Dominique Belmonte
— "Mais uma noite solitária, estou me acostumando bem demais," — murmurei para mim mesmo ao me levantar da cama e me espreguiçar. Com passos lentos e medidos, caminhei até a janela e contemplei o vasto terreno da minha mansão, refletindo sobre os cantos e recantos ainda inexplorados deste imenso lar. Vivo nesta mansão há apenas alguns meses, mas parece que minha existência está mais ancorada no trabalho do que nas paredes desta casa.
Tenho o péssimo hábito de querer me mudar sempre que um relacionamento chega ao fim. Odeio permanecer em espaços que ecoam as memórias e os fantasmas do passado; cada canto parece sussurrar episódios que prefiro esquecer. E agora, faz três meses desde que levei um pé na b***a – uma maneira um tanto crua de colocar, mas é a verdade. Essa é a minha sina, uma espécie de ma'ldição pessoal na loteria do amor, sempre me perguntando onde meu cupido foi treinado, porque parece que ele é terrivelmente péssimo no trabalho.
Talvez seja uma metáfora para minha própria existência – tão cheio de espaços vazios, de promessas não cumpridas. Deixo escapar um suspiro, sentindo o peso da solidão, mas também reconhecendo a liberdade que ela traz. Aqui, neste imenso vazio, tenho espaço para reconstruir, para reinventar, para começar de novo. Talvez, apenas talvez, esta noite solitária seja exatamente o que eu preciso para finalmente enfrentar a mim mesmo.
Me chamo Dominique Belmonte, sou o CEO de uma das empresas mais proeminentes da indústria alimentícia. Aos 44 anos, carrego nos ombros não apenas a responsabilidade de dirigir uma corporação multimilionária, mas também o legado de uma família dedicada à excelência gastronômica. Minha jornada até aqui não foi apenas um caminho profissional, mas uma viagem pessoal de autodescoberta, paixão e dedicação.
Acordo todas as manhãs antes do amanhecer, uma rotina que me mantém ancorado, lembrando-me de onde vim e para onde estou indo. Meu reflexo no espelho mostra um homem maduro, com linhas de expressão marcadas pela experiência, mas ainda assim, um semblante de vigor e determinação. O terno bem cortado e a postura impecável são minhas armaduras diárias, símbolos do papel que desempenho não só na minha empresa, mas no mundo dos negócios.
O aroma de café recém-preparado invade o ambiente, misturando-se aos sons vivos de uma manhã típica, mas uma rápida olhada no celular me arranca dessa tranquilidade, lembrando-me que minha vida está longe de ser um mar de rosas — principalmente por causa de Heitor, meu filho. Desde que encarei a realidade da paternidade, tenho tentado lidar com isso da melhor forma possível, mas confesso que é difícil. Muitas vezes, minha paciência se esgota diante de sua constante irresponsabilidade.
Heitor é a imagem viva do jovem que eu mesmo fui. No entanto, tive a "sorte" de ter um pai rigoroso, um corretor de imóveis que não me deixou seguir pelo caminho do descuido, mostrando-me a importância de ser responsável. No entanto, minhas tentativas de guiar Heitor parecem infrutíferas.
Sinto que, com ele, estou constantemente pisando em terreno minado; nossa relação há tempos não é nada amigável. Apesar disso, estamos tentando nos entender, um processo complicado, especialmente depois que, em um ato que considerei quase insano, sua mãe vendeu sua casa e mudou-se para a residência de sua mãe, deixando Heitor sem outra escolha a não ser vir morar comigo, já que a sua avó é rigorosa demais. O rapaz afirma que está trabalhando, mas eu só o vejo saindo para festas e reunindo-se com amigos. Se bem que ma'l paro em casa. Mas nunca vi um indício concreto desse suposto "trabalho". É vergonhoso admitir, mas não sei quase nada sobre a vida do meu próprio filho. Observo-o, tentando decifrar seus pensamentos e aspirações, mas a distância entre nós parece apenas crescer. É uma situação complicada, que me deixa mais reflexivo a cada dia que passa, enquanto tento encontrar uma forma de nos conectarmos.
