O olhei surpresa e ao mesmo tempo intrigada. Não sabia o que ele queria e para ser sincera, estava com medo do que poderia ser.
Suspirei fundo e engoli em seco, em seguida prossegui:
— O que quer?
— Queria conversar um pouco com você.
— Sobre?
— Desde quando você retornou? Não a vi chegar.
— Foi ontem, então sim, você me viu voltando.
— E seu pai, como está?
— Ele está bem! — puxei meu braço bruscamente de sua mão. — Mais alguma coisa, Matteo?
Matteo abaixou sua cabeça, olhando para os seus sapatos, ele parecia relutante em perguntar algo a mais.
— Era apenas isso.
Revirei os olhos e voltei a caminhar até a porta, mas assim que estava seguindo em direção a mesma, Matteo me chamou.
— Milana... e você... você está bem?
— Eu estou ótima Matteo!
Voltei a caminhar. Abri a porta e me retirei do vestiário.
Assim que a aula havia terminado, peguei as minhas coisas e Alessa e eu seguimos em direção a saída.
— Sobre o que a diretora queria falar com você? — perguntei enquanto caminhávamos de volta para casa.
— Sobre alguns papéis, nada demais.
— Entendi... Matteo veio falar comigo no vestiário.
— Sério? E o que ele falou?
— Perguntou se meu pai e eu estávamos bem, e em que momento eu havia voltado.
— Da para ver o quanto ele quer voltar a falar com você.
— Com perguntas bestas? Isso é ridículo!
— É claro! Ele quer conversar contigo, mas não soube o que falar, então ele arrumou uma "desculpa" com essas perguntas para ir conversar com você.
— Então não funcionou, porque eu não dei o mínimo de interesse em suas perguntas e muito menos perguntei se ele ou os seus pais estavam bem.
— Nossa, como você é rancorosa.
— Não é rancor, é apenas mágoas do passado.
— Eu chamaria de rancor.
Ao chegarmos na rua da minha casa, me despedi da Alessa e voltei a caminhar. Assim que estava passando em frente a casa do Matteo, o vi olhando para mim. Rapidamente desviei meu olhar e entrei em casa. Subi as escadas e entrei em meu quarto, deitando-me na cama em seguida.
Às vezes eu me sentia solitária em casa, meu pai e eu não conversávamos muito, principalmente depois que a minha mãe partiu. Quando a minha mãe morreu, meu pai havia entrado em uma depressão muito grande, então eu tive que fingir ser uma pessoa "forte" e não transparecer para o meu pai que eu também estava caindo, mesmo que eu ainda esteja.
Algum tempo mais tarde, ouvi a campainha tocar. Desci as escadas e abri a porta, avistando a minha avó.
— Oi vó — sorri a abraçando. — Entre — dei passagem para que a mesma entrasse.
— Olá querida, como você está?
— Estou bem e a senhora?
— Muito bem. O que tem feito?
— Nada demais, só estive indo para a escola.
— E seu pai, como ele está?
— Ele está bem também.
— Fico feliz. Bom, hoje farei um de seus pratos favoritos.
— Essa foi a frase que me animou hoje.
— Então espere até a hora para você comer.
— Me animará ainda mais.
A minha avó vinha nos visitar toda semana, ele ainda sentia medo de que meu pai caísse em depressão novamente e cometesse algo r**m, então ela nos visitava para ter certeza que tudo estava bem, principalmente com o meu pai.
Eu admirava muito a minha avó, mesmo com todas as coisa que havia acontecido com a sua filha, que no caso era a minha mãe, a minha avó ainda tentava se manter firme, com um sorriso em seu rosto.
Algum tempo depois, meu pai chegou. O mesmo entrou e cumprimentou minha avó.
— Oi Marisa, como a senhora está? — perguntou a abraçando.
— Estou ótima e você?
— Estou ótimo também.
— Que bom que você chegou, Milana e eu já estávamos indo jantar e aproveite, porque eu fiz um dos seus pratos favoritos.
— Você sabe que não precisava.
— É claro que precisava! Vem.
— Obrigada Marisa, a senhora arrasa sempre — sorriu levemente.
Sentamos na mesa e começamos a comer. A vovó havia feito uma lasanha com muitos ingredientes e temperos, fazendo com que ficasse ainda mais gostoso e saboroso.
— Está delicioso como sempre — sorri.
— Fico feliz que tenha gostado meu bem — sorriu minha avó.
— Faço das palavras da Milana as minhas — disse meu pai.
