_____ 1° decepção amorosa

1850 Words
Valentina Eu estava tentando não pensar no que ouvi, mas foi impossível. Dessa vez, entretanto, o que me incomodou foi ouvir a forma como eles se referiam à possibilidade de Lisa ter um caso quando eu mesmo estava-me sentindo tão atraída por um homem mais velho. ____ Eu não acredito que você ainda não terminou de se alongar - Fernanda resmungou para mim, pendurando a perna no banco. ____ Não precisam-me esperar — Eu disse, já sabendo que eles não esperariam mesmo que eu pedisse. ____Se você insiste... — Léo deu de ombros e puxou Fernanda em direção à quadra de vôlei do ginásio, logo engatando numa conversa sobre algo que certamente não me interessa. Suspirei ao terminar o meu alongamento sozinha, enquanto os meus amigos formavam dupla na quadra de vôlei. ____ Cuidado, hein? - Ouvi a voz da única pessoa que ainda estava ali. — Eu posso muito bem espalhar mentiras de vocês para o colégio todo também. — Lisa alertou-me, debochada, fazendo um gesto obsceno com a mão. O comentário não foi dos mais agradáveis, mas eu não me dei ao trabalho de me stressar por causa disso. ____Você ouviu? — Foi o que perguntei, um pouco constrangida. ____ Seus amigos são uns babacas, eles falam alto justamente para que eu escute. - Ela disse sem parecer irritada. — Qualquer dia eu lembro de avisar que tô cagando para o que eles acham. Eu ri um pouco, mesmo sem jeito, e vi ela ficar de pé enquanto enfiava um chiclete na boca. ____Não vou forçar a barra dizendo que você parece uma garota legal demais para andar com eles, porque nem parece, mas você deveria rever a suas amizades ____Ela alertou, caminhando em direção à quadra. ____ Vai ser um problema quando você quiser assumir que gosta de alguém mais velho. A última coisa que eu poderia ouvir era isso. E então eu estava finalmente sozinha, chocada demais com o que tinha acabado de ouvir. Eu não sabia se ela tinha falado aquilo para me provocar, mas fiquei tão curiosa que logo depois eu terminei de me alongar às pressas, e saí correndo atrás dela. Quando a alcancei, a impedi de atravessar a passagem até a quadra onde os outros da nossa turma estavam, porque não queria que eles me vissem falando com ela. ____ Algum problema? — Ela perguntou, debochada, quando olhou para mim. ____Por que você disse aquilo?! ____ Eu disse muitas coisas, você precisa ser mais específica. ____ Você acha que eu gosto de homens mais velhos? ____ Mudei a abordagem, sem entender se aquilo na minha voz era raiva ou não. Lisa fez uma careta como se tivesse escutado um absurdo. — Claro que não acho. Valentina. Eu tenho certeza, você nunca namorou nenhum garoto até hoje e nem garotas, então você assim como eu curti um homem mais experiente, ou está no armário. Eu uni as sobrancelhas, confusas. Nem eu mesmo tinha certeza, como ela poderia ter? ____ Escuta. — ela deu um passo na minha direção, aproximando-se como se fosse contar um segredo ___ eu reconheço uma s*********y quando vejo uma. É meu superpoder. Ela sorriu, com o rosto bem em frente ao meu, e a minha mente viajou por várias possibilidades em poucos segundos. Pensei em mandar ela ir se ferrar, em dar um soco na cara dela e por último mandar ela ir se ferrar. Mas a verdade é que, sendo Caio Victor o único ou não, eu estava interessado por um homem mais velho. Por fim, apenas continuei com a minha careta de confusão, engolindo a raiva. ____ Então você gosta de homens mais velhos? — Perguntei, torcendo para que ninguém resolvesse passar por ali e visse-me falando com a garota mais rejeitada da escola. Ela abriu um sorriso orgulhoso, em resposta — passiva mais agressiva que você vai conhecer. Eu não sabia muito bem o que aquilo queria dizer, mas entendi que era uma confirmação. ____ E você... sai mesmo com homens mais velhos? — Insisti, tentando soar casual, mas ela pareceu ter percebido a motivação da minha pergunta. ____ Você também curte um s*********y. Valentina? — Ela riu, voltando a caminhar em direção à passagem, mas eu impedi-a outra vez. — Por que eu não estou surpresa? ____ Eu nem sei o que é s*********y. ____ Püta que me pariu, as virgens são as piores — ela resmungou, enfiando mais um chiclete na boca. ____ Olha, eu estou um pouco confusa e acredite ou não, mas você é mesmo a única pessoa com quem eu posso falar sobre isso, então que tal ser um pouco mais agradável? – Pedi, espalmando as mãos no seu ombro quando ela fez menção de que caminharia, de novo. Lisa levantou as sobrancelhas com deboche, talvez percebendo o que eu estava tentando fazer, mas não foi sobre isso que ela falou. ____O que foi? Quer saber como fazer a chuca ou aprender a fazer garganta profunda, é? Mais duas coisas que eu não entendia. ____ Eu só quero saber como... como agir com um cara mais velho. — Confessei, mortificada por estar falando aquilo em voz alta. ____Ele deixa-me muito nervosa e eu não sei o que fazer, então acabo fazendo besteira. Ela revirou os olhos, entediada. ____ É isso? ___ Perguntou, fazendo pouco caso. - Quão mais velho esse cara é? ____ Cinco anos — Anunciei, certeiro, porque as informações de Isabella tinham sido bastante completas. — Mas não é só isso... ele tem essa atmosfera toda confiante e fica incrível usando terno e gravata, mas também tem aquela tatuagem e... tudo nele deixa-me... Eu gesticulei, me abanando furiosamente, porque não sabia que palavra usar. ____ Um homem de negócios com uma tatuagem escondida? - Ela disse, torcendo os lábios em algo que me pareceu satisfação. — Que delícia. Eu suspirei, concordando, ainda um pouco atordoada por estar falando sobre aquilo com ela. Por estar falando sobre aquilo com qualquer pessoa. Lisa então puxou a mochila das costas e abriu o zíper do compartimento médio, enfiando a mão para pegar alguma coisa. Depois ela tirou dali um cantil e jogou para mim, que quase não consegui pegá-lo no ar e por pouco não tive um treco quando peguei. ____ Bebe um pouco disso, relaxa e segue o fluxo. — Ela disse quando eu abri a tampinha de metal para cheirar o que tinha dentro, sem controlar uma careta. - O álcool vai-te ajudar. ____ Você traz bebida para escola? — perguntei, julgando-a. ____ Para sua sorte, sim — Respondeu, jogando a mochila no ombro outra vez. — Devolva o cantil sem nenhum arranhão ou eu juro que te mato. Eu fiz uma careta pela ameaça, cheirando de novo a bebida, mas logo percebi que não deveria estar com aquilo exposto no meio da escola. ____ Já sei que você não vai falar comigo quando outras pessoas estiverem por perto, então boa sorte com o seu s*********y. — Foi a última coisa que ela disse, já após me dar as costas e finalmente seguir para a quadra. Lisa não parecia irritada ao pressupor corretamente que eu não falaria com ela quando estivéssemos no meio de outras pessoas. Na verdade, ela parecia considerar aquilo algo completamente normal e previsível, e então eu senti-me m*l de verdade. Ela tinha um jeito rebelde e um linguajar meio-grosseiro, mas não parecia má pessoa como todos os outros faziam-me acreditar. Na verdade, de todas as pessoas que conheci naquela escola e que viviam julgando qualquer um que não seguisse o que eles consideravam normal. Lisa parecia ser a mais decente. Mesmo assim, eu era covarde. Ser uma aluna invisível poupava-me de diversas situações que eu queria evitar, mas ser visto com Lisa, com certeza atrairia as atenções para mim, então eu só deixei que ela fosse à frente e esperei um tempo, após esconder o cantil no fundo da minha mochila, até que finalmente me juntei ao resto da turma e ignorei a sua presença no meio do grupo, como sempre fiz. Quando a aula terminou, após ter levado duas boladas na cara e tropeçado no cadarço desamarrado do meu tênis, eu corri para os vestiários e fui a primeira a tomar banho e trocar de roupa, porque queria voltar logo para casa. Enquanto apressava o passo no caminho de volta, chequei as horas no celular e vi que passavam dez minutos das dezassete, então andei mais rápido ainda até que finalmente cheguei e, ao invés de seguir até a passagem que levava à minha casa, atravessei a recepção como um furacão, ignorando o chamado de Isabella. Quando finalmente parei diante da porta do quarto onde Caio Victor estava hospedado, eu respirei fundo e passei as mãos nos cabelos, no rosto e na roupa, tentando não parecer tão desleixada. E então eu finalmente bati na madeira da porta de correr, esperando que ele a abrisse ou dissesse-me que podia entrar. Mas Caio Victor não abriu, nem me falou palavra alguma. E eu esperei. Depois, bati de novo e esperei mais um pouco, mas nada aconteceu da mesma forma. Já um pouco nervosa, eu forcei a porta para o lado, percebendo que ela estava destrancada e o quarto... vazio. As toalhas e lençóis que ele tinha usado estavam juntos sobre o colchonete, exatamente como todos os hóspedes deixavam no dia em que iam embora. Sentindo o meu coração acelerar, eu dei um passo para dentro sem nem mesmo tirar os meus sapatos, olhando para cada canto em busca de qualquer coisa que provasse que eu estava errado e que Caio Victor não tinha ido embora daquele jeito, mas suas roupas não estavam mais ali nem a sua mala ou a bandeja com o chá ao lado dos papéis que ele lia com tanta concentração duas noites antes. Caio Victor foi embora, assim, sem uma despedida, após me fazer acreditar que, naquele exato momento, eu estaria com ele, sozinho, sentindo o meu estômago revirar a cada vez que ele olhasse para mim. Raiva nunca seria a palavra certa para descrever o que senti, porque a tristeza e a sensação de ter sido enganada tão cruelmente não deixaram espaço para isso. Eu estava completamente encantada por aquele homem, mas, no final, parecia que para ele eu era só uma diversão passageira. E antes que a minha visão se tornasse turva devido às lágrimas ou que eu saísse dali e escondesse-me no meu quarto, eu vi o pequeno pedaço de papel que, até então, tinha sido ignorado. Boba como sou, corri para me ajoelhar diante da mesa de chá e peguei o pequeno bilhete, desfazendo as suas dobras com as mãos atrapalhadas até ver aquela caligrafia bonita sobre o papel branco. Então eu li, reli e li mais uma vez as suas palavras. Tão poucas, perto de tudo que eu tinha pensado em dizer-lhe, acreditando que ainda teríamos a oportunidade de conversar. Caio Victor tinha-me conquistado e oficialmente abandonado. Naquele verão dos meus dezesseis anos, eu tive a minha primeira desilusão amorosa. E com o whisky barato do cantil de Lisa, tive o meu primeiro porre.
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