Capítulo 5

3006 Words
Beatriz Estar aqui entre a família de Joaquim me causa um pequeno sentimento de inveja. É impossível não imaginar como a minha vida seria maravilhosa se tivesse nascido em uma família como os D’Angelo e não estou falando do dinheiro ou prestígio. Estou falando dessa união que eles têm e a alegria que parece emanar de cada um deles. Desde os mais velhos até os mais novos. A prova disso são os mais velhos palpitando e apostando sobre o jogo de queimada que está acontecendo nesse exato momento entre os primos. Aos poucos os pequenos vão sendo tirados da brincadeira. Alguns vão caçar outra coisa para brincar como, cavar a grama ou correr um atrás do outro. Outros se juntam as seus pais em busca de um refresco e algo para comer. Já os maiores seguem na disputa acirrada. _ Amo o meu filho, mas tenho certeza de que as garotas vão ganhar. – Gabriela comenta antes de bebericar o seu suco. _ Elas sempre ganham, Gabi. – Uma outra mulher fala. Acho que o nome dela é Nathália. Ela é a publicitária da família. Lembro que comentaram que ela fazia a campanha de todos os vinhos lançados pela vinícola e que é ela quem vai fazer a campanha para promover os produtos que serão produzidos na fazenda quando tudo estiver pronto. _ Isso é bem verdade. – Acho que é Júlia a falar agora. São tantas pessoas que fica difícil de guardar o nome. O jogo termina quando as gêmeas conseguem eliminar os dois garotos restantes em uma jogada combinada. É impossível não rir da comemoração das duas enquanto os garotos deixam o corpo cair no chão exaustos. _ Chega de brincar, crianças. – Cida, a outra avó de Joaquim, determina ao trazer uma enorme travessa de macarronada. – Venham comer. Não é preciso mandar duas vezes. Logo a enorme mesa de madeira está rodeada por toda a família. Cada um carregando o seu prato consigo. E fico apenas a observar a enorme bagunça se instalar sem a mínima noção do que fazer. _ Perdida? – Gabriela pergunta parando ao meu lado. _ Um pouco. – Admito um tanto acanhada. – Não estou acostumada a me reunir com tanta gente. _ Eu sei. É uma bagunça. – Comenta com um largo sorriso. – Uma bagunça que eu amo. – O brilho em seu olhar não contradiz suas palavras. – Não consigo me imaginar longe deles. _ Imagino. – Suspiro cruzando os braços para me proteger da brisa fria. – Percebi que são todos muito próximos. – Comento ao observar Ana Luiza ajudar a servir o irmão mais novo. – Todas as famílias deveriam ser assim. – Me volto para a olhar melhor. _ Mas infelizmente não são. – O seu sorriso diminui, mas não some. E vejo algo passar por seus lindos olhos verdes. Uma pequena sombra de tristeza que ela faz questão de afastar. _ Não. – Digo forçando um meio sorriso sem deixar os dentes a mostra. _ Venham comer, meninas. – Camila nos chama com um aceno colocando um fim na nossa conversa. E agradeço mentalmente por isso. Não quero estragar o momento feliz em família com os meus dramas familiares. Quando me aproximo da enorme mesa de madeira ganho um prato que Camila e Cida fazem questão de encher com um pouco de tudo. Quando terminam o meu prato parece uma pequena montanha e duvido que conseguirei comer tudo o que está nele, mas apenas sorrio agradecida antes de ir procurar um lugar para me sentar. _ Vem ficar aqui perto da gente, Bia. – Maia pede indicando o lugar vago ao lado do primo. Mesmo querendo ficar o mais longe possível de Joaquim e ter passado todo o resto da semana evitando passar muito tempo perto dele não posso negar o pedido de Maia. Sento ao seu lado sem dirigir o olhar para ele e me concentro em comer enquanto o grupo fala animado sobre a viagem de Maia e Ricardo a Itália e tudo o que eles deveriam ver e fazer nas duas semanas que vão estar lá. Não participo muito da conversa. Interagir com um grande grupo de pessoas nunca foi muito o meu forte. E prefiro apenas observar a interação entre eles. Gosto como o riso e a brincadeira são o toque principal. O completo oposto de como eram as coisas quando a minha família estava reunida. Aos poucos os casais se dispersam