Victor
Fiquei por quase 3 horas parado dentro do carro, na saída da propriedade dos Belladona. E eu passaria a noite inteira ali, se fosse necessário. Em algum momento, ela teria que sair.
Quando eu estava estudando como invadir a propriedade, eu avistei o carro dela. O mesmo de ontem. Vi o sentido que ela tomou e acelerei atrás. Mantive uma boa distância, para ela não perceber que eu a estava seguindo.
Assim que ela entrou na estradinha de terra eu soube onde ela estava indo.
Ela parou o carro e eu reduzi, esperando ela descer. Ela não fez isso. Eu passei a entrada e parei um pouco mais para frente, e voltei caminhando. A minha ideia era pegar ela de surpresa, para que ela não tivesse chance de assumir o papel de atriz que me encantou na noite passada.
Ela ainda estava dentro do carro, e eu a vi dar socos e tapas no volante seguidas vezes. Ela parecia muito brava, de certo alguma coisa aconteceu.
Alguns minutos depois ela desceu do carro, fechou a porta mas não trancou. Ela caminhou lentamente mata a dentro e foi quando eu ouvi o primeiro soluço. Ela não estava apenas brava, ela estava chorando. Mantive uma distância adequada, enquanto a observava. Ela parecia completamente vulnerável, e me pareceu muito errado invadir aquele momento. Até para mim.
Ela observou a queda d’água e quis saber o que ela estaria pensando.
Na vingança, nos pais, em mim…?
Afastei esse pensamento quando ela sentou em uma das pedras e voltou a soluçar, agora tremendo intensamente entre lágrimas. O meu impulso foi correr até ela e acalmá-la com um abraço, tamanho era o sofrimento daquele choro. Mas, eu me contive. Eu queria a verdade, mas não precisava ser agora. Eu a deixaria sofrer em paz, mesmo que todo o meu corpo me implorasse para ir até ela.
Quando eu decidi ir embora, ela levantou de uma vez. Uma confiança tomou os ombros dela, quando ela tirou a jaqueta. Depois ela puxou uma bota e eu me dei conta do que ela iria fazer. Estava quase 10 graus, e a água deveria estar congelante. Quando ela tirou a outra bota, eu me movi sem pensar. Eu não poderia deixá-la fazer, seja lá o que ela estava pensando.
Falei a primeira coisa que veio na minha cabeça.
- O que você pensa que vai fazer? - A tensão nos ombros dela foi imediata, então eu tentei aliviar a tensão. - Eu ficaria decepcionado em te ver nua, pouco antes de te ver morta.
Muito devagar ela virou na minha direção. E a luz da lua me fez perceber que aquele choro começou bem antes dela chegar ali.
- O que está fazendo aqui? - Ela perguntou, com os dentes trincados.
- Eu vim dar uma volta. - Enfiei as mãos no bolso e comecei a me aproximar. - Vi o carro e fiquei curioso.
- Você está me seguindo? - Era uma acusação válida.
- Estou. - Ela arregalou os olhos inchados. - Estou atrás de você desde ontem.
A raiva ferveu no rosto dela, assumindo o lugar da tristeza que estava ali, e ela deu um passo para trás. Eu me dei conta que ela se machucaria antes dele, e me movi, puxando ela pela mão e firmando o corpo dela no meu, antes que ela caísse no chão.
Ela estava gelada, mas o resultado na minha corrente sanguínea foi como se eu tivesse entrado em uma banheira de lava.
- Cuidado! - Eu a alertei e ela tentou se afastar. - Acho melhor se sentar. - Ela parecia completamente vulnerável e eu a ajudei a sentar na pedra. Puxei a jaqueta que ela tinha acabado de tirar e joguei nas costas dela. Ela vestiu rapidamente e depois vestiu as botas, ainda em silêncio. As lágrimas começaram a diminuir, e quando ela pareceu estar aquecida de novo, eu sentei ao lado dela.
Esperei ela falar alguma coisa, mas ela parecia abalada demais para começar uma conversa.
- Você vai me contar o motivo das lágrimas, ou terei que descobrir sozinho, assim como descobri o seu sobrenome? - Eu senti ela endurecer completamente ao meu lado e olhei para ela. Aquele par de olhos intensos me encaravam, e agora, com a pele completamente tomada de rubor e os olhos inchados do choro, eles pareciam ainda mais azuis. Esquecer aqueles olhos seria uma missão impossível.
- Você veio me matar! - Ela afirmou e eu quase ri.
- Se eu negar, não estarei sendo completamente honesto. - Esperei ela tentar se afastar, mas para crédito dela, ela não se afastou. - Está com medo?
Ela suspirou e levantou a cabeça para o céu. O cabelo dela estava preso em um coque elaborado, como se ela tivesse vindo de um evento importante, e esse penteado não combinava com a imagem de mulher vivaz que eu criei na minha mente.
- Depois de hoje, morrer seria uma dádiva. - Ela falou, acho que para si mesma.
- Por isso resolveu nadar nesse frio? - Ela negou com a cabeça antes de abaixar o olhar de novo.
- Eu só queria sentir algo forte o suficiente para aplacar o que eu já estava sentindo. - Eu apertei os lábios. A cada frase que ela pronunciava eu ficava mais curioso sobre ela.
- Pelo visto o seu dia foi bastante dificil. - Eu incentivei e ela suspirou outra vez, antes de responder, com a voz trêmula.
- Não só o dia. A vida inteira.