Capítulo 4

3082 Words
Joaquim Estava amando passar a manhã com Beatriz e apresentar para ela um pouco mais da minha cidade. E pretendia continuar com o meu papel de guia turístico e leva-la para conhecer mais lugares, mas tive que deixar para depois quando mamãe ligou me pedindo para deixar meus irmãos com a vovó Camila. Eles adoraram me ver parado no portão da escola os esperando. E ficam ainda mais eufóricos quando veem que Beatriz está comigo. Ela é simpática com os dois, mas se mantém em silêncio durante todo caminho até a vinícola enquanto Lulu e Theo fazem um pequeno relatório de como foi o dia deles no colégio. Com direito a um interrompendo o outro o que causa uma pequena briga que encerro com a ameaça de contar tudo para a mamãe. Um sentimento de nostalgia me atinge assim que cruzo os portões da vinícola D’Angelo e vejo a casa dos meus avós ao longe. Ela passou por algumas reformas no decorrer do tempo, mas ainda conserva a estrutura externa que me deixou admirado quando era apenas um garoto assustado sendo arrastado por uma maluca. Pisco algumas vezes e balanço levemente a cabeça afugentando a memória daquela mulher que tem assombrado os meus pensamentos nos últimos dias. Assim que chego mais perto da casa grande vejo vovó Camila na varanda a nossa espera. Com certeza mamãe a avisou que estava trazendo as crianças. Ela começa a descer os degraus para nos receber com um beijo quando por fim estaciono o carro e salto do mesmo sendo seguido por Beatriz e meus irmãos. _ Que saudade que estava dos meus pequenos. – Diz abraçando e beijando cada um de nós. – E essa moça só pode ser Beatriz. _ Sou eu mesma. – Fala com certa timidez. – Muito prazer, senhora D’Angelo. – Estende a mão para a minha avó que ignora preferindo por lhe dar um beijo no rosto. _ O prazer é todo meu, querida. – Garante com um largo sorriso. – Vamos entrar. Está na hora do almoço e tenho certeza de que estão famintos. _ É que pensei em deixar as crianças e seguir para a fazenda, vó. Nós temos muito trabalho. _ Nada disso. – Decide começando a subir os degraus abraça aos meus irmãos e a seguimos sem qualquer alternativa. – Vocês podem voltar para a fazenda quando estiverem com a barriga cheia. – Pontua ao parar próxima a porta para voltar a me olhar. – Fiz aquela carne de panela que você tanto gosta. Vocês vão me fazer uma desfeita dessas? _ Claro que não, vovó. – Me apresso em falar. Tudo o que não quero é magoar a minha avó. – Tudo bem se ficarmos para almoçar, Beatriz? _ Claro. – É tudo o que ela fala. Percebi que ela só tem respondido as minhas perguntas de forma curta desde que saímos do Mundo do Chocolate. _ Ótimo. – Vovó fala com um largo sorriso. – Então, vamos deixar essa conversação para depois ou a comida irá esfriar. – Determina antes de entrar na casa sendo seguida pelos meus irmãos, que na certa estão famintos. _ Está tudo bem mesmo ficarmos? – Questiono a impedindo de seguir os outros segundando o seu braço de forma leve. _ Já disse que tudo bem. – Diz libertando o braço da minha mão. – Podemos entrar? Não é educado deixar a sua avó esperando. _ Claro. – Digo dando espaço para que entre primeiro. Eu a conduzo direto para a sala de jantar onde uma imensa e saborosa mesa nos aguarda. A mesa está um pouco maior do que quando eu era criança. Meus avós a trocaram para comportar toda a família. Mas os D’Angelo insistem em crescer de forma descomunal e desordenada e hoje apenas os mais velhos tem o privilégio de fazerem suas refeições aqui enquanto os outros de espalham pela casa. _ Isso tudo é apenas para nós ou vem mais alguém, vó? – Pergunto ao puxar a cadeira para Beatriz antes de me acomodar ao seu lado. _ Bem que queria que os outros também viessem. Mas seu avô, seu tio, seu pai, Matheus e Maia ficaram presos no trabalho. Marina foi almoçar na casa da família do namorado e sua tia Bruna foi encontrar a Laura para resolverem as coisas para o casamento. – Conta enquanto serve o prato de Theo. _ Ou seja, estão todos ocupados. – Pontuo estendendo o meu prato para que ela coloque um pouco de carne. _ É bom que sobra mais comida para a gente. – Theo fala com a boca cheia. _ Não fala com a boca