buscando um lugar mais calmo para namorarem e sobramos apenas Joaquim, o meu prato ainda pela metade e eu na pequena roda. _ Não aguenta comer mais? – Sussurra para que só eu ouça e o seu hálito faz cocegas em minha orelha. _ N-n-não. – Gaguejo um tanto desconcentrada com o que a sua proximidade me causa. – Já estou satisfeita. _ Então é só não comer mais. – Responde como se fosse assim tão simples. _ Mas não quero fazer uma desfeita com as suas avós. _ Só que vai acabar passando m*l se continuar comento. – Fala e de fato já estou sentindo o estômago doer um pouco. – Deixa esse prato aí. – Diz tomando o objeto da minha mão e colocando junto a sua taça que está pela metade. – Vem. – Se ergue me estendendo a mão. _ Para onde? – Questiono franzindo o cenho. _ Caminhar um pouco. – Diz dando de ombros. _ Por que? _ Porque também comi muito e andar um pouco vai ajudar na digestão. – Fala enfiando as mãos nos bolsos da calça erguendo um pouco os ombros. – Vamos logo. Vai te fazer bem também. _ Certo. – Digo sentindo o estômago pesar ao me erguer. Com um maneio de cabeça ele me indica o caminho. Andamos um ao lado do outro e aos poucos vamos nos afastando da bagunça e agitação dos D’Angelo. Nunca pensei que pessoas tão ricas e importantes como eles seriam tão barulhentos. No fundo eles parecem nenhum pouco com os elitistas e aristocratas que a impressa os costuma pintar. Damos a volta na casa chegando ao jardim da frente e seguimos por uma pequena e estreita trilha de pedras que nos levam em direção as videiras. O cheiro que exalam é maravilhoso. Nunca havia estado tão perto de uma videira antes e fecho os olhos para apreciar melhor a experiencia. _ Esse lugar é lindo. – Digo abrindo os olhos. – Deve ter sido um máximo crescer correndo por aqui. _ Foi realmente muito bom. – Comenta com um ar saudoso. – Quer conhecer o lugar onde os vinhos são criados? – Questiona quando me viro e ficamos de frente um para o outro. _ A gente pode mesmo ir até lá? _ Claro. – Garante com um sorriso de lado. – Mas vai ser preciso atravessar o vinhedo e como você não conhece o lugar é bom que fique perto de mim durante todo o caminho até o galpão. – Instrui e assinto em resposta. – Certo. O caminho é por aqui. – Diz me guiando pela rua a nossa frente. Me mantenho o mais perto possível dele com medo de me perder aqui e nunca mais encontrar o caminho de volta. São menos de três minutos caminhando em linha reta até que chegamos a uma construção de madeira no mesmo estilo colonial da casa grande. É um ambiente acolhedor e o cheiro dos barris de carvalho espalhados por toda a extensão do enorme galpão inunda o lugar. Com uma nas minhas costas Joaquim me guia para a parte mais interna onde encontramos duas salas pequenas com duas mesas cada uma. E uma sala maior ao fundo com uma mesa central, um computador e várias garrafas de vinho emoldurando as quatro paredes dando a entender que estamos em uma adega. _ Todos esses vinhos foram produzidos aqui? – Pergunto me aproximando para observar melhor os rótulos. _ Sim. – Fala caminhando para ficar mais próximo a mim. – Parte deles foi feito por nossos antepassados quando a vinícola ainda era uma pequena produção para a população local e não são mais comercializados. Meu avô guarda as últimas garrafas como relíquias e só as abre em momentos especiais para a família. Ele estica a mão e pega uma garrafa dentre muitas. Passa a mão no rótulo para tirar a poeira e consigo ver o nome Amore escrito em letras bem desenhadas. _ Gosto de todos os vinhos criados pela minha família, mas esse tem um lugar especial. – Fala me mostrando melhor a garrafa. – Foi um vinho feito pelo meu pai e que, de certa forma, contribuiu para a história dos meus pais. _ Seus olhos brilham quando fala deles. – Digo olhando em seus olhos azuis como os de seu pai. – Dá para ver que os ama muito. _ Eles são tudo para mim. – Diz se aproximando um pouco mais de mim enquanto devolve a garrafa para a prateleira junto com as outras. Seus olhos me estudam. A proximidade me faz engolir em seco. Meu coração