— E vocês estão bem mesmo, não é? — perguntou minha avó ainda preocupada.
— Estamos sim, não se preocupe — respondeu meu pai com um leve sorriso.
— Tudo bem — sorriu ela.
Algum tempo depois, nos despedimos da vovó e voltei para o meu quarto. Deitei em minha cama e comecei a pensar na minha mãe, imaginando de como seria a minha vida e a vida do meu pai se ela estivesse viva, provavelmente seria muito melhor. Algum tempo depois, adormeci.
Na manhã seguinte, havia despertado um pouco desanimada. Levantei-me sonolenta e calcei as minhas pantufas. Peguei uma toalha e segui para o chuveiro. Assim que terminei, saí do banheiro e vesti o meu uniforme, calçando meus sapatos em seguida. Peguei a minha bolsa e desci as escadas, caminhante até a cozinha. Me sentei na mesa e preparei meu sucrilhos com leite, tomando-o em seguida. Ao terminar de comer, peguei os meus pertences e me retirei de casa, esperando Alessa chegar.
Matteo estava do outro lado da rua em seu quintal, conversando com o seu amigo. Ele estava me olhava a cada segundo, deixando-me desconfortável.
Assim que Matteo começou a vir em minha direção, Alessa chegou.
— Graças — suspirei aliviada. — Ainda bem que chegou.
— Por que? O que houve?
— Vem, vamos.
Começamos a caminhar em direção a escola e enquanto isso, eu conversava sobre o Matteo com Alessa.
— Segundos antes de você chegar, Matteo começou a caminhar em minha direção, mas ainda bem que você chegou antes.
— Outra vez? O que será que ele está querendo com você agora?
— Não sei, mas talvez esteja querendo se reconciliar comigo, sei lá...
— Ele viu que você está uma gatinha, por isso tanto interesse.
— Não seja b***a — sorri.
— E não seja modesta.
Ao chegarmos no colégio, entramos e Alessa pediu para que eu a encontrasse na classe, pois ela precisava ir novamente conversar com a diretora, para entregar alguns papéis assinados. Em seguida caminhei até meu armário. O abri e peguei o livro para a próxima aula. Assim que o fechei, avistei Dylan encostado no armário ao lado, olhando-me com um sorriso debochado.
— E aí “olhos diferentes”, faz tempo que não nos vemos.
— Estava demorando — bufei irritada. — O que você quer?
— Nada... bem, talvez saber das novidades.
— Cai fora Dylan! Não irei falar com você!
— Mas já está estressada? — indagou cínico.
— Volte para o seu amigo e deixe-me em paz! — o empurrei, caminhando em direção a classe.
Dylan era um dos melhores amigos do Matteo e uma das pessoas que amava me irritar.
Achei que Matteo e Dylan haviam amadurecido, mas infelizmente isso não aconteceu e para a minha infelicidade teria que aguenta-los mais um ano.
Eu odiava o jeito que ambos me chamavam, “olhos diferentes”. Eu tenho heterocromia, um lado do meu olho é verde e o outro da cor de mel. Quando pequena, as crianças viviam tirando sarro de mim e chamavam-me de “olhos diferentes” ou “a garota dos olhos estranhos”, e Matteo sabia disso, principalmente Dylan, mas para eles eram indiferentes.
Assim que ouvi o sinal tocar, entrei na classe, sentando-me ao lado de Alessa.
— Matteo e Dylan começaram a implicar novamente comigo.
— Já estava demorando... olha, não liga para o que aqueles dois idiotas falam, eles só dizem as coisas para te perturbar, então apenas ignore ambos.
— Irei fazer isso.
A professora entrou na classe e colocou seus pertences na mesa. Em seguida, a mesma prosseguiu.
— Bom dia, hoje temos um colega novo.
A professora chamou um garoto que estava sentado na carteira da frente. O aluno se levantou e caminhou até a professora, parando ao seu lado.
— Este daqui é o Lorenzo, ele veio da Espanha, então por favor, sejam educados. Obrigada Lorenzo, pode voltar a sentar.
Lorenzo sorriu timidamente e voltou para o seu lugar.
— Um gatinho, não acha? — perguntou Alessa em voz baixa.
— Concordo plenamente, mas não se esqueça que a senhorita tem um pretendente — sorri.
— É claro que não, jamais!
Lorenzo era um rapaz muito bonito e esbelto. Ele era alto, como se tivesse um e oitenta e sete de altura, tinha cabelos pretos e seus olhos eram castanhos claros.
