Amora foi para a entrevista de táxi, com o coração apertado. Estava assustada com a vida e com o mundo.
Deixou escapar algumas lágrimas ainda dentro do carro, ela chorava porque não se sentia pronta para isso, para enfrentar a vida, e só tinha dezessete anos, mas quando tivesse dezoito também não estaria pronta.
Mas lutaria para sobreviver, mesmo que o mundo fosse cru£l.
Olhou para as ruas, algumas lojas, casais, crianças caminhando com os pais.
Não demorou muito para o táxi estacionar.
Ela desceu.
A entrevista era em um hospital pequeno, parecia mais uma clínica estética, pelo tamanho e simplicidade, o imóvel ficava em um lugar com pouco movimento. E quem lhe recebeu foi um médico relativamente jovem.
Benício Carllagam, Amora o achou estranho, muito sorridente, mas talvez, fosse porque ela tendo crescido quase reclusa, não estivesse acostumada com muito sorrisos, no orfanato não se sorria muito.
__ Tem mesmo dezoito anos? – O médico perguntou.
__ Faço dezoito anos em quatro meses, senhor.
__ Pois parece ter quinze. Compreende bem sobre computadores e internet?
__ Compreendo sim. Eu só não sei muito sobre termos médicos ou jargões, nunca trabalhei em hospitais, mas posso aprender rápido.
__ É curiosa?
__ Com a minha própria vida, não vou ficar bisbilhotando o que não é da minha conta.
No orfanato cada um cuidava de si, e as freiras enfatizavam que Deus abominava a fofoca.
O médico olhou para ela. Era uma jovem bonita, uma beleza diferente, os olhos femininos demonstravam medo, e para alguns homens, o medo podia ser uma afrodisíaco.
Além de tudo os olhos de Amora era negros como a noite, cabelos da mesma maneira, os fios batiam na cintura, porque no orfanato não podiam cortar, somente as madres raspavam a cabeça para se despirem da vaidade.
Olhou em volta da recepção do pequeno hospital, estava tudo organizado e limpo, sem paciente ainda, Amora estranhou, mas
Era uma clínica nova, talvez fosse isso.
O médico a levou para um tour pelo lugar, e assinalou duas portas que ela não podia entrar.
Amora segurou na bolsa, se lembrou de todas as reportagens apresentadas no orfanato, de jovens ingênuas que iam em uma entrevista de emprego e desapareciam. Benício Callaghan poderia a estupr@r e depois m@tar, ele era médico sabia como desaparecer com um corpo, e ninguém sentiria a sua falta, provavelmente as freiras rezariam uma novena pelo desaparecimento dela, e só.
Amora sentiu o ar começar a faltar. Segurou na bolsa e pensou em uma desculpa para fugir dali, mas suspirou aliviada quando encontrou uma enfermeira conferindo estoques com uma prancheta na mão.
Não seria dessa vez que morreria. Felizmente, mas foi quase, porque por um momento, Amora pensou que o coração sairia pela boca.
Cindy se apresentou. Amora fez mesmo.
__ Você está bem? – Cindy perguntou ao olhar para Amora.
__ Estou.
Amora tinha a pele clara, mas sabia que deveria estar quase transparente.
__ Parece pálida. – Cindy insistiu.
___ Hoje está quente. É só calor. — Colocar culpa no clima, foi a única coisa que Amora pensou.
Sorriu para a enfermeira, ao menos não seria a única mulher trabalhando ali.
Ao menos isso, mas Amora tinha a sensação de perigo, como se algo rui.m fosse acontecer,mas possivelmente era por causa da saída do orfanato. Teria que deixar ser uma menina e aprender a ser mulher, mesmo que quisesse se fechar em um casulo, não podia, ou mundo a atropelaria, mas Amora não sabia se estava com bagagem suficiente para enfrentar o mundo.
Com o fim do tour, parou na frente do médico, rezando para que ele dissesse que entraria em contato depois, pois era isso que costumavam dizer quando não gostavam da entrevistada para a vaga disponível, ao menos foi isso que ouviu em um tutorial de empregos que a madre a deixou assistir.
__ Está contratada. Eu espero você na próxima semana com os documentos pessoais. Começamos a funcionar em quatro meses, e espero você para ser a minha secretária. O seu horário de trabalho será das 9 às 14:00 . E não faça perguntas que não precisa saber e vai ficar tudo bem. – O médico disse.
__ Sim, senhor.
__ Pode me chamar de você.
Dessa parte ela não gostou, preferia a tratar como senhor.
Amora achou estranho tudo aquilo, muito estranho, mas não tinha muita ideia de como era uma entrevista de emprego, aceitou, mesmo assustada e com o seu sexto sentido dizendo não, ela aceitou. E não era como se pudesse escolher um trabalho, não podia, mas também não podia negar que ficou assustada com tudo aquilo.
Saindo da entrevista, ela caminhou pelas ruas da cidade, agora que estava prestes a sair de vez do orfanato , tinha mais liberdade, só agora , quando ela não queria. O governo poderia ter um programa, como uma casa para mulheres, onde pudessem trabalhar, e viver, protegida, longe de pessoas perigosas, e principalmente longe de homens perigosos.
Mas não era assim que as coisas funcionavam. Se lembrou de um livro que leu, onde a mocinha se casava obrigada , assim que saia do orfanato, mas o marido era bom para a mocinha do livro, quase desejou que funcionasse assim na vida real também, ao menos teria um casa, alguém para a proteger, e poderia ter filhos e cuidar deles, como não foi cuidada. Nunca abandonaria um filho seu.
Caminhou devagar, olhando ruas e casas, precisava encontrar uma pensão também. Não fazia ideia onde procurar, teria que pedir ajuda a alguma senhora que ia na missa dos domingos.
Odiava ter que morar em uma pensão. Sonhava com uma casa grande, com um grande jardim, com um cachorro grande e bobo, que só servisse para fazer bagunça e a fazer rir. Talvez gostasse de coisas grandes, o cabelo estava enorme e não tinha pretensão de cortar.
Toda a ideia de casa que construiu, era uma ilusão, sabia, mas sempre sonhou com isso.
Sonhava com o que nunca teve, e possivelmente nunca teria, sozinha, seria só mais uma alma perdida em uma cidadezinha quente e abafada do Texas. Nem nisso teve sorte, moraria justamente em El Paso, o lugar mais quente dos Estados Unidos, de acordo com os jornais.
Se sentou na praça, era uma praça pequena. A árvore diminuía o calor.
Nesse momento, passou um casal, a mulher de cabeça baixa, com o braço sendo apertado pelo homem. Amora mudou de ideia sobre ter um marido, os homens quase sempre eram mais fortes, e faziam o que queriam. Cabia ao mais fraco se submeter, ela sempre seria a mais fraca, em tamanho e em poder aquisitivo, era o prato cheio para ser maltratada, no fim Amora pensou que lhe restava a solidão.
Teve a impressão que alguém a vigiava, mas pensou ser somente expectativa e ansiedade.
Amora usou algumas notas do dinheiro que tinha e comprou duas camisetas comportadas para poder trabalhar, com as camisetas usaria as saias que costuravam no orfanato. Se tudo desse certo, poderia comprar mais algumas peças, antes de começar o trabalho
Caminhou de volta para o lugar que foi sua casa por quase dezoito anos e se refugiou em seu quarto.
Estava crescendo, mas não queria, a sensação não era agradável e algo lhe dizia que problemas grandes aconteceriam, só não sabia bem o que era.