sono

2758 Words
Adam parou ao lado do carro de Robin, preocupado. Não acho boa ideia você voltar sozinha a esta hora. Não vai chegar em Santa Fé antes da meia-noite. Tenho de voltar. Marquei compromisso de trabalho para amanhã. Mas eu não me sinto tranquilo. Não se preocupe ela garantiu, sorrindo. Só porque seu aluno viu um homem nos arredores não significa que ele tenha alguma coisa a ver com o desabamento. Não sei... Adam tinha suas dúvidas. Ou melhor, mais do que dúvidas. Ele sentia que havia alguma ligação. Mas Robin já estava com o motor ligado. Eu aviso assim que souber mais notícias desse John Martinez. Acredito que a mulher índia vai me procurar de novo. Tchau, Adam. Ele enfiou as mãos nos bolsos e a viu sair do estacionamento, levantando terra do chão com os pneus. Por que não insistira mais para que ela ficasse? Seria por ela estar ameaçando abalar a armadura com que ele se protegia há dez anos? Era uma noite sem nuvens e o imenso dossel de estrelas brilhava sobre as paredes do canyon. O céu era tão límpido que a Via Láctea parecia feita de gaze branca. Parado ali, Adam sentia uma proximidade com a natureza que o revigorava e acalmava. Ia virar-se para voltar ao acampamento quando uma vaga apreensão o deteve. Seu olhar seguiu a curva da estrada e avistou as lanternas do carro de Robin, sozinha na escuridão, cada vez menores. Uma parte da mente de Adam o tranquilizava dizendo que ela estava bem, apesar de dirigir um pouco rápido demais. Outra parte, porém, reagia por puro instinto e continuava a incomodá-lo. De repente, Adam percebeu a razão de sua inquietude. Com o coração apressado, viu outro par de faróis entrar na estrada bem atrás de Robin. Àquela hora da noite, em uma parte isolada do canyon, a coincidência de surgir outro automóvel era grande demais. Adam não perdeu tempo. Correu pelo estacionamento e, em questão de segundos, encontrava-se em seu carro acelerando em direção à pista. Bateu no volante com o punho fechado. d***a! Por que ela não o escutava? Por que ele não insistira mais para impedir uma viagem tão arriscada? Seria impossível alcançar Robin naquela estrada cheia de curvas fechadas. O motor roncava com o esforço excessivo que lhe era exigido, enquanto subia e descia ao longo do canyon. Do alto de uma ladeira, Adam avistou os dois pares de luzes a distância, antes que eles desaparecessem em uma nova curva. Robin certamente percebera que estava sendo seguida e pisava o acelerador até o fundo. Nunca a alcançaria a tempo. Imagens horríveis desfilaram por sua cabeça. Robin caída na estrada com um tiro no peito. Robin no carro em chamas, gritando por ajuda, com os olhos azuis cheios de terror. Durante vários quilômetros, Adam não viu nada à frente. Apenas as paredes de pedra maciça margeavam a estrada como escuras sentinelas. O motor começava a esquentar, f*****o além de seu limite. Adam sabia que podia estragar o carro, mas não se importava. Só havia Robin em sua mente, e o medo de não chegar a tempo. Depois de uma curva abrupta, ele por fim avistou faróis ao longe, mas pareciam estar imóveis, e num ângulo esquisito. Seriam do carro de Robin? As luzes vermelhas cresciam em sua visão à medida que o marcador de temperatura de seu automóvel aproximava-se da zona de perigo. Mas Adam ignorou o alerta e pisou mais fundo no acelerador. Era mesmo o carro de Robin, tombado fora da estrada, com os faróis iluminando a escuridão. Adam parou no acostamento e correu, com o coração apertado. Bateu na janela de Robin, gritando seu nome, enquanto forçava a maçaneta. Ela movia-se lá dentro, porém muito lentamente, como se estivesse bêbada. Quando, por fim, conseguiu abrir a porta, Adam a ouviu gemer. Tocou-lhe de leve o ombro e sua voz não passava de um murmúrio. Robin, sou eu. Adam. Vamos, Robin, temos que sair daqui. Ela gemeu outra vez. Venha, devagar... Você está bem? Acha que pode ficar de pé? Mas ela não podia. Apoiou-se nele atordoada, dolorida. Quando a tomou nos braços, os faróis de seu