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4764 Words
-Eu acho que já fiz o possível para ela se tocar. -Não. Não fez. Na verdade as suas ações só a iludem cada dia mais, você finge que não percebe isso mas no fundo é o que você quer fazer. Ouvir aquilo foi como um soco no estômago, provavelmente por que era verdade. Engoli em seco e não pensei em nada que pudesse falar sobre aquilo. -Fala a verdade, você ainda é ligado naquela mulher, não é? Parei o carro de súbito quase tendo um ataque cardíaco ao ouvir aquilo, Caleb sabia muito bem que eu não gostava de falar sobre nada que envolvesse Susan e o maldito escolheu uma péssima hora para fazer aquilo. -Você não sabe de nada. -Foi a única coisa que eu disse, pressionado as mãos no volante como se aquilo pudesse conter toda a avalanche de sentimentos terríveis que estava sentindo. Por um momento Caleb pareceu se encolher um pouco no banco, mas não demorou muito até que ele pensasse em algo mais a dizer. -Você nem precisa responder. Está mais do que claro. Só não entendo como você pode ainda gostar de uma mulher que te seduziu quando você não passava de uma criança. -Ela não me seduziu. -Pontuei as palavras com os dentes cerrados. Caleb riu, uma risada de pura ironia. -Sera mesmo que você não enxerga o que aconteceu com voce, Finn? O que essa mulher fez, não só no passado, mas continua fazendo, ela te mudou, você virou uma pessoa fria, que não consegue se envolver com ninguém. Consegui olhar para ele, vendo o quão revoltado Caleb estava, só que eu não estava muito diferente e me arrependi amargamente do dia em que num ato de despero contei tudo a ele. O que eu poderia esperar? Ninguém nunca ia me entender. -Ela não fez nada, fui eu em quem fui atrás, eu que comecei tudo aquilo. -expliquei, embora soubesse que era inútil. De alguma forma eu não queria atribuir a culpa somente a Susan, quando na verdade eu que era culpado. Caleb balançou a cabeça em negativa. -Então você está me dizendo que uma mulher de trinta anos aceitar as investidas de alguém dezesseis anos mais novo é algo razoavel? Sério? Se uma dessas garotas de quatorze anos viesse dar em cima de você, você pegaria numa boa também? Aquilo deu um nó no meu estômago e me senti indubitavelmente enjoado ao pensar naquilo. Eu tentava muito não pensar, justamente para que os fatos não se embaralhassem ainda mais na minha cabeça. -p***a, é claro que não. -Respondi largando as mãos do volante em desistência. O problema era que quando pensava em mim e em Susan nada daquilo parecia errado. -Então. Só estou dizendo que é a mesma coisa Finn. Está na hora de você esquecer essa história e aceitar que aquela mulher cometeu um crime. Talvez você fosse jovem demais para ter pensado nisso antes, mas agora não, você é maior de idade, tente entender essa merda de uma vez por todas. Ele praticamente cuspiu as palavras e pegou a mochila no banco de trás fazendo menção a querer sair do carro. -Pra onde você vai? Ainda não chegamos. -Me adiantei a segurar o braço dele. Porém Caleb se desvencilhou de mim e me lançou um último olhar. -Você gosta muito de ficar sozinho não é? Então use esse tempo pelo menos para colocar sua cabeça no lugar Finn, ninguém pode fazer isso, só você mesmo. E saiu batendo a porta do carro. Eis o motivo pelo qual eu não gostava de conversar sobre o que tinha acontecido. 1- não adiantava, eu continuava amando Susan e não conseguia enxergar erros nem crimes. 