Finn
Já estava quase no final da aula e todos os alunos da minha turma se encontravam ansiosos pela hora em que tudo aquilo finalmente iria acabar. Não era final do ano, muito menos fim da faculdade, mas enfim estávamos no verão o que significava que a faculdade nos liberaria um mês de férias.
O que para mim não mudava muita coisa já que meus planos se resumiam a ficar em casa ou na oficina concertando minha velha mas estimada picape, ou quem sabe passando o tempo jogando vídeo game enfurnado dentro do meu quarto e desfrutando da coisa que eu mais gostava na vida: ficar sozinho.
Parece i****a dizer isso, mas eu de fato apreciava a solidão. Quando ela é imposta a você talvez seja algo negativo, o que não era meu caso por que eu escolhi ser assim, gostava inclusive e me custava tentar ser de outro jeito ainda que ouvisse diariamente os conselhos da minha mãe sobre socialização e diversão.
Não que eu fosse antisocial como ela pensava, até tinha um pequeno círculo de amigos, mas raramente saia com eles e por consequência disso também não recebia muitas visitas, logo, aprendi a me divertir sozinho, seja lá o que isso signifique.
Acontece que quando você faz uma coisa errada, é fácil esconder das pessoas ao seu redor, por que desde que ninguém descubra você está seguro. Mas quando você é completamente ferrado da cabeça e assim sente e faz coisas que as pessoas considerariam erradas é bem mais difícil disfarçar por que isso é quem você é e você acaba deixando transparecer isso de alguma forma.
Esse era o motivo pelo qual depois de tudo o que aconteceu na minha vida decidi que o melhor seria me distanciar das outras pessoas e assim evitar que elas me conhecessem de verdade, a parte r**m pela qual eu fazia questão de esconder.
Não, não matei alguém, não torturei nem fiz nada de tão hediondo assim, mas o que fiz ainda assim poderia ser considerado um crime, o problema nisso tudo era que: o crime não era meu e sim de outra pessoa.
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Oito anos antes.
Meu quarto parecia uma zona de guerra. Livros, jogos e caixas de pizza vazias estavam espalhadas por cima e aos lados da cama. Eu poderia manter minha bagunça, pelo menos até o dia em que minha mãe decidisse entrar para limpar o quarto, enquanto isso não acontecesse eu estaria seguro.
Segunda-feira e meu primeiro dia de férias da escola, bem propicio para que eu tivesse acordado tarde e aproveitado a manhã para dormir já que não havia feito isso durante a noite, porém estranhamente não consegui pregar os olhos, logo as oito da manhã desci para tomar café com a minha família.
Ficar de férias da escola no entanto não significava que meus pais estariam no trabalho já que os dois eram professores e consequentemente ficavam em casa sempre nesses períodos, era por isso também que aproveitavamos para fazer viagens e as temidas coisas em familia. Eu gostava para ser sincero, apesar de que preferia jogar o dia inteiro.
Meu pai estava ao meu lado se servindo de suco e torradas enquanto meu irmão mais velho Nick não saia do celular provavelmente conversando com alguma garota por quem ele estivesse caidinho. Isso costumava acontecer com frequencia. Minha mãe já havia o repreendido pela falta de educação, porém meu irmão não se importava e acho que ela não também não ligava muito já que desistia da briga antes mesmo que começasse. Talvez por que Nick, era o filho mais velho e dali a poucos meses estaria indo embora para fazer a faculdade e assim adiquiria certos privilegios. Se eu decidisse por acaso jogar na mesa, estaria completamente ferrado.
Enquanto estávamos na mesa, a campainha tocou e minha mãe sorriu ao ir atender, como se já soubesse quem era. Talvez fosse algum vizinho, ou simplesmente o carteiro. Sim, ela costumava ser muito simpática e amava qualquer visita.
Minha mãe era a mulher mais doce do mundo, e também era a mulher mais linda de todo o universo.
