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Millie.  -Você parece melhor hoje. Posso saber o motivo? -Minha mãe perguntou, assim que foi servido nosso jantar. Não havia reparado, mas estava sorrindo pro telefone já haviam alguns bons minutos. Levantei a cabeça e a sacudi, olhando dela para meu pai que não tirava os olhos do prato. -Nenhum específico. Só estou animada com a viagem. -Dei de ombros colocando um pouco do peixe na boca. Ela mastigou a comida devagar, me avaliando para ver se acreditava na minha resposta. Por um milagre, decidiu ignorar e mudou de assunto. -Londres... Faz muito tempo que não vou lá. Você deveria aproveitar e passar na casa dos seus avós. -Eu? Não. Vou estar muito ocupada. -Rescusei, com vontade de revirar os olhos. Gostava dos meus avós, mas ir até lá significava que eu teria que voltar no assunto das minhas fotos. Se minha mãe já era insuportável naquele aspecto a mãe dela era ainda pior. -Ocupada demais para visitar sua família? Tenho certeza de que meia hora não ia fazer tanta diferença assim. -Ela insistiu, no seu melhor tom de diálogo causal. Era fingimento. Ela estava irritada. -Vou ver se consigo. Ok? Mas não prometo nada. Ela deu uma espécie de sorriso convencido e assentiu. -Quem sabe nós possamos ir com você. Depois do desfile em Toronto vou estar livre. Larguei o garfo no prato com um estalido ruidoso e olhei para ela. -Mãe, isso não é férias. Estou indo a trabalho, você sabe muito bem disso. Ao invés de olhar para mim, ela virou o rosto em direção ao meu pai. Ele fez um gesto com o ombro, sinalizando que não entraria na discussão. Ele não gostava da vovó. Não gostava de ninguém da família dela que não fosse o tio Oliver. -Não iremos atrapalhar. Além disso podemos ir a festa de lançamento do filme. Ou você não quer a sua família presente? Dei uma risada, descrente do que tinha ouvido. -Desde quando você faz isso? Até onde me lembro os únicos eventos dos meus trabalhos que você vai são os que indiretamente tem a ver com você. Ela se calou, espremendo os lábios. Dava para sentir a tensão se formando enquanto nossos olhares duelavam. Ela tinha sido pega de surpresa por aquela afirmação e como sempre iria recorrer ao meu pai. -Robert, está vendo a forma como sua filha fala comigo? Meu pai levantou a cabeça e limpou os lábios no guardanapo. -Ela tem razão. Nunca fizemos isso. -Respondeu usando toda a cautela possivel. Lhe mandei um sorriso, mas logo mamãe falou outra vez. -Isso não quer dizer que não podemos fazer agora. A Ava chega amanhã da colônia de férias e ela vai adorar viajar. Está decidido, vamos para Londres. Coloquei os cotovelos na mesa mandando para o espaço as regras ridículas de etiqueta. Ela não ia parar nunca de tentar me controlar. -Eu disse que não, Mãe. Vou viajar sozinha com o David e a Rose. Fim de história. Ia levantar da mesa quando meu pai tocou meu braço. -Acalme-se, Millie. -Ele pediu, mas na verdade era uma ordem, depois virou sério para minha mãe. -E quanto a você Kelly, seja menos intransigente, se a Millie não nos quer na viagem não vamos. -Voce está mesmo compactuando com essa rebeldia? Ela não pode nos dizer o que fazer. -Apontou o dedo para mim com desdém. -A vida é minha e eu tenho vinte e um anos. Posso muito bem me negar a andar por aí com a minha família para todo lugar. Já passamos dessa fase a muito tempo. -Respondi afastando os dedos do meu pai. Não queria que eles fossem comigo. Londres era talvez o único lugar onde eu poderia ficar finalmente livre para esquecer tudo o que tinha acontecido e eu já podia prever todas as coisas que ela me obrigaria a fazer ou me convenceria a não fazer enquanto estivessemos lá. -Você é tão adulta, não é? Sabe tanto o que é melhor para você que se envolveu com um moleque qualquer que te trocou na primeira oportunidade. -Kelly! -Meu pai advertiu, soando mais rude dessa vez. Desde que eu tinha terminado com Finn ela nunca havia aberto a boca para dizer nada, mas era muito óbvio que não deixaria