Capítulo 5

1508 Words
Na sala de Bruno, demoro um tempo absorvendo o ambiente em que estou. Tudo parece igual, e uma onda de saudades percorre meu coração. Faz quase dois anos desde que estive aqui. Esse tempo pode não significar muito para a maioria das pessoas, mas significou tudo para mim. A minha vida mudou tanto que é inacreditável ver como aqui continua igualzinho. Bruno apenas me observa enquanto eu admiro o lugar como se fosse uma sala cheia de obras de artes.  Caminho até a estante e sorrio para as fotos que ainda estão lá.  Bruno com cinco aninhos; nossos pais na época da faculdade; Eu, Bruno e Daniel com rostos colados e sorridentes depois de vencermos uma corrida de obstáculos na gincana da escola; nossas famílias se abraçando como se fossem uma só. A última é uma foto minha com Bruno, no dia em que começamos a namorar. Daniel tirou a foto enquanto estávamos distraídos, nossas mãos estão entrelaçadas e sorrimos um para o outro, a outra mão de Bruno acaricia o meu rosto. Eu pareço tão feliz que poderia sair voando. — Uau. São verdadeiras relíquias.  Bruno ri. — Foi exatamente a minha reação quando cheguei na casa.  Sorrio e aponto para o sofá.  — E foi bem dali que Daniel pulou, caiu e abriu o queixo.  — Sim. Você ficou apavorada — Lembro que fiquei mesmo — E foi ali — Ele aponta para mesa da sala de jantar — Onde você subiu e começou a fazer um show cantando Xuxa. Eu gargalho. — Essa é uma lembrança que deveria ser esquecida. — Isso não vai acontecer.  Nós sorrimos um para o outro, como dois idiotas. Sinto um frio na barriga e me xingo mentalmente porque eu não deveria sentir isso por um amigo. Mas nenhum de nós quebra o contato visual até ouvirmos passos na escada. — Pronta pra ouvir minha mãe surtar por te ver aqui? Ele sussurra. Sorrio em resposta.  O rosto da tia Fernanda realmente se ilumina quando me olha.  —  Não acredito! Melzinha, você na minha casa? — Espero não estar incomodando.  — Não seja boba, Mel!  Ele me abraça apertado e eu retribuo.  — Mãe, Mel está morta de fome. Olho f**o para Bruno, que pisca para mim. — Você vai jantar conosco, Melzinha ? Que alegria! Vou providenciar já já  o jantar. Não saia daí, menina!  Ela corre para cozinha.  — Eu disse que ela ia adorar te ver.  — Sua mãe sempre foi incrível.  — Eu não vou discordar. O pai de Bruno chega. Ele abre a porta distraído e sorri quando vê o filho, mas para ao me ver lá também. Ele me olha de cima a baixo. — Será que estou mesmo vendo minha menina aqui em casa? Corro para abraçá-lo. Tio Augusto era o melhor amigo de meu pai e sofreu muito quando ele morreu. Lembro de como ele olhava pro caixão com um olhar perdido no rosto. Ele também sempre me tratou como uma filha, já que a vida nunca lhe deu uma menininha. Em outras palavras, eu o amo. — Ela vai jantar com a gente, pai. — Isso é sério? É uma ocasião muito especial essa. Espero que sua mãe tenha caprichado na janta. — Bem, ela foi pega tão de surpresa quanto o senhor. Mas a Mel vai comer qualquer coisa, né? Ela não pode reclamar hoje. Ele me lança um olhar de advertência, eu reviro os olhos. Será que ele vai esquecer essa coisa de ter passado o dia inteiro sem comer algum dia? — Tenho certeza que a comida vai estar ótima.  Eu digo honestamente. Sempre fui louca pela comida da tia Fernanda. Depois de muita conversa fiada jogada fora, nós vamos todos para a mesa de jantar. Eu não sei se a tia Fernanda é mágica ou advinha, mas por incrível que pareça, estou diante da minha comida favorita no mundo: bife à milanesa com batata frita. — Fala sério, tia. Eu já disse que te amo hoje? Ela abre um sorriso doce. — Acho que já faz um tempo que não escuto isso de você. A verdade da afirmação dói em mim. — Bem, eu amo. Amo você e o tio Augusto. — digo sinceramente. — Também te amamos, menina. Tio Augusto responde e Tia Fê concorda com um aceno vigoroso. — Eu não irei comentar sobre a exclusão que aconteceu com minha pessoa. Rio e dou a língua para Bruno. Ele olha diretamente pra minha boca e depois começar a encarar o prato. É constrangedor e excitante essa coisa entre nós. O conhecimento silencioso que eu poderia provocar Bruno com as mais simples ações. É errado também. Não, é? Eu tenho um namorado e não deveria, de forma nenhuma, ter prazer em ver o Bruno corando por mim.  