carro a iluminaram e Adam percebeu o sangue manchando a blusa de seda e grudando os cabelos loiros junto à testa. Com cuidado, recostou-a na lataria do automóvel para examiná-la melhor. Robin parecia bastante tonta, mas respirava bem. Fique quieta. Vou buscar o estojo de primeiros socorros em meu carro. Ele foi e voltou em segundos. Descobriu que o sangue saía de um grande corte na testa, sobre o olho direito. Adam deteve a hemorragia e improvisou um curativo, limpando a ferida o melhor que pôde e prendendo um pedaço de gaze sobre ela. Robin, você está me entendendo? Precisa levar alguns pontos nesse corte. Robin, por favor, você pode me ouvir? Estou ouvindo ela murmurou, após um tempo assustadoramente longo. Graças a Deus. Adam sorriu e sentiu a tensão deixar seu corpo. Acha que consegue chegar até o meu carro? Ah... claro. Ela não caminhava com muita firmeza, mas voltava lentamente a si. Chegou até a ensaiar seu velho senso de humor. Você não deveria me perguntar que dia da semana é hoje ou algo assim? Para saber se eu estou consciente? Que dia da semana é hoje? ele perguntou, ajudando-a a entrar no carro. Segunda-feira. Tente quinta. Certo, quinta. E meu nome é Robin Hayle. Essa eu acertei, não é? Adam fechou a porta e ligou o motor. Está indo muito bem. E... e o meu carro? Não se preocupe. Eu peguei as chaves. Está com um pneu furado e a roda partida. Para onde estamos indo? Para Cuba. Conheço um médico lá. Cuba? É uma cidade aqui perto, Robin. Ah. Eu preciso mesmo de um médico? Precisa. E sem discussão, mocinha! O dr. Ernest Lopez era um caso raro de médico rural. Ainda atendia chamados em casa dos clientes, embora insistisse com a população mexicana e indígena de Cuba para que o procurassem na clínica. Algumas vezes eles iam. Poucas vezes. Adam estacionou diante da casa do médico. Havia luzes acesas na sala. Espere aqui, Robin. Vou ver se Ernest pode atender você aqui ou na clínica. Adam, sobre o que aconteceu na estrada... Falaremos sobre isso mais tarde, está bem? Certo. Robin tentou mostrar-se corajosa quando sentou-se na cozinha do dr. Lopez para levar os pontos na testa. Ai, eu odeio isso reclamou, fechando os olhos enquanto Ernest injetava anestésico em torno da ferida. Esticou a mão à procura de Adam e encontrou-o a seu lado. Ainda bem que uso franja. Vou ficar parecendo a noiva do Frankestein. Ai! Adam teve de insistir para que o dr. Lopez aceitasse um pagamento pelos serviços. Se você não aceitar, Ernest, da próxima vez eu vou procurar outro médico. E onde mais você vai encontrar uma clínica por estes lado, Adam? É, boa pergunta. Pouco depois, Robin encontrava-se no carro de Adam, enrolada em uma velha jaqueta de jeans que ele deixara no banco. Seguiram metade do caminho para Santa Fé em silêncio, até que ela resolvesse falar no acidente. E o meu carro? Ficou lá na estrada? Não se preocupe com o carro. Eu cuidarei disso. Aquele maluco. Ela tocou a testa com cuidado. Do que você se lembra, Robin? Não muito. Ela puxou a jaqueta com mãos trêmulas. Ele me seguiu, você sabe. Não foi acidente. É, eu sei. Ele até bateu na traseira do meu carro umas duas vezes. Robin, se você preferir não falar... Eu estou bem, Adam. Na verdade, estou começando a ficar furiosa. Dá para acreditar? O sujeito poderia ter me matado! Ficou me seguindo com aquela caminhonete velha, tão perto que eu não via os faróis no meu espelho retrovisor. E então... então ele emparelhou comigo e me forçou a sair da estrada. Ele vai pagar por isso Adam afirmou, fervendo de ódio. Como? Nem sabe quem ele é! Ah, mas vou descobrir. Você parece muito certo disso. Vou falar com Rod Cordova. Não, você n******e! Dei minha palavra àquela mulher, Adam. Eu prometi. Eu entendo. Mas, Robin, será que você compreende que alguém tentou... matá-la esta noite? Será que percebe isso? Sim ela murmurou, baixando os olhos. Tenho certeza de que a sua visitante, a mulher índia, compreenderia. Eu não sei... Bem, mas eu sei. Robin, há alguém ciente de cada