2- falar sobre isso me fazia pensar nela e consequentemente eu me lembrava de que ela tinha ido embora, para nunca mais voltar. -- - Cinco anos antes. -Eu amo você Suh. Amo de verdade. -Falei encarando Susan ao meu lado no carro. Sua primeira reação foi levar a mão a boca, querendo conter os lábios tremulos, mas seus olhos azuis assustados demonstravam o quanto aquelas palavras eram dolorosas de se ouvir. Eu nunca teria contado a verdade, teria morrido escondendo minha paixão proibida pela vizinha casada e dezesseis anos mais velha do que eu. O problema era que naquele dia descobri o que acontecia com ela e com o marido quando ninguém estava por perto, não que ela tenha me contado, mas tive o desprazer de ver ele batendo nela quando voltou do trabalho e estava bêbado demais. Tive que conter todos os meus instintos para não pular pela janela e fazê-lo parar, por que se eu fizesse aquilo talvez fosse muito pior, para ela. Depois de anos escondendo minha paixão, as coisas entre ela e eu foram só crescendo, obviamente nada demais acontecia, exceto que nos encontravamos escondido para conversar e as vezes Susan me recebia em sua casa. Eu sabia que nada iria acontecer mesmo que ela permitisse que eu me aproximasse, talvez por medo, por achar que fosse errado, mas era inegável que Susan não era totalmente alheia às minhas intenções ainda que me contesse na maior parte do tempo. As únicas vezes que a via sorrir era quando eu estava por perto. Era quando ela poderia ser a Suh, minha Suh, não a Susan perfeita esposa de um degenerado. -Você não pode... -Ela disse tremendo. -Não pode dizer isso, nunca mais repita isso. Sua mãos estavam tremendo e as grossas lágrimas escorriam em cascatas de seu rosto bonito. -Como não posso dizer, se é a verdade? Eu te amo Suh, sempre te amei. -Insisti. Ela fechou os olhos e tentou se afastar de mim. -Você é filho da minha única amiga Finnie, eu tenho idade para ser sua mãe e ainda sou casada. Suas palavras eram desconexas e não pude deixar de notar que a última parte parecia ser a única que talvez mais lhe assustasse. -O Marvin é um louco! -Grunhi com raiva. -Ele bate em você e eu nunca mais vou permitir que isso aconteça. Ela arregalou seus olhos com meu grito e começou a balançar a cabeça negativamente. -Não, você não pode fazer nada. Oh Deus, se o Marvin descobre isso... -Ele não vai. -A interrompi segurando sua mão fria. -Vou te ajudar a fugir e só preciso de um tempo para que eu possa te encontrar depois, eu tenho um dinheiro guardado e podemos nos virar em alguma cidade afastada daqui. O plano todo já havia sido recapitulado muitas vezes na minha cabeça, era arriscado, não tinha como negar, mas eu conseguiria, não importava como, eu tiraria Susan daquela casa. Ela me olhou ainda chorando, seus olhos demonstrando a pouca credibilidade que tinha na minha promessa. -Você é tão bom para mim. -Ela se aproximou resvalando os dedos sobre meu rosto. -Mas eu não posso fazer isso, se eu permitir que aconteça estarei cometendo um crime. Você não entende. -Eu entendo sim. -Falei segurando sua mão no lugar quando ela ameaçou se afastar. -Mas não me importo com nada disso, para mim sua idade não significa nada. Eu te amo e ninguém vai me dizer que isso é errado. Você me ama também, não ama? Apesar de ter absoluta certeza do que eu estava dizendo, senti meu coração apertar com a expectativa. Susan me olhou ainda mais triste, como se estivesse em uma luta interna com os próprios sentimentos. Eu entendia aquilo, uma vez que já havia sentido a mesma coisa. -Eu amo. -Disse com a voz fraca, quase inaudível. -Mas não posso. Então ela tentou se desvencilhar do meu braço, mas não foi rápida o suficiente para fazê-lo e eu a segurei, puxando-a para mim. Eu só precisava daquelas palavras, e agora que as tinha jamais desistiria. Segurando seu rosto com delicadeza, tomei sua boca com um beijo, nosso primeiro beijo e que com certeza não seria o último. No início Susan se mostrou relutante, tentando se afastar murmurando sobre meus lábios que aquilo era errado e que não deveríamos, mas com um pouco mais de insistência ela finalmente se abriu para mim e me beijou de volta. Foi de longe a melhor sensação que já senti na minha