_____ Jantar

967 Words
Valentina Eu apertei ainda mais os meus olhos e senti-me muito mais frustrada que antes, porque, mesmo irritada, eu queria sair com Caio. Mas o pouco orgulho que eu tinha não me deixou anunciar isso em voz alta. Ele foi c***l comigo, então pelo menos dessa vez eu não seria manipulada tão fácil. E tudo que fiz, após erguer os ombros numa resposta positiva, foi caminhar até o sofá e sentar-me na outra ponta. Dali até que o entregador chegasse com o pedido que ele tinha feito, eu não falei sequer uma palavra. Apenas dobrei as minhas pernas sobre o assento fofo, apoiei o meu queixo nos meus joelhos e esperei em silêncio enquanto Caio, que parecia menos disposto ainda a ceder, se sentou diante da mesa de centro com alguns papéis e começou a lê-los, quase como se eu não estivesse ali. Durante o jantar eu estava ciente de que a minha careta em burrada fazia-me parecer ainda mais infantil, mas incapaz de me conter mesmo enquanto eu comia. E Caio também comeu em silêncio mesmo que a sua expressão, diferente da minha, fosse tão tranquila. A minha cabeça ainda parecia que ia explodir só de pensar que nós poderíamos ter nos beijado, mas ele parecia alheio completamente a isso e comia com tanta serenidade que chegava a ser difícil acreditar que nós dois tínhamos experienciado o mesmo momento. Então eu observava-o com as bochechas estufadas de comida e os olhos cheios de aborrecimento, mas sempre abaixava o rosto e enfiava mais arroz na boca quando ele me olhava também. E nesse ritmo nós terminamos de comer sem que qualquer conversa tivesse sido iniciada. Quando começou a arrumar a bagunça sobre a mesa de centro, Caio o fez ainda sem falar comigo, mas ainda com a mesma expressão calma. Eu não entendia como, porque eu estava quase explodindo de frustração. Então, sentindo o meu orgulho quebrar por ver o tempo passar sem que eu pudesse ficar perto de Caio do jeito que eu queria, acabei por me levantar, juntando o resto do lixo sobre a mesa e levando-o até a cozinha, onde ele já tinha começado a lavar os pratos. Após separar o lixo, eu parei apertando uma mão na outra enquanto via Caio enxaguar a pouca louça que tínhamos sujado. Quando acabou, ele secou as mãos com calma e só então olhou para mim. ____Você pode dormir no quarto. — Ele disse com a intonação que sugeria, ou exigia, que eu já fosse-me deitar, mesmo que não fosse tão tarde assim. ____Amanhã nós vamos sair cedo. Eu abaixei os olhos, sentindo que toda a minha irritação anterior tinha sido convertida numa sensação mais mansa e um pouco mais desagradável. ____E se eu quiser ficar acordado com você? Perguntei, um pouco sem jeito. Mas Caio negou com um gesto suave. ____Você não está se comportando bem, meu anjo - Ele disse ao se desencostar do balcão da pia. — Vá dormir. Sozinha. Com o peito queimando de arrependimento, eu vi Caio deixar-me na cozinha. ____ i****a! — Praguejei contra a minha atitude, ou talvez contra a minha própria existência. Eu sabia como as coisas funcionavam com ele, por que tentei fazer do meu jeito? Os meus pais sempre me ensinaram a respeitar a privacidade dos outros. Nada de bisbilhotar, nada de escutar conversas sem permissão. Eu estava errada, então merecia, sim, ser castigada. Se eu tivesse aceitado isso e entendido que Caio só estava tentando-me disciplinar, nós poderíamos estar em algum restaurante, agora, juntos. Mas tudo que consegui foi uma refeição silenciosa, a sua declaração de que eu estava mesmo me comportando m*l e a única opção de ir dormir sozinha. Santo deus, eu estava muito arrependida. Mas quando também voltei à sala, ainda sem saber se seria melhor obedecer Caio em silêncio ou tentar-me desculpar, vi que ele não estava ali. Por sorte, o som do chuveiro logo me tranquilizou, anulando a possibilidade de que ele teria saído. Então eu esperei pelo que me pareceu uma eternidade, usando a desculpa de que precisava esperar ele sair do banheiro para que eu pudesse escovar os dentes, mas, na verdade, pouco preocupado com os detalhes da minha higiene. Mas foi quando ele saiu, vestindo nada além de uma calça de pano, que eu realmente senti que o arrependimento não cabia em mim. ____ Caio... — Eu chamei com a voz de quem estava prestes a chorar, porque era isso que aconteceria se ele não me deixasse tocá-lo outra vez. ____Vá dormir. Valentina. — Foi tudo que ele disse, ficando de costas para mim quando se abaixou para sentar diante dos documentos que lia uma hora antes. Sentindo o meu coração bater furiosamente contra o meu peito, como se ele mesmo estivesse a tentar-me castigar, eu engoli todo o meu pedido de desculpas desajeitada e peguei o meu pijama dentro da mochila como se essa tarefa precisasse mesmo de tanto tempo para ser feita. Depois, eu deixei a bolsa em cima do sofá, para ter um motivo para voltar na sala, e fui ao banheiro. Então após escovar os meus dentes e deixar a minha escova ao lado da dele, eu tirei a minha roupa feia, mas não vesti o meu pijama porque, antes que o fizesse, vi a blusa e a calça de Caio dobradas sobre uma das prateleiras debaixo da pia. Curiosa como sempre fui, eu peguei sua blusa com a estampa de motocicletas e a observei como se olhasse o item mais precioso do mundo. E talvez fosse, porque ela ainda tinha o cheiro suave dele. Decidindo arriscar-me, eu acabei vestindo a camisa, confirmando também que ela ficava enorme em mim. Mas a sensação de ter o cheiro dele tão perto foi confortável, e eu me sentiria um pouco consolada se pudesse dormir daquele jeito.
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