movimento seu. Mas como? Se eu soubesse... E eu diria que a razão de você ter sido atacada esta noite é a comissão especial de que está participando. Isso é absurdo. Eu não acho. Por que mais alguém ainda estaria atrás de você? Não sei. A outra possibilidade é que você esteja sendo vigiada cada minuto do dia. Se alguém viu sua visitante... A mulher índia? É. Tenho uma sensação r**m quanto a essa visita. No mínimo, foi uma imprudência. Mas ela não poderia saber se eu estava sendo vigiada. Talvez Adam disse, pensativo. Ah, não! A reunião da comissão era esta noite! Só lembrei agora! Eles vão compreender por que você faltou. E acho melhor você sair deste caso. Vamos entregar o problema à polícia. Mas se falarmos com Rod... Eu vou falar com Rod ele afirmou, decisivo. Ele pode localizar John Martinez e talvez obtenha alguma pista. E se Martinez não quiser falar com ele? Então eu mesmo irei procurá-lo. Adam, eu não acho... Assunto encerrado. Passou pela cabeça de Adam contar a Robin sobre a misteriosa mulher índia, Josefina Ortega. Dizer-lhe que ela provavelmente iria à polícia se soubesse o problema que sua visita causara. Mas, talvez, quanto menos Robin se envolvesse, melhor. Quero que você passe os próximos dias na fazenda de meus pais ele disse, quando as luzes de Santa Fé surgiram à vista. Ah, não sei, Adam. Sinto que é um incômodo para mim e para eles. Eu não estou pedindo, Robin. Está decidido. Adam não gostava de ser autoritário, mas sentia uma incontrolável necessidade de proteger aquela mulher que entrara tão de repente e de forma tão intensa em sua vida. Talvez ela nem se interessasse por ele e todo aquele esforço mental estivesse sendo em vão, Adam pensou. Mas um homem não poderia se enganar com os sinais que haviam surgido tão nitidamente entre eles desde a primeira vez em que seus olhares se encontraram, na loja de Robin. E ele não fizera nada concreto para interromper aquilo! Era culpa sua se agora tinha de enfrentar o problema. Vamos aborrecer sua mãe, Adam. Já é muito tarde. Não é justo com eles. Bobagem. Meus pais teriam um ataque se eu não a levasse para ficar lá. Mas não posso largar minha casa para sempre e ficar fugindo como um coelhinho assustado. Não vou. Robin, vamos resolver uma coisa de cada vez ele afirmou, estacionando diante da fazenda. Talvez amanhã Rod consiga alguma solução para o caso. Você acredita mesmo nisso? Ele não acreditava, mas achou melhor não responder. Chegamos. Espere aqui enquanto eu pego a chave do quarto de hóspedes. Era quase uma hora da madrugada e Adam teve cuidado para não acordar os pais. Eles estavam acostumados com suas chegadas e saídas em horas estranhas; sempre que Adam se encontrava em Santa Fé no verão, usava seu velho quarto na fazenda. Ele acompanhou Robin até o aposento de hóspedes, sabendo que ela ainda não estava muito firme para caminhar sozinha. O dr. Lopez recomendara que ela procurasse seu médico local, pois pancadas na cabeça não eram coisas com que se pudesse brincar. Mas Adam duvidava que Robin fosse seguir o conselho. Vou ligar o aquecimento para você. Fica muito frio aqui no começo de setembro. Obrigada. Ela sentou-se na beira da cama e fitou a blusa ensanguentada. Nossa, pareço uma criatura de filme de terror! Vou ver se acho alguma coisa para você vestir. Enquanto isso, você poderia dar uma lavada na blusa. As roupas de minha mãe não vão lhe servir. Robin apenas fez um sinal afirmativo com a cabeça, parecendo uma menininha perdida. Ele hesitou à porta. Tem certeza de que vai ficar bem sozinha? Claro, só estou cansada. Adam entrou silenciosamente na casa principal, pensando. Suas irmãs haviam levado embora todas as roupas. O que ele arrumaria para Robin vestir? Seguiu por um corredor longo e estreito até seu próprio quarto. Poderia lhe dar uma de suas camisas, mas não tinha um pijama em algum lugar? Claro, na última gaveta. Um presente de Natal que ele nunca usara. Adam levantou o pijama azul e imaginou Robin nele. O decote em V ficaria