Collin
Notei a presença de Anna na cozinha rapidamente. Ela ficou alguns instantes com os olhos em mim e isso quase me fez perder o controle. Talvez ela realmente seja bem curiosa. Deu pra ver que ela ainda carrega bastante mágoa e como não carregar ? Notei ela mais corajosa e isso me deixou contente. É isso que eu quero dela, quero que ela se sinta feliz e confiante.
Estava indo me deitar e vi a porta aberta. Achei estranho pois ela nunca deixa a porta aberta. Não me contive e olhei pra dentro, ela estava encolhida na cama com um cobertor até o pescoço.
Linda, simplesmente linda dormindo.
Procurei não demorar muito olhando-a. Eu a desejo com todas as forças e não quero arriscar fazer alguma besteira e quebrar o coração dela mais do que já está.
Dei as costas e fui me deitar. A dor no meu rosto era mínima então peguei no sono.
No meio da madrugada acordei com um grito. Era Anna.
Peguei minha arma e corri em direção ao quarto dela, entrei de rompante e ela estava encolhida na cama.
Entrei no banheiro e revisei todo o quarto, não havia ninguém.
_ O que houve ? Você está bem ?
Ela tremia.
_ S-sim.... eu só me assustei com o barulho...
_ Qual barulho ?
_ O da chuva e trovoada... você não ouviu ?
Parando pra prestar a atenção percebi que havia uma tempestade lá fora. A chuva estava forte e as trovoadas também. Tomei tantos analgésicos que não escutei quando começou a chover.
_ Ah .. não tinha escutado.
_ Eu morr0 de medo de trovoes. Quando era pequena sempre pulava para a cama dos meus pais, meu pai sempre me amparava até dormir.
_ E no convento ?
_ Eu tinha uma colega de quarto. Ela não gostava muito mas era compreensiva.
_ E aqui ? Nunca ouvi você gritando.
_ Sempre que chove assim você está em missão. E mesmo que não estivesse jamais me deitaria em sua cama !
Anna é direta. Sem rodeios.
_ Mas pode deitar se quiser. Não vou tocar em você.
_ Eu não confio em você!
_ Não estou pedindo que confie. Apenas saiba que sou um homem de palavra.
Anna ficou pensativa, por um segundo achei que fosse recusar mas quando uma forte trovoada se fez presente ela arregalou os olhos se dando por vencida. Decidi deixa-la sozinha. Se ela realmente quisesse ajuda ela viria até mim.
Sai do quarto e me deitei, a porta estava destrancada. Não demorou muito e a ouvi entrar no quarto, ela carregava um travesseiro na mão e uma coberta na outra.
_ Não precisava ter trazido, tenho o suficiente para nós dois.
_ Eu prefiro usar minhas coisas!
Disse ela com o nariz empinado.
Mais um barulho alto e Anna pulou quase que em cima de mim. Se enrolou na coberta e colou o pequeno corpo ao meu, não movi um músculo, a menina de olhos arregalados dormiu rapidamente após cessar a tempestade. Pedi a Deus que chovesse todos os dias.
O dia amanheceu ensolarado e eu amaldiçoei tudo e todos. Minha paciência estava por um triz.
Me levantei enquanto Anna dormia e preparei um café. Passaria o dia em meu escritório procurando quem delatou a mim e a Leonardo para aquela maldita colombiana. Não posso negar que a garota é forte e sabe conduzir um império. Eles exportam muitas drogas e Olivia é uma mulher de palavra apesar de ser nova. Pra falar a verdade nem sei a idade da garota, mas sei que é mais nova que Anna.
Mandei uma mensagem para Benno, nosso aliado alemão. Ele e o capo são conhecidos e amigos de Matteo então a relação entre as duas máfias são genuínas. Ficamos em conferência durante horas, tivemos a ipotese de alguns nomes mas nada conclusivo.
Ouvi uma batida na porta.
_ Entre!
Não gosto de receber pessoas em meu escritório e muito menos Anna. Sempre que saio deixo a porta trancada com uma senha que somente eu tenho. Não quero que ela conheça o outro lado da minha máscara, no dia em que executei os pais dela foi apenas uma coisa básica e rápida. Ela não sabe o monstro que se esconde dentro destes armários.
_ O-oi.. eu .. eu imaginei que estivesse com fome .. fiz um sanduíche ..
Olhei para o relógio e já era quase noite.
_ Não vi o tempo passar.
_ Eu imaginei, você deveria estar descansando não é ? Está com dor ?
_ Não, estou bem.
Ela se aproximou e me entregou o prato, os olhos curiosos rodaram por toda a sala, comi rapidamente na tentativa de sair logo dali.
_ Quer comer fora ?
Os olhos curiosos me encararam com uma enorme surpresa.
_ Claro que sim... faz quase dois anos que não saio daqui de dentro!!
Disse ela com um sorriso no rosto.
_ Então se arrume, vou esperar você na sala.
Falei de maneira indiferente. Anna não conteve a alegria e se atirou em meus braços. Não tive reação...
_ Obrigado... é muito bom poder voltar a viver !
Disse ela com o rosto colado ao meu pescoço. Acariciei suas costas e inalei profundamente seu cheiro. Anna estava feliz e isso mexia totalmente com meu equilíbrio emocional. Nem mil anos em um campo de concentração da máfia poderia me deixar apto para aguentar essa coisa que cresce dentro de mim.
Ela se levantou e correu para fora dando risada e cantarolando. Enquanto isso eu ainda estava ali, totalmente paralisado, o cheiro dela impregnou em mim e eu ainda conseguia sentir seu rosto em meu pescoço, me senti vazio, Anna me deixou vazio ao se afastar, ao sair de meus braços. Nunca precisei implorar por relacionamento ou qualquer outra coisa, mas ali, naquele momento eu percebi que se fosse necessário eu rastejaria o deserto inteiro só para ter aquele sorriso e aquele corpo colado ao meu, em meus braços até o dia da minha morte.