cheia, garoto. – Ralha Lulu. Eles começam uma nova discussão, mas dessa vez os deixo a cargo de vovó Camila. Que ameaça coloca-los de castigo sem sobremesa. _ Desculpe por isso. – Pede a Beatriz que responde com um leve abanar de mão garantindo que está tudo bem. As duas engatam em uma conversa que começa com um questionário sobre a adaptação de Beatriz a cidade e termina com vovó contando a história de como conheceu o vovô Sérgio e em como eles fizeram o pequeno vinhedo local se tornar esse sucesso que é hoje. E, mesmo tendo ouvido essa história muitas vezes, paro e presto atenção em cada detalhe do seu relato. Bem como os meus irmãos. Que acrescentam algum relato aqui e ali entre uma colherada e outra de musse de chocolate. Me despeço de vovó e dos meus irmãos depois do almoço com a promessa de que volto no churrasco de domingo para a despedida de Maia. Beatriz também é convidada para o banquete dos D’Angelo e vovó praticamente ordena que eu a traga a qualquer custo. Só depois que me comprometo a isso é que somos liberados. O caminho até a fazenda tento puxar conversa com Beatriz, mas ela diz que está com um pouco de dor de cabeça e decido me calar para não a incomodar. Quando chegamos em casa ela vai se recolher em seu quarto e aproveito para ver com Luiz como estão as coisas. Na hora do jantar ela não desce alegando que ainda está com dor de cabeça e acabo jantando sozinho. Quando estou satisfeito peço que Rosa tire a mesa e se recolha e sigo para o escritório. Ainda está cedo e tenho tentas coisas na cabeça que o sono simplesmente não chega. Sobre a mesa de carvalho estão os documentos que assinei no banco. Quase não pude acreditar quando o gerente me contou do fundo de investimentos que vovô Theodoro deixou para mim. Foi uma surpresa. Ele estava sempre tão preso aos costumes do passado e rejeitava todos os tipos de mudanças que pensava que nunca ouvia as minhas ideias. Mas esse fundo de investimentos é a prova de que ele, sim, me ouvia com atenção. E mais do que isso. Ele acreditava em mim. E vou fazer de tudo para não o decepcionar. _ Prometo que vou dar motivos para se orgulhar de mim, vovô. – Falo para o porta-retrato com uma foto dele com todos os netos ao seu redor. Deixo a foto de lado e aproveito que estou aqui para começar a pesquisar os equipamentos que vamos precisar para ampliar a nossa produção de derivados. Listo tudo para mostrar a Beatriz amanhã. Assim ela já pode computar os gastos e fazer os prospectos dos ganhos. Quando termino passa um pouco das 21hrs. Desligo o computador e apago as luzes do escritório antes de subir. Quando passo em frente a porta de Beatriz e vejo a sua luz acesa penso em bater e perguntar se ela está melhor. Ergo a mão com punho fechado pronto para bater levemente na porta à minha frente, mas paro no meio do caminho quando ouço a sua voz. Ela provavelmente está falando ao telefone e sei que ficar aqui escutando a sua conversa é falta de educação e invasão de privacidade. Eu deveria seguir meu caminho até o meu quarto, mas, ao invés disso, aproximo ainda mais o ouvido da porta na esperança de conseguir escutar melhor. _ É lógico que estou sentindo a sua falta. – Ela diz em um tom animado e risonho. Ela deve estar falando com o namorado que deixou em São Paulo. – Nunca faria isso com você. Você é insubstituível, Dani. – Fala e então a ouço dar risada. – Claro. Você é a minha pessoa favorita. – Ouço quando deixa um suspiro escapar. – Também preciso desligar. Te amo. – Diz e então ouço o barulhinho do celular quando uma ligação é encerrada. Em seguida ouço o som de passos pelo quarto e mais que depressa me afasto da porta para não correr o risco de ser descoberto. Quando os passos ficam mais perto da porta me apresso em direção ao meu quarto. O coração bate num ritmo alucinado quando fecho a porta atrás de mim como se tivesse acabado de aprontar alguma coisa junto com os meus irmãos como quando eu era criança e fugia das broncas dos meus pais. Só que dessa vez a consequência por ter feito algo que não devo foi pior que uma bronca dos meus pais ou ficar sem sobremesa. Já cheguei a cogitar que Beatriz havia deixado alguém em São Paulo. Mas até a poucos