Lara
Eu passei a tarde toda sentindo uma agonia forte no coração, depois de saber que eu acabaria em um convento. Eu tinha que partir, e eu nem sabia por onde começar.
Eu trabalhei no jardim por algumas horas, tentando calar os meus pensamentos que giravam entre as injustiças da minha vida e um certo Herdeiro de olhos pretos.
Se eu aceitasse casar com ele?
Eu tinha me feito essa pergunta milhões de vezes, mas o meu pai afirmou me preferir morta. Se ele soubesse que eu já conhecia um dos Romano, e que eu tinha beijado ele com vontade, e depois passado a noite inteira pensando nele, com certeza ele me deixaria acorrentada na saleta de punição por uma semana.
Suspirei, puxando a última erva daninha e fiquei ali, olhando para ela, sabendo que morreria pouco a pouco, depois de ser tirada com tanta violência da terra.
- Princesa? - A Teresa sentou na cadeira perto de mim e eu parei para olhar para ela. - Falei com ele.
- Convento ou casamento? - Ela fez um biquinho. Eu não escolheria nenhuma das coisas. A minha vontade real era sair pelo mundo, conhecendo cada canto da Europa, trabalhar para pagar a minha moradia e viver feliz. Conhecer paisagens que eu só via em quadros e fotos e ler, em qualquer lugar, ler muito.
- Convento é a ideia que ele está mais inclinado, mas eu dei algumas sugestões de noivos que podem ser discretos. - Eu senti os meus ombros afundarem. - Depois que casar, mudará o sobrenome e tudo estará resolvido. Você pode sair dessa prisão. - Ela falou como se fosse uma boa noticia.
- Apenas para ser presa em outra. - Joguei a erva daninha no monte de lixo e limpei as mãos. - Acha que eu poderia trabalhar como governanta em algum lugar? - Ela pareceu confusa. - Eu pensei em ir para bem longe e buscar um trabalho.
- Meu amor, trabalhar de governanta exige mais do que apenas saber cuidar de uma casa. - Observei ela lutar com as palavras. - Exige que você tenha certos dotes e conhecimentos.
- Você pode me ensinar! - Ela negou com a cabeça. - Por favor, Tete…?
- Não posso e não vou. Os dotes que eu digo, tem relação com serventia física. - Eu senti o meu corpo congelar. - Eu tenho muita sorte Larinha, de servir apenas ao seu pai. - Eu senti o meu estômago embrulhar. - Tem famílias que exigem que a governanta se deite com todos os homens. - Eu ia vomitar a qualquer momento agora. Isso era tão repulsivo! Tratar uma mulher como um pedaço de carne assim.
- Teremos visitas para o jantar, seu avô pediu para te ajudar a ficar apresentável. - Ela não parecia muito animada, mas eu senti uma ansiedade nova.
- Quem? - Ela apertou a boca.
- Parece ser primo da sua mãe, não tenho certeza. Não sei quem é.
- Um pretendente? - Ela deu de ombros de novo e eu já sabia que sim. E se era primo da minha mãe, de certo era um homem mais velho e nojento. As poucas vezes que o meu pai permitiu que eu interagisse com outras pessoas eu precisei me portar como criada. - Devo ficar bonita? - Ela assentiu.
Era um pretendente, com certeza. Isso saia completamente do comum, e eu duvidava muito que o meu pai tivesse concordado com aquilo. - O meu pai sabe?
- O seu pai saiu faz pouco mais de 1 hora, ele foi até algumas cidades vizinhas… - Ela olhou para o chão.
- Visitar conventos. - Não foi uma pergunta, mas ela assentiu. - Eu estou cansada dos outros decidirem a minha vida. - Falei sem pensar.
- Eu sei. - Ele ficou de pé. - Mas, por hoje, vamos fazer o que podemos, ok? - Ela me estendeu a mão e me ajudou a levantar.
Duas horas depois eu estava completamente diferente de como eu costumava ficar em casa. Diferente da noite anterior, o meu vestido era estilo camponesa, em tons verdes, que ressalta as minhas sardas. A Teresa prendeu o meu cabelo em um coque elaborado e pintou os meus olhos, destacando o azul deles. Eu quase não me reconheci, depois de pronta. Suspirei para a minha imagem no espelho e a Teresa sorriu ao concluir o trabalho.
Descemos e eu fiquei sentada na sala de estar aguardando. O meu avô surgiu pouco depois e sentou perto de mim. Ficamos aguardando ali, um silêncio tenso entre nós.
- Você entende a importância de um bom casamento? - Ele quebrou o silêncio, mas eu não tinha uma boa resposta para aquela pergunta. Pelas crenças da máfia, eu entendia. Pelas minhas vontades, não.
- Sim, Dom. - Uma meia verdade me deixaria fora de encrencas e punições.
- O seu pai não entende. - Eu me limitei a olhar para o chão. - Homens como nós precisam de uma mulher do lado. Ele deveria herdar o meu legado, mas se recusa a estar em condições para isso. - Ele parecia estar pensando alto e não falando comigo. - Preciso tomar providências para manter o legado da nossa familia. - Era como se ele estivesse procurando a minha aceitação, mas isso, ele nunca teria. Eu me mantive em silêncio, me sentindo de novo, como um pedaço de carne.
- Se tudo der certo essa noite, sábado teremos um contrato de casamento assinado e você irá continuar o nosso legado. - Finalmente olhei para ele. - Além de você, outra pessoa sobreviveu ao ataque daquela noite. - Eu engoli em seco. - O Stefano estava passando alguns dias com os seus avós, e naquela noite ele tinha saído para se divertir. Quando voltou, ele encontrou tudo destruído e você dormindo nos braços da Teresa. - Ainda não estava claro para mim se eu podia fazer perguntas, mas muitas delas surgiram na minha mente. - Eu o mandei para longe, para que ele pudesse voltar e te desposar quando você estivesse pronta. Ele assumirá o nosso sobrenome e vocês vão manter o nome Belladona vivo, depois os herdeiros de vocês e os herdeiros deles.
- Ele será o Dom depois de você? - Eu perguntei antes de conseguir me conter, mas ele não ficou bravo, como normalmente ficava. Se limitou a confirmar com a cabeça.
O meu pai seria descartado então e o meu avô me usaria para o plano de manter o nome da família vivo, os negócios funcionando, trazendo outro que deveria estar morto para essa casa.
A campainha interrompeu os meus pensamentos e eu senti o ar faltar um pouco quando ouvi a porta abrir. A Teresa entrou primeiro, fazendo uma reverência e logo atrás estava um homem que eu nunca vi.
Ele não era feio, mas era muito mais velho que eu. Deveria ter mais ou menos a idade do meu pai, e ele colocou os olhos cheios de cobiça em mim e sorriu amargamente.
- Vejo que se tornou uma linda mulher. - Ele veio até mim, segurou a minha mão e depositou um beijo nela. O cheiro que emanava dele era forte, um misto de álcool e tabaco. Ele parecia estar me despindo com o olhar, enquanto me analisava. Eu senti o impulso de correr imediatamente.
- Tio! - Ele abraçou o meu avô rapidamente. - Fico feliz que finalmente me ligou.
- Eu disse que esse dia ia chegar. - Ele olhou de novo para mim, e eu senti um incômodo intenso na minha pele. Estar no mesmo ambiente que ele já me dava náuseas, imagine casar? Ou deixá-lo me tocar?
Respirei fundo, sabendo que não seria o suficiente para evitar que eu não vomitasse.