Marco Antônio sempre fora pontual e naquela tarde, não foi nem mesmo um pouco diferente. Prometeu estar na casa de Brianna às três horas e pontualmente às três, ele estava lá. Chegou com uma caminhonete e não com a moto, como seria o mais normal de se esperar.
- Brianna – ele diz sorrindo, assim que entra no quarto, acompanhado de Dulce que já ofereceu café à visita – como é bom ver que está melhor.
- Oi Marco – ela diz sorridente – acho que eu me sinto muito melhor também e isso é essencial para minha recuperação: positividade.
- Me deixa feliz – ele suspira e senta-se nos pés da cama, onde ela está confortavelmente acomodada – de verdade.
- É bom saber que se preocupa... Você disse que precisávamos conversar naquela noite – ela diz – qual é o assunto?
- Ah, sei lá – ele suspira – acho que pode ter interpretado m*l algumas coisas – ele diz.
- Do que é que você está falando, exatamente? – Brianna questiona.
- Bella conversou comigo sobre você e o seu irmão procurarem coisas no armário dela... E bem, sabe como são as coisas, ela ficou assustada – ele diz.
- E por ficar assustada com isso, ela te ligou? – Bri pergunta novamente, de forma despretensiosa.
- Sim, Brianna – ele confirma e esfrega o rosto com as mãos – precisa entender a minha situação, a Bella e eu estamos saindo juntos, desde que você e o Jonah começaram a namorar.
- Eu sei disso – Brianna diz pacientemente – mas acredito que você teve bastante tempo para me contar sobre isso antes de toda essa m***a acontecer.
- Lamento – ele diz – eu nunca sabia como você reagiria e sabe, você andava bem instável desde que começou a sair com o Jonah.
- Instável? – eu pergunto surpresa.
- Sim – ele confirma – eu não sei o que é que vocês faziam juntos, mas você se tornou outra pessoa quando namorou com ele...
A conversa continuou em um rumo totalmente esquisito, onde Marco Antônio dava a entender que eu havia me afastado de tudo e de todos para namorar com Jonah. Como se eu simplesmente houvesse surtado e decidido que deveria ser rebelde e muito provavelmente viver de s**o, drogas e rock ‘n roll.
Aquilo tudo durou um pouco mais do que uma hora e meia, quase duas... No fim das contas, Marco ainda despediu-se dizendo que desejava, do fundo do seu coração que ela recuperasse toda a sua memória e que as coisas passassem a fazer sentido e que ele sempre estaria ali para ouvir ela e para ajudar no que ele pudesse.
- Você não me parece muito convencida de tudo o que ele disse – Benjamin falou no fim do dia, quando finalmente voltou para casa e ouviu comigo, boa parte das gravações da nossa conversa.
- Não faz o menor sentido – Brianna reflete, nervosa – sabe que eu não estava no meu melhor dia quando te liguei... Estava triste, por Jonah.
- O problema é que com tudo isso acontecendo, nem mesmo podemos confiar na mamãe ou no papai – ele diz.
- Não me fala do papai – ela resmunga.
- O que foi que ele aprontou? – Ben parece surpreso com o comentário da irmã.
Brianna conta rapidamente sobre o “passeio” e a conversa sem muito sentido que ele tinha iniciado com ela no escritório do supermercado.
- Bri – ele diz encarando a irmã – eu não posso negar que eu não pensei que talvez, isso fosse uma boa ideia – ele a encara, totalmente perplexa – sei no que está pensando, mas veja isso como um plano, certo?
- E qual seria esse plano, Benjamin? – ela questiona.
- Aceitar – ele sorri – dizer que não consegue se lembrar mesmo, mas que encontrou sei lá, os seus diários, que compreende que foi um momento difícil, delicado e triste e que pensou em tirar a sua vida – o irmão parece ter pensado muito à respeito – Sabe, com isso a cidade toda sai do seu pé...
- E eu fico como a louca suicida – ela constata, desanimada.
- Ao menos até provar que não foi isso – ele sorri – Bri, eu estou totalmente convencido de que Marco estava com você e mesmo que ele não tenha sei lá, jogado você lá ou empurrado, ainda assim, ele se omitiu, ainda assim ele não prestou socorro, mesmo que tenha sido um acidente. E o cara, ele é filho do dono da cidade... Não vamos conseguir absolutamente nada, com todo mundo na tensão de livrar ele.
- Acho que eu preciso concordar – ela diz, derrotada – mas saiba que isso não tem nada a ver com o que eu realmente quero.
- Sei disso – ele sorri – me conta, como podemos fazer isso?
- Vou querer sair da cidade, então, eu preciso estar cem por cento recuperada, fisicamente – ela diz – vou me empenhar, me esforçar e me livrar totalmente de cadeiras, muletas e tudo mais...
- E então, vai fazer um acordo com o pai, vai dizer o que ele quer que diga, desde que ele convença à todos de que você está em uma clinica ou em um retiro, sei lá, qualquer m***a dessas que as pessoas fazem para “se recuperarem” – o irmão sugere.
- Tudo bem – ela concorda.
Claro que ela agora se via em um verdadeiro impasse: não seria absolutamente nada fácil convencer Voller, que tanto se empenhara em ajudar ela com a sua recuperação, de que ela aceitaria essa historinha sem fundamentos de tentativa de suicídio e também, muito provavelmente, ela decepcionaria Jonah, e mesmo que as vezes ele parecesse um total estranho, uma parte dela não queria, de forma alguma, decepciona-lo.
“O dia em que eu decidi que talvez deveria desistir, ao menos para o resto de todo o mundo...
Querido diário,
Hoje eu tive um dia realmente difícil e estou prestes a tomar uma decisão que vai, com toda a certeza, mudar aminha vida e definir a forma com que todas as coisas deverão caminhar daqui para frente. Após uma conversa esquisita para caramba com o papai, onde ele sugeriu que eu deveria aceitar essa balela de tentativa de suicídio, precisei refletir sobre a minha vida e sobre as probabilidades de conseguir, efetivamente, resolver essas questões. Foi um dia intenso, preciso escrever:
1. Eu e Voller fizemos as pazes e bem, aparentemente, podemos ser amigos, independente das coisas que tenham acontecido e de qualquer coisa que possa vir a acontecer. Ele foi super legal comigo hoje e me ajudou bastante.
2. Recebi Marco aqui em casa e ele segue agindo como se não soubesse de nada e me tratando como se eu fosse uma espécie de bomba relógio, o que eu acho extremamente suspeito.
3. Benjamin acha que eu poderia fazer um acordo e fingir que lembrei que tentei me m***r mesmo, e que assim, essa cidade toda acharia qualquer outra coisa para fazer e sairia do pé da “pobre coitada menina perturbada”.
4. Voller e Jonah não vão gostar dessa ideia. Eles sempre me incentivaram a descobrir a verdade e a ir atrás de todos os detalhes.
Não sei como eu devo reagir à todas essas coisas. Estou extremamente cansada e esgotada com tudo o que aconteceu hoje. Preciso de um tempo para processar e preciso conversar com Jorge sobre isso, sobre tudo. Sinto a falta dele nos meus dias também.”
Brianna encarou aquela página escrita por um longo tempo e bem, talvez tivesse sido um pouco exagerado escrever sobre a falta que sentia de Jorge, mas ele deixou claro que ela precisava escrever sobre os seus sentimentos, de forma verdadeira e sincera. Aquilo era, sem a menor dúvida, o mais verdadeira e sincera que ela poderia estar sendo com ela mesma e naquele momento, isso era tudo o que realmente importava para ela.