. Segui cantando uma das cantigas que mamãe me ensinou, de melodia romântica e doce, que aconchega a alma, sabe? As marcas das minhas pegadas molhadas no chão não me incomodavam. Dei de ombros, antes do Alfa voltar, o chão já estará seco… — Bom dia, Luna Esmeralda! Ei dei um grito signo de um pinscher com o susto que levei. Segurei instintivamente a toalha e virei na direção da voz. Beta Alaor estava diante de mim com uma bandeja na mão. — Por Allah, que susto! Por que não me avisou que estava aqui? — Você estava cantando, não quis interromper. — Mas assustou-me, poxa vida, se fosse uma cobra, me mordia. — Lobos também mordem… Ele resmungou baixinho, não tive certeza se entendi o que foi dito. — O que disse? — Perdoe-me, Luna, o Alfa ordenou que lhe trouxesse o desjejum caso não tivesse saído para comer. Ele estava tranquilo e não parecia em um pouco constrangido ao ver-me quase pelada. — Você sempre chega assim, sem bater e sem fazer barulho como um gatuno? — Eu nunca precisei bater para entrar na casa do Alfa, Luna, e temo que os seus ouvidos humanos não são capazes de ouvir passos de lobisomens. Ele sorriu para mim, mas os seus olhos tremiam um pouco, até passearem pelo meu corpo da cabeça aos pés, dos pés volta a cabeça. Ele piscou algumas vezes antes de virar de costas para mim. — Eu vou levar a bandeja lá para baixo e deixar a sua refeição na mesa da sala, se não se importa. A voz dele estava tensa e falava muito rápido. Rá, finalmente um pouco de constrangimento em alguém por aqui além de mim! — Tudo bem… Ele deu alguns passos e parou no meio da escada. — Luna Esmeralda… — Ele disse hesitante, sem olhar para mim. — Pois não, Beta. — A senhora é uma fêmea muito bonita, Alfa Ares tem muita sorte por te encontrar. — Hm…. Obrigada… Ele voltou a caminhar e seguiu caminho. Ouvi a porta da entrada fechar e respirei aliviada. Todos os lobisomens são bonitos assim? Quer dizer, até o general Igor é um gato… hehe… um gato… Eu diria, se Amir gosta realmente de homens, arrumou um bonitão, bem no estilo militar mesmo. Beta Alaor é bem bonitão, cabelos longos amarrados para trás, como um lorde inglês de filmes de época. Parece ser um pouco mais velho do que o Alfa, não sei se ele é casado, não vi nenhuma marca de dentada no pescoço dele. Às vezes, fico a imaginar como reagiriam as minhas colegas de escola se viessem para cá e se deparassem com tantos homens maravilhosos de lindos. Parece que vivo num ensaio de revista, daquelas que tem modelos masculinos com uniformes de bombeiros. Quando terminei o café da manhã, abri a porta e o Gama estava me aguardando do lado de fora. Muito simpático esse gama Antero, sempre sorrindo. — Bom dia, Luna! — Bom dia, Gama, tudo bem? — Tudo ótimo, estou muito animado em te acompanhar no passeio, Luna. Se me permite um atrevimento, está muito bonita. — Obrigada, Gama! Hoje é dia de elogiar a Luna ou algo assim? Vou ficar m*l acostumada! — Não, senhora, por que a pergunta, mais alguém elogiou a sua beleza? — Ainda agora o Beta também disse que eu era bonita. Não estou reclamando, só estranho a diferença. Há bem pouco tempo eu era xingada de vários nomes diariamente, com inútil., imunda, porca, preguiçosa… — Quem ousava desrespeitar-lhe dessa maneira tão abjeta, Luna? — O gama tinha o cenho franzido e a expressão de irritação evidente no rosto. — Minas ex-sogra, a mãe do Amir. Nossa, que velha megera, não saía nada de bom daquela boca maliciosa. O próprio Shaytan poderia aprender umas maldades com aquela mulher! — O macho do general era o seu macho humano, se entendi direito? — Pode se dizer que sim, mas não por minha vontade. — Se não era da sua vontade, por que se uniu a ele? — Fui forçada pelo meu pai. — Isso não é bom, se um macho precisa forçar uma fêmea para aceitá-lo, sinal de que não tem honra. — Concordo! Ei, tem alguma notícia de Amir? — Ele resolveu