vida, não era meu primeiro beijo, mas eu com certeza queria que fosse. Ela tinha uma boca tão macia quanto eu imaginava e os movimentos que fazia demonstrava o quanto era experiente naquilo, muito mais do que eu. Tentei afastar da minha mente a imaginação dela beijando Marvin e me concentrei apenas em seus lábios em minha boca, na sensação incrível que estava sentindo dentro do peito. Eu amava aquela mulher e faria o que fosse preciso para tê-la para sempre. Momentos depois, no meio da confusão de mãos e braços se envolvendo Susan estava sentada sobre meu colo no banco do motorista. Eu nunca imaginei até que ponto as coisas chegariam com ela, mas não podia negar que era absolutamente incrível aquela sensação e estava muito disposto a ir adiante embora não tivesse nenhuma experiência s****l que me guiasse. Ela soltou meus lábios com um pequeno estalo e enfiou a cabeça ao lado do meu pescoço onde foi trilhando beijos suaves e molhados na minha pele, aquilo era bom, Deus, nunca estive tão e******o em toda minha vida. -Eu te amo Finnie. -Murmurou baixinho. -Eu também te amo Suh. Era um sonho, que eu jamais queria acordar, mas como se uma força negativa estivesse a espreita ouvindo meus pensamentos, despertei no instante em que ouvi alguém batendo contra o vidro do carro. Susan se levantou espantada e despencou de volta para seu banco, olhei para o lado encarando o rosto muito vermelho do meu tio do lado de fora, ele estava espremendo os olhos tentando ver com mais clareza o que estava acontecendo. Eu parei de respirar por um segundo, sem saber o que fazer e me arrependendo amargamente de ter beijado Susan logo ali, enquanto estava parado do outro lado da minha casa. Vieram mais batidas, o som m*l sendo captado pela minha cabeça atordoada, só conseguia olhar para ela enquanto Susan voltava a se debulhar em lágrimas provavelmente prevendo o que aconteceria no instante em que meu tio descobrisse que ela estava ali comigo. Desesperado com aquele pensamento tentei ligar o carro e arrancar daquele lugar, mas quando dei por mim já era tarde demais e Susan havia descido do carro. Abri a porta do meu lado dando de cara com meu tio. -Você... O que você.. ela? -Ele parecia chocado olhando de mim para Susan que estava parada sem dizer absolutamente nada. -Tio, eu posso explicar. -Tentei controla-lo querendo que ele não fizesse um escândalo no meio da rua. Por sorte meus pais estavam trabalhando, mas se os vizinhos aparecessem com certeza não demoraria muito para que eles descobrissem também. -David, por favor, vamos conversar. -Susan tentou argumentar. Meu tio lhe lançou um olhar fulminante entao deu a volta no carro para se aproximar dela. -O que você fez? Sua vagabunda! Pedófila desgraçada! -Ele estava vociferando enquanto Susan se encolhia cada vez mais. Corri na direção dos dois e segurei no braço dele. -Por favor! Pare de gritar! Você precisa me ouvir! -Implorei, sentindo meus próprios gritos explodirem minha garganta. David me olhou como se não me compreendesse e segurou o meu braço. -Vamos, vou te lavar para sua casa e ligar agora mesmo pro seus pais. Ele tentou me arrastar, mas eu me debati não o deixando ir muito longe. -Nao! Você não pode fazer isso! -Me larguei de seu braço com um puxão e fui até onde Susan estava. -Eu a amo! -O que?? Deus! Isso só pode ser uma brincadeira! -Ele exalou incredulidade e passou as mãos pelos cabelos. Susan se afastou de mim, usando as mãos para conter as lágrimas. -David, por favor, entre, vamos conversar, eu posso explicar tudo. Meu tio não a encarava, ao invés disso mantinha os olhos sobre mim. -O que ela fez com você? -Perguntou com um tom mais baixo. -Nada. -Respondi sem hesitar. -Ela não fez absolutamente nada, você tem que acreditar em mim, por favor. Ele ponderou sobre minhas palavras e por um instante pensei que não