Máscaras

1183 Words
Lara Ao mesmo tempo que eu sentia o meu estômago revirar de ansiedade eu nunca estive tão feliz. Finalmente eu estava em um baile da Corleone. E a descrição da Teresa para aquele tipo de baile não fazia jus. Tudo era lindo e muito bem decorado. As obras de arte, que eram o meu ponto fraco, depois dos livros, estavam expostas e eram originais. Eu não pensei muito no que fazer ali, além de me sentir uma mulher de verdade e ver o meu quadro mais uma vez, mas com certeza não imaginei que iria ficar tão maravilhada por tudo. As pessoas eram lindas e todas estavam maravilhosamente bem vestidas, exatamente como nos meus sonhos. “Ignore o anfitrião.” - O alerta da Teresa ecoou no meu pensamento assim que passei pelas portas. Ele estava sentado em uma espécie de trono, sob uma plataforma elevada, para se destacar. Era a festa de noivado dele, sem uma noiva. A décima sétima, segunda a Teresa. E eu obedeci cegamente ao que ela aconselhou, me forçando a não dar um segundo olhar para ele, mesmo que eu quisesse e estivesse curiosa quanto a beleza dele. As nossas criadas diziam que Victor Romano era o homem mais lindo de toda a Itália e que a sua frieza era maior que a sua beleza. E de qualquer forma, ele era a última pessoa que eu queria conhecer. Ele era o símbolo de tudo que deu errado na minha vida. Todos os anos que passei escondida e trancada dentro de casa, pelos medos do meu pai, foram causados pela família Romano, e ele representava tudo isso. Então eu ignorei a imagem em destaque dele e procurei olhar para outras coisas, e a cada lugar ou pessoa que eu olhava eu ficava mais encantada. Eu sentia olhares em mim, sabia que as pessoas nunca me reconheceriam ou associariam quem eu era com a minha família. Na verdade, pouquíssimas pessoas sabiam sequer que eu existia. O meu pai assegurou isso. Suspirei ao me deparar com o meu quadro, Jardim em Giverny, que estava cuidadosamente preso em destaque no salão. Perder aquele quadro tinha sido uma das maiores dores da minha vida. Uma punição recebida depois que fugi para nadar na cachoeira. O meu pai vendeu por milhões, mas, nem todo o dinheiro do mundo pagaria a beleza dele e o que ele significava para mim. A única foto que restou da minha mãe e que eu escondia com a minha vida, era admirando esse quadro e ele era a afirmação que ela realmente existiu. Por isso me arrisquei tanto vindo aqui hoje. Eu queria olhar para ele novamente, e depois de achar o recibo de venda com o endereço de entrega, eu me senti traída pelo meu pai, o que acontecia com frequência. Ele vendeu o meu quadro, o quadro que a minha mãe comprou, para o responsável pela morte dela. Foi impossível não suspirar de novo. Sabe aquela sensação que você sente quando alguém está olhando para você de costas? Um incomodo me tomou e eu senti alguém me observando. A sensação aumentava a cada segundo que passava e eu considerei ir embora, mesmo que eu tivesse acabado de chegar e não tenha visto tudo. Eu senti a presença dele em seguida e me mantive concentrada nas pinceladas de Monet. O perfume dele me atingiu e eu pisquei para afastar a sensação estranha que subiu pela minha pele. Se eu ignorar, ele sairá de perto de mim e vou poder voltar ao normal. Eu não tinha tido contato com muitos homens durante a minha vida, apenas servos que tinham ordens expressas de se manter longe. O meu pai e o meu avô não contavam, visto que nunca houve nenhum tipo de atenção real da parte deles, além de me manter cativa dentro daquela casa. Então estar tão próxima de um homem era novo para mim, e ele era tão cheiroso, que eu precisei lutar contra o impulso de olhar para ele. Lutei bravamente, mas perdi. Felizmente. - Senhor, sinto muito. - Assim que vi de quem se tratava eu precisei recorrer aos muitos anos de treinamento com a Teresa, de como manter todas as minhas emoções escondidas. Victor Romano era, de fato, o homem mais lindo da Itália. E eu nem estava vendo o rosto dele inteiro. Eu sabia que era ele pela cor do smoking, bordo, diferente de todos os outros cavaleiros na festa. E ele estava ali, com os olhos fixos em mim, como se eu fosse um quebra-cabeça a ser montado. O meu maior impulso foi me afastar e correr. - Fique à vontade. - A voz dele não combinava com o que eu sabia dele. - É uma peça intrigante, não acha? - O tom dele era caloroso. Recorri a minha máscara interna, para evitar qualquer rubor que entregasse as minhas emoções e olhei de novo para o quadro, e a imagem que eu cresci admirando me acalmou um pouco. - Impressionista, exatamente como Monet era. - Eu quase sorri. - O misto de tons de rosa e roxo é delicado e marcante, como tudo o que ele pintou. - Eu estava divagando, era melhor me calar. - Concordo. - Ele falou baixinho. - Qual o seu nome? - Lara. - Respondi mantendo o sobrenome oculto. - E o seu? - Ele não podia ter a impressão que eu sabia quem ele era, ou que estava interessada nele de alguma forma. Eu já tinha chamado a atenção dele demais. - Victor. - Ele respondeu, também ignorando o sobrenome, e eu quase suspirei de alívio. - Você é nova aqui? - Eu me limitei a negar. - Eu nunca te via antes. - Uma meia verdade sempre é melhor do que uma mentira completa, eu aprendi isso da pior forma. - Nasci e cresci em Bisacquino. - A meia mentira. - Mudei para a Corleone com o meu pai tem uns 5 anos. - Eu apenas nasci em Bisacquino, depois da morte da mamãe, o meu pai me trouxe para a Corleone, eu tinha 1 ano. - Devo conhecer a sua família. Qual o seu sobrenome? - Eu senti a garganta fechar com a pergunta e me forcei a olhar para ele. Eu não podia revelar quem eu era, seria fácil demais ele somar dois mais dois e mandar me matar, assim como o meu pai temeu durante a minha vida inteira. Eu precisava ir embora, agora! - Duvido que conheça. - Eu forcei um sorriso e decidi que era hora de encerrar aquilo. - Obrigada pela conversa, Victor. - Eu o reverenciei por pura força do hábito, de tanto fazer com o meu pai e o meu avô e caminhei tentando não correr para a porta. Ir até ali tinha sido um dos maiores erros que eu já cometi em meio a minha rebeldia. Depois de tudo que o meu pai fez para me proteger, depois de tudo o que eu sofri com a proteção excessiva dele, eu fiquei cara a cara com um Romano, e por um triz eu não revelei quem eu era.
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