O que foi a caçadas a bruxa

3898 Words
??Meus amores este capítulo e fruto de pesquisa, não faz parte da história. Estou recebendo muitas dúvidas dos leitores querendo saber mais do tema, os nomes abaixo são reais e aqui está mais informações sobre o século? ? Este capítulo não faz parte da história? O termo caça às bruxas pode ser utilizado para designar historicamente a perseguição ocorrida em qualquer era às mulheres que supostamente possuíam poderes sobrenaturais, mas é usualmente mais usado para se referir aos eventos ocorridos durante cerca de quatro séculos a partir do século XV, quando a Igreja liderou uma grande investida contra mulheres que de alguma forma haviam ferido as expectativas sociais, políticas ou religiosas, normalmente de classe social mais humilde. Atualmente, a expressão caça às bruxas diz respeito especificamente à perseguição sistemática contra algum grupo. No século XIII, a Igreja criaria o Tribunal do Santo Ofício – melhor conhecido como Inquisição – para impedir que pessoas desviadas dos ensinamentos cristãos deixassem a instituição, utilizando-se para isso de variados mecanismos de perseguição e punição. Neste sentido, costuma-se dividir a ação da Inquisição em dois períodos: o medieval, do século XIII ao XIV, e o moderno, do século XIV ao XIX. Em 1484, durante o papado de Inocêncio VIII, seria emitida uma bula oficial com condenações à prática da feitiçaria: o Summis desiderantes affectibus, que também apoiava as ações necessárias para livrar a cristandade dos praticantes de bruxaria. Dois inquisidores nomeados aproximadamente nesta época, Jakob Sprenger e Heinrich Kramer, escreveriam “O Martelo das Feiticeiras”, livro que nortearia uma série de perseguições aos acusados de bruxaria por meio de argumentos jurídicos e religiosos. Contracapa de “O Martelo das Feiticeiras”, edição em Latim, 1669. Via Wikimedia Commons As mulheres seriam o grupo mais acusado de prática de feitiçaria: atualmente, calcula-se que elas representavam cerca de 80% dos denunciados. Embora tenham existido acusados de todas as classes sociais, eram as mulheres mais pobres as mais vulneráveis, geralmente viúvas, que tentavam sobreviver produzindo remédios de ervas ou atuando em atendimento médico, sendo muitas vezes a única possibilidade existente em suas comunidades. Em um período de crises epidêmicas, instabilidade política e mudança social, essas mulheres seriam utilizadas como alvo de uma campanha das classes dominantes para direcionar o pânico da população, gerando histeria. Acontecimentos negativos passaram a ser considerados como fruto da ação de bruxas. Mulheres com aparência vista como desagradável, como deficiência física, deformidades e idade avançada, ou então muito bela, que despertavam desejos não correspondidos em homens poderosos, poderiam ser denunciadas por praticar bruxaria ou então ter um pacto com o demônio. Iniciando-se no sudeste da França em meados do século XV, a caça às bruxas visava encontrar culpados por eventos que variavam de pragas e colheitas falhadas até esterilidade feminina e impotência masculina. O processo jurídico incluía mecanismos de “reconhecimento” das feiticeiras como pesá-las (bruxas eram vistas como pesando nada ou quase nada) ou mesmo amarrando-as e jogando-as em lagos ou rios abençoados previamente. Se afundassem, eram inocentes; se flutuassem, eram culpadas. Outro mecanismo usual de “verificação” de culpados de feitiçaria era a procura por “marcas do demônio”, ou seja, marcas de nascença como pintas, verrugas ou até cicatrizes. Tal marcas seriam procuradas no corpo da pessoa suspeita em um exame público após retirada de todos os pelos corporais. Elas seriam então espetadas com instrumentos cortantes. Se houvesse sangramento, a pessoa era inocente; se não houvesse – o que era costumeiro devido à técnicas específicas dos inquisidores -, a pessoa era culpada. Calcula-se que cerca de 100.000 pessoas podem ter sido executadas pela prática