aquilo passar tão facilmente. Estava só esperando que eu me recuperasse para me destruir de novo. -Você não sabe de nada, mãe. -Falei balançando a cabeça, embora eu soubesse que ela sabia sim. Quando fui embora ela ficou na festa e muito provavelmente viu Finn indo para casa com Susan. -Ja chega! Vamos parar com essa discussão! -Meu pai interviu antes que ela dissesse mais alguma coisa. -Deus! Será que não podemos jantar em paz nenhuma vez? Me obriguei a sentar outra vez vendo ela se esforçar para prestar atenção na comida depois de ser calada por meu pai. Mexi no peixe sem vontade ainda sentindo a tensão me sufocar. Havia perdido a fome. -Você está comendo cada vez menos. -Mamãe disse olhando de novo para mim. -Estou sem fome agora. -Respondi baixo cutucando o creme no meu prato. O simples pensamento de encosta-lo em minha boca me deu embrulho no estômago imaginando o sabor adocicado da comida. -Esta tudo bem, princesa? Você ficou meio pálida. -Meu pai perguntou esticando o braço para tocar minha mão. Seus olhos se alarmaram. -Você está fria também. Fiz uma negação com a cabeça, mas o movimento me causou uma vertigem e meus olhos se fecharam. Contei de dez até zero devagar rezando para que a sensação acabasse logo. -Robert, vamos, vamos levá-la ao hospital. Ela não está bem. -Minha mãe gritou e de repente a senti perto de mim. Meu pai alcançou meu outro braço e eu me agarrei nele sentindo o mundo começar a girar. Consegui abrir os olhos e encarei minha mãe do outro lado, seu rosto desesperado me fitava. -Você não. -Murmurei quase sem voz. Seus olhos se arregalaram e ela deu um passo para trás se distanciando ainda mais. Meu pai continuou me segurando. -Você consegue levantar? -Perguntou puxando meu braço. Afirmei com a cabeça e ele me ajudou a ficar de pé. Senti minha boca começar a salivar e entortei a cabeça para o lado. Uma dor aguda atingiu meu estômago e o jato quente do vômito rompeu para fora. Minha mãe se afastou dando espaço para que eu vomitasse no chão. -Robert! Depressa! Leve-a! -Gritou ela movendo as mãos para que saíssemos. A empregada apareceu na minha frente me entregando uma caixa de lenços. Limpei os lábios parando de encarar a pequena poça em meus pés. Que nojo. -Vamos, querida. Venha. Meu pai agarrou minha cintura e eu passei meu braço sem força em seu ombro. O carro dele já estava parado no lado de fora da casa e ele abriu a porta para mim. -Estou bem. Pode me soltar. -Falei quando entrei lá dentro. Ele saiu correndo para entrar do outro lado. Apoiei meu rosto na mão fechando bem os olhos. Estava me sentindo fraca, anjoada e com um gosto terrível na boca e a rapidez com a qual ele dirigia só parecia aumentar a sensação. Quando chegamos tive a impressão de que ele faria um escândalo na recepção caso eu não fosse atendida logo e a atendente nos mandou direto para o consultório. Assim que entramos lá dentro afastei as mãos do meu pai que parecia muito preocupado com a possibilidade de eu desmaiar a qualquer momento. -Estou bem. Relaxa. -Falei forçando-o a se sentar na cadeira ao meu lado. Ele foi e segurou a testa suada embora o ar condicionado estivesse ligado no máximo. Demorou apenas alguns minutos e um médico entrou. Eu já havia sido atendida por ele inúmeras vezes e o reconheci. Era um loiro, bonito, mas tinha uma grande pinta marrom no pescoço, o que fazia com que toda a atenção fosse retirada de seu rosto. -O que aconteceu? -Ele perguntou, já se aproximando de mim para abaixar a pele sob meus olhos. -Nada demais. Me senti enjoada e vomitei um pouco. -Falei prendendo ligeiramente a respiração. Seu perfume era horrível. Ele assentiu e deu a volta na mesa, parecendo desapontado. Talvez por que tivesse sido chamado para uma emergência enquanto eu só tinha tido um enjôo. -Desde quando está se sentindo assim? -Perguntou, olhando diretamente para o computador. Parei um pouco para pensar e então respondi: -Algumas semanas. Na verdade acontece mais quando eu fico nervosa ou ansiosa com alguma