fosse me dar ouvidos e simplesmente fazer uma besteira, mas ao invés disso ele assentiu e Susan se apressou em abrir a porta de sua casa. David no entanto ficou duro ao meu lado e voltou a segurar no meu braço mesmo quando andamos e entramos lá dentro. Protegidos com a porta fechada, eu quis me desvencilhar dele, porém seu toque se tornou ainda mais forte não me permitindo me aproximar minimamente de Susan. -Não quero que você me explique nada, por que o que eu vi não tem nenhuma explicação, só quero que me dê um bom motivo para não sair daqui imediatamente e chamar a polícia para te prender. -Ele foi o primeiro a falar, não se dando ao trabalho nem mesmo de sentar no sofa. Susan abriu e fechou os lábios, como se não soubesse o que dizer perante aquilo. Eu, como sempre, me senti na obrigação de defende-la. -Fui eu quem a beijou. Estou apaixonado por ela. O olhar de Susan caiu sobre mim, mas não demorou muito para que voltasse a encarar meu tio. -Eu não perguntei nada a você, Finn. Fique quieto. -Ele me repreendeu, ainda sem me largar. -Vamos Susan, estou esperando. -Nunca aconteceu nada entre nós dois. -Ela respondeu friamente. -Nada exceto aquilo que você viu, mas não ia passar disso, foi um erro, eu não deveria ter permitido. Aquilo doeu como um inferno, mas ao invés de dizer alguma coisa, cada palavra foi morrendo dentro de mim. -É meio tarde para pensar nisso. -Meu tio rebateu. -Acabei de pegar você com a língua enfiada dentro da boca do meu sobrinho, ele é menor de idade você sabia disso? -Eu sei, sim. -Susan assentiu séria, sem me encarar. -Como eu disse, foi um erro. -Um erro inadmissível, pessoas que cometem esse tipo de erro merecem apodrecer na cadeia. Você pensou nisso? Você pensou na minha irmã? No que ela vai sentir quando souber que a melhor amiga dela estava se agarrando com seu filho mais novo? As p************s dele parecessam atingir Susan pela primeira vez e ela balançou a cabeça como um cão arrependido. -Por favor, não conte nada a ela nem para ninguém, eu imploro. O desespero era nítido na feição de Susan que praticamente se jogou aos pés de David. -Eu talvez mereça tudo isso, mas... -Fez uma pausa começando a chorar de novo. -Eu estou grávida, se meu marido descobrir ele vai acabar comigo e com meu bebê. O mundo pareceu parar de girar ao mesmo tempo que um buraco profundo se abriu sobre meus pés.   Ela estava grávida. -Suh... -Chamei por ela, m*l contendo a voz trêmula. Susan no entrando não me olhou, ainda encarando apenas meu tio como um prisioneiro encara seu carrasco. -Voce deveria ter pensado na criança antes, não cabe a mim protegê-la. Que tipo de mãe você será quando na verdade se envolve com um menor de idade? E sinceramente seus problemas com seu marido não me interessam nenhum pouco. David estava sendo completamente duro e severo, fiquei com vontade de explicar a ele toda a situação, que na verdade ele tinha que me ajudar a salva-la de Marvin, que ele a espancava, mas Susan me silenciou quando voltou a falar: -Nós estamos indo embora da cidade. Meu marido vai ter operações em outro lugar e eu vou com ele, vou sumir para sempre e vocês nunca mais vão me ver por aqui outra vez. Só preciso que me deixe ir sem que ninguém descubra, é o único jeito de proteger o meu filho, eu juro que nunca mais vou voltar. -Você o que? -Perguntei antes mesmo de digerir aquilo tudo. No meio da confusão nem havia me dado conta de que haviam caixas empacotadas ao redor da sala, o que denunciava que Susan estava mesmo dizendo a verdade. Porra ela iria embora mesmo. E nem ao menos me disse nada.  -Eu ia contar a você. -Ela teve a decência de me olhar parecendo arrependida. -Ja estamos com quase tudo pronto, partiremos no final da semana, mas consigo adiantar para amanhã mesmo. -O que? Não! Você não pode fazer isso! Não pode ir com ele! Consegui me soltar da mão de David e corri até onde Susan estava de joelhos no chão. -Me diga que não é verdade Suh, você disse que me amava, eu ia dar um jeito de te proteger dele. -Minha voz soou embargada ao passo que as lágrimas me preenchiam. Meu tio não falava nada, parecendo atordoado demais para interromper. -Eu sei. -Susan segurou minha mão. -Mas eu não posso, meu destino é esse. Seu tio tem razão, eu cometi um crime e vou pagar por ele vivendo o resto da vida com Marvin. -Não. Por favor. -Insisti deixando que as lágrimas saíssem de vez. Levantei do chão e fui até onde meu tio estava parado. -Vamos ajudá-la, tio, por favor! Ela não pode ir com ele! David desviou do meu olhar, voltando a encarar Susan no chão. -Você nunca mais vai voltar aqui? Nunca mais vai tentar se aproximar dele ou da minha família outra vez? -Ele perguntou com a voz estridente. -Eu prometo. -Susan nem pensou. -Faço qualquer coisa para proteger meu filho. -Otimo. Por que eu também sou capaz de qualquer coisa para proteger minha família. -Ele assentiu, exalando o ar. -Não vou contar isso a ninguém, e eu espero muito que cumpra a sua parte no acordo, por que se eu ao menos sonhar que você voltou ou mantém algum tipo de contato com meu sobrinho, não hesitarei em ir até no inferno para mandar prende-la. Está nas suas mãos. Sem esperar uma resposta, meu tio começou a andar me arrastando pelo braço. -Suh! Não! Não faça isso! -Eu implorei lutando para me soltar Susan apenas levantou do chão e cobriu a boca me vendo ser levado a força para fora de sua casa e de sua vida. Antes que meu tio pudesse me levar até a parte de fora, tive um último vislumbre da mulher que eu amava esmiuçando um " me perdoe eu te amo" de forma muda enquanto as lágrimas escorriam. Depois disso a porta se fechou e eu fui arrancado de Susan para sempre. -- Dias atuais. Depois que Caleb desceu do carro demorei para voltar para casa, dando algumas voltas pelos bairros próximos a minha casa. Minha cabeça ainda estava atordoada sobre tudo que tinha ouvido do meu melhor amigo, portanto voltar para minha rua e encarar a casa onde Susan havia morado a cinco anos atrás não era exatamente o que eu estava preparado para fazer. Havia se passado muito tempo e mesmo que eu evitasse pensar sobre tudo aquilo era quase impossível sair daquela bolha de pensamento quando eu entrava nela. Somente depois de quase acabar com a gasolina, foi que relutantemente me convenci a voltar para casa. Logo na porta de entrada reconheci o carro que estava estacionado ali em frente e foi como uma infeliz coincidência do destino, justo naquele momento mais um fantasma do meu passado voltava para me assombrar. -Querido, seu tio está lá em cima, disse que que quer falar com você. -Minha mãe disse, me parando quando cruzei o corredor. Ela provavelmente havia acabado de chegar do trabalho, pois estava usando o uniforme, blazer cinza e saia do mesmo tom com o emblema da universidade. -Sim, já vou subir. -Voltei apenas alguns passos e me abaixei para beijar sua testa. Ela sorriu e então bagunçou um pouco meus cabelos. -Depois peça para ele descer, o almoço está quase ficando pronto. Assenti com a cabeça e subi as escadas até meu quarto no andar de cima. A porta estava entreaberta, talvez por que eu nunca a deixava trancada e meu tio David estava recostado na janela olhando distraidamente para o lado de fora. Apesar de Susan ter ido embora por causa dele, eu não o odiava, principalmente pelo fato de David nunca ter dito nada a respeito dela para minha mãe ou qualquer outra pessoa mantendo assim sua palavra, assim como Susan fez, já que nunca voltou ou fez questão de procurar ter contato comigo. Ainda assim era sempre esquisito quando ele estava por perto e era inevitável me lembrar de tudo o que tinha acontecido naquele fatídico dia. -Oi, tio. -cumprimentei, jogando