Da sala de jantar ouvi quando ela riu e conversou com muita alegria com qualquer pessoa que tenha chegado, parecia que ela estava com saudade o que discartava a hipótese de ser o carteiro. Logo depois ela voltou até a sala e pela porta vi quando segurava na mão de uma outra mulher, não tão velha quanto ela, mas as roupas formais e o jeito como se sentia a vontade com minha mãe demonstrava que tinham idades parecidas ou talvez fossem amigas.
-Pessoal essa é Susan, ela acabou de começar a trabalhar na faculdade e agora é nossa vizinha. -Minha mãe apresentou a tal mulher dando um passo para o lado para que nós pudéssemos vê-la.
A tal da Susan era alta, tinha um rosto afilado e pele clara, os cabelos eram loiros, não loiros tingidos, mas naturais que iam até o meio de sua cintura fina. Ela usava um uniforme, algo parecido com terninho e saia comprida, a camisa da parte de dentro era de gola alta o que não deixava nenhuma brecha a mostra do pescoço. Dali podia-se ver apenas uma correntinha dourada com pingente de flor, combinando com uma que usava no cabelo deixando uma pequena mecha presa.
-Olá, é um prazer. -Ela disse.
Sua voz era bonita, baixa e meio rouca apesar dela parecer tão empolgada quanto minha mãe.
Essa mulher é estranha.
Meu pai levantou da cadeira depois de limpar a boca e foi até lá falar com a mulher, Nick deu uma espiada nas pernas dela e me lançou um sorriso de lado, meio sugestivo que eu não entendi a princípio.
Logo depois todos eles vieram para a mesa e Susan pegou um lugar vazio ao meu lado.
-Essas são meus filhos, Nick é o mais velho, daqui a alguns meses vai começar a estudar em Toronto. -Minha mãe m*l continha um sorriso orgulhoso. -E esse é o Finn, meu mais novo, estuda aqui perto e é incrivelmente inteligente.
A mulher olhou diretamente para mim com aqueles olhos tão azuis que me deixaram... Sei lá... Envergonhado? De repente eu não queria estar ali, talvez por que não tinha dormido e estava provavelmente com uma cara horrível e os cabelos despenteados já que faziam dois dias que não viam a cor da água. O que era estranho, eu nunca havia me preocupado com aquilo e de repente estava constrangido com aquela mulher bonita olhando para mim como se eu fosse um pequeno bichinho em exibição.
Mesmo assim continuei ali, ouvindo as conversas e vendo os adultos conversarem enquanto comiam. Descobri que ela tinha acabado de se casar com um fuzileiro naval, o que eu não fazia ideia do que significava mas pela forma como meu pai falou parecia que era algo envolvido com a polícia ou exército. Reparei que susan usava uma aliança, bem maior e mais cara do que a da minha mãe, mas não parecia tão feliz quanto ela.
Comecei a me perguntar por que, mas estava ciente de que aquela pergunta não poderia ser feita, ainda mais por mim que não estava envolvido no assunto.
Depois disso, Susan foi embora, mas os questionamentos ficaram me deixando cada vez mais intrigado. Segui até a janela da sala, vendo ela ir em direção a uma das maiores casas da rua que ficava somente a alguns metros da nossa, eu não iria atrás dela, se não fosse por uma presilha de cabelo que ela havia deixado cair em nosso tapete que ninguém mais havia notado. Eu poderia entregar a minha mãe e ela saberia o que fazer, mas por alguma razão eu queria entregar, queria ver como ela era dentro da própria casa e se esse tal marido era alguém pelo menos legal.
Esperei que todos ficassem ocupados em casa e sai com minha bike, dizendo a minha mãe que iria jogar vídeo game na casa de um amigo, o que poderia ser verdade, e fui direto até a casa enorme em que Susan morava.
Havia um letreiro na porta, algo discreto que dizia "aqui mora a felicidade".
Que brega.
Contive a vontade de rolar os olhos e bati na porta. Segundos depois Susan abriu. Ela já havia trocado de roupa e agora usando uma calça legging e camiseta ficava ainda mais impressionante.
Eu nunca fui de ficar encarando as pessoas, muito menos reparar no que elas vestiam, mas com Susan era diferente, ela tinha um jeito que chamava atenção, talvez não de todo mundo, mas a minha com certeza.