coisa. -Me lembrei daquele detalhe. -E dor? Sentiu alguma dor? -Não. Só desconforto no estômago. Ele digitou alguma coisa no computador e depois de alguns minutos uma enfermeira entrou na sala. -Vamos tirar um pouco de sangue para um exame. -Ela explicou, amarrando uma fita apertada em meu braço. Afastei o rosto para o lado enquanto não muito sultimente ela enfiava uma agulha em minha veia. -Você tem tido um ciclo menstrual regular? -O dr. Pinta marrom perguntou. Senti os olhos do meu pai se voltarem direto para mim e afirmei com a cabeça já prevendo sua preocupação infundada. -Sim. Está tudo bem. Depois de colher o meu sangue a enfermeira se retirou e então fui levada a uma sala de observação. Somente quando esvaziei um soro inteiro me chamaram novamente para o consultório. Meu pai me seguia segurando meu braço como se temesse que eu desmoronasse, mas eu já me sentia muito melhor em comparação quando havia chegado ali. O dr. Pinta segurava um envolope de papel na mão e olhou para mim pela primeira vez desde que eu havia chegado. Meu pai não se sentou dessa vez, ficou atrás da minha cadeira segurando meus ombros com uma firmeza exagerada. -Vamos, o que ela tem? -Ele apressou o médico. -Bem, suspeitei que fosse uma gravidez inicialmente, mas os resultados foram incompatíveis. Soltei a respiração que nem sabia que estava prendendo e meu pai também relaxou. Grávida. Era só o que faltava. -Mas você está com uma pequena inflamação no pâncreas. Nada muito preocupante, mas pode se tornar se não mudar alguns hábitos. Voltei a ficar tensa novamente e meu pai se sentou ao meu lado. -O que isso quer dizer? -Perguntou, antes que eu mesma pudesse falar alguma coisa. O médico passou as folhas para o lado e abriu alguma coisa no computador. -Suas taxas de glicemia deram baixas, o que pode indicar que você não está se alimentando muito bem. -Ela passou quase três dias sem comer nada, nem levantar da cama na semana passada. Deve ter sido isso. -Meu pai resmungou, nitidamente aborrecido. Quem tinha tido a brilhante ideia de deixá-lo me levar?  -Pai! -Adverti, envergonhada e cobri os olhos com a mão.  -Pode ser. -Dr. Pinta concordou. - De qualquer forma tem que melhorar a alimentação e tomar alguns comprimidos antiinflamatórios. Fazendo isso vai ficar tudo bem. -Não vou precisar ficar de repouso nem nada disso, não é? Tenho uma viagem no final da semana, não posso adiar. -Perguntei realmente preocupada. O médico fez que não e se alongou para retirar uma folha da copiadora. -Não precisa, mas vai ser necessário que se consulte novamente daqui a algumas semanas. Além disso, não pode ingerir álcool por pelo menos um mês. Quis dar uma risada, mas fiquei com raiva demais para fazer isso. Ir para Londres e não beber era quase impossível. -Ela não vai. Pode ter certeza disso. -Meu pai garantiu, pegando a folha onde o médico havia impresso a receita. Quando saímos do consultório, a mesma atendente nos chamou no balcão. -Você precisa assinar aqui para ser liberada. -Ela disse passando para mim uma folha por cima da pedra de mármore. Ela estava tensa e nervosa, ainda efeito dos gritos que meu pai havia dado quando chegamos ali mais cedo. Tentei rabiscar no papel mas a caneta estava sem tinta. -Não funciona. -Falei devolvendo a caneta. Ela se afastou do balcão e pude ver a enorme barriga que antes ficava escondida por trás. Estava grávida. Muito grávida. Seu braço se esticou para pegar uma caneta nova em um estojo e ao fazer isso sem querer acabou derrubando tudo no chão. Ela ia levantar para apanhar quando eu a parei. -Deixa. Eu pego. Dei a volta no balcão sem muita certeza se poderia fazer isso e peguei as canetas que caíram. Ela deu um sorriso em agradecimento e pegou o papel para que eu assinasse. Do outro lado eu podia ver a tela do computador aberta em uma página online do histórico médico da minha família. Por alguma razão demorei para assinar, concentrada no que estava vendo. A última assinatura era um rabisco m*l desenhado, uma caligrafia torta mas que eu era perfeitamente capaz de reconhecer. -Filha, depressa. Está começando a entrar mais pessoas aqui dentro. A voz do meu pai me tirou dos pensamentos e eu assinei a folha entregando de volta a atendente. Quase tivemos que correr para voltar para o carro pois a rua ficou nitidamente um pouco mais cheia. Assim que entramos meu pai ligou o carro e arrancou. -Pai. -O chamei, lhe tirando parcialmente a concentração do volante. -O que o Finn foi fazer no hospital, e por que ele estava no histórico médico do nosso plano? Meu pai não esboçou nenhuma reação e não olhou para mim. -Não faço ideia do que você está falando. Quem é Finn? Soltei o ar pelo nariz, sem paciência. -Você sabe muito bem. Por que não está me contando o que aconteceu? Levantei as pernas e coloquei os pés em cima do painel do carro. Ele odiava que fizesse aquilo em sua Land Rover, mas era um castigo para seu comportamento evasivo. Ao invés de brigar ele deu uma risada por baixo das grandes bochechas. -Ele levou uma surra dos nossos seguranças. -Continuou rindo como se estivesse se lembrando exatamente da cena. Voltei os pés para o chão de repente. Me virando totalmente para ele. -Ele o que? Que merda é essa que está me dizendo? Papai olhou para mim franzido o cenho em desagrado ao palavrão, mas eu não me importei nenhum pouco. -Ele foi no condomínio, tentou entrar para falar com você e os seguranças o irritaram. Tenho que admitir que ele tem coragem, ou é burro demais. Pestanejei, sendo completamente pega de surpresa. -Ele foi...quando isso aconteceu? -A umas duas semanas. Cheguei bem a tempo de impedir que o matassem. O trouxe para o hospital, ele estava totalmente ferrado. Engoli em seco voltando a me endireitar no banco. Havia pensado que Finn não tinha ido atrás de mim, que só nos encontramos por que eu invadi seu apartamento, mas aquilo mudava tudo. -Por que bateram nele? -Perguntei, olhando para meu pai. Ele fez uma careta, não querendo relembrar. -Pai, por que bateram nele? -Insisti, com mais firmeza. -Não sei direito, o Finn disse que insinuaram alguma coisa sobre você e ele perdeu a cabeça. -Ah. Claro. -Resmunguei com raiva. Nao podia negar que aquilo me dava uma pequena pontinha de alegria em saber que ele havia me defendido, isso era a cara dele, mas ao mesmo tempo fiquei com raiva. -Você não me contou nada. Espero que pelo menos esses seguranças tenham pagado pelo que fizeram. Ele sorriu e afirmou com a cabeça. -Foram demitidos. Além disso não contei nada por que o garoto bem merecia umas porradas por ter feito você sofrer. Tentei me conter, mas acabei rindo. Até onde eu tinha verificado Finn estava bem, não havia nenhuma marca em seu corpo além das que eu tinha deixado, apesar de não ser um preço muito justo. A culpa era de Susan e não dele. -Ele também não me contou nada. Vocês dois me pagam. -O ameacei fingindo estar irritada. Meu pai virou o rosto para mim, desconfiado. -Hum, então ele teve a oportunidade? Foi por isso que saiu correndo naquele dia? Para encontrá-lo? Você não voltou para dormir em casa. Bati a palma da mão na testa, percebendo que havia falado demais. Meu pai riu e esfregou meu joelho. -Tudo bem, princesa. Ele é um doido, com certeza não regula muito bem, mas gosta de você de verdade. Senti minhas bochechas esquentarem e olhei para ele. -Vocês conversaram? Ele contou o que aconteceu? -Contou. Não fiquei nenhum pouco feliz em saber da outra mulher, mas ele realmente parecia sem saída. E queria seu perdão. Você o perdoou? Fiz uma pausa para pensar e respirei fundo. As coisas entre Finn e eu ficavam ótimas quando eu não precisava pensar nela nem em todo o resto. Faltavam alguns dias para nos encontrarmos novamente e eu estava quase enlouquecendo de ansiedade, mas perdoar? -Não sei. As coisas ainda são complicadas, estou tentando ir devagar. Ele assentiu, como se realmente entendesse, mas como entenderia? Eu tinha certeza de que Finn tinha contado tudo, mas não o fato de que Susan havia se