aceitar conviver com o general, mas como se recusa a se deitar com ele, continua sob punição e só sai da tenda com uma coleira. General Igor e muito rigoroso nas suas punições. — Não te entendo, Gama, você é contra forçar uma fêmea, mas acha normal que Amir esteja sendo coagido a aceitar o general — É diferente, Luna. O humano desafiou o general num duelo pela dominação. Ele disse que preferia morrer a ser um “homem-dama” em alto e bom som, para todos que estavam presentes ouvirem. O general ficou muito constrangido, o próprio companheiro o envergonhou, então perguntou se o humano aceitava o duelo, o humano aceitou e perdeu. General Igor, como vitorioso, tem o direito de puni-lo como achar necessário até que se submeta. — Onde aquele i****a estava com a cabeça para aceitar um duelo contra um lobisomem! Somos fisicamente mais fracos, perder a luta tornou tudo ainda mais ridículo. — O humano não resistirá muito tempo, está marcado, o vínculo vai se tornar cada vez mais forte. — Quer dizer que essa marca faz a gente se render a vocês? — Não é isso, Luna, se a senhora fosse uma de nós, teria reconhecido o Alfa como a sua alma gêmea desde que o viu pela primeira vez. Como não tem uma loba, o vínculo é muito mais fraco, a marca apenas abre um pouco a visão da sua alma para o reconhecimento. — O Beta tem uma companheira? — Não, nunca a encontrou, e olha que ele procurou muito, só parou quando a loba da irmã dele nasceu, porque ele teve que tomar conta dela. A Loba da beta fêmea é muito forte e arisca, sem controle, e atacava qualquer macho que se aproximava dela para montá-la, mesmo em meio a dor. Levou alguns anos para que a Beta Estela aprendesse a controlá-la. — Agora que essa Estela é adulta, ele voltou a procurar? — Sim, mas sem muito afinco, está cansado e desanimado com tantas negativas, creio eu. — E você, Gama? Está em busca da sua? — Sim-senhora, agora estou mais animado, pois posso prover melhor a minha fêmea, quando a encontrar, terei orgulho em dizer que sou o Gama da nossa Luna. O jovem Gama estufou o peito de orgulho, uma gracinha de rapaz. Falo no diminutivo no sentido carinhoso, pois Antero era quase tão enorme quanto o Alfa. A manhã foi muito agradável, conheci algumas pessoas do clã, olhando assim, ninguém diz que viram lobisomens. Algumas foram muito simpáticas, outras olharam-me com desdém, bem, desdenharam de mim e do Gama e foi fácil adivinhar s razão, né? Quem se surpreenderia com lobisomens preconceituosos contra humanos? Eu, nunca. No meu mundo, as pessoas têm preconceito até pela religião que a gente escolhe seguir, todo mundo se acha dono de deus, só eles estão certos, se você é de uma religião diferente, está condenado ao inferno. Como se ser mesquinho assim não fosse um inferno particular de cada preconceituoso… Uma das piadinhas que eu mais odiava na escola era a mais repetida: “Vai atirar bomba na gente não, hein!” Não era falta de vontade, acreditem, mas o esforço não valia a pena. Imagina gastar dinheiro, tempo e o réu primário explodindo o saco de bostas? Gama Antero parou numa barraca e comprou uma espécie de pão escuro e crocante que vinha recheado com uma mistura de carnes. Estava bem gostoso e o vinho dos lobisomens tem tempero, especiarias estranhas, mas de gosto muito bom. Sim, álcool é haram, mas descobri que o mundo tem muito mais do que eu jamais pensei existir e comecei a renunciar a detalhes que não considero mais importante. Se estiver errada, Allah tenha piedade, mas seguirei o meu coração em tudo o que fizer! — Olha só quem está aqui, Esmeralda! Que surpresa agradável! Ah… já estou sendo punida por ingerir álcool, alhamdulillah, com que rapidez vem o karma… Peguei a mão de Antero e o puxei para a estradinha de terra. — Venha, Gama, vamos para o outro lado, tem uma coisa ali que quero te mostrar…
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