André Narrando
Lívia sempre foi o tipo de mulher que parecia intocável. Classe, elegância, dona de um olhar que te atravessa e deixa qualquer um sem chão. Quando a gente começou a namorar, eu tinha certeza que era pra sempre. Mas, de repente, ela começou a mudar. Primeiro, vinha com uns papos estranhos sobre "espaço". Depois, dizia que queria "tempo". Até que um dia, pum, ela sumiu. E agora? Ela tá aí, dona de uma loja que parece mais uma joia no meio do caos do centro da cidade.
Eu já tinha ido lá antes, mas hoje eu decidi que ia com tudo. Entrar com o pé na porta e mostrar que ainda sou o homem que ela merece. Comprei um buquê gigante de rosas vermelhas, aquelas que custam um rim, e mandei embrulhar o presente mais caro da Hermès. Uma bolsa que parecia até feita de ouro, de tão cara.
Entrei na loja como quem entra no meu mundo, mas era o dela. A decoração era moderna, com cheirinho de baunilha no ar, e tudo brilhava, como ela. Lá estava Lívia, atrás do balcão, ajeitando uns papéis. Linda como sempre. Meu coração deu um pulo.
— Oi, Lili — falei, deixando a voz mais suave.
Ela levantou os olhos, surpresa, mas logo fechou a cara.
— André? O que você tá fazendo aqui?
— Vim te ver. Não é óbvio? — mostrei o buquê e a sacola da Hermès. — Trouxe um presente pra você.
Ela suspirou, cruzando os braços.
— Já falei que não quero isso, André. Eu não quero nada teu, daqui a pouco você me liga me pedindo de volta os presentes que você mesmo me dá
— Eu quero, Lívia. É você.
Ela revirou os olhos, andando até a outra ponta do balcão, mas eu fui atrás.
— Olha só, André, eu já falei mil vezes. A gente acabou. Por que você não entende?
— Porque não faz sentido, Lívia! A gente tava bem, tudo tava perfeito! O que foi que eu fiz de tão errado?
— Você não entende que nem tudo é sobre o que você fez ou deixou de fazer? Eu mudei. Eu sou outra pessoa agora.
— Outra pessoa? Desde quando você é alguém que foge de tudo que a gente construiu?
Ela me olhou, séria, e bateu a mão no balcão.
— Você não sabe de nada, André. Para de agir como se soubesse o que eu sinto ou o que eu quero.
Eu respirei fundo, tentando não perder a calma.
— Tá bom, então me diz. O que você quer? Eu te dou qualquer coisa, Lívia. Qualquer coisa!
Ela riu, mas não foi uma risada feliz. Foi amarga.
— É isso, né? Você acha que dinheiro compra tudo. Mas tem coisa que nem toda a sua fortuna pode pagar, André.
Eu fiquei sem palavras por um momento. Nunca pensei que ouvir isso dela ia doer tanto.
— Então o que você quer, Lívia? — insisti, baixando a voz. — Fala comigo.
Ela hesitou, olhando pra porta, como se quisesse fugir. E foi aí que eu percebi. Tinha algo mais. Algo que ela não tava me contando.
— Você tem alguém, né? — perguntei, sentindo o estômago revirar.
— André, isso não é da sua conta.
— Claro que é! Você ainda é a minha mulher!
Ela soltou uma risada curta.
— Sua mulher? Acorda, André. A gente acabou faz tempo.
— Então me explica. Por que você tá tão diferente? Você ta com alguém ou é só drama?
— Drama? — ela deu um passo na minha direção, os olhos brilhando de raiva. — Você não sabe nada da minha vida! Fica aí, achando que flores e presentes vão me trazer de volta, mas nunca teve coragem de me perguntar o que eu realmente quero!
Eu fiquei em silêncio. Porque, p***a, ela tinha razão.
— Então me fala agora. O que você quer, Lívia? — perguntei, sentindo a voz falhar.
Ela respirou fundo, parecia buscar força pra responder.
— Eu quero ser livre, André. Quero viver minha vida do meu jeito, sem ninguém me dizendo o que fazer. Sem você pra me controlar
Eu pisquei, tentando processar aquilo. Livre? Que p***a era essa?
— E você acha que é livre aqui, nessa lojinha? Sendo que eu posso te da o mundo com você somente dentro de casa? Tá brincando comigo, né? É a vida que toda mulher quer ter, Lívia.
— Tá vendo? É exatamente por isso que a gente nunca ia dar certo. Você sempre diminui tudo que eu faço.
— Não é isso, Lívia. Eu só quero te dar o que você merece. Você tá se contentando com pouco.
— E quem é você pra dizer o que é pouco pra mim? — retrucou, furiosa.
Eu passei a mão no cabelo, frustrado. Não tava dando certo. Tudo que eu falava parecia piorar as coisas.
— Tá bom. Eu vou embora. Mas eu não vou desistir de você, Lívia.