Decido mudar de assunto. — Tia, como você faz para cozinhar cada vez melhor ? — Ah, querida, não cozinho tão bem assim. Mas você sempre foi apegado a minha comida. — É verdade. — Tio Augusto continua — ainda me lembro quando você tinha cinco aninhos e sua mãe bateu aqui em casa com você toda chorosa no colo porque dizia que queria comer a comida da titia Fê e não a da mamãe. Todos rimos, apesar dessa história já ter sido contada diversas vezes.  — Eu estou tão feliz de você tá aqui, Melzinha. Me lembra dos nossos antigos jantares de sexta feira, lembra? Claro que sim. Desde que consigo me lembrar, as sextas eram dias de jantar junto com a família de Bruno. Em casa, nada de restaurantes. Nesses dias, quem fazia a comida eram nossos pais. Nossas mães conversavam na sala, enquanto eu, Bruno e Daniel fazíamos apostas no vídeo game. Depois de comer, sempre rolava algum jogo em família. Eram sextas mágicas. E pela primeira vez percebo que não foi só eu quem perdeu a i********e com minha mãe. Tia Fê perdeu também todo o contato com sua melhor amiga. — Claro que lembro. — Eu estava pensando... que tal você tentar convidar sua mãe para jantar aqui essa sexta ? Primeiro, eu teria que conseguir ver a minha mãe. Depois convecê-la que ela não está manchando a memória de meu pai se aceitar se divertir com nossos velhos amigos. É claro que nunca seria como antes, mas não quer dizer que seria r**m.  Prometo que vou tentar e a conversa continua tão animada que nem me dou conta que já são meia noite. Me despeço de todos porque tenho que acordar cedo amanhã e Bruno me acompanha até a porta de casa. — Sabe, Bruno... Eu gostei muito de hoje. Obrigada. Ele concorda  — Estou feliz que você tenha ido lá. Boa noite, Mel. Ele sai e eu entro. Minha mãe ja está dormindo e toda a felicidade que eu sentia evapora. Antigamente, ela nunca deixaria eu chegar depois de meia noite em casa sem se importar com onde ou com quem eu estava. Digo a mim mesma que é hora de aceitar que o antigamente não é mais minha realidade. Sinto falta de minha mãe, sinto falta de Daniel. Sinto falta de meu pai. Decido ligar para Thiago antes que os pensamentos acabem me deixando para baixo. Ele atende no terceiro toque.  — Oi, lindinha.  — Oi, gato. Como está as coisas com sua mãe? — Tudo bem agora. Ela está dormindo. — Fico feliz. — O que aconteceu? — Por que acha que aconteceu alguma coisa? — Deve ser porque você está me ligando depois da meia noite.  — Ai meu Deus! Eu te acordei? — Não, relaxa. Agora me diz o que foi? Suspiro.  — Não sei. Acho que estou um pouquinho triste. Ele fica em silêncio por alguns segundos.  — Eu vou aí. — Thiago, já é quase 1 da manhã.  — Não me importo. Sei porque ele está tão preocupado, sei porque ele realmente vai aparecer na minha casa a essa hora, se eu não impedir. — Não faça isso, Thiago. Não sou uma criança. Você precisa superar o que aconteceu. Mais silêncio. — Tudo bem, eu acho. Quer me contar porque está triste? — Ah, agora você quer saber? Acho que agora eu só prefiro ir dormir.  — Você tá com raiva de mim agora? — É a segunda vez que você menciona tal assunto hoje. — Não é verdade. Não falei nada sobre isso agora. — Mas estava pensando. — você não pode ter certeza. — ceeeerto, Thiago. Eu realmente estou com sono, então conversamos amanhã? — Sempre, nervosinha. — Boa noite. — Boa noite. — Tchau.  — Se cuida.  Ainda estou sorrindo quando desligo o celular. Tomo um banho e me deito. Penso em Thiago, tenho sorte por ter ele na minha vida. Mas, então, uma imagem de Bruno invade minha mente sem permissão nenhuma. A imagem vem acompanhada de um pensamento maluco "quero beijá-lo". Me repreendo mentalmente. De onde veio isso? Esqueça Bruno, foque no Thiago. Não dá certo. Porque quando pego no sono, ainda estou vendo o sorriso de Bruno na minha cabeça.
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