João chegou em casa e comentou o encontro que teve com o vizinho na padaria:
- Encontrei com o Paulo e ele perguntou pelas crianças. Aí eu contei da Jurema e que você estava fazendo uma sopa pra ela. Ele recomendou que colocasse espinafre porque é forte e dá um gosto muito bom na sopa.
Espinafre cozinha muito rápido. É quase no susto. Dá pra você ir comprar?
- Dá sim. Será que no mercado tem?
- Acho melhor você ir no sacolão. As verduras do mercado não são muito frescas.
- Vou lá. Quantos trás?
- Um só. As crianças não estão acostumadas e podem não gostar.
- Tem que gostar. Se faz bem a saúde tem que comer e pronto.
- Você come o que não gosta?
- Não, mas já passei da fase de crescimento há muito tempo.
- Garanto que quando era pequeno, também não comia.
- Você sabe como eu fui criado. Com os pais que tive, tinha que comer qualquer coisa, porque era raro ter comida. O dinheiro era gasto no vício deles.
- Desculpa. Não quis te lembrar de coisas que ainda doem.
- Deixa prá lá. Tô indo buscar o espinafre.
- Você conhece?
- Não, mas peço ajuda a alguém.
Foi rápido e voltou com a verdura.
- Como limpa?
- Retira só as folhas e lava bem. Mas não joga os talos fora.
- E faz o que com os talos?
- Tira as pontas, corta um pouco e lava. Vou fazer um pirão com eles.
- Assim em pedaços?
- Não. Vou bater no liquidificador com um pouco de água.
João adiantou o serviço de Jandira e logo a comida estava toda pronta.
Pegou um prato e colocou um pouco da sopa para experimentar antes de oferecer as crianças.
Falou para Jandira:
- Não é que o espinafre dá um gosto bom mesmo na sopa?
- Nunca tinha usado. Eu não sabia.
Pegou a colher de João e experimentou do prato dele.
- Ficou gostoso mesmo. Vou passar a fazer sempre. É forte e refogado as crianças não comem.
- Eles têm que comer o que faz bem. Eu nunca vi reclamarem de comida. Sempre comeram tudo que se bota no prato.
- É. Nós demos sorte. Eles são muito bonzinhos. Por isso que eu não faço o que não gostam.
- O médico não deu dieta pra Jurema. Amanhã faz um fígado acebolado.
- Você nunca me pediu fígado. Pensei que não gostava.
- É um prato que enjoa. Não dá pra comer sempre, mas de vez em quando eu vou comprar e a gente vai dar pras crianças.
- Taí, é bom e não é caro.
- Ainda é cedo. Eu vou lá no mercado comprar. Tem batata em casa?
- Prá fazer o quê?
- Pode fazer purê ou frita.
- Purê é mais saudável. Estamos no meio da semana. Deixa as fritas para domingo. Trás algumas também que temos poucas e trás umas cebolas também. Enquanto você vai lá, vou dar comida a Jurema e a bebê.
- Acho melhor a gente parar de chamar ela de bebê. Ela tem nome. Daqui a pouco vão perguntar o nome dela e ela vai dizer que é bebê.
- Você tem razão. Vou dar comida para Jurema e pra Joelma.
- Não é muito cedo.
- Com a confusão as crianças não almoçaram.
- Ah bom. Então adianta. Mas antes era melhor dar um banho na Jurema. Ela ainda está com a roupa de dormir.
- Vou dar nas duas. Assim a sopa esfria um pouco.
João saiu para o mercado e quando voltou, as meninas já estavam comendo.
Jandira tinha que dar a comida na boca as duas. O braço quebrado e operado de Jurema era o direito e não estava acertando comer com a mão esquerda.
João perguntou:
- Está gostosa a comida?
Jurema respondeu:
- É a melhor sopa que já tomei na minha vida.
E para Jandira:
- A idéia do Paulo foi boa.
- Eu também gostei. Vou passar a colocar sempre. O pirão também está uma delícia.
Acabou de dar comida as crianças e foi fazer a higiene das bocas. Depois deu o remédio de Jurema que estava na hora.
Logo as duas estavam dormindo.
Pouco depois, Jonas e Janaína chegaram em casa. Cada um tomou banho e se sentaram para ver tv.
Chamaram Júnior no quarto e sentaram para jantar.
Janaína perguntou:
- Mãe, o que a senhora colocou na sopa de diferente que está muito mais gostosa?
Jonas comentou:
- Eu também achei.
Jandira perguntou:
E você Júnior, gostou?
- Tá uma delícia.
- Foi espinafre. Foi seu Paulo que ensinou. Vou passar a colocar sempre.
Janaína falou:
- E esse pirão também está muito bom. É de que?
- De espinafre. Fiz com os talos. Ficou gostoso mesmo.
Jonas perguntou:
- Pai, o que o senhor foi comprar no mercado?
- Como você sabe que eu fui lá? Vocês não estavam na porta nem na hora que eu entrei e nem na hora que eu saí.
- Vimos o senhor de longe. A gente tava chegando de um carreto.
- Fui buscar uns bifes pra tua mãe fazer amanhã.
Janaína perguntou:
- Já acabou aquela carne toda do churrasco?
Jandira respondeu:
- Não. Ainda não mexi nelas. O bife que teu pai foi buscar é diferente. É de fígado. Vocês nunca comeram.
- Ah tá.
Acabaram de comer, lavaram a boca e se sentaram para ver a tv que tinha sido desligada durante o jantar.
Depois de um tempo, foram para os quartos.
Jandira recomendou a Janaína:
- Procura não fazer barulho que as meninas estão dormindo.
- Pode deixar, vou entrar no quarto que nem uma formiga.