Algum tempo depois, o sinal havia tocado. Levantamos e pegamos os nossos pertences, nos retirando da classe e seguindo para o refeitório. Assim que pegamos as nossas bandejas com os alimentos, avistamos Lorenzo sozinho em uma mesa, então decidimos ir fazer companhia para ele. Caminhamos até o mesmo e sentamos em sua frente.
— Olá, prazer! Eu me chamo Milana — estendi minha mão.
— Muito prazer — sorriu apertando a minha mão.
— E eu me chamo Alessa.
— Olá Alessa.
— Então você é espanhol, certo? — indaguei.
— Isso, mas meus pais são italianos, então desde pequeno aprendi o idioma.
— Que bom, isso é muito legal — respondeu Alessa.
— O que está achando do colégio? — perguntei.
— Ainda é tudo muito novo para mim, mas fico feliz por estar conhecendo vocês e por estar conversando com alguém, é muito r**m ter que passar o recreio sozinho.
— Nós entendemos você, é realmente muito r**m — disse Alessa.
— E nós ficamos felizes por estar conhecendo um novo amigo — sorri.
— Então Lorenzo, você mora em qual bairro por aqui? — indagou Alessa.
— Na Vila Licoln, conhecem?
— Sim, eu já fui lá, é um bairro muito bonito — respondeu Alessa.
— E você, Milana? — perguntou Lorenzo.
— Sim e realmente é uma graça.
Estávamos comendo, quando Anna parou em nossa frente, com um sorriso animador em seus lábios. Ela estava com alguns papéis em suas mãos.
Anna era uma das garotas populares da escola. Uma garota alta com um e setenta de altura. Era magra e seus cabelos eram ruivos, e seus olhos esverdeados.
— Boa tarde, estou entregando os convites para a minha festa a fantasia e espero que vocês vá — falou enquanto distribuía os convites.
— Pode deixar, nós iremos sim — respondeu Alessa com um sorriso empolgado.
— Que bom, espero vocês lá!
Anna se afastou e começamos a ver mais detalhes sobre a festa.
— Quem faz uma festa em plena terça-feira? — indaguei.
— Amanhã é feriado, se esqueceu? Mas com certeza nós iremos! — respondeu Alessa.
— Você vai Lorenzo? — perguntei na esperança de que sua resposta fosse um sim.
— Eu vou ver, mas parece que será legal.
— Sim.
Algum tempo depois, assim que a aula havia terminado, nos despedimos do Lorenzo e seguimos em direção a casa.
— Então, percebi que você gostou do Lorenzo — disse Alessa com um sorriso cínico.
— Ele é bonitinho e bem divertido.
— Será que teremos mais um casal futuramente?
— Não se emociona, acabamos de conhecê-lo, mas espero que sim.
— Então tampouco se emocione também — Alessa riu.
— Um pouco difícil, mas tentarei.
Assim que me despedi de Alessa, entrei em casa e avistei meu pai sentado no sofá, com alguns documentos em suas mãos. Eu havia ficado intrigada e surpresa em vê-lo em casa, pois ele deveria estar no trabalho.
— Oi pai, o que está fazendo aqui? — sentei-me ao seu lado.
— Oi Milana, preciso lhe contar algo e espero não te ver triste.
— O que houve?
— Bem, você sabe que eu trabalho em uma empresa grande e muito boa, mas hoje, eu estava conversando com o meu chefe e ele quer que eu vá para Venezia a trabalho.
— Então... nós iremos?
— Não, será apenas eu e você terá que ficar, até porque, você voltou para a escola agora.
— E que dia você retornará?
— Eu ficarei esse mês inteiro, então voltarei apenas mês que vem.
— Ah... entendi — respondi tristonha.
— Mas não precisa ficar triste, o mês passará rápido e sua avó estará vindo visitá-la sempre.
— E nós iremos poder conversar todos os dias?
— É claro que sim! Te ligarei e enviarei mensagens todos os dias, assim que eu tiver o tempo livre e voltar para o hotel.
— Tudo bem — forcei um sorriso.
— Então tudo bem. Bom, agora preciso terminar de rever esses documentos.
Levantei-me da cama e subi para o meu quarto. Entrei e fechei a porta, deitando-me na cama.
Estava triste por meu pai ter que ir para outra cidade e ter que ficar um mês, isso me deixava bastante desanimada. Não queria que ele fosse, mesmo que nós não conversasse muito, eu ainda queria ele por perto.