de bruxaria, normalmente pela fogueira ou, caso confessassem previamente, estrangulamento. Caso tivessem bens, eles eram confiscados, o que tornaria a Inquisição uma instituição muito rica. A caça às bruxas se estenderia pelas Reformas Religiosas do século XVI adentro, sendo os julgamentos mais famosos os ocorridos em North Berwick, na Escócia, no final do século XVI, e em Salem, nas 13 Colônias americanas, no final do século XVII. Progressivamente, porém, a influência cada vez maior do Humanismo e do Iluminismo contribuiria para a diminuição dos julgamentos por bruxaria até que, no século XVIII, eles cessaram. Atualmente, o movimento feminista considera a caça às bruxas como um verdadeiro genocídio do sexo feminino. ✔️O que significa a palavra inquisição? ? Eram pessoas acusadas de fazer feitiços e usar poderes sobrenaturais, supostamente obtidos em rituais satânicos e pactos com demônios. ✔️Quantos anos durou a caça às bruxas na Europa? 400 anos A caça às bruxas, que atingiu o ápice entre os séculos 15 e 17, foi um capítulo sinistro na transição do mundo medieval para o período moderno. Durante cerca de 400 anos, os governos laicos e as autoridades religiosas da Europa prenderam, torturaram e assassinaram uma multidão de pessoas pelo crime de feitiçaria CAÇA ÀS BRUXAS: AS MULHERES MORTAS POR BRUXARIA Durante vários séculos, elas foram cruelmente — e injustamente — acusadas de práticas satânicas e pagaram com as suas vidas 1. Agnes Sampson Agnes Sampson era uma famosa curandeira que morava em Nether Keith, na Escócia. No século 16, desempenhava o papel de parteira na região onde morava. Viúva, e com filhos, rumores alegavam que Agnes, devido a sua sabedoria e experiência, possuía poderes mágicos. Quando a caça às bruxas se instalou na Escócia, em meados de 1590, Sampson foi uma das mulheres levadas ao palácio do rei James VI, sob a acusação de bruxaria. Inicialmente, a mulher negou que tinha qualquer envolvimento com magia n***a. Levaram-na para a masmorra, onde ela foi submetida a brutais sessões de tortura, durante dias. Rasparam o cabelo de Sampson e arrancaram suas roupas em busca da marca do d***o — algo que toda bruxa recebia no momento que aceitavam a servidão —, mas sem sucesso. Os guardas reais decidiram então aumentar a tortura, com o uso do torniquete, um aparelho que apertava o pescoço da vítima. Foi quando Agnes sucumbiu e aceitou todas as acusações do rei. Segundo o embaixador inglês, Robert Bowes, a bruxa havia confessado ter tentado lançar feitiços contra o monarca. Sampson foi condenada a morte por bruxaria, e queimada na fogueira em 28 de janeiro de 1591. Uma lenda afirma que o fantasma de Agnes ainda está preso no Palácio de Holyrood, em Edimburgo, aparecendo nua e careca para assombrar quem passa pelo local. 2. Jennet Device Jennet era uma pobre menina de nove anos que morava com a família, mãe e irmãos, na casa de sua avó, em 1612, período no qual o rei James I, da Inglaterra, popularizava a caça às bruxas no país e todos viviam aterrorizados. A avó de Jennet era quem sustentava a família, moradores pagavam para que ela curasse doenças ou ajudasse a encontrar objetos perdidos. Um trabalho comum na época, o que permitia a sobrevivência dos Device. Um dia, ao pedir esmola, a irmã de Jennet, Alison, teria gritado uma maldição para uma pessoa que rejeitou lhe dar dinheiro, no mesmo momento o homem sofreu um grave derrame. Amedrontada, Alison afirmou ser uma bruxa e acusou também todos os membros de sua família. A acusação não foi levada a sério, mas as autoridades começaram a vigiar os supostos bruxos. Na Sexta-Feira Santa, a mãe, Elizabeth, decidiu não ir à igreja, e sim dar uma festa em sua própria casa. Durante o evento, oficiais da Inquisição invadiram o local e levaram todos presos, com exceção de Jennet. Na prisão, a avó morreu, devido a condições desumanas que foi submetida. Sobraram a mãe e os irmãos de Jennet para serem julgados. No dia do julgamento Jennet foi a principal testemunha, e acusou todos seus familiares de praticarem feitiços e assassinatos. O relato foi tão convincente que, não só, garantiu a morte por enforcamento de sua família, como, a partir daquele momento, validou crianças como testemunhas credíveis para acusações de bruxaria. 3. Joan Flowers Joan Flowers e suas duas filhas, Margaret e Philippa, eram servas no Castelo de Belvior, residência de Francis Manners e família, que trabalhavam na corte de James I. As três funcionárias desempenhavam a função de curandeiras, e não era bem vistas por seus colegas. Eventualmente, elas foram demitidas com acusação de roubo. Em seguida, os dois filhos da família do conde morreram misteriosamente. O casal e a única filha também sofreram de vômitos e convulsões, porém ninguém desconfiou de causas sobrenaturais e, por cinco anos, as mulheres da família Flowers levaram uma vida normal. Até que, em 1618, os Rutlands prenderam Joan, Margaret e Philippa por bruxaria. No caminho da prisão, Joan foi implorando sua inocência, e afirmou que apesar de não frequentar a igreja poderia provar que não era uma bruxa. A mulher então pediu um pedaço de pão para um dos guardas, e disse que seria como a eucaristia, tão abençoado que seria impossível para uma bruxa comer e não morrer. Para a surpresa de todos, após o primeiro pedaço, Joan engasgou e morreu. Margaret acusou a falecida mãe de bruxaria, enquanto Philippa admitiu ser culpada. Elas ainda acusaram outras mulheres de bruxaria. As irmãs foram enforcadas em 1619. 4. Bridget Bishop , até hoje, uma das mais famosas mulheres acusadas de bruxaria da História. Ela foi a primeira pessoa a ser morta na infame caça às bruxas de Salem. Na época com 60 anos, tinha sido casada três vezes e optava por usar seu nome de solteira, o suficiente para que moradores da região espalhassem absurdos rumores sobre sua vida. Bishop foi acusada de todo tipo de comportamento mágico e maléfico. Afirmavam que ela se materializava nos quartos e nas camas dos homens da aldeia, fazia maçãs voarem, atravessava portas fechadas e torturaria as meninas adolescentes, ameaçando-as de morte. Muitas pessoas testemunharam contra Bridget, alegando que ela ou os perseguia, ou já havia os atormentado de alguma forma, algo que ela sempre negou. Um júri de mulheres ficou encarregado de revistar o corpo da acusada, em busca da marca do d***o. Um terceiro mamilo teria sido encontrado, e na revista seguinte, já não conseguiam encontrar nada de anormal em seu corpo. Foi condenada a morte por enforcamento em 10 de junho de 1692, marcando o início de centenas de morte que viriam a acontecer na cidade de Salem. 5. Gwen Ferch Gwen Ferch nasceu em 1542, e morava no Vale de Clwyd, no País de Gales. Foi a primeira pessoa acusada e executada por bruxaria no país. Ferch foi casada três vezes, sendo que nas duas primeiras seu marido morreu de forma misteriosa, enquanto o terceiro tem seu destino incerto. Ela ganhava o sustento fabricando roupas de linho e fazendo ocasionais trabalhos de cura. Apesar do uso de feitiços verbais não ser uma prática anormal no País de Gales, Gwen se destacou por usar um encanto conhecido por, se praticado ao contrário, causar destruição, e não a cura do doente. Foi examinada pelo bispo William Hughes, e diferentes testemunhas a acusaram de bruxaria. Entre as afirmações estava a de que ela teria levado uma criança à loucura, e ter causado a morte de um homem doente após se encontrar com ele. Ferch foi considerada culpada e enforcada na praça da cidade de Denbigh, em 1594. A verdade por trás da acusação Já entrado nos 50, o burgomestre (prefeito) de Bamberg estava em profunda depressão quando decidiu passear pelo campo de sua propriedade. Sentou-se no chão para chorar. Então foi interrompido por uma estranha aparição, um súcubo, um demônio que se fantasia de mulher para seduzir os homens. Que então perguntou por que estava tão triste. Ele respondeu que simplesmente não sabia. Então a criatura se aproximou. E se transformou num bode, que falou: Agora você sabe com quem está lidando. O bode exigiu a Johannes Junius — esse era seu nome — que se entregasse a ele, ou seria morto. O burgomestre gritou “Deus, me salve disso!”, e o monstro sumiu. Apenas para retornar com mais demônios. Junius então cedeu, negou a Deus e passou pelo batismo n***o. Depois disso, uma rede de satanistas na cidade de Bamberg se revelou a ele, e o convidou a celebrar sabás negros. A história acima Junius contou a seus inquisidores, em 5 de julho de 1628, após uma semana sendo pendurado pelos punhos com as mãos para trás, tendo os dedos apertados até sangrarem, e as pernas pressionadas até quase seus ossos se partirem. Segundo ele próprio, na carta final à sua filha, apenas uma história que ele inventou para parar o suplício. Junius sabia o que os caçadores de bruxas queriam ouvir. Sua colorida narrativa foi aceita como realidade. Mas seus acusadores não estavam satisfeitos. Queriam nomes, quais eram esses satanistas que encontrou, ou haveria mais tortura. E nomes ele teve de dar. Foi por essa mesma armadilha viciosa que o próprio Junius havia caído. Sua esposa e um amigo o haviam denunciado antes de queimarem. Bamberg arderia por mais três anos, até que a população começou a questionar o tribunal, pois ninguém estava seguro. A loucura terminaria quando tropas protestantes invadiram a cidade, em meio à Guerra dos 30 Anos. Ninguém esperava a inquisição O prefeito em desgraça não era o caso mais típico — ele era homem e rico. A grande maioria dos até 100 mil mortos acusados de bruxaria era de mulheres, muitas delas pobres. Bruxas, mulheres com poderes mágicos e más intenções, são parte do folclore de quase todas as culturas, dos astecas aos zulus. Na Europa, em meio ao declínio do feudalismo, a partir do século 13, inicia-se um processo de êxodo para as cidades, que duraria séculos, acompanhado por uma série de revoltas camponesas por toda a Europa, que alteram a relação entre servos e senhores feudais. E a relação das mulheres com as normas sociais vigentes. À medida que os camponeses passam a conquistar mais liberdades — seja passando de uma relação feudal a uma relação dinheiro-aluguel, seja funcionando como contratados, e não como semiescravos a serviço perpétuo de um senhor —, as mulheres passam a conquistar mais liberdades também. O que não necessariamente significava uma vida materialmente melhor, pois com ela vinha a perda de garantia de alimentos e moradia. Daí as revoltas. O processo de substituição do modelo feudal pelo capitalista, como explica a historiadora ítalo-americana Silvia Federici em seu livro Calibã e a Bruxa: Mulheres, Corpo e Acumulação Primitiva, levou ao êxodo das aldeias para as cidades e, nesse ínterim, mulheres começaram a exercer funções e profissões para além das casas e terrenos familiares, seja como pedreiras, seja até mesmo como cirurgiãs. E comumente como prostitutas. Essa aparente liberdade das mulheres, que mesmo exercendo em geral atividades inferiores estavam menos sujeitas ao controle dos homens, não passou desapercebida pela Igreja. A Inquisição havia nascido no século 12 como forma de eliminar heresias como o catarismo e o valdismo. Mais de um século depois, passou a olhar para a bruxaria como uma forma de heresia. Até então, muitos dos próprios papas poderiam ser acusados de tal prática, dado o enorme interesse de alguns deles pela alquimia e pura e simples magia. As primeiras medidas que dariam início à Inquisição começam a ser postas em prática em 1184 com o papa Lúcio III (a chamada Inquisição Episcopal). Com o papa Inocêncio II acontece a primeira cruzada inquisitória, contra os cátaros (também chamados albigenses), em 1198. O Tribunal do Santo Ofício, ou a Inquisição Papal, é criado oficialmente em 1229-1230 pelo papa Gregório IX durante o Concílio de Toulouse. Em 1320, finalmente, o papa João XXII inclui a bruxaria no hall de heresias. As bruxas passam a ser o alvo preferencial da Inquisição a partir do século 14, após o surto de Peste n***a, que dizimou um terço da população europeia e foi lido por líderes religiosos como uma forma de punição pela leniência a heresias e comportamentos não cristãos. Obra indireta e direta de bruxas e magia n***a. O best-seller assassino A criação da prensa de Guttenberg é comumente vista com um instrumento de elucidação das massas. Uma visão idílica. Veja o caso do clérigo católico Heinrich Kramer. Em 1487, ele lançaria Malleus Maleficarum. Um livro que deveu seu sucesso ao revolucionário método de reproduzir livros e, por dois séculos, o segundo mais vendido na Europa após a própria Bíblia. É um guia de caça às bruxas e heresias afins. Nele, Kramer endossa o extermínio, valendo-se de detalhadas análises legais e teológicas, louvando a prática da tortura para obter confissões. E, um ponto central, afirma que mulheres têm tendência natural a se tornarem bruxas. O Malleus, diz Diarmaid MacCulloch no livro Reformation: Europe’s House Divided, foi escrito como uma forma de vingança e autojustificação por Kramer ter sido impedido de levar adiante um dos primeiros processos contra bruxas na região do Tirol. Kramer foi expulso da cidade de Innsbruck e, após apelar ao papa Inocêncio VIII, este lhe atendeu com uma bula, em 1484, a Summis Desiderantes Affectibus, que lhe garantia jurisdição para atuar na Alemanha. Até a publicação do livro, a bruxaria era considerada um crime menor, punido com castigos físicos diversos. Uma esquisitice folclórica de velhinhas m*l-orientadas pelos padres. Após a publicação do Malleus, autoridades católicas e protestantes passaram a usá-lo no julgamento e condenação de suspeitas de bruxaria, tornando mais brutal a perseguição. O livro não era usado por inquisidores, mas sim por tribunais seculares, em especial durante a Renascença. Quem queimava os acusados de bruxaria era o Estado, não o clero — o governo da Espanha, Portugal, dos vários Estados alemães etc. Só nos Estados Papais, onde a Igreja também era a autoridade secular, a Inquisição tinha poder para executar — como no célebre caso do teólogo Giordano Bruno, que queimou em Roma, em 1600. Simpatia pelo Diabo Não era só a negação a Cristo que movia a fúria contra as bruxas. O escândalo andava de mãos dadas com a fé em ceifar vidas inocentes. Acusações de sexo com demônios eram lugar-comum durante o auge da perseguição à mulheres consideradas bruxas, entre os séculos 14 e 17, uma época em que sexo era um tabu, como conta o historiador David M. Friedman, em Cultural History of the p***s. Não era incomum que os juízes nos julgamentos das bruxas exigissem detalhes minuciosos das alegadas práticas sexuais. Quanto mais inventivos os atos, maior a sensação nas seções de tortura a que submetiam as acusadas e que prenunciavam o auto de fé. Além de curandeiras, aquelas mulheres que não seguiam à risca normas sociais da época (como se portar de maneira recatada, obedecer aos pais e marido etc.) eram alvos dos inquisidores, assim como as mentalmente insanas ou perturbadas. Ou, sem fazer nada, as que tivessem o azar de serem denunciadas por inveja, ciúme ou, como no caso do prefeito, alguém forçado a dar um nome Também escandalosa é a origem do veículo favorito das bruxas, a vassoura. Atestado por múltiplas fontes e em múltiplas receitas, o unguento voador era um composto tradicional alucinógeno feito de plantas venenosas como a mandrágora, a beladona e a figueira-do-d***o. Provável vestígio da era dos druidas, era usado em rituais noturnos, que envolviam vassouras de um jeito peculiar. No julgamento da nobre irlandesa Alice Kyteler, em 1324, é mencionado que as bruxas confessaram besuntar o cabo com o unguento e cavalgá-lo até o ponto de encontro, ou ungirem-se nas axilias e em outros locais peludos. Não ria. Alice foi queimada viva. Histeria e Hecatombe O livro European Witch Trials: Their Foundationsin Popular and Learned Culture, de Richard Kieckhefer, traz uma longa e assustadora lista de julgamentos de bruxas a partir do século 14, como por exemplo o julgamento de 600 pessoas acusadas de bruxaria na cidade de Toulouse entre 1320 e 1350, sendo 400 delas condenadas e executadas. Ou 400 pessoas julgadas e 200 condenadas e executadas na vizinha Carcassonne, na mesma época. Além das torturas, havia ainda os métodos práticos para encontrar bruxas. O mais comum era o teste da água. Uma mulher era arrastada para um lago ou rio, despida e amarrada. Ao ser atirada, se flutuasse, era bruxa. Se afundasse, eles até tentavam puxar de volta. A explicação é que bruxas repeliam a água por terem rejeitado seu batismo ao aceitarem Satã. Mas não era a única: também disseram que era por serem anormalmente leves. E assim surgiu o teste do peso: se a ré pesasse menos do que se imaginava normal, era bruxa. A Alemanha do fim do século 16 e começo do 17 viu alguns dos maiores autos de fé registrados na História. Junto a Johannes Junius, pelo menos mil pessoas foram executadas em Bamberg (1626- 1631) e em Trier (1581-1593). Na mesma época, mais 250 em Fulda (1603-1606) e 900 em Würzburg (1626-1631). No século seguinte, a caça às bruxas se tornou a peça número um da denúncia dos iluministas aos abusos da religião e superstição. Aos poucos, a loucura iria se arrefecendo. A última pessoa a ser morta por acusação de bruxaria foi Anna Göldi, na Suíça. Foi acusada de materializar magicamente vidro e agulhas no pão e leite da filha de Jakob Tschudi, para quem trabalhava como doméstica. Torturada, falou ter feito um pacto com o d***o, na forma de um cachorro preto que se materializou do nada. A caça às bruxas então já era bem desmoralizada. Göldi foi acusada formalmente de envenenamento, não bruxaria — ainda que a lei não prescrevesse pena de morte para tentativa de envenenamento. Era 1784, oito anos após a morte de David Hume, seis anos da de Voltaire e Rosseau, um após a de D’Alembert e o mesmo da de Diderot, filósofos anticlericais que dariam origem ao jeito moderno e secular de pensar. Antes do fim do século, em 1798, os Estados Papais seriam capturados pela França, restaurados em 1800 e novamente capturados sob Napoleão, em 1808. O total de mortos por acusações de bruxaria desde a Idade Média é controverso. A cifra mais baixa, 35 mil, é defendida pelo historiador William Monter, da Northwestern University (EUA). Em seu livro Witchcraze (sem tradução), de 1994, a historiadora Anne Llewellyn Barstow chegou a 100 mil. Las Hay? Mas, afinal, tudo isso foi mesmo por nada? As bruxas existiam? A resposta é sim. Havia de fato satanistas na Idade Média. Ao menos um caso é bem registrado: o dos luciferianos, um grupo derivado dos cátaros que viveu na Alemanha do século 13. Acreditavam que Satã havia sido injustiçado e na verdade era o lado bom da guerra com Deus. Mesmo se satanistas reais fossem raros ao ponto da irrelevância, o que não faltava era candidatos a mago. Alquimistas ganhavam fortunas não só por fórmulas como por rituais secretos. Os grimórios, livros de feitiços, circulavam por mãos cobiçosas por toda a Europa. O Grimório de Honório, do século 13, era atribuído a um papa. Ele ensinava como escapar do purgatório e invocar demônios, entre outras. A diferença entre alquimistas e bruxas é que os primeiros eram homens, ricos, educados e próximos ao poder, conselheiros de reis e papas, justificando sua atividade como uma manipulação da natureza. As bruxas eram conhecedorasde ritos e poções de tempos pagãos, sem entender como isso poderia ser visto como adoração a Satã. Como os alquimistas, todas (ou quase todas) deviam se ver como boas cristãs. Certamente, algumas delas e alguns deles usaram seus poderes — bem reais, no caso de venenos — para o m*l. Mas quem teve uma vovozinha tradicional, daquelas que fazem rezas, simpatias e garrafadas, conheceu a bruxa típica.
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