-Você esqueceu isso lá em casa. -Levantei a presilha em sua direção, percebendo que minha mão estava trêmula.
Susan tirou os fones do ouvido e limpou a testa suada com o braço, se qualquer outra pessoa fizesse aquilo na minha frente eu provavelmente acharia nojento, mas com ela não.
-Oh, querido, que gentileza a sua. -Ela me deu um sorriso grande mostrando o quanto seus dentes eram brancos e bonitos.
Pegando a presilha a levou até uma mecha e a prendeu lá como estava usando antes.
-Ficou bom? -Perguntou lançando os cabelos para o lado a fim de que eu pudesse ver o adereço.
Engoli em seco, sem saber se aquela pergunta de fato precisava de resposta, ou se era apenas uma forma de ser simpática comigo, na dúvida decidi responder.
-Sim. Está linda.
Susan me fitou com as duas piscinas azuis e deu um sorriso contido, mas havia algo ali que não era vaidade somente.
-Você me acha linda? -Questionou, como se precisasse urgentemente ouvir aquela resposta.
-S-sim. Muito linda. -Gaguejei feito um tremendo i****a.
Ela sorriu mais aberto e então abriu um pouco mais a porta.
-Você quer entrar? Estou arrumando a casa, se quiser esperar eu preparo uns biscoitos para comermos.
Bem, aquilo me pegou desprevenido, eu não sabia se era algo certo, e lembrei que tinha mentido para minha mãe, mas olhando para o interior da casa notei que ela estava um pouco bagunçada e não havia mais ninguém ali, talvez Susan precisasse de ajuda com as caixas grandes e me convenci que aquele era um bom motivo para aceitar. Que m*l teria?
Passei por Susan pela porta, ela era somente um pouco maior do que eu, e pude sentir pela primeira vez um cheiro caracterisco que vinha dela, baunilha, talvez fosse o shampoo e algo mais misturado com suor, o que talvez fosse somente o cheiro natural de sua pele.
Ela me deixou entrar e eu me deparei com a casa imensa e desorganizada. Fomos direto para a sala, de onde ela começou a tirar utensílios de cozinha de dentro de uma caixa grande.
-Você... Pode me ajudar a levar essa caixa até a cozinha? -Ela perguntou receosa e mordeu o lábio inferior, algo que não era sugestivo, mas talvez uma mania que ela tinha especialmente quando estava nervosa.
Ela estava nervosa? Merda.
-Claro. Onde fica?
Me aproximei da caixa e a tirei do chão, era realmente bem pesada mas eu daria conta.
Ela apontou para um corredor largo em seguida foi caminhando me mostrando o lugar.
-Onde seu marido está? -Não contive a pergunta.
Susan parou de andar, então olhou para mim.
-Esta no trabalho, só vem mais tarde.
E com isso voltou a andar até abrir a porta da cozinha imensa.
Que tipo de marido não fica em casa nem para ajudar a esposa a orgazar os móveis depois de uma mudança?
Coloquei a caixa em cima de um balcão de mármore e Susan se aproximou para começar a tirar as tranqueiras de dentro.
-Você tem quantos anos, Finn? -Ela perguntou sem me olhar.
-Quatorze, mas faço quinze esse ano.
Não sei por que tive o impulso de dizer aquilo, como se eu de repente quisesse que ela soubesse que eu era mais velho do que aparentava. Susan franziu o cenho na minha direção.
-Serio? Você não parece tão criança.
Seu tom rouco não demonstrava nenhuma espécie de escárnio nem ironia, mas havia algo ali, talvez, desapontamento e surpresa?
Criança. Não eu não era criança.
-Bem, você não quer saber a minha idade?
Ela voltou a perguntar quando eu não disse nada. Eu tinha curiosidade em saber quantos anos ela tinha, obviamente, mas algo em mim teve uma espécie de medo também.
-Não. Acho que isso não importa. -Respondi dando de ombros.
Susan riu, mas dessa vez me olhou de um jeito diferente como se eu fosse ingênuo demais para dizer algo como aquilo.
-Eu tenho trinta anos, Finn. Sou velha, não é?
