O carro parou depois de quase uma hora, em uma propriedade que parecia abandonada pelo tempo. O mato estava alto por todos os lados da entrada de carros; no centro do que deveria ser um jardim tinha um lago que estava quase seco e a casa (que mais parecia um castelo retirado de contos de terror) se projetava ao fundo de um campo imenso e alto de plantações, que também pareciam abandonadas.
O Victor desceu do carro, mas eu não me movi, nem mesmo quando o motorista abriu a porta para mim. O homem tinha uma marca feia no rosto, uma queimadura talvez, mas o que mais me chamou a atenção foi a raiva evidente nos olhos dele.
- Chefe? - Ele chamou o Victor, que logo estava ao lado dele.
- Ainda lembra como se anda? - Ele me perguntou, tentando fazer uma piada.
- Exijo saber onde estou! - Os dois fizeram uma expressão surpresa e eu me dei conta que a minha atitude não era o que se esperava de mim.
Eu sempre fui ensinada a demonstrar respeito na presença de qualquer um dos membr0s da máfia, e até de alguns soldados deles. Os demais nunca se aproximavam o suficiente para que eu pudesse dizer um bom dia.
E a minha frase, as palavras que eu usei, causaram um choque em qualquer um. Principalmente em um homem que estava se preparando para ser Dom, da família que me odiava.
- Você está segura aqui, é tudo o que precisa saber. - Mesmo que as palavras do Victor saíssem em um tom forte, beirando a raiva, os olhos dele estavam calmos; Ele parecia quase aliviado. - Venha!
Não foi um pedido, não com aquele tom.
Eu deslizei para fora do carro e me coloquei de pé. Olhando novamente para a casa de dois andares na nossa frente.
- Você ficará aqui por um tempo. - Ele apoiou a mão nas minhas costas, me conduzindo até a escadaria, e eu precisei controlar o choque do toque. A mão quente dele era uma segurança que eu não poderia me dar ao luxo de ter.
- Quanto tempo? - Eu usei o tom mais submisso que eu consegui, mesmo que o que eu sentisse fosse um desespero tremendo, a incerteza do que seria feito comigo ameaçando me tomar por inteira.
- Até eu descobrir o que farei com você. - Foi impossível conter o tremor que subiu pelo meu corpo.
Entramos em um salão, com móveis cobertos por lençois brancos; duas escadas em cada lado do salão levavam ao andar de cima, e 4 portas que deveriam ir para as áreas de apoio da casa.
- Ainda não consegui deixar tudo como quero. - Ele explicou. - Será necessário alguns dias, mas o seu quarto está perfeitamente habitável. - Eu assenti.
Ele me olhou, e os olhos dele dançaram do meu rosto, descendo pelo meu corpo, como se avaliando o que eu vestia e vi as chamas dos olhos dele ficarem mais fortes. Dei um passo para trás por puro instinto e ele sorriu.
- Eu imagino que queira se livrar desse vestido. - Eu abracei o meu próprio corpo, como se eu pudesse me proteger do que seja lá o que ele estava pensando. - Vou te levar ao seu quarto. - Ele segurou a minha mão e me conduziu até as escadas, sem mais explicações.
Eu lutei contra o pensamento de estar novamente sozinha em um quarto com ele, e ignorei a reação que o meu corpo teve com esse pensamento. Ao invés disso, tentei prestar atenção ao caminho que seguimos no topo da escada.
Não era um corredor reto, ele tinha alguns recuos com duas ou mais portas cada um. Fomos até o final, onde o recuo tinha apenas duas portas, uma de frente para a outra. Ele apontou para a porta da direita.
- Esse é o seu quarto. - Ele apontou para a porta da esquerda. - E esse é o meu.
Apertei os lábios com uma força que eu nem sabia que tinha, ao constatar a proximidade dele.
Ele abriu a porta e me puxou para dentro, soltando a minha mão em seguida, antes que o meu corpo tivesse tempo de processar o toque quente dele.
- Acredito que aqui você tenha tudo o que precisa. - Ele apontou para as partes do quarto. - Cama, um guarda-roupa, banheiro. - Ele abriu uma porta anexa, que revelou pouco do banheiro, mas parecia completo, com uma banheira e tudo. - As roupas que eu providenciei são mais ou menos do seu tamanho, caso tenha alguma coisa que te desagrade, me avise, que resolvo. - Eu engoli em seco.
Eu não sabia o que responder, ele parecia um homem normal recebendo uma visita, mas eu sabia que não era isso.
Não importa que uma gaiola seja coberta de ouro, com acessórios e necessidades atendidas. Uma gaiola sempre é uma gaiola.
- E essa porta? - Apontei para uma porta ao lado do banheiro e ele sorriu.
- Essa porta é para quando você se sentir solitária. - Senti o franzir da minha própria testa enquanto ele caminhava para a porta, ele abriu, o que revelou um pequeno corredor, com outra porta no fim. - Esse é o acesso para o meu quarto. - Eu senti o meu corpo inteiro travar. - Será sempre bem vinda… - Acho que ele se deu conta da minha reação porque caminhou até mim. - Não espero nada além de uma boa companhia Lara. - Eu dei outro passo para trás, sentindo a parede nas minhas costas quando ele chegou mais perto. - Você é minha convidada e prometo que o seu tempo aqui será tranquilo…
- Você espera que eu sirva a sua cama! - Não foi uma pergunta. Era o que aquela conexão entre os quartos dizia, era o que ele queria desde o começo.
- Eu espero te manter segura! - Ele estava mais perto agora, e eu lutei com todas as minhas forças contra a vontade de sentir a barba por fazer na palma da minha mão, lutei para não respirar fundo e me inebriar com o cheiro de força dele, lutei contra tudo o que o meu corpo queria…
- Eu não preciso que me proteja! - Foi a arma mais forte que consegui alcançar em meio às reações do meu corpo.
- Você precisa sim! - Ele colocou as mãos na parede, do lado da minha cabeça, quase me prendendo.
Eu conseguia sentir a respiração dele agora, formigando a pele do meu rosto. - E mesmo se não precisasse, eu ainda assim teria feito a mesma coisa. - Ele respirou fundo, a boca a centímetros da minha. - Eu sonhei tantas vezes com isso que quase não acredito que você está mesmo aqui.
A voz rouca e baixa dele abaixou todas as minhas defesas e amoleceu as minhas pernas, eu fechei os olhos me deixando levar pela onda intensa que ele era, a onda que ameaçava me levar para as profundezas da insanidade.
- Isso é uma péssima ideia… - Ele falou com a boca a centímetros da minha.
- O que? - Eu perguntei num sussurro.
- Te beijar. É uma insanidade… - Ele não parecia estar falando comigo. - Se eu começar, não serei capaz de parar.
Era um aviso que deveria me colocar em pânico. Esse era o momento de empurrá-lo, impedindo que ele tocasse a minha pele, que ele fizesse aquele tudo que ele comentou. Era uma insanidade com certeza, qualquer toque. Era uma loucura completa, que poderia me desonrar…
- Então não pare!