minha bolsa sobre a cama. Ele virou com uma expressão semelhante a um susto, talvez por estar realmente distraído, mas quando me viu abriu um sorriso suavizando mais o rosto. -Oi, Finn. Está tudo bem garoto? Não. Não está. Você fez ela ir embora. Eu quase disse aquilo, mas como sempre faço mudei de ideia. -Sim, está. E com você? -Respondi recebendo de quase bom grado o abraço desajeitado que ele me deu. -Bem, isso depende. -E.. eu posso ajudá-lo de alguma forma? Meu tio abaixou um pouco o olhar. Ele sempre se vestia muito bem e dessa vez usava um conjunto social escuro e discreto, mas não passou despercebido que havia um vinco de preocupação estampado em seu rosto. Suspirando, ele foi até a cama e sentou depois de afastar um pouco da minha bagunça para o lado. -Acho que você já deve ter ouvido falar ou até mesmo visto que a Millie teve algumas fotos vazadas ontem a noite. Lembrei de Caleb e de seus comentários a respeito daquilo e logo associei um fato com o outro. Meu tio já era acessor dela a algum tempo e sempre que nos encontravamos ele falava sobre ela e era bastante óbvio que tinha uma espécie de carinho pela garota. -Sim, eu soube, não quis ver as fotos, mas já está se espalhando pelos quatro ventos, eu acho. Tive a necessidade de me afastar um pouco então puxei a cadeira que ficava sob a mesa do computador e me sentei nela. Seja lá o por que ele queria falar sobre aquilo comigo, senti que não seria nada legal. -É, então. A garota está com um problemão por causa disso. -Ele disse usando as pontas dos dedos para sustentar o queixo. -Imagino que você já tenha algo em mente para amenizar a situação. Ele fez uma pausa, como se estivesse pensando sobre aquilo. Só depois levantou a cabeça e me fitou. -Leva um tempo para descobrirem quem fez isso, estou fazendo o que posso para agilizar o processo mas por enquanto só nos resta esperar. Assenti em compreensão. -E você veio aqui apenas para me contar isso? Ele novamente fez uma pausa. -A carreira dela está bem comprometida, você deve saber que a Millie é bem querida pelos jovens até mesmo pelas crianças e a maioria dos seus trabalhos envolvem esse público, o problema é que agora as marcas e até mesmo instituições estão querendo dispensa-la. Vamos esperar para ver como as coisas irão se seguir, mas eu preciso que a Millie suma por um tempo, a mídia está em cima esperando somente uma brecha para pega-la desprevenida. David me olhou com pesar, quase com tristeza ao anunciar aquilo. Eu não era ingênuo o suficiente para não saber como a sociedade funcionava, em se tratando de uma garota ainda por cima famosa, poderia ser bem pior. -Isso é uma bobagem. Não foi culpa dela eu tenho certeza e julga-la dessa forma é bastante c***l. Senti necessidade de defende-la mesmo que não a conhecesse. Eu não havia assistido o seriado que ela tinha feito e o máximo que vi foi o filme, mesmo assim me parecia que ela não era um monstro pervertido como estavam falando. David me encarou, parecendo gostar do meu comentário. -Que bom que entende isso. Na verdade não estou surpreso e é por isso que vim até aqui. Queria sua ajuda para afasta-la de mais encrencas. Franzi o cenho sem entender direito o que aquilo significava. -Bem e o que você quer que eu faça? -Estou mandando Millie para minha casa de campo em Tobermory, lá é afastado, sem riscos de paparazzis ou qualquer outro tipo de assédio da imprensa. Vai ser por pouco tempo e preciso que alguém fique com a garota. Tive que abrir bem os olhos para ter certeza de que havia compreendido de fato o que ele havia me falado. -E você quer que eu fique com ela? A pergunta soou tão ridícula que m*l contive uma risada de incrédula. Com certeza era algum tipo de brincadeira. David exalou o ar e levantou da cama, ficando parado na minha frente. -Por pouco tempo. Você