Susan deu a volta no balcão ficando de frente para mim, não uma distância longa demais, mas perto o suficiente para que eu sentisse cada vez mais o seu cheiro.
Eram dezesseis anos de diferença e com certeza era tempo demais para qualquer outra pessoa, mas eu não via Susan como uma mulher de trinta anos, sua aparência e doçura aparentavam no máximo uns vinte e poucos, não mais do que isso. Soltei uma longa exalação, tentando dizer algo minimamente inteligente. De alguma forma notei que ela precisava constantemente de elogios e algo me dizia que ela gostava que eu em especial fizesse aquilo.
-Você não é velha coisa nenhuma. -Falei cruzando os braços, querendo parecer maior do que ela.
Ela riu de novo, um som gostoso de ouvir e descobri naquele momento que gostaria de ouvir muito mais daquilo.
Ela ria assim para o marido? Quem iria saber?
-Esta bem, posso não ser, mas também não sou tão jovem quanto você. -Ela parou de sorrir um pouco e pensou em algo, mas logo balançou a cabeça como se quisesse se desfazer do pensamento. -Sente, eu vou preparar os biscoitos.
Ela apontou para a cadeira da mesa e nas horas seguintes observei o modo como ela se mexia para guardar as panelas, limpar o balcão, se inclinar sobre o forno enquanto deixava os biscoitos cozinhando lá dentro. Depois fomos até a sala outra vez onde tinha apenas um sofá, Susan começou a conversar comigo, algo que notei que ela não costumava fazer com muitas pessoas já que parecia ter muita coisa a falar.
Ela morava antes em uma cidade pequena, e foi onde conheceu Marvin, o seu marido, me explicou que se casou com ele assim que fez vinte e um anos por que os pais não queriam que namorasse muito tempo sem ser casada e além disso Marvin já era do exército e também tinha um jeito meio tradicional demais. Depois do casamento eles viviam viajando, conforme o batalhão tinha tarefas em outras cidades, o que desencadeou a forma nômade em que eles viviam sem nunca ter uma moradia fixa a nove anos. Em todo momento em que ela falava sobre o marido, havia algo em seu rosto, talvez uma tristeza disfarçada com conformação, mas não era carinho muito menos amor que era o que eu costumava ver ao escutar minha mãe falando sobre meu pai.
Os dois pareciam ter uma vida meio chata, ele passava o dia todo fora e as vezes nos finais de semana nem voltava para casa deixando Susan a maior parte do tempo sozinha cuidando da casa e trabalhando. Ela era professora de literatura e também me contou sobre seus livros e autores preferidos, nada dos quadrinhos de super-heróis ou guerras que eu costumava gostar, mas livros de verdade, histórias de amor e de aventura que ela explicou com um brilho surreal nos olhos azuis.
Pude notar o quanto ela era inteligente e apesar de parecer frágil se mostrou muito determinada e a frente do seu tempo, embora fosse limitada a uma realidade monótona dentro das paredes daquela casa.
Comecei a pensar se nada disso tivesse acontecido, se Susan tivesse se casado com algum outro professor ou alguém que parecesse menos intransigente, que faria carinho em seus cabelos, que a beijaria com amor e não a deixasse tão sozinha. Não sei por que me peguei com aqueles questionamentos, por que, sendo sincero, o que eu entendia sobre casamento?
Comemos cerca de uma dezena de biscoitos com leite quente, o que também me surpreendeu foi como Susan sabia cozinhar. Só depois disso, quando a tarde foi caindo me convenci a pegar minha bike para ir embora, eu não costumava sumir e provavelmente minha mãe estaria preocupada comigo.
Antes de alcançarmos a porta Susan segurou minha mão sem que eu esperasse e então afastou uma mecha rebelde do meu cabelo para trás, não estávamos muito próximos mas ainda assim senti algo estranho, como eletricidade passando por todo meu corpo com aquele toque sutil
-Foi muito bom conversar com você Finn. Espero que possamos ser amigos.