O casal ficou mais um pouco assistindo a programação, mas estavam cansados. O dia tinha sido muito tumultuado e resolveram ir deitar.
Jandira colocou o despertador para tocar porque Jurema tinha que ser medicada de madrugada.
Na hora que tocou, foi na cozinha e apanhou um copo de leite que amor ou e foi dar o remédio a menina. Ela tomou e logo estava dormindo de novo.
Jandira deixou o copo na cozinha e foi se deitar de novo.
Quando amanheceu, Jandira já estava com tudo muito adiantado. Depois de dar o remédio a filha, deitou, mas não conseguiu pegar no sono. Para não incomodar o marido, levantou e foi adiantar o serviço.
No meio da manhã, parou um caminhão na porta e o motorista gritou:
- Dona Jandira!
João chegou no portão e falou:
- É minha mulher. O que é.
- Entrega. Tá aqui a nota.
- Eu não sei ler. Pera um pouco que eu vou chamar ela. Ela lê.
João foi na cozinha chamar a mulher:
- Tem entrega pra você. Deve ser as coisas que ficaram faltando.
- Ué. Mas faz três dias amanhã.
- Vai vê adiantaram.
- Vou ver o que é.
Foi até o portão e realmente tinham adiantado em um dia a entrega.
Jandira olhou a nota e mandou descarregar.
Na nota tinha muito mais coisas do que Marisa tinha dito. Esperou descarregar para confimar.
Realmente ficou tudo que constava na nota.
Estava esperando um jogo de sofá, uma estante, um freezer, um fogão e a máquina de lavar, mas além disso veio um conjunto de panelas, um de pirex, microondas, batedeira, espremedor de frutas, liquidificador, ferro elétrico, aspirador de pó, um aparelho de jantar para vinte pessoas, uma piscina de armar de três mil litros, diversos ventiladores de teto, armário de cozinha, um faqueiro enorme e uma mesa de madeira com oito cadeiras.
Pediu a caneta para assinar, mas o motorista falou:
- Não precisa, ela já deixou assinado.
João apanhou no bolso uma nota de cinquenta reais e entregou ao motorista, agradecendo.
Depois que o caminhão partiu, Jandira comentou:
- Veio muito mais coisas do que a dona Marisa disse que vinha. Será que é tudo daqui mesmo?
- Claro que é. Ela assinou a nota.
- Você sabe instalar ventilador de teto?
- Eu não. Isso é com eletricista. Vou perguntar pro Paulo se ele conhece algum por aqui.
João foi na casa do amigo e voltou com a resposta:
- Ele não conhece também. Depois a gente vê isso. Vamos arrumar o resto.
- Deixa pra depois, eu tenho que fazer o almoço. Vai dar a hora da Jurema tomar o remédio e ela não pode estar com o estômago vazio.
- Eu vou arrumando então.
Enquanto Jandira terminava o almoço que já estava bem adiantado, João foi arrumando o que podia no armário novo.
Deu um tempo antes de ligar o freezer e assim que ligou, foi passando as carnes e frangos que estavam na geladeira, sendo mantidas apenas resfriadas por falta de espaço.
Jonas e Janaína chegaram para almoçar.
Lavaram as mãos e se sentaram. Jandira deu a comida das meninas menores e se sentou na mesa com o restante da família. Ainda não tinham arrumado a mesa nova.
Todo mundo adorou o fígado, que estavam comendo pela primeira vez.
Jandira estava satisfeita em ver os filhos comendo refeições saudáveis.
Jonas e Janaína saíram para o mercado de novo e Jandira estava acabando de lavar a louça, quando tocaram uma buzina em frente a casa.
João foi atender e se deparou com o rapaz que havia feito a parte elétrica da casa.
- Você por aqui?
- Vim instalar os ventiladores. Já chegaram?
- Vieram hoje de manhã. Foi dona Marisa quem te mandou?
- Já estava combinado. Já deixei os fios prontos e vai ser muito rápido.
- Pode entrar então. Quanto é?
- O serviço é a minha contribuição na campanha. Eu também faço parte dela, só que só invés de dinheiro, doei o meu trabalho.
- Muito obrigado, então. Pode entrar.
O rapaz apanhou a escada que estava em cima do carro e entrou na casa.
Tinham cinco ventiladores. Um para cada quarto, um para a sala e outro para a cozinha.
Jandira perguntou:
- Não vai apagar o fogo?
- É pra ser usado enquanto a senhora descasca algum legume ou cata um feijão ou arroz. Na hora que acender o fogão desliga.
- Vou passar roupa aqui na cozinha a partir de agora.
- Vai ficar mais fresco mesmo.
Depois de instalar os ventiladores, perguntou:
- E a máquina de lavar? Já instalaram?
João respondeu:
- Não. Isso é com bombeiro.
- Já tá tudo pronto. É só encaixar.
- Nós nunca tivemos máquina. Eu não se fazer.
- Vamos lá que eu faço. Assim o senhor aprende.
João seguiu o homem e viu que era muito fácil fazer a instalação.
Quando terminou, o rapaz se despediu e João agradeceu.
O rapaz prendeu novamente a escada em cima do carro e se foi.
- Jandira perguntou:
- João, você pagou o homem?
- Não. Ele também participou da campanha doando a mão de obra dele.
- Pensei que ele fosse cobrar a dona Marisa.
- Eu perguntei antes dele entrar e ele me explicou. Se fosse pra pagar, eu pagava. Ainda não mexi no dinheiro que ela deu pro ano novo a Janaína.
- É bom não mexer se não tiver necessidade. Não se sabe quando você vai arrumar trabalho de novo.
- Tenho que tirar uma carteira de trabalho. Ela vai me colocar com uns amigos.
- Vê isso logo. Procura saber o que precisa e tira. Emprego não espera ninguém.