Capítulo X

2016 Words
Em dois dias a fundação tinha sido feita, agora estavam atrás de entulho para fazer o alicerce da obra. Arrumaram de uma demolição que havia sido feita perto dali e João teve que alugar um caminhão para buscar. Nem falou nada com Marisa, com medo que ela achasse que estava querendo mais dinheiro. Jandira tinha comentado com ele que ela não deixava fazer quase nada na casa dela, porque gostava do serviço doméstico e ela que estava sendo tratada como uma rainha. Marisa se esforçava para tirar todo peso que podia de Jandira, porque achava que ela merecia um descanso. Afinal, anos sozinha para cuidar dos filhos e da casa com poucas coisas para amenizar o serviço. Não tinha nem máquina de lavar. Assim foram passando os dias e a obra ficou pronta. Jandira avisou a ela: - Está na hora de voltar pra casa. A obra acabou e a casa ficou uma beleza. - Já? - Levou mais tempo do que estávamos esperando. Foram três semanas de trabalho duro. E nós já demos muito trabalho pra senhora. - Por mim, ficariam aqui, mas eu sei que vocês têm que voltar. A hora que precisar, minha casa vai estar sempre aberta para vocês. - Nós sabemos disso e agradecemos muito o tempo que ficamos aqui, e tudo que a senhora fez por nós. - Ainda faltam os móveis. - Para de gastar dinheiro com a gente. A gente se vira. - Mas é o dinheiro da campanha. Sobrou muito ainda. Não gastei nem a metade do dinheiro arrecadado. Você quer ir escolher comigo? - Fica difícil por causa das crianças. Eu prefiro a surpresa. A senhora tem muito bom gosto. - Tá bom, então. Eu escolho e peço para entregar o quanto antes. Mas como vocês vão ficar sem fogão? - O João já fez outro. - Na cozinha nova? - Não. Fez no terraço. Ficou enorme e ele fez num cantinho. - Ah! Pensei que tinha feito na cozinha. - Não. Ele sabia que a senhora não iria gostar. - Eu vou comprar um fogão pra vocês e só vão fazer na lenha em caso de necessidade. - Enquanto não chegar vou ter que fazer. O que a senhora pretende comprar? - Camas novas e armários para os quartos. Um jogo de sofá e uma estante para a sala, e o fogão e um freezer para a cozinha. E uma máquina de lavar para colocar no banheiro que ficou bem grande. Vai ajudar muito no teu trabalho. - É muita coisa. - Os quartos são grandes? - Todos os três. E a cozinha também. Dá pra dançar dentro dela. - Assim que eu queria. Uma casa confortável. - Eu lhe agradeço muito. Agora está na hora de voltar. O João está sentindo falta das crianças. - É um pai muito carinhoso. - Mas quando tem que dar bronca, ele dá. - Sinal que educa os filhos. Quando fazem coisa errada, tem que chamar a atenção. Isso é educar. - As vezes eu acho que ele exagera! Peraltice é coisa de criança. - Mas se deixar tudo pra lá, vão se tornar crianças que ninguém vai querer chegar perto. Os seus filhos são muito educados. E são felizes. - Agora vão ser muito mais. Principalmente se o João arrumar mesmo trabalho certo de carteira assinada. - Isso é certo. Tenho certeza que vou conseguir. Vai lá então que você ainda vai ter que fazer a comida. Não tem nada pronto em casa. Pede ao seu João para dar uma passada aqui para pegar o dinheiro para dar uns trocados aos homens que trabalharam. - Não quer que eu leve? - Não sei quantos são. Preciso saber o número exato e só ele sabe. - Vou mandar ele vir aqui então. Foi embora e quando saiu, Marisa já começou a sentir saudades, principalmente das crianças. Não tinha filhos, porque tinha tido um câncer que a obrigou a retirar o útero. Somente o marido sabia. Não falava disso a ninguém. Por isso tinha escolhido a profissão e o local de trabalho. Poder cuidar do bem estar das crianças, era o que mais gostava de fazer. Para aliviar a sensação de perda, resolveu sair para comprar logo os móveis e as outras coisas que tinha prometido. Ia saindo, quando João chegou. Desceu do carro e foi falar com ele: - Estava indo comprar os móveis. Esqueci que pedi para o senhor vir aqui. Quantos homens trabalharam. - Foram cinco além de mim. - Vou lhe dar cinco mil e o senhor dá mil pra cada um. Está bom? - É até demais. Mutirão não se paga. Um agrado, tudo bem mais assim é muito dinheiro. - As pessoas que trabalham, merecem receber. E esse pessoal está parado. Trabalharam todos os dias. - Nisso a senhora tem razão. Estão todos desempregados. Como eu. - Eu vou lhe arranjar aquele emprego que prometi, só estava esperando terminar a obra. Espera aqui que eu vou pegar o dinheiro. Tornou a entrar em casa, e saiu com o embrulhinho de jornal. João pegou, agradeceu e foi procurar os rapazes que tinham trabalhado. Deixou todo mundo muito satisfeito. Só depois de pagar aos rapazes é que voltou para casa. Estava há algum tempo de volta, quando parou um caminhão de uma loja de móveis na porta. Buzinou e avisou: - Entrega de Dona Marisa para dona Jandira! É aqui? - Aqui mesmo. Vou chamar a Jandira. Já estavam descarregando. Tinha três guarda roupas e diversas camas, sendo uma de casal. Deixaram tudo montado e quando João foi apanhar uma gorjeta, avisaram: - Já está tudo p**o. Até a montagem. A nota está aqui. Deu a nota na mão de João e subiu com os ajudantes no caminhão. Depois que eles se foram é que João entrou para ver. No quarto do casal, tinha sido montada uma cama enorme e um guarda roupa também muito grande. No outro uma beliche, uma cama de solteiro e um guarda roupas também grande para as meninas e no último duas camas de solteiro e o guarda roupas igual ao das meninas. Uma buzina tocou e Jandira foi ver quem era. Voltou acompanhada de Marisa, que tinha vindo trazer roupas de cama novas. Tinha comprado dois jogos para cada cama. Olhou a obra e aprovou. Tinha sido muito bem feita e avisou que o resto das coisas seria entregue em três dias. Tinha comprado os móveis de quarto direto no fabricante para que fosse entregue rápido. O restante comprou em loja que tinha prazo de entrega. Admirou o trabalho da colocação do piso. Estava perfeito. João falou cheio de orgulho: - Fui eu que coloquei. - Ficou ótimo. O senhor sabe trabalhar. Acho que ao invés de limpeza, vou falar com o Ricardo para arranjar na construtora de um amigo dele. Um talento igual ao seu, não pode ser desperdiçado. - Qualquer um eu vou satisfeito. Nunca tive carteira assinada. - Mas o senhor tem a carteira? - Não. - Então tem que tirar uma urgente. Vou esperar mais uns dias. Se despediu e foi pra casa. Voltou para o quarto e Jurema estava na parte de cima do beliche. - Você vai dormir em baixo. Em cima vai ser a Janaína que é mais velha. - Ah pai, deixa eu aqui. - Não. É perigoso. Tem que ser a mais velha. Choramingando, Jurema desceu. Quando a mãe veio fazer as camas com a roupas novas o choro passou. As camas ficaram lindas com as roupas novas e quando Jonas e Janaína chegaram, também gostaram muito da novidade. Jurema pediu: - Janaína, eu posso dormir em cima? - Não. O papai disse que é perigoso e eu que sou mais velha é que tenho que dormir em cima. - Como é que você sabe? Você nem tava aqui quando ele falou. - Ele me falou assim que eu cheguei. - Eu queria ficar em cima. - É perigoso. Você pode errar o degrau e se machucar. - Não vou me machucar não. João que estava escutando, acabou entrando no quarto e falou: - Jurema, eu já disse que você vai dormir em baixo. Não quero ouvir nem mais um pio sobre isso. Se continuar, vou levar esse beliche para o quarto dos meninos e trazer uma cama pra Janaína e você vai dormir no chão. A menina começou a chorar, irritando João. - Para de chorar. Você está muito teimosa. Quer ficar de castigo? - Não. - Então para com o choro e obedece. No dia seguinte, assim que Janaína levantou e saiu do quarto, Jurema foi subir e o pé escorregou e ela caiu, quebrando um braço. - Foi um Deus nos acuda. Todo mundo gritando ao mesmo tempo, sem saber o que fazer. O Hospital era longe. Janaína correu para casa de Marisa pra pedir ajuda. Tocou o interfone e falou: - A Jurema caiu do beliche e acho que quebrou o braço. Na mesma hora, Marisa apanhou as chaves do carro e a bolsa. Abriu o portão da garagem e falou para Janaína: - Entra. Janaína entrou no carro e Marisa foi na casa da menina buscar e irmã dela para levar ao hospital. Quando chegou, falou: - Vem a Jurema, com um responsável. Jandira falou: - Vou eu. João respondeu: - Vou eu. Você fica com os outros e vai fazendo o serviço da casa. E para Jurema: - Viu no que deu a tua teimosia? Eu falei que em cima era a Janaína que é mais velha. Se você não estivesse com o braço quebrado, eu te dava uns tapas agora. Nessa hora, lembrou que Marisa trabalhava no conselho tutelar e se arrependeu do que disse: - Desculpa. Nunca bati neles, mas estou nervoso. - Um tapinha de pai, ajuda na educação em casos de teimosia. Quando comprei o beliche, pensei na arrumação do quarto e não na segurança. - Se ela tivesse obedecido, não tinha acontecido. Jurema chorando falou: - Eu não vou teimar mais não. Tá doendo muito. Marisa com pena da criança: - Já vai passar. Logo vamos chegar ao Hospital. Marisa entrou no estacionamento de um Hospital particular e João falou: - Aqui é muito caro. Vamos para o público. - Pode deixar que eu p**o. No público demora muito e as vezes nem ortopedista tem. Vamos ficar de hospital em hospital até achar um. - Mas a senhora já gastou muito com a gente. - É uma emergência. Pode ficar sossegado, que eu posso pagar. Jurema foi atendida rapidamente e logo veio o diagnóstico. Era um caso cirúrgico. E tinha que ser feito depressa. Tinha fraturado em diversos lugares e estava sentindo muita dor. Marisa foi saber o custo da cirurgia e mandou fazer. Pagou todas as despesas e perguntou: - Quanto tempo leva a cirurgia? - Umas duas ou três horas. Tem que esperar a anestesia fazer efeito para começar. Voltou para perto de João e falou: - Vai levar duas ou três horas. Quer ir em casa falar com a Jandira? - Não. Vou ficar aqui mesmo. Até levar minha filha pra casa. - Então eu vou ficar com o senhor. Se o senhor soubesse como estou arrependida de ter comprado a beliche. - A senhora comprou o móvel certo. Ela é que teimou. - Isso é normal em criança. Eu fiz a opção do beliche por causa do espaço. - Era o melhor mesmo. Mas agora fique sossegada. A senhora não teve culpa nenhuma. As horas custaram a passar. Quando a cirurgia acabou, veio o médico conversar com eles. - Por ser criança demos anestesia geral. Vai demorar a acordar mais correu tudo bem. João perguntou: - Quando ela pode ir pra casa? - Só depois que acordar e passar pelo pediatra. Só o pediatra pode dar a alta. Não deve sair daqui hoje. Desolado, João pensou no que fazer. A demora devia estar deixando Jandira nervosa. - Ela está dormindo e vai demorar a acordar. Acho melhor ir em casa pra dar notícias a Jandira. - Vamos. Eu lhe levo e volto com o senhor.
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