Ela não respondeu, só me olhou como se já soubesse que aquilo era verdade.
Eu sei o buquê e a sacola em cima do balcão, e sai daquela loja me sentindo um i****a. Mas eu não ia desistir. Se tinha uma coisa que eu sabia sobre Lívia, era que ela ainda sentia algo por mim. Eu só precisava descobrir como alcançar isso de novo.
Enquanto andava até o carro, fiquei pensando no que ela disse. Livre? Talvez ela achasse que podia ser livre longe de mim. Mas eu sabia que, no fundo, ela ainda precisava de mim. E eu tava disposto a fazer o que fosse preciso pra provar isso.
Liguei o motor do carro, mas antes de ir embora, olhei mais uma vez pro shoppig. E imaginando que ela tava lá dentro atrás do balcão, fingindo que eu não tinha mexido com ela.
— Eu vou te reconquistar, Lívia. Você vai ver — murmurei, antes de acelerar e sumir no trânsito.
Eu tava com o coração pesado e a cabeça fervendo. Ela tava me escapando, mas eu não ia deixar isso acontecer. Não agora, não depois de tudo que a gente viveu. Enquanto dirigia pela Zona Sul,uma ideia me bateu: Álvaro, o pai dela. O coroa sempre gostou de mim, pelo menos fingia bem. E se eu conseguisse trazer ele pro meu lado?
Com uma mão no volante e a outra no celular, procurei o contato dele na agenda. "Álvaro - Sogro", tava salvo assim desde sempre, e nunca mudei. Sorri, pensando que ainda tinha um jeito. A ligação tocou algumas vezes antes dele atender.
— Alô? — a voz rouca e sem muita paciência.
— Seu Álvaro! Que prazer falar com o senhor — comecei, já puxando o saco. — É o André, lembra de mim?
Ele deu uma pausa, como se estivesse processando quem era.
— Ah, o André. E aí, rapaz? O que cê quer?
Direto. Sempre foi assim. Respirei fundo, tentando soar o mais amigável possível.
— Tô com saudade do senhor,Queria saber como vocês estão, faz tempo que não nos falamos.
Ele riu, seco.
— Saudade, é? Sei. Cê quer é falar da Lívia, né?
— Não, não é só isso! — apressei, tentando parecer casual. — Claro, eu me preocupo com ela também. Sei que ela tá tocando a loja agora e...
— Olha só, André, vou ser curto e grosso: se é pra falar da minha filha, nem adianta. A vida dela é problema dela, não meu, nem seu.
— Mas, Seu Álvaro, eu ainda gosto dela, o senhor sabe disso. Eu só quero entender por que ela tá tão distante.
Ele bufou, claramente perdendo a paciência.
— Distante? Porque ela cansou, rapaz. Tá na cara que a Lívia quer outra coisa pra vida dela. E vou te falar, se cê não entendeu isso ainda, tá cego.
Aquilo bateu como um tapa. Mas eu não podia deixar ele me cortar assim.
— Com todo respeito, seu Álvaro, acho que a gente ainda tem chance de se acertar. Eu só preciso mostrar pra Lívia que...
— André, na boa? — ele me interrompeu, a voz firme. — Para de se enganar, moleque. Minha filha é mulher feita, sabe o que quer. E o que ela não quer tá claro: você.
Senti o sangue subir na hora. Quem ele pensava que era pra falar assim comigo?
— O senhor tá sendo injusto! — retruquei, a voz subindo. — Eu sempre tratei a Lívia como uma rainha. Sempre estive lá por ela.
— André, cê pode ter tratado ela como rainha, mas quem é que disse que ela queria ser a sua rainha? — A risada dele foi quase debochada. — Olha, garoto, tô no meio de um negócio aqui. Não tenho tempo pra esse tipo de papo. Boa sorte aí, mas procura outra.
E antes que eu pudesse responder, ele desligou na minha cara.
— FILHO DA p**a! — gritei, jogando o celular no banco do passageiro.
O sangue fervia. Quem ele pensava que era? Eu tinha sido o genro perfeito, sempre respeitei a casa dele, trouxe presentes, ajudei a Lívia em tudo que ela precisava. Agora ele vem me dar sermão?
Enquanto acelerava pelas ruas, tentando digerir o tapa de realidade que o velho tinha me dado, minha mente girava. Eu sabia que ele não tava errado, mas aceitar isso? Nem fodendo. Não depois de tudo que investi nesse relacionamento.
Parei o carro no primeiro sinal vermelho e respirei fundo. "Calma, André. Calma. Esse coroa não vai te derrubar." Pensei por um momento em voltar na loja, mas a expressão de Lívia quando me viu mais cedo ainda queimava na minha memória. Ela não tava nem um pouco interessada.
Mas p***a, como ela podia preferir outra vida, longe de tudo que eu podia dar pra ela? Casas, carros, viagens... Aquilo não fazia sentido nenhum.