Um feliz ano novo

1344 Words
                Acordei na manhã do dia 31 de Dezembro com uma estranha sensação de que tudo daria errado, e se eu tivesse feito o que eu realmente queria fazer – desligar o telefone celular e sumir no mundo – talvez os resultados não fossem tão desastrosos.                 O entregador chegou cedo para trazer um vestido especialmente encomendado da minha loja favorita de New York, para a noite de Reveillón, para a festa que James e eu iríamos: corte ajustado, decote discreto, mangas longas em corte sino e comprimento mais curto do que eu normalmente usava, mas eu estava sem filhos e com o meu marido.                 Dediquei muito tempo ao meu outfit impecável: esfoliação no rosto, máscara de argila para a revitalização fácil, outra hidratação no cabelo, matização das mechas, esmaltação das unhas em um tom de vermelho bordô que eu sabia que James gostava. Carreguei o carro: morangos, champanhes, minhas roupas e necessárie de maquiagem.                 Tomei um banho demorado, vesti um conjunto de lingerie especialmente escolhido para a encontrar com meu marido, preto e super sexy, coloquei um vestido de lã preto e botinhas de cano curto, escovei os cabelos e dirigi até a cidade, tudo parecia perfeito. Cheguei ao flat antes de James, coloquei champanhes para gelar, fiz fogo na pequena lareira da sala, e o esperei linda e paciente, por horas... Até que ele chegou. - Feliz ano novo – ele gritou na porta, estava bêbado. - James? – eu o encarava incrédula. - Desculpe o atraso – ele riu – acabei passando na comemoração do escritório, mas eu estou bem aqui agora – ele soluça – só vou tomar um banho e estarei renovado. - Tudo bem – eu respondo, parecia não querer acreditar do que os meus olhos estavam vendo.                 Esperei... Mais uma hora. Ele estava pronto. Ajudei-o com a camisa e fomos para o restaurante que ele havia reservado. Jantamos praticamente em silêncio, ele sabia que não estava sendo legal, que eu estava chateada, e aparentemente, estava com vergonha. Voltamos ao flat, me vesti para a noite, e quando eu estava pronta, precisei acordar ele, porque ele dormia no sofá da sala. Ele murmurou alguma coisa sobre eu estar bonita e eu agradeci desanimada.                 Havia combinado de encontrar com Greg e Jenny, seria bom ter a minha melhor amiga da adolescência e aparentemente, única amiga da atualidade, junto comigo naquela noite. James pareceu não se importar e sim, tratou bem o meu casal de amigos e estávamos tendo uma noite bem agradável, a julgar pelos acontecimentos anteriores.                 Eu estava feliz – sim, eu estava feliz de verdade, naquela festa, com meus amigos, com meu marido... James me tratava bem, e eu quase poderia acreditar que nós não tínhamos mais nenhum problema e que tudo ficaria bem. E nós todos brindamos chegada do ano novo, com os melhores desejos de saúde, amor, sucesso... E todos dançamos e nos divertimos. James parecia um pouco menos alcoolizado quando saímos da festa e seguimos para o flat... Eu  estava confiante de que iríamos conseguir passar uma boa noite: ainda tinha a lingerie, os champanhes e tempo. Tudo estava bem. Transamos, e quando eu estou saindo do banheiro, a campainha toca, estranho... James salta do quarto, veste o roupão e diz que está indo. Estou voltando para o quarto, pode ser um bêbado que aparentemente, errou o caminho de casa. - Surpresa – uma voz feminina e estridente grita assim que meu marido abre a porta. - O que está fazendo aqui? – ele fala baixo, eu podia ficar dentro do quarto e fazer de conta que eu não tinha ouvido. - Resolvi passar e ficar com você um tempo – ela diz. - Precisa ir embora, minha esposa... – ele diz aparentemente constrangido. - Você prometeu que nunca mais traria ela para casa – ela grita, estava alcoolizada. - Precisa ir embora... – ele insiste.                 Meu mundo esta desmoronando de novo: quem sabe chegar bêbado, fosse uma forma de me fazer desistir da noite e voltar á Napperville para que ele pudesse passar a noite com a amante? Eu não sabia de mais nada. Apenas enfiei minhas roupas, calcei minhas botas e dei de mão em minha bolsa: - Tudo bem – eu disse assim que cheguei na sala, interrompendo uma conversa baixa enquanto a mulher, não, a garota, ela era muito jovem, vestia um casado pesado que estava semi aberto, deixando à mostra muita pele, provavelmente era uma surpresa mesmo e ela estava apenas de lingerie pro baixo... Ela chorava baixo, encolhida no sofá da sala – eu nunca deveria ter saído da minha casa mesmo. - Querida, eu não sei – ele tentou fingir confusão – eu sinto muito. - Eu também sinto – suspirei – mas não se preocupem – ri debochada – eu nunca mais voltarei para essa “casa”.                 Sai pela porta, batendo-a com força: como ele podia ter feito aquilo comigo? O tamanho da humilhação... Eu me sentia a pior das criaturas, era como e absolutamente nada do que havíamos conversado, tivesse validade. James não me respeitava, ele continuava mantendo amantes e agora, elas ainda eram petulantes, e ele lhes fazia promessas de que nunca mais me levaria, eu, a esposa, para o flat.                 Me sentia uma i****a, havia dedicado muito tempo para apresentar à James a minha melhor versão, havia me empenhado em ser educada, razoável... Em não surtar pelo atraso e por ele estar bêbado quando chegou. Eu não era ingrata, eu não era c***l, eu era uma boa esposa. Eu era a esposa que havia se empenhado, que havia tentado.                 A neve estava mais densa e pesada. Dirigir semi alcoolizada, de saltos e na neve, foi um grande desafio, mas eu consegui chegar em casa. James telefonou compulsivamente durante todo o meu percurso e por mais de uma hora, até eu me cansar de ouvir e atender: - Querida – ele grita – eu sinto muito. - James, resolve seus problemas – respondo derrotada – conversamos com calma amanhã ou depois, estou cansada, preciso dormir. - Não desligue – ele diz em tom de súplica – me deixa explicar. - Não precisa explicar – respondo – conversamos amanhã.                 Desligo o telefone e me afundo em minha cama: ainda com o vestido, com a maquiagem, como a adolescente que chegou decepcionada pro ter tido uma noite r**m. Eu estava sendo muito, muito i****a e eu sabia, e me odiava por isso.                 Queria pegar o carro e dirigir até a cabana para aninhar-me no abraço de Dom, mas eu sabia que eu não podia fazer aquilo com ele, que eu não podia chegar lá despedaçada, que eu não podