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Finn.
Em algum momento da noite senti o corpo de Millie rolar para fora da cama. Eu estava cansado e dolorido e a bebida me deixava terminantemente mais lento, mas ainda assim notei ela se afastando. Sempre notaria, por que automaticamente meu corpo ficou com saudade.
Abri os olhos devagar, apenas o suficiente para que ela não percebesse que eu havia acordado. Seu corpo nu apareceu na minha frente mas ela não estava olhando para meu rosto exatamente e sim para a cama minúscula onde meu braço estendido continuava a sua espera.
Se abaixando, Millie apanhou minha camisa e a vestiu abotoando somente alguns botões da parte de cima. Seus cabelos estavam bagunçados e ela os penteou com os dedos os prendendo no topo da cabeça. Por um momento quase entrei em Pânico, pensando que ela estava se vestindo para ir embora, mas quando vi que ela não vestiu mais nada consegui me acalmar. Estava me sentindo esquisito, compilado a levantar a cabeça e tentar conversar mas ao mesmo tempo fiquei parado apenas observando. Ela olhou para mim e fechei os olhos novamente. Seus passos se arrastaram e ouvi o barulho do fecho da janela se abrindo.
Uma brisa suave entrou e então experimentei abrir os olhos outra vez. Ela estava inclinada na janela com o telefone nas mãos olhando para a lua distante. Havia algo passando por sua cabeça, eu queria saber o que, mas temia tanto aquela conversa que resolvi não dizer nada.
Depois de um tempo para se decidir ela ligou o celular e o colocou no ouvido. Estava nervosa, seus pés a balançavam de um lado para o outro enquanto esperava alguém atender.
Que não seja um motorista.
Comecei a pedir silenciosamente. Não queria que ela fosse embora de jeito nenhum. Agora curado da embriaguez ficava sem nenhuma desculpa que a convencesse a ficar. Depois de um tempo ela murmurou de maneira aflita:
-David? Está acordado? Desculpa ligar a essa hora. Eu só preciso falar com alguém.
Esse alguém tinha que ser a merda do meu tio? Sério? Revirei os olhos como se ela pudesse me ver, queria voltar a dormir sabendo que provavelmente ela iria dizer que estava arrependida de ter ficado comigo então tentei fazer isso fechando bem os olhos. Obviamente não consegui.
-Não estou em casa. Estou num hotel quase na saída de Vancouver, o Finn estava bêbado ontem a noite, eu o trouxe para cá. Ele não queria ir pra casa. Nós ficamos e agora eu estou desesperada.
Agora seu tom de voz estava mais alto vomitando as palavras como se David fosse entender a situação. Ele não ia. Queria que ela colocasse em alto falante.
-Isso não importa. Ele teve uma reunião com meu tio, parece que os dois vão trabalhar juntos agora. Fui até lá por que a Gia queria inventar que o Finn estava dando em cima dela. Eu juro que era só isso, mas aí viemos para cá e não sei... Eu perdi a cabeça.
Ela afastou os cabelos para trás recomeçando a balançar de um lado para o outro. Então era isso? A Gia queria me encrencar? Mas por que? A única coisa que eu conseguia me lembrar da noite passada antes de Millie chegar era de Gia falando alguma besteira, perguntando por que nós dois tínhamos terminado e outras coisas das quais eu nem mesmo lembrava.
-Eu deveria ter ido embora. Deveria tê-lo deixado aqui... Mas é tão difícil, tão difícil David..
Sua voz falhou, embargada e seu tom diminuiu outra vez. Se ela não estivesse chorando iria chorar a qualquer momento. Houve um momento de silêncio do que imaginei ser David tentando acalma-la.
-Não sei como as coisas vão ficar. Ele disse que agora vai poder alugar um apartamento pra Susan morar e que depois que ela arranjar um emprego a ligação dos dois vai acabar. Mas eu não sei se posso acreditar nisso, quer dizer, eu quero, mas e se não acontecer?
Mais um momento de silêncio. Rezei para que pelo menos uma vez na vida David me ajudasse e dissesse que eu estava falando a verdade. Pelo som abafado de choro eu sabia que provavelmente tinha sido o oposto.
-Eu não aguento mais isso. -Ela se sentou sobre uma cadeira, passando as mãos pelos olhos. -Não vai ter fim, ela sempre vai ficar por perto. Ele nem se quer enxerga o quanto ela faz m*l a ele.
Engoli em seco e fechei os olhos. Minha cabeça doía e aquela conversa não estava ajudando em nada. Eu já tinha feito de tudo para demonstrar o que eu sentia e mesmo assim era inútil. Não esperei para ouvir mais nada, já era mais do que o suficiente. Tirei o lençol que me cobria e joguei as pernas para fora da cama ficando de costas para ela. Millie soltou uma exclamação de surpresa que veio junto com um soluço mas eu não me movi para encara-la.
-Eu ligo depois. Tenho que desligar. -Ela disse encerrando a ligação.
Apoiei os cotovelos nos joelhos e esperei até que ela dissesse alguma coisa agora que via que eu já estava acordado, que havia escutado tudo. Ela resfolegou o rosto nas mãos e levantou-se.
-Agora você escuta minhas conversas escondido? -Ela disse, trocando o tom chorado por um irritado e isso me irritou também.
-Talvez assim eu possa saber o que você pensa. Já que não conversa comigo que era o que você deveria fazer.
Ela emitiu uma risada de descrença. Depois tive certeza de que apanhou alguma coisa no chão. A calça. Estava se vestindo.
-Por que eu conversaria com você? Para ouvir sempre as mesmas coisas? Já estou cansada.
Respirei fundo e levantei, pouco me importando que estivesse nu. Ela estava colocando a calça e parou por um segundo quando me viu.
-Esta cansada? Sério? Cansada de me ver correndo atrás de você como um i****a? Cansada de não fazer nada e de colocar a culpa toda em cima de mim?
Talvez tenha perdido um pouco da noção da minha voz. Ela estremeceu e pulou para dentro da calça com mais rapidez. Estava furiosa.
-Não pedi que viesse atrás de mim. Não pedi por nada nisso. Você fica me cercando, me manipulando, me distraindo, não tenho como fugir pra sempre.
Virando de costas ela tirou minha camisa, apanhando a dela no chão.
Passei a mão pelo rosto e vesti minha cueca. Ela estava impossível.
-Então foi isso que eu fiz ontem? Eu te manipulei para t*****r comigo? Você não queria e eu te forcei, não foi isso?
Abotoando o sutiã ela me ignorou e eu perdi a paciência. Fui até ela e quase segurei seu braço para faze-la me olhar, mas não fiz. Estive fazendo muito aquilo ultimamente e percebi que era errado.
-Olhe pra mim. -Pedi, mais uma vez respirando fundo.
Ela balançou a cabeça e continuou tentando fechar o sutiã.
Eu pensei que as coisas seriam complicadas quando acordassemos mas não fazia a menor ideia de que para ela o que tínhamos feito simplesmente não significava nada. Parei de insistir.
-Me desculpe por ter te forçado. Isso realmente nunca mais vai acontecer.
Me sentei na cama para colocar a calça. Ela virou a cabeça, balançando, como se o que eu tivesse dito não fizesse o menor sentido.
-Você não me forçou. Eu quis. Era isso que você queria ouvir?
-Sim. Mas faz alguma diferença? Olho pra você e a única coisa que consego ver é seu arrependimento.
Millie fechou os olhos inspirando o ar abafado para dentro depois exalando para fora. Como ela poderia estar tão perturbada daquele jeito?
-Eu não me arrependi. -Murmurou e foi escorregando até sentar no chão. -Não me arrependi de nada.
Ajustei o cinto na calça e levantei. Não podia negar que era o que eu queria ouvir, mas ainda não era o bastante.
-Não era o que parecia quando você estava falando com o David.
Virei as costas, pegando minha camisa que ela havia jogado na cama.
-Eu só disse que não deveria ter acontecido. Agora estamos brigando outra vez e é exatamente por causa disso.
-Estamos brigando por que você se recusar a conversar comigo! Eu já tentei de todo jeito explicar e dar um jeito nessa situação, mas você é teimosa, cabeça dura demais.
Fui em direção ao banheiro, deixando Millie com uma expressão indecifrável no rosto. Lá dentro fechei a porta e me encarei no espelho minúsculo em cima da pia. Com a camisa aberta eu podia ver os intensos tons de roxo marcados em minha pele que iam desde o pescoço até meu peito. Entre as costelas haviam mais marcas dessa vez de unhas. Balancei a cabeça, mas um sorriso triste invadiu meu rosto. Como ela podia abrir a boca para dizer que aquilo foi um erro?
Depois de passar mais tempo do que o necessário para fechar a camisa, voltei para o quarto. Ela continuava sentada no chão mas dessa vez olhou direto para mim. Seu rosto que antes estava inexpressivo agora estava completemente obscuro, com uma sombra.
-Você acha que eu gosto disso não é? Acha que eu estou me fazendo de difícil de propósito só para te ver correndo atrás de mim.
Fui até a cama e me sentei na sua frente.
-Você sempre julga as minhas escolhas, mas é você quem sempre escolhe me deixar, escolhe não me ouvir e tirar suas próprias conclusões sobre tudo. O que quer que eu pense?
Ela balançou a cabeça enquanto colocava algumas mechas de cabelo para trás das orelhas.
-Você não entende. Pra você a minha única razão para ficar desse jeito é ciúmes, mas não é. Se você decidisse ajudar e se aproximar de qualquer outra pessoa eu poderia perdoar, mas ela não.
Espremi os olhos, tentando enxergar por trás daquelas palavras. Até ali tudo o que eu pensava era que Millie tinha ciúmes, e ela me dizer aquilo me deixava completemente sem entender mais nada.
-O que tem de tão errado assim com a Susan? Por que especificamente dela eu não posso me aproximar?
Millie me fitou, desgostosa, como se a resposta para aquilo fosse muito óbvia e eu fosse burro demais para perceber. Eu reconhecia aquele olhar. Era o mesmo de David.
-Por que você não vê nada de errado no que ela fez no passado. Antes você era uma criança e não percebia, agora a única explicação é que você simplesmente não quer enxergar.
-Ja fazem oito anos Millie. -Murmurei, completemente exausto. Quando contei tudo a ela fiquei surpreso que Millie havia entendido, mas ali percebi o óbvio, ela nunca ia entender. -Fui eu quem começou isso, a Susan não fez nada.
Millie limpou os olhos, parecendo aborrecida. Depois levantou.
-Não dá. Simplesmente não dá. -Ela balançou a cabeça e veio na minha direção. Apesar de se conter seus olhos estavam cheios de lágrimas outra vez, ela ergueu o dedo trêmulo apontando para mim -Você nunca vai perceber. E eu... Eu te amo demais para aguentar ver isso e não conseguir fazer nada para te mostrar.
Ela ia sair quando segurei seu braço.
-Espere. -Pedi me levantando e mantive a força no punho lhe mostrando que não era uma opção sair.
Ela ficou no lugar, mas com o rosto virado. Ouvir aquilo fez com que tudo se conectasse dentro de mim. Na noite passada me lembrei de ter dito que a amava inúmeras vezes e ela não respondeu. Agora que a ouvi claramente nem conseguia acreditar. Tive a impressão de que embora não fosse verdade havia se passado muito tempo desde que tinha ouvido aquilo pela última vez.
-Repita. -Pedi com a respiração acelerada.
De costas para mim podia ver os ombros dela sacudindo sinalizando seu choro. Queria acalma-la, mas antes precisava ouvir de novo. Ela hesitou, lutando para manter a respiração controlada.
-Eu disse... -ela virou o rosto para mim. Seus olhos castanhos demonstrando que estava prestes a desmoronar. -que te amo.
Aliviei o aperto em seu braço sentindo todo meu corpo relaxar também. Ela abriu os lábios para me dizer alguma coisa mas eu a impedi chegando mais perto. Não queria ouvir mais nada, especialmente sabendo que viria um "mas" depois daquilo.
-Isso. -Encostei o dedo em seus lábios. -Não diga mais nada.
Ela abaixou a cabeça desviando do meu olhar. A puxei para mim e com passos hesitantes ela veio para me abraçar. Segurei firme em sua cintura e ela envolveu os braços em meus ombros. Instantanemente senti seu corpo pequeno balançar outra vez e deixei que ela chorasse em meu peito.
Não entendia como havíamos passado de uma briga intensa para aquilo, mas também não me importava. Tudo o que eu tinha estava em meus braços e dessa vez eu nunca mais deixaria que ela escapasse outra vez. Enfiei a mão em seus cabelos até sentir a pele fina do pescoço entre meus dedos. Talvez a noite passada tenha sido o melhor sexo que tínhamos feito, mas nada se comparava aquilo, nada se comparava com aquela conexão. Percebi que durante aquelas horas Millie havia entregado a mim somente seu corpo, e ali, naquele instante finalmente me entregava seu coração.
-Vamos superar tudo isso. Sei que você tem medo por mim, mas agora eu sei me cuidar, só preciso que fique comigo, me dê força para continuar. -Sussurrei em seu ouvido depois de engolir o nó na minha garganta e perceber que ela havia se acalmado.