O sorriso que se desenhava em meu rosto foi morrendo meio aos poucos com aquilo, mas o que eu poderia esperar? Que uma mulher de trinta anos desse bola para um moleque? E por que eu queria que ela desse? Que louco.
-Sim, eu também Suh. -Respondi tentando disfarçar minha apreensão.
Aprendi também que ela gostava daquele apelido. Fui embora em seguida, minha casa ficava perto da dela, mas o que me deixou confuso naquele momento foi saber que mesmo assim, parecia que ela e eu estávamos a um milhão de quilômetros de distância, e infelizmente, eu não estava falando somente distância física.
-
Dias atuais.
-Finn, você ainda não disse o que vai fazer nas férias, ou melhor não deu o seu famoso sermão de como gosta de ficar enfiado dentro da sua oficia. -Caleb falou assim que fomos finalmente liberados para ir embora.
Estávamos em nosso pequeno grupo de amigos, o que consistia nele, eu e duas garotas, Sophia e Iris. Elas riram daquele comentário e Sophia se aproximou passando um braço em torno da minha cintura enquanto andávamos.
-Deixa ele em paz Caleb, o Finn gosta de ficar na dele, qual é o problema? -Ela me defendeu, como uma mãe leoa.
Eu sabia que Sophia nutria sentimentos por mim, algo que eu nunca consegui retribuir apesar de que ficava com ela ocasionalmente e mantínhamos uma espécie de relacionamento, nada oficial, pelo menos para mim.
-O problema é que ele quer me arrastar para as montanhas e eu obviamente tenho coisas mais interessantes a fazer. -Falei pouco animado, lançando um olhar para meu amigo.
Mantive o braço sobre o ombro de Sophia apenas por comodidade, apesar de não ter sentimentos por ela, não podia negar que ela era legal comigo e eu não faria algo como dispensa-la na frente dos outros.
-Iria ser muito bacana se todos fossemos. Estamos de férias e é verão, quando vamos poder repetir isso de novo? -Iris falou indignada, rebolando os grandes cabelos loiros de um lado para outro.
Na verdade ela era muito patricinha para gostar de fazer uma trilha, mas desde que Caleb estivesse, ela aceitaria qualquer merda. Esse é o problema do amor: você nunca pode escolher por quem vai se apaixonar e isso faz com que você se apaixone justamente por alguém que não pode nunca te amar de volta. Disso eu entendia muito bem.
-Certo. Não vou mais insistir no assunto. Vai rolar a minha carona para casa hoje? -Caleb falou esfregando as mãos juntas.
Eu apenas dei de ombros e então as garotas se despediram seguindo caminho através do estacionamento da UV.
Encarei minha picape ali parada e fiz uma anotação mental para que não esquecesse de avaliar o motor ao longo da semana. Um detalhe sobre mim é que só há duas coisas materiais que eu prezo bastante, o console de vídeo game e o meu carro.
Geralmente assim que você faz dezesseis anos seus pais lhe dão de presente um carro novo, ou o antigo da família, mas no meu caso não foi bem assim, meus pais tinham condições de me dar um, mas eu havia juntado um bom dinheiro com minha oficina improvisada e comprei o meu próprio. Sempre tive facilidade com carros, motores e manutenções em geral e aproveitei esse talento para abrir meu negócio, não era exatamente uma máquina de dinheiro, mas eu conseguia grana consertando os carros dos vizinhos quando davam problema.
Foi quando comprei a picape Ford 1990, era uma lata velha no início e me dava muito trabalho ainda, vendo que eu sempre tinha algo pendente para fazer com ela, mas era algo que eu não conseguia me livrar, digamos que eu gostava de me manter ocupado e o que melhor do que consertar todo dia meu carro imprestável?
Eu e Caleb subimos e eu virei a chave da ignição velha fazendo o motor roncar feito uma locomotiva, depois saímos para pegar a estrada. Ele era meu melhor amigo da faculdade e nos conhecíamos a muito tempo desde a escola para ser sincero e fazíamos o mesmo curso de economia na universidade de Vancouver.
Na maior parte do tempo eu gostava de conversar com ele, inclusive boa parte das merdas da minha vida ele sabia, embora quase nunca tocassemos no assunto.