entra de férias hoje sei que não tem muitos planos para passar os dias e a cidade não fica muito longe daqui. -Por que não contrata.. sei lá um segurança ou manda alguém da família dela? Não vou ficar de babá de uma garota que eu nem conheço. Levantei da cadeira também quando finalmente digeri aquela informação. De jeito nenhum eu faria aquilo. Era simplesmente ridículo. -Os pais dela trabalham, a mãe inclusive está fora do país agora e a Millie está passando por um momento complicado, não quero piorar ainda mais as coisas colocando um segurança lá dentro, a intensão não é vigia-la é simplesmente fazer companhia. Vocês tem idades parecidas e não estou podendo confiar em todo mundo, pensei que você pudesse fazer isso por mim. Jogo sujo. Meu tio era um cara legal, mas era bem óbvio que ele estava usando o fato de ter me ajudado no passado para tentar me convencer daquela merda, todavia eu não estava inclinado a aceitar aquilo. -Não sei tio. -Suspirei. -Ela não tem uma amiga? Alguém que aceite e que ela conheça? Ele me olhou como se eu não soubesse o que estava dizendo. -As amigas dela não são exemplos de boas companhias exatamente, e as mais próximas são tão famosas quanto, não podem parar tudo o que estão fazendo para fazer uma viagem de última hora. -Ah, e eu posso? -O interrompi irritado. -Você pode não acreditar mas eu tenho uma vida. -Passar os dias jogando aqui no quarto ou enfiado dentro de uma oficina não é exatamente ter uma vida na minha opinião. Assim que David falou aquilo, pareceu se arrepender e caminhou na minha direção. -Me desculpe, não foi isso que eu quis dizer. Me afastei antes que ele chegasse mais perto. -É mas você disse. Quer saber, não dou a mínima para o que você acha de mim, a resposta é não. David se afastou um pouco e suspirou parecendo cansado, que bom, por que eu também estava cansado daquela conversa sem sentido. -Eu não procuraria você se tivesse uma opção mais fácil, acredite em mim, se isso facilita as coisas, lá perto conheço o dono de um depósito de desmonte de carros, ele é um bom amigo, você poderia aproveitar isso, levando seu carro até lá ele poderia te ajudar. Não seria tão r**m quanto parece, além disso é uma boa casa, perto de um lago e vocês nem mesmo precisam fazer amizade. Droga ele não iria desistir facilmente. -Eu entendo sua intenção, entendo mesmo. -Diminui o tom de voz. -Mas isso é demais. David passou as mãos pelo cabelo. -Ok. Já entendi. -Respondeu depois de se recompor. -A Millie é uma boa garota, não merece passar por nada disso, mas você tem o direito de recusar. Ele fez menção a sair do quarto, mas de repente eu o impedi. -Você vai levá-la quando? Ele me encarou surpreso, depois passou a mão pela testa contendo o suor. -Ela irá ainda hoje, mas essa noite consigo fazer companhia, só preciso que alguém fique a partir de amanhã. Assenti, enfiando as mãos nos bolsos, depois virei de costas tentando esconder a confusão que se passava pela minha cabeça. -Ate lá eu dou minha resposta definitiva. David limpou a garganta, se eu pudesse ve-lo diria o quanto estava impressionado com minha mudança de idéia. -Obrigado, Finn. Eu não respondi, apenas fiquei parado esperando o barulho que sinalizava a porta se fechar. Ainda parecia uma ideia absurda na minha mente. Passar vários dias ao lado de uma menina que eu não conhecia mas que o mundo inteiro estava condenando não era exatamente o melhor plano para passar as férias, mas pensei em tudo o que David disse sobre ela, sobre essa situação horrível e também lembrei das palavras nojentas que Caleb havia usado. De repente, quem sabe, eu realmente poderia ajudar... Talvez eu pudesse, se minha cabeça não fosse tão ferrada quanto a dela. Balancei a cabeça com aquele pensamento, é, seria um longo verão para mim.
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