Ela suspirou, como se não aguentasse ouvir minhas palavras, mas não se afastou. Senti seus lábios roçando em minha clavícula.
-Até quando? Preciso saber até quando.
-Até quando o que? -Perguntei, realmente sem entender.
Millie levantou a cabeça para me olhar. Sua mão inconscientemente encostou em minha bochecha.
-Até quando ela vai ficar. Até quando você precisa estar perto dela...
Fechei os olhos, respirando devagar. Queria poder ter uma resposta exata para dar, mas a verdade era que mesmo que eu já tivesse um plano, não sabia em quanto tempo conseguiria coloca-lo em prática.
-Não sei. -Adimiti, deixando meus ombros caírem. -Algumas semanas, um mês, talvez. Consigo um apartamento pra ela antes disso, mas não posso simplesmente dar as costas quando isso acontecer. Tem a garota, ela ficou apegada a mim.
Millie assentiu lentamente. Achei que fosse brigar comigo, mas não. Ela respirou fundo e se sentou na cama, segurando minha mão. Ficamos em silêncio por um tempo, ela tentando talvez pensar em tudo e eu só rezando para que aquilo significasse ao menos algo bom.
Depois de um momento ela ergueu o queixo, mais resolutiva.
-Vou viajar. Tenho que passar quase três meses fora e não vou voltar nesse período. -Hesitou, colocando uma mecha do meu cabelo para trás. Fechei os olhos, quase roronando de saudade daquele toque. -Quando eu voltar, isso tudo vai ter acabado?
Abri os olhos rápido, sem acreditar.
-Sim. Com certeza. -Afirmei alarmado, mas logo me dei conta da outra parte da conversa. -Tres meses? Isso...
-Vai ser bom pra mim ficar longe de tudo isso. -Ela me interrompeu, tirando a mão do meu cabelo. Quase a puxei de volta. -Não vou aguentar ficar para ver. Preciso ficar longe.
As batidas do meu coração aceleraram com tristeza. Três meses era muito tempo longe dela, mas para quem não tinha nenhuma esperança, de repente me pareceu uma condição justa.
-Tudo bem. Até lá eu não vou mais ter nenhuma ligação com a Susan.
Ela balançou a cabeça afirmativamente, apesar de parecer desgostosa ao ouvir o nome de Susan.
-Acha que isso vai ser mesmo possível? Eu vou estar longe, você vai ficar com ela o tempo todo e... Tem essa criança. Você gosta dela.
Passei a mão pelo rosto tentando pensar a frente. Eu só tinha poucas certezas.
-Eu não vou ficar o tempo todo com ela. Na verdade até agora nunca fiquei. O máximo que nos víamos era pela manhã antes de eu ir trabalhar e quando chegava ela já estava dormindo. Isso não é um problema.
Millie deu um meio sorriso, mas senti que ficou feliz em saber disso. Depois sua expressão mudou outra vez.
-E a garota?
Estava com medo de que ela falasse da Sarah outra vez. Realmente não era algo que eu gostaria de pensar. Foi pouco tempo, mas eu sentia uma ligação com aquela menina.
-Vai ser difícil, mas ela vai se acostumar. De toda forma eu não quero me envolver demais, nem representar nada pra ela. Vai ser bom que a gente se afaste. Ela não tem pai, não quero que pense que...
-Nem fale isso. -Ela me cortou, rejeitando a ideia com a cabeça. -Não quero nem pensar nisso. Ela não tem culpa de nada.
-Eu sei. Por isso tento manter o máximo de distância. -Concordei, mesmo que fosse difícil.
Millie suspirou, desenhando um padrão circular nas costas da minha mão. Estava olhando para frente, perdida em pensamentos.
Pigarreei com medo da minha próxima pergunta.
-Estamos bem. Não estamos? Quer dizer, quando isso acabar...
-Quando acabar, estaremos. -Ela disse, sem deixar que eu terminasse. -Até la podemos nos ver, mas não quero ir até a sua casa, ou sei lá, a casa de vocês.
Dei uma risada sem graça ao vê-la fazendo uma careta.
-Então não voltamos? Não estamos namorando?
Ela hesitou pensativa. Apertou meus dedos e levantou.
-Acho melhor irmos com calma. As coisas aconteceram muito rápido da primeira vez e deu completamente errado.