Descobrir a paternidade de Heitor quando ele já era um jovem rebelde de 20 anos foi como um soco no estômago. Nunca imaginei ter um filho, e muito menos sob tais circunstâncias. E com essa revelação tardia, veio também sua rebeldia contra mim e sua mãe. Mas vamos deixar o passado de lado e focar no presente, no agora.
Numa dessas manhãs, enquanto eu me preparava para mais um dia de trabalho, avistei Heitor entrando em casa. A luz do amanhecer refletia em sua blusa branca, destacando manchas de batom que não passaram despercebidas por mim.
— Bom dia, Heitor. Estava com a Ana? — perguntei, tentando parecer casual. Ana é a nossa vizinha, uma jovem encantadora, mas bastante ingênua, que começou a namorar Heitor desde que ele se mudou para cá.
Com um sorriso sarcástico, ele respondeu:
— Com a Ana? A minha namorada que quer se casar virgem? Conta outra, velho. Nem você acredita nessa pergunta. — Seu tom era zombeteiro, e a maneira como ele ignorava o peso de suas ações me deixava preocupado, mas, ao mesmo tempo, determinado a tentar estabelecer o respeito e entendimento, algo que nos levasse a uma relação de pai e filho mais saudável.
— Já disse para me tratar com respeito, rapaz, se não quiser que eu te trate da mesma forma, e não gostara nenhum pouco — falei, rígido, com um semblante de poucos amigos. Sou conhecido por ter uma personalidade forte, às vezes até considerada bipolar.
— Desculpa, 'imponente Dominique'. Poderia ter me criado, né? E me dado um nome forte como o meu avô te deu — retrucou Heitor, com uma mistura de sarcasmo e desdém na voz.
— Sabe que a culpa não foi minha — respondi, tentando manter a calma, embora seu comentário tivesse me atingido.
— Entendo, você só espalhava o seu sêmen por aí — ele provocou, com um sorriso mordaz.
— Heitor! — exclamei, mais alto do que pretendia, sentindo a tensão aumentar. Eu queria repreendê-lo, mas também sabia que precisávamos encontrar uma maneira de superar nossas diferenças.
— Dominique, estou exausto, posso subir, tomar um banho e dormir? — Heitor pareceu desistir do debate, sua voz carregava um misto de cansaço e resignação.
— Não era para ir trabalhar? — questionei, cruzando os braços e encarando-o com ceticismo.
— Trabalho por conta própria, já comentei isso. Falando nisso, o senhor iria investir comigo, cadê o investimento? — Seu tom era de leve desafio, como se tentasse me colocar contra a parede.
— Pedirei a Raquel para fazer a transferência, só envia a conta e as informações necessárias — concordei, mantendo o tom sério, indicando que não toleraria deslizes.
— Quanto o senhor quer investir? — Heitor perguntou, um lampejo de interesse brilhando em seus olhos.
— Isso é seguro, rapaz? Não brinque com meu dinheiro — alertei, pesando minhas palavras com cuidado.
— 100% seguro, meu amigo é o craque nisso. Logo, o senhor terá o dobro em sua mão — ele assegurou com uma confiança que quase me convenceu.
— 100 mil para começar, mas não me venha com falsas promessas. Não caio nessa; é só para te ajudar — estabeleci meus termos, querendo deixar claro que minha paciência tinha limites.
— Valeu, Dom — Heitor sorriu, reconhecendo a concessão, mas sua expressão ainda guardava traços de cansaço.
— Estou indo. Não passe o dia todo dormindo ou te coloco para fora — aconselhei, virando-me para sair.
— Valeu, pai. Entendi — ele respondeu, um traço de sinceridade em sua voz que há muito não ouvia.
Minha intenção com esse investimento nem é o próprio investimento, mas, quem sabe, ajudá-lo a se erguer. Vejo potencial no garoto; acredito que ele só precisa de disciplina. Sua mãe foi um tanto irresponsável ao não dar limites a ele. Que ele comece o seu próprio negócio. Meu pai me deu uma chance na vida, e eu a abracei; me dei muito bem com isso. Como dizem, azar no amor, sorte nos negócios.