Chucky estava debaixo do chuveiro, deixando a água quente cair sobre seu corpo enquanto tentava lavar a sensação de sujeira que o consumia. Às vezes, ele perdia as contas de quantos banhos tomava por dia, uma tentativa desesperada de se livrar das lembranças que o assombrava.
Ainda se sentia sujo pelos contatos que teve com as mulheres, as mãos delas que costumavam passar horas se esfregando nele, deixando uma marca que queimava em sua pele e em sua alma. Tinha tentado esquecer, mas a ânsia por algo que ele não conseguia definir, o impulsionava a recordar, precisava descontar a raiva em alguém para esquecer.
O cheiro das freiras ainda estava nele, impregnado em cada poro de sua pele, uma lembrança constante do inferno que ele viveu todos os dias todos da sua adolescência, só ficou menos pio.r quando ele se tornou adulto, porque ele ficou muito violento e as freiras o temia.
Era impossível não voltar para o chuveiro.
O silêncio reinava dentro do pequeno chalé em que ele costumava ficar, uma solidão que ele mesmo escolheu. Morava na mesma propriedade que a irmã, o cunhado e os sobrinhos, mas preferia a companhia solitária das sombras.
Não era bom em convivência e não tinha coragem de pegar o sobrinho de 3 meses no colo, pois parecia que profanava a inocência daquele pequeno ser. Já o sobrinho mais velho gostava de caminhar com ele pela propriedade, uma presença que trazia um pequeno conforto em meio ao caos de sua mente atormentada.
Lá fora, uma chuva forte caiu, mas ele não tinha medo dela. Desligou o chuveiro e caminhou pelo chalé com as luzes apagadas, uma sombra entre as sombras. Tinha ficado tanto tempo no escuro por trás da piscina que se acostumou com escuridão, passava dias e dias sem nem mesmo ligar uma única lâmpada.
Depois de vestir uma bermuda, ele saiu para caminhar na chuva, deixando que as gotas geladas o envolvessem como um abraço.
A chuva costumava dar a sensação de limpeza que tanto buscava, mas naquela noite, parecia que nada poderia lavar a sujeira que o consumia por dentro. Ele se ajoelhou no chão, sentindo a água gelada, e ficou ali, perdido em seus pensamentos sombrios.
Em algum momento, a chuva passou e a lua iluminou a Terra.
Ele pegou uma vareta no chão e escreveu o nome Moa Yotis na terra úmida, fazendo um círculo em volta daquele nome e se sentando dentro dele, nem soube, porque fazia aquilo.
Não entendia, mas ficou ali, imerso em sua solidão e em sua dor. Estava frio, mas ele tinha se acostumado com aquela sensação também. Não importava se era noite, dia, inverno ou verão, parecia que tudo era a mesma coisa, um borrão de dor e desespero.
A única coisa que aliviava seu sofrimento e sua raiva era o contato com a irmã e com o cunhado. A irmã era a presença que o lembrava de que ele ainda era humano, apesar de tudo. Viu o dia amanhecer dentro do círculo que havia desenhado, o sol era como uma luz tênue que anunciava o início de mais um dia de tormento e solidão.
Ele se vestiu antes de descer para tomar café da manhã com a irmã e o cunhado. Usavam um pequeno jipe para percorrer a propriedade,
Ao descer, foi envolvido por um abraço caloroso da irmã.
__ Por que você sempre desaparece pela propriedade? __ Amora o questionou.
Ele respondeu se esforçando para não parecer grosso.
__ Não sou uma boa companhia, Amora. Às vezes, preciso caminhar para me sentir gente.
A irmã o conduziu para dentro da casa, tratava-o como se fosse uma criança em alguns momentos. Chucky não reclamava, sabia que era sua maneira de oferecer amor. Ele escondia sua verdadeira natureza, para poupá-la do sofrimento que sua escuridão poderia trazer.
As crianças da casa ainda dormiam quando ele chegou à mesa do café. Chucky era servido pela irmã, pois tinha uma imensa dificuldade em se servir sozinho. Passara tanto tempo dependendo dos outros para sua alimentação que era difícil fazer as coisas por si mesmo. Muitas vezes, as refeições no orfanato vinham acompanhadas de uma drog@ que aumentava sua libido, algo que o enchia de raiva sempre que se sentia excit@do sem nem mesmo desejar.
Tiraram tudo dele.
Ele pegou um brinquedo infantil, pensou que nem isso poderia ter, a redenção de ser pai..