Ponto de Vista: Saga
Dez dias já haviam se passado desde a sua partida, quando quatro carruagens trazendo suas coisas chegaram. Um homem de barba branca foi logo descendo e fazendo uma reverência sutil com a bengala de apoio.
_ Sou o servo pessoal do senhor Halan, chamo-me Barnepe e preciso averiguar as acomodações do príncipe. _ disse gentilmente o homem.
_ Essa é a serva responsável pelos quartos, siga-a e escolha um bom quarto para o príncipe. _ falei devolvendo a gentileza.
Fui informada, mais tarde, que o homem escolheu o quarto mais longe do meu possível, com uma antecâmera. O servo responsável pela notícia informou que Halan gosta de receber amigos em seus aposentos, revelou o homem dando ênfase aos "amigos".
Foi averiguado também se o quarto tinha passagens secretas. Os painéis foram movidos, quadros retirados, móveis foram deslocados para outros quartos e tudo foi analisado com paciência pelo homem. Depois fecharam a única passagem que tinha, na antecâmera, com pregos na moldura do quadro.
Provavelmente Halan não ordenou isso, já que ele gosta de libertinar pelos corredores internos do palácio.
Todos os objetos e móveis do príncipe foram colocados nos lugares, mas meus servos foram impedidos de verificar como ficou a estrutura. Provavelmente ele deveria ter projetado o quarto para seus prazeres sexuais, e não queria os meus servos espalhando essa notícia pelo palácio.
Joguei-me na cadeira do escritório e afundei-me em trabalho. Segundo Barnepe, o príncipe estaria chegando pela manhã com mais servos e objetos pessoais. Dois soldados dele, ficavam em sua porta dia e noite, independente se ele estava ou não. Em minha porta também ficavam dois soldados da mesma forma e só entrava servos de minha confiança.
Estava com raiva e chateada pelas coisas que estavam me impondo, mas eu tinha que entender que era um casamento de aparências. Ele receberia o título de Rei Consorte e eu calaria a boca do Conselho, isso teria que bastar para os dois.
Eu não precisava de alguém que me amasse em minha cama, eu precisava de alguém obediente, mas infelizmente não poderia escolher, meu pai escolheu por mim.
Orava aos deuses que ele fosse mansidão, o que eu dúvida muito, mas mesmo assim orava, pois não queria me desfazer dele antes de ter um herdeiro ou herdeira.
Durante a tarde recebi o pai de Lara para uma audiência. O homem teve a audácia de levar um pano úmido e ficar fingindo tosses enquanto falava comigo.
_ Estou enfermo, majestade. _mentiu tossindo exageradamente.
_ Senhor Lourival, temo que está me desagradando exigindo que Lara se case com um homem muito mais velho que ela. _ revelei sem dar arrodeios. _ Como minha amiga, fico bastante infeliz igual a ela.
_ Veja bem, majestade. Eu sou velho e adoentado, preciso de renda para custiar os remédios e não tenho saúde para cuidar de Lara. _ continuou mentindo o homem.
_ Então veja bem, senhor Lourival. _ continuei usando as mesmas palavras que ele. _ Farei de Lara dama da rainha e pagarei um dote ao senhor, o mesmo que tem exigido com um bônus a mais. Ela sairá da sua tutela para a minha e seu destino não pertencerá mais ao senhor.
_ A senhora, majestade, não tem damas da rainha. _ contrapos o homem sem entender como eu faria isso.
_ Não tenho porque nunca gostei de ficar de conversa com outras mulheres, mas eu e Lara dividimos o interesse pelos mesmo assuntos triviais. _ respondi solicitando que Onto se aproximasse. _ Publique em decreto, por enquanto, ela é a única dama da rainha.
_ Sim, Majestade! _ respondeu Onto pegando tinta e papel para escrever o decreto.
_ Posso me retirar, Majestade? _ perguntou Lourival.
_ Não! O senhor irá assinar antes, concordando com o decreto e a nova tutelagem. _ respondi fazendo-o sentar, iria amarrar essa decisão para que ele não tentasse me passar a perna.
_ Podemos enviar o documento para a casa do senhor Lourival para que ele assine em momento mais oportuno. _ contrapos Onto ainda escrevendo.
_ Não! _ falei com autoridade. _ Devido a situação do senhor Lourival, devemos fazer isso o mais rápido possível, pois me parece que seu pulmão está desmanchado e não queremos deixar isso para depois de sua morte.
_ Eu já me sinto bem melhor, majestade. Até parei de tossir, veja. _ declarou o homem guardando o pano úmido no bolso da camisa.
_ Se sua saúde está melhorando, então o senhor pode esperar e assinar. Quero ler antes Onto. _ falei olhando o integrante do conselho pelo canto do olho.
_ Como desejar, majestade. _ disse os dois homens ao mesmo tempo.
Eu sabia lidar com esse tipo de homem e com certeza demorei demais para tomar providências. Provavelmente ele já estava com um contrato nupcial em cima da mesa e um pretendente caquético na porta. Inventaria qualquer desculpa e eu não poderia fazer nada, pois um casamento só poderia ser desfeito por uma entidade religiosa superior.
Eles só desfaziam casamentos em caso de morte antes de consumar o casamento ou dez dias sem consumação, evidenciando problemas sexuais masculinos.
Eu não era uma mulher religiosa, mas meu povo era e meus inimigos mais ainda. Já tinha visto reis serem depostos, por não agradarem tal entidade e querer se separar da mesma.
Em minha Cidade Forte eles só interferiam quando o assunto era casamento, um dos motivos também do meu. Eles estavam só aguardando, meus dezoito anos, para enviarem uma carta solicitando meu casamento.
O chefe da igreja não admitia mulheres nobres, com mais de dezoito anos, boas de saúde, solteiras. Mandava cartas aos responsáveis solicitando os arranjos nupciais e oferecendo os conventos, caso fosse necessário conter a garota.
As mulheres da plebe eram mais livres, pois não tinham dotes e nem casamentos para serem arranjados. Muitas trabalhavam e sustentavam suas famílias, casavam-se por amor ou apenas se juntavam, pois a igreja exigia p*******o pelos papéis de casamento e algumas não conseguiam pagar.
Eu teria que casar Lara rápido, pois ela já tinha dezoito anos e sendo minha dama da rainha, ficaria mais em evidência. Mas eu não a casaria contra a vontade dela.
_ É preferiu que depois nomeie outras garotas com tal título, pois ficará muito evidente sua preferência pela garota. _ disse minha madrasta de seu lugar, que quase nunca ocupa.
_ Não tenho outras em mente. _ contestei.
_ Vamos analisar algumas de boa família. _ respondeu Eron.
_ Vou ter que ter encontros diários com elas? _perguntei já me sentindo atormentada pela ideia.
_ Passeios nos jardins, eu creio. _ respondeu Eron. _ O cargo é de acompanhante da rainha, mas basta que sejam vistas com a senhora por alguns minutos diários.
_ Solicite que recebam um salário. _ informei fazendo todos olharem para mim.
_ O cargo em si já é bastante pleiteado. Terão casamentos vantajosos. _ revelou Eron.
_ Podemos pagar salários para as moças. _ concordou Carlos.
_ Ótimo! Se meu tesoureiro não tem nada contra. Pagaremos. _ informei.
_ Poderia mesclar entre nobres e plebeias. _indicou Lírio fazendo o Conselho protestar. _ Daria oportunidade de bons casamentos para elas.
_ Gostei da ideia. Cinco nobres e cinco plebeias para fechar dez. _ empolguei-me rindo com Lírio. _ Quem casa sai.
_ Majestade, vai convidar plebeias para o baile de casamento? _perguntou Lírio.
_ Não! Mas pensarei na ideia para o futuro. _ respondi fazendo o conselho respirar aliviado.
Ponto terminou de fazer o decreto e li. Estava tudo bem escrito e explícito para não deixar dúvidas. Assinei o decreto e coloquei o brasão anelar, passando o papel para que fosse assinado por Lourival.
O homem assinou o decreto suando, provavelmente teria que se explicar com o pretendente de Lara. Tremia tanto que pensei que não fosse capaz de terminar, mas ele conseguiu e mandei que fosse publicado no jornal.