-Certo. -Arrastei a palavra, tentando me contentar com aquilo. -Acho que a partir de agora temos que conversar, de verdade, parar de esconder as coisas um do outro.
Millie franziu o cenho.
-O que eu escondi de você?
-Ah, você não sabe? -Respondi, levantando a sobrancelha, mas não estava exatamente irritado. O que era um milagre. -Alem de ter mentido pra mim sobre ela, você talvez tenha se esquecido de dizer que o Jacob te beijou na festa.
Seus olhos se arregalaram e ela passou a mão na testa. Quase a vi ruborizar, não de vergonha, mas de raiva.
-Ela te contou, não foi?
-Sim. Me contou no primeiro dia em que nos encontramos.
Millie bufou fechando as mãos em punhos ao lado do corpo.
-Aposto que ela inventou uma boa história. Não foi nada do jeito que ela disse.
Dei uma risada, me divertindo com sua raiva. Ela podia ser complicada, mas eu era desesperadamente apaixonado por isso. Levantei e dei a volta em seu corpo, tocando seus ombros tensos por trás. Ela estava furiosa.
-Ela disse que foi a força, que ele te agarrou e que só te soltou por que ela jogou uma bebida em vocês. -Falei, próximo ao seu ouvido.
Ouvi uma exclamação de surpresa escapar de sua boca e ela se virou para mim. Estava chocada.
-Ela disse isso?
-Sim. Não foi o que aconteceu?
Passei a mão em seu pescoço afastando os cabelos dali.
Ela olhou para o lado, como se fosse difícil admitir.
-Foi. Foi exatamente isso.
Dei mais uma risada baixinha, agora por perceber que ela queria que Susan tivesse mesmo inventado uma história, talvez para alimentar mais sua raiva.
-Então? Tá vendo? Ela não é tão terrível assim. Acho que ela inclusive quer que a gente fique juntos.
Me inclinei, dando um beijo em seu queixo. Ela se afastou, empurrando meus ombros.
-Você não pode estar falando sério. Por que ela iria querer isso?
Dei de ombros. Pouco me importava.
-Sei lá. Ela disse que sabe que eu não sou feliz sem você. Inclusive se propôs a conversar com você, para explicar...
-Espera! O que você disse? -Me interrompeu arregalando os olhos.
Balancei a cabeça, não deveria ter dito nada.
-É uma ideia s*******o, não levei isso a sério.
Millie espremeu os lábios, concordando com veemência.
-Acho bom. Não quero nem vê-la quanto mais falar com ela. Por mim ela nem estaria tão... -Sacudiu as mãos para frente, na minha direção. -Tão perto de você.
Aproveitei o momento e a puxei de volta pra mim.
-Ela não está perto de mim. -Murmurei quase encostando nossos lábios. A respiração dela se alterou no mesmo instante. -É você quem está.
-Hum. E se ela tentar...
-Ela não vai. -Assegurei, beijando o cantinho de sua boca. -Eu não vou deixar.
Desviei o caminho beijando ao longo de seu queixo até o pescoço. Ela estava suspirando, deixando escapar suaves sons pelos lábios.
-Você... Promete.. promete que nunca vai tocar nela. Nem se ela estiver triste, nem se você se sentir culpado?
Parei com a boca em cima da sua clavícula e Millie ficou tensa. Quando levantei a cabeça pude ver o horror em seus olhos.
-Ei. -Sussurrei segurando seu queixo. -Você não confia em mim?
Ela fechou os olhos e respirou, como se só conseguisse fazer uma coisa de cada vez. A felicidade em mim foi se esvaindo ao perceber que ela ainda tinha dúvidas.
-Confio. Só não confio nela. -Respondeu finalmente, abrindo os olhos.
Há um certo tempo eu poderia dizer que também não confiava, mas nos últimos dias Susan vinha se mostrando cada vez mais compreensiva e nunca tivemos nenhum momento em especial que pudesse me fazer acreditar no contrário. Segurei o rosto de Millie com as duas mãos e movi o polegar sobre seu lábio macio.
-Eu confio. -Os olhos dela se assustaram então tratei de explicar. -Sei que é difícil pra você entender, as vezes acho que eu nem mesmo entendo, mas a Susan mudou. Se ela ainda sente algo por mim nunca vai dizer. Ela quer que eu seja feliz e é isso que estou tentando, com você. Só com você.
Seus ombros relaxaram apesar do pequeno vinco entre as sobrancelhas. Amaciei a marquinha com o dedo.