minutos atrás isso era apenas uma hipótese. Agora é uma realidade e nem sei porque o fato dela ter alguém me incomoda tanto. Eu acabei de conhecer a moça e a contratei para trabalhar comigo e não para nos envolvermos. Mas a quem estou tentando enganar? Penso ao me jogar na cama. O fato é que me encantei por aqueles olhos azuis e cabelos cor de sol. Beatriz me atrai. Mas é algo inalcançável. Preciso colocar isso na cabeça de uma vez por todas. Minha relação com ela é profissional e tenho que aprender a separar as coisas. E com esse pensamento adormeço. Acordo antes do raiar do sol. Depois de tomar um rápido banho, visto minhas roupas de trabalho e desço para tomar uma xícara de café forte na cozinha antes de sair para fazer a ronda a cavalo. Sei que tenho pessoas qualificadas para essa função e não preciso fazer tal coisa. Mas trabalhar ocupa a minha cabeça e me impede de pensar bobagens. Sem contar que com essas ocupações não preciso me encontrar com Beatriz além do necessário. Acho que ela pensa da mesma forma porque se limita apenas a falar sobre trabalho comigo quando nos reunimos no escritório durante a tarde. No resto de semana que se segue focamos em resolver detalhes do projeto e comprar os equipamentos necessários para começarmos a produção o mais rápido possível. Quando o domingo chega estou tão exausto que cogito inventar uma desculpa para os outros e ficar em casa descansando. Mas desisto da ideia assim que Maia envia uma foto em nosso grupo onde mostra todos reunidos e felizes no jardim. Me apresso em tomar um banho e trocar de roupa. Depois de colocar um pouco de perfume deixo o meu quarto e sigo até a porta de Beatriz e estou a ponto de bater quando a mesma é aberta. _ Precisa de algo? – Pergunta cruzando os braços e encolhendo os ombros. Está usando calça jeans clara, moletom rosa e tênis branco. Além de um par de óculos redondos que a deixam ainda mais bonita. – Joaquim. – Chama me despertando. _ Desculpe. – Digo engolindo em seco. – Vim saber se já estava pronta. _ Pronta para quê? – Questiona franzindo levemente o cenho em confusão. _ Para irmos para o churrasco de despedida da minha prima. – Explico enfiando as mãos nos bolsos da calça. – O churrasco que a minha avó te convidou quando almoçamos com ela. _ Ah! – Fala parecendo ter se recordado. – Agradeça a ela o convite, mas eu não vou. _ Por que? _ Porque é uma reunião de família e não quero ser uma intrometida. Depois de falar isso ela passa por mim e seguindo pelo corredor em direção a escada, mas apresso meus passos e paro na sua frente impedindo que continue. _ Seu argumento não é válido tendo em vista que foi a matriarca da família que te convidou. – Pontuo. _ Ela convidou apenas para ser educada. _ Vovó Camila é, realmente, uma mulher bastante educada. Mas nunca te convidaria da boca para fora. Ela gostou de você e com certeza quer te apresentar para o resto da família. – Ela abre a boca para protestar novamente, mas a interrompo. – Vai mesmo fazer essa desfeita com uma velha senhora? – Sei que é golpe baixo, mas apelo para a chantagem emocional. _ Tudo bem. Eu vou. – Se dá por vencida e sorrio feliz por minha vitória. – Pode esperar eu me trocar. Para mim ela está perfeita assim. E preciso segurar a língua para não dizer isso em voz alta. Ela me encara a espera de uma resposta e apenas assinto com um movimento de cabeça para não correr o risco de falar o que não devo. Desço e espero na sala que se arrume. Envio uma mensagem para meus primos avisando que vou demorar um pouco. Checo os meus e-mails enquanto espero por Beatriz. Estou envolvido na tarefa de descartar as propagandas e Spams que só percebo que ela chegou quando a ouço raspar a garganta. Fico em choque quando ergo os olhos e me deparo com uma Beatriz ainda mais linda. E conseguiu esse resultado trocando o moletom por um suéter, tirou os óculos e soltou os cabelos. _ Podemos ir? – Pergunta me tirando do transe. _ C-claro. – Gaguejo me erguendo do sofá ao mesmo tempo que guardo o celular no bolso. – Vamos. – Indico a porta e deixo que ela saia primeiro. Quando estamos no carro a caminho da vinícola me concentro na direção enquanto Beatriz fica a observar