proveitado dele quando era criança. Ele não contava isso pra ninguém por que não conseguia admitir nem para si mesmo. Fiquei com vontade de falar ao meu pai, mas não disse. Não era algo meu e eu já tinha feito coisas demais sobre um assunto que nem mesmo era da minha conta. -Faça as coisas no seu tempo, você é jovem demais para ter que lidar com esse tipo de problema. Se for para acontecer, vai acontecer independentemente do quanto você lute contra. -Meu pai disse. De repente parecendo compreender muito mais do que eu imaginava. Passei o restante do caminho em silêncio, tentando entender aquelas palavras. Talvez ele falasse apenas por experiência própria, uma vez que meus pais tiveram dificuldades para ficarem juntos no início e se ele conseguiu passar por cima de todos os defeitos da minha mãe, talvez eu também conseguisse superar o passado de Finn, só não tinha certeza se ele mesmo conseguiria. Assim que entramos em casa, minha mãe correu até mim. Havia trocado de roupa, estava usando um hobe de seda mas não estava com cara de quem iria dormir tão cedo. Estava desesperada. -Filha, o que foi? Você melhorou, está bem? -Perguntou, passando as mãos pelo meu rosto como se quisesse saber que eu era mesmo real. Dei um passo para trás me afastando de seu toque superprotetor. Em outro momento eu gostaria de ter sua atenção, mas não quando ainda não tinha sequer esquecido o que ela havia me dito mais cedo. -Estou bem. Vou me deitar. A deixei com a expressão mais confusa do mundo olhando para meu pai que não disse nada e subi para meu quarto. Peguei o celular vendo que Finn tinha continuado me mandando mensagens, as quais eu não havia respondido. Estava chateada por que ele não me disse que tinha ido a minha casa, mais chateada ainda por ter ficado tão machucado por minha causa. Desculpe. Passei m*l, cheguei agora do hospital. Mandei aquilo e segui para dentro do banheiro. Ainda podia sentir o cheiro de vômito misturado com o odor típico de hospital e a última coisa que precisava era ter mais um acesso de enjôo. Assim que tirei as roupas meu celular tocou e eu esperei até que a chamada caísse. Era ele. E além da ligação haviam outras mil mensagens. O que aconteceu? Você está bem? Fale comigo. Droga! Me atenda! Millie! Millieeeee!!! Me atende! Um sorriso involuntário escapou da minha boca, mas eu não podia ser tão c***l daquela forma. Peguei o celular e retornei a ligação enquanto enchia a banheira. Ele atendeu imediatamente. -Você não pode fazer isso. O que aconteceu? -Perguntou assim que coloquei a chamada em alto falante. -Nada demais. Tive um enjôo. Me virei para verificar a temperatura da água, deixando o celular sobre o banco. Ele bufou. -Por que não me disse? Eu fiquei preocupado. -Ah é? Você também não me disse que veio aqui. Nem que levou uma baita surra dos seguranças. Qual a diferença? Ele hesitou, parecendo tentar se lembrar. Coloquei os pés na água quente e deslizei para dentro da banheira cheia de espumas. -Vou fazer uma vídeo chamada. Preciso te ver. -Ele disse, ignorando minha pergunta. Peguei o celular rapidamente. -Não. Não pode. Estou... Estou desarrumada. -Inventei, instantanemente afundando mais sob a espuma. Ele bufou novamente. -Que besteira. Vou ligar. É melhor me atender. Ia protestar quando a ligação foi desligada e logo em seguida a tela se iluminou de novo mostrando sua solicitação no Skype. Foi a minha vez de bufar. Por que eu havia desbloqueado ele? Mesmo contra minha vontade me peguei alinhando os fios de cabelo em um coque no alto da cabeça e verificando minha imagem no espelho perto da banheira. Eu poderia sair e atender lá fora, mas estava confortável demais lá dentro. Espalhei a espuma para cima do meu peito e atendi. A imagem travou nos primeiros instantes e só depois pude vê-lo completamente. Estava sentado na cama, sem camisa, o rosto quase perto demais da câmera mas eu ainda consegui ver um detalhe: ele não estava no apartamento.
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