acelera, mas não é medo ou pânico como sentia todas as vezes que Dani me arrumava algum carinha para ficar quando íamos a alguma festa ou barzinho. É algo bom. E pela primeira vez na vida sinto, de fato, vontade de o beijar. Dou um pequeno passo em sua direção nos deixando a poucos centímetros um do outro. Suas mãos me envolvem a cintura enquanto uso o seu peito de apoia para ficar na ponta dos pés fazendo os nossos narizes encostarem. Esse simples contato faz meu corpo reagir. Nossos lábios estão quase se encontrando quando o toque estridente do meu celular quebra o clima e nos afastamos mais que depressa como se tivéssemos tomado um choque. Joaquim caminha até a mesa passando as mãos nos cabelos enquanto ainda meio desorientada fisgo o aparelho do meu bolso. Com a respiração ainda um tanto ofegante atento ao ver o nome de Dani piscando na tela. _ Adivinha quem está namorando? – Dispara assim que murmuro um alô. – Isso mesmo. Euzinha! – Responde me deixando ainda mais zonza com a sua agitação. – Acho que finalmente achei o cara certo dessa vez. _ Legal. – Digo tentando me recompor. _ Eu te conto a maior novidade de todos os tempos e você me responde com um Legal, Bia. _ Desculpe. – Digo engolindo em seco. – É que não estou podendo falar agora. – Ergo os olhos e me deparo com Joaquim a me olhar atento a minha conversa. O que me desconcentra um pouco. – Ah! – Raspo a garganta. – Será que podemos conversar mais tarde, Dani? – Peço virando de costas para ele. _ Você está estranha, Bia. O que está rolando? _ Depois ligo e conto tudo. – Garanto antes de desligar. Guardo o celular novamente no bolso e me volto para Joaquim que está olhando para a prateleira eu fica atrás da mesa com as mãos nos bolsos. Queria que elas estivessem em minha cintura como estavam a antes da ligação de Dani atrapalhar. Minha mente viaja imaginando como seria se o telefone não tocasse e tivéssemos nos beijado. Mas então lembro que ele é o meu chefe e que beijá-lo seria um grande erro. Nunca é bom misturar o pessoal com o profissional. Meus pais são a prova disso. Os dois trabalhavam juntos, se envolveram, meses depois estavam casados e minha mãe grávida de mim e anos depois estavam em uma briga infinita até por fim decidirem se separar. E não é isso que quero para a minha vida. _ Acho que já podemos voltar. – Falo atraindo a sua atenção. Prefiro voltar para aquele churrasco junto a família dele e correr o risco de passar m*l com dor de estômago do que ficar à sós com ele e acabar em seus braços novamente. E acredito que não haveriam interrupções dessa vez. Ele não fala nada. Apenas aponta o caminho e me deixa sair da sala primeiro. O som dos nossos passos no piso de madeira é a única coisa que quebra o silêncio enquanto deixamos o galpão. Quando chegamos ao vinhedo me mantenho em uma proximidade segura para não me perder ou me agarrar ao meu chefe. Imaginei que encontraria a todos recolhendo as coisas quando chegássemos ao jardim na parte de trás da mansão. Mas encontro o completo oposto. As crianças continuam a brincar de qualquer coisa que envolve correr uns atrás dos outros e os casais se dividem em dançar ao som da cantoria dos outros convidados e namorarem com uma taça de vinho a acompanhar. _ Os fujões voltaram! – Nathália brinca atraindo a atenção de todos para nós. – Onde estavam escondidos? – Seu comentário me faz sentir as bochechas queimarem e sei que estou ficando vermelha. _ Fomos caminhar e aproveitei para mostrar um pouco do vinhedo para a Beatriz, tia. – Diz ao sentar ao lado dos pais. _ É um lugar encantado, não é. – Gabriela comenta encostada ao marido e apenas assinto me acomodando ao lado do meu chefe. Logo tenho uma taça cheia na mão. Mas não vou beber mais. Já tomei duas taças de vinho quando cheguei e tenho quase certeza que foram essas duas taças que me deram coragem para quase me agarrar com Joaquim a pouco. O sol aos poucos vai se pondo dando ao céu um tom alaranjado de final de tarde. Mas só quando a lua assume o seu lugar de dama da noite e as estrelas brilham no céu escuro é que