a paisagem pela janela. O silêncio que nos cerca é um tanto ensurdecedor e ligo o rádio em uma estação qualquer apenas para tentar amenizar o desconforto entre nós que é praticamente palpável. Somos recebidos pelos meus primos assim que estaciono o carro. Então tem aquela confusão de apresentações e cumprimentos. Beatriz senta junto com o grupo de mulheres que engatam uma animada conversa sobre programas noturnos para se fazer na cidade, segundo Maia e tia Nath. Os relatos das duas arrancam muitas risadas delas. _ Ela está se dando bem com as garotas da família. – Papai comenta ao sentar ao meu lado com a sua taça de vinho pela metade enquanto vovô e tio André assumem a churrasqueira. _ Parece que sim. – Beberico um pouco da minha bebida olhando em volta. – Como estão os preparativos para a colheita? _ Tudo em ordem. – Suspira se recostando na cadeira. – Mas você sabe que sempre aparecem problemas de última hora. – Assinto com um maneio de cabeça. – E como estão as coisas na fazenda? _ Está tudo caminhando bem. Conseguimos o dinheiro e os investidores. Também compramos o equipamento necessário e ficaram de entregar na terça. Luiz já está treinando os peões para as novas funções. Não quero contratar ninguém nesse início. E Beatriz achou uma boa ideia. _ E ela ainda é a sua hóspede? – Pergunta como quem não quer nada. _ Sim. _ Mas pensei que o problema no apartamento que seria dela era pequeno. _ Também pensei, mas o encanamento estava todo comprometido e tiveram que trocar tudo e fazer uma pequena reforma. E isso leva um pouco mais de tempo. _ Entendi. – Diz pensativo. – Mas esse negócio dela trabalhar e morar com você não dificulta as coisas. Para caramba, penso. Mas n**o com um movimento de cabeça enquanto viro todo o conteúdo da minha taça em um só gole. _ Tem certeza de que está bem com essa situação? _ Por que tantas perguntas? _ Porque não sou bobo. – Diz em um tom mais baixo para que apenas nós dois ouvíssemos. – Vejo o modo como olha para Beatriz. _ E como olho para ela? _ Da mesma forma que olhei para a sua mãe quando a conheci. _ Está dizendo que estou gostando dela? _ E não está? – Rebate com outra pergunta. _ Eu sou chefe dela, pai. _ Isso não me impediu de ficar com a sua mãe. _ Acontece que eu não sou o senhor e nem a Beatriz é a mamãe. Sem contar que ela tem namorado e não quero complicações. – Digo deixando a taça sobre a mesa. – A minha relação com ela é apenas profissional e ponto. Ele abre a boca para continuar a argumentar, mas é interrompido por Theo. Meu irmãozinho tem o rosto corado por estar correndo e os cabelos estão colados na testa por causa do suor. Ele me pede para ir brincar e aceito. No meio do caminho até as crianças também recrutamos Matheus. Tem aquele velho debate de sempre antes de decidirmos por jogar queimada. Os times são divididos entre garotas contra garotos e como o time das meninas estava em desvantagens as gêmeas vem se juntar a elas para a alegria da minha irmã. _ Se preparem para perder, rapazes. – Maia grita segurando a bola. _ Vocês estão ferrados. – Reafirma Lulu com um largo sorriso no rosto. Assim como Maia, a minha irmã também é bastante competitiva e não entra num jogo para perder. Mas quando perde leva na esportiva. _ Menos ameaças e mais ação, meninas. – Matheus alfineta sendo o alvo da primeira investida que consegue desviar muito bem. – Que comecem os jogos! – Grita em tom dramático antes de atirar a bola de volta para o lado das meninas. Os menores saem depois da quarta rodada e vão arrumar outra coisa para fazer enquanto continuamos o nosso embate. Theo consegue até que consegue ficar por muito tempo no jogo, mas Lulu se aproveita de um momento de distração para tirá-lo em uma jogada combinada com Marina. Mas é tirada logo em seguida por Matheus. Só restando apenas nós quatro. Já estou cansado e por mim daria a vitória de bandeja para as gêmeas. Mas não quero passar o resto do dia ouvindo Maia zombando de mim. Então me esquivo das bolas como se as mesmas pudessem de fato me queimar. Sei que não aguento muito tempo nesse ritmo. Mas se vou perder quero fazer isso com honra.
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