profundo, porque ela era bem magra. E a cintura baixaria até os quadris. Sem querer, pensou como seria a sensação do tecido novo de algodão contra a pele macia de Robin. O que é isso, Adam? resmungou consigo mesmo. É apenas um pijama. Voltou ao quarto de hóspedes e bateu à porta, mas não teve resposta. Talvez ela tivesse adormecido. Abriu devagar e ouviu o som de água corrente no banheiro. Adam atravessou o quarto e clareou a garganta. Ahn, Robin, eu trouxe algo para você vestir. Ah, obrigada. Já vou sair. Ela esticou a mão pela fresta da porta e pegou o pijama. Eu... ahn... acho que vou indo. Espere. Estou acabando. Ele sentou em uma poltrona, sentindo-se ridículo. Devia voltar para a casa principal e dormir um pouco. No entanto, uma parte dele recusava-se a qualquer movimento, antevendo Robin naquele pijama. Quando saiu do banheiro, ela trazia nas mãos a blusa molhada. Preciso de um cabide. Há alguns no armário. Vá para a cama que eu cuido disso. Adam levantou-se depressa, pegou o cabide e pendurou a blusa perto do aquecedor para secar. Parecia tão pequena e feminina, tão molhada e macia ao toque. Ao virar-se, viu Robin puxando o lençol para deitar-se e, como imaginara, o decote do pijama era grande demais, expondo o pescoço e a suave elevação dos s***s. Adam respirou fundo. Obrigada pelo pijama ela agradeceu, sorrindo. Para Adam, estava absolutamente linda. Nem chegou a ser usado. Foi um presente de Natal. Nunca uso... Bem, ele é novo Adam explicou, atrapalhado. Ela bocejou e Adam lembrou-se de que era tarde. Tinha muito a fazer no dia seguinte. Uma das primeiras coisas seria entrar em contato com Rod Cordova. Adam adoraria interrogar pessoalmente o tal de John Martinez, mas tinha receio de acabar assassinando o homem. Afinal, fora um índio que seu aluno vira rondando a kiva e, depois, deixando o estacionamento em uma caminhonete velha. Adam chamou Robin, interrompendo-lhe os pensamentos. Será que você poderia... O quê? Ficar aqui um pouco? Apenas ficar aqui, mais nada. Seu olhar normalmente ousado baixou para as mãos, que ainda seguravam o lençol. Adam engoliu em seco. Não devia ficar. Não conseguiria estar ali e não tocá-la. Porém, sair assim... Como se alguma entidade invisível o impulsionasse antes que ele pudesse pensar, viu-se sentado na beirada da cama com a cabeça de Robin em seu ombro. Obrigada ela murmurou, feliz. De alguma forma, Adam controlou os instintos e apenas a acolheu junto a si. Quando a respiração de Robin ficou mais profunda e regular, ele levantou-se com cuidado e apagou a luz. Depois sentou-se outra vez, colocou os pés em cima da cama e ajeitou a cabeça de Robin na curva de seu braço, afagando-lhe suavemente os cabelos dourados que há tanto tempo desejava tocar. E eles eram macios como seda. Vária vezes na hora que se seguiu ele baixou a cabeça e seus lábios tocaram os cabelos que os dedos acariciavam. Seus sentidos, apesar da cautela, estavam aguçados. Tinha a plena consciência dos cheiros que enchiam o quarto, da lã do tapete navaho, dos lençóis limpos, do sabonete que Robin usara para lavar a blusa. E da própria Robin vinha um aroma terreno, feminino. Seus olhos, ajustando-se ao escuro, fitaram através das cortinas entreabertas e viram os pontos de luz enfeitando o céu noturno. O aquecedor roncava baixinho, quase em compasso com sua respiração, e o peito de Robin subia e descia suavemente. Fechou os olhos por um minuto, depois tornou a abri-los e fitou o rosto de Robin. Ela era tão corajosa, tão perfeita. E a única coisa que podia fazer por ela era protegê-la da terrível situação em que a havia envolvido. Parecia muito pouco. Sem perceber, Adam adormeceu. Quando voltou a abrir os olhos, a luz havia passado o centro do céu e o alvorecer já se pronunciava a leste. E ele soube que havia dormido, porque Robin encontrava-se em seus braços agora, os s***s firmes pressionados contra seu peito, a boca perigosamente perto da sua.
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