os músicos começam a guardar os seus instrumentos. As crianças mais novas dormem no colo dos pais e do churrasco só restam as brasas. _ Hora da arrumação, gente. – Gabriela determina. Logo os grupos são divididos. Os homens se encarregam de carregar mesa, bancos e cadeira enquanto as mulheres levam a travessas para dentro e se ocupam de guardar tudo o que sobrou em potinhos e colocar na geladeira. Então tem todo aquele momento de despedidas antes de Joaquim e eu pegarmos a estrada de volta para a fazenda. Assim que chegamos somos recepcionados por Rosa. Que questiona a Joaquim se deve preparar algo para nós jantarmos. A simples menção a comida faz meu estômago embrulhar e acredito que o mesmo acontece com Joaquim, porque ele dispensa o jantar e diz que ela já pode se recolher. A mulher se retira depois de um maneio de cabeça nos deixando sozinhos no meio do hall de entrada. _ Foi muito bom passar o dia com a sua família. – Digo quebrando o silêncio. _ Tirando a parte que minhas avós quase te mataram com tanta comida. – Fala em tom brincalhão e sorrio com a lembrança. _ Me lembre de servir meu próprio prato da próxima vez. – Rebato no mesmo tom. – Se houver uma próxima vez, é claro. _ Lógico que vai haver uma próxima vez. – Fala enfiando as mãos nos bolsos e erguendo um pouco os ombros. – A minha família adorou conhecer você. _ E eu adorei os conhecer também. – Digo cruzando os braços em um tipo de escudo protetor. Mas o escudo não impede que nossos olhares se encontrem. Os seus olhos parecem me fazer algum tipo de pergunta que não entendo. Dessa vez não damos nenhum passo em direção ao outro, mas ainda assim sinto como se estivéssemos colados. E meu coração está novamente aos pulos em meu peito. Como na outra vez é o toque do meu celular a nos fazer quebrar o contato visual. Mordendo a bochecha por dentro pego o aparelho do bolso de trás da calça e lá está o número da minha amiga maluca piscando na tela. Tenho que admitir que ela tem o timer perfeito. _ Vou até o escritório para deixar que atenda a ligação. Assim que fala isso ele se afasta em direção ao escritório. Espero que ele suma por completo do meu campo de visão antes de atender. _ Está podendo falar agora? – Pergunta quando atendo. _ Sim. – Respondo enquanto caminho até a sala de estar. _ O que estava fazendo aquela hora que não podia me atender? – Questiona direta como sempre. _ Estava em uma festa na casa da família do meu chefe. – Conto deixando o meu corpo cair sobre o sofá fofinho. _ Festa? Mas estava o maior silêncio no fundo quando você me atendeu. – Observa me deixando um pouco nervosa. Não quero contar que estava quase beijando o meu chefe quando ela ligou. Do jeito que ela é vai começar a me dar vários conselhos de como devo agarrar Joaquim e aproveitar ao invés de fugir dele como ando fazendo. _ Estava no banheiro. – Digo a primeira coisa que vem a cabeça. – Mas agora me conta. É verdade que está namorando? – Questiono tentando mudar de assunto. A minha estratégia dá certo porque ela começa a falar sem parar sobre Gustavo. O carinha novo do trabalho com quem ela vem saindo a um pouco mais de um mês e que ela garante ser o cara certo dessa vez. Coisa que duvido mundo já que o histórico da minha amiga com homens não é dos melhores. Mas não quero acabar com a sua alegria. Então deixe que fale pelos cotovelos murmurando algumas palavras de empolgação para mostrar que estou atenta a conversa. Cansada pelo dia agitado me livro dos sapatos deixando os meus pés respirarem um pouco e confiro se não tem ninguém vindo antes de me aconchegar melhor no sofá. Com o braço dormente de segurar o celular por muito tempo apoio o aparelho no espaço entre o ombro e o ouvido enquanto arrumo melhor a almofada que está sob minha cabeça. Aos poucos começo a sentir os olhos pesarem. Tento os manter abertos e prestar atenção a curta e romântica história de amor de Dani e Gustavo. Mas não consigo e adormeço antes que consiga me dar conta. Deixando a minha amiga falando sozinha.
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