-Caramba, você tem que ver isso. -Ele disse encarando o celular parecendo embasbacado com qualquer coisa que tenha visto lá.
Mantive meus olhos no caminho, pouco animado.
-O que foi dessa vez?
-Oh, sabe a Millie Bobby Brown? A atriz que fez aquele filme de romance olhares impiedosos que vimos no cinema no ano passado? -Ele levantou a sobrancelha na minha direção mantendo um sorriso lascivo nos lábios.
A imagem da garota surgiu na minha mente, não só por que eu havia visto aquele filme clichê quando eles praticamente me forçaram a ir ao cinema, mas por que meu tio, irmão da minha mãe, era acessor de vários atores e atrizes e lembrava vagamente de que atualmente estava trabalhando com ela.
-Sim, o que tem ela?
Caleb passou os olhos pela tela do celular, como se estivesse vendo uma mina de ouro.
-Vazaram fotos dela peladinha na internet. Olha só, está em todos os sites e acabaram de me mandar sem a sensura.
Ele virou a tela do celular na minha direção e o que vi foi um deslumbre de uma foto preto em branco onde a garota estava de costas para uma câmera, não precisei prestar muita atenção para saber que ela de fato estava completamente nua.
-Cara, melhor você apagar isso. -Falei voltando a olhar para frente.
Caleb me olhou como se eu de repente tivesse duas cabeças.
-Você só pode estar brincando comigo. É a maior gostosa, você tem que ver as outras fotos, os p****s dela...
-Chega. -O interrompi antes que finalizasse aquela frase. -Ja falei pra você apagar isso. Deve ser ilegal e mesmo que não seja isso é muito babaca.
Mantive um tom calmo, embora estivesse realmente incomodado com aquilo. Para falar a verdade nunca fui muito fã de seriados nem filmes românticos, mas senti que era errado olhar as fotos de alguém que com certeza não publicou aquilo por conta própria.
-Esta bem! Está bem! -Caleb levantou as mãos em sinal de rendição e depois voltou a guardar o celular. -Sabe, se não te conhecesse bem diria que você é gay.
Não contive e ri daquilo.
-Ah é? E você por acaso é homofóbico ou coisa do tipo? -Balancei os cílios para provoca-lo.
Eu sabia que Caleb estava brincando e sinceramente poucas coisas me tiravam do sério e deixar que as pessoas achassem que eu fosse gay não era uma delas.
-Não. -Ele disse rindo. -So acho esquisito você não querer ver a maior gostosa nua. Sabe os caras normais gostariam de ver e usariam isso mais tarde em um momento sozinho.
Rolei os olhos em direção ao meu amigo.
-Que bom que eu não sou um cara normal então. Vai ver nem é ela nas fotos. -Dei de ombros.
-Ah mas é ela sim. Inclusive as redes sociais foram desativadas e ninguém tem notícias dela desde hoje de manhã. Quem diria que a princesinha na verdade é uma tremenda safada.
Caleb levou as mãos aos p****s e os insinuou para frente em forma de deboche. Uma nova onda de incomodo me atingiu, mas preferi apenas rolar os olhos e não dizer mais nada aproveitando o fato que já estávamos próximos da casa dele e eu me livraria de mais comentários retrógrados.
-Eu não te entendo direito. -Caleb falou depois que fizemos uma longa pausa. O encarei esperando que continuasse. -Você é todo esquisito, principalmente em relação a garotas. A Sophia praticamente lambe seu saco por onde passa mas você não dá a mínima para ela.
Ok. Aquilo me irritou um pouco.
-Nós não temos nada a ver. -Respondi seco, era o máximo de verdade que eu conseguia eximir.
A verdade era que Sophia era muito bonita e inteligente, mas eu simplesmente não conseguia dar um passo a diante. Sabia que era egoísmo da minha parte, uma vez que ela deixava claro seus sentimentos por mim.
-Bem nesse caso você deveria mandar a real, essa brincadeira de nem f***r nem sair de cima não faz bem para ninguém. -Caleb disse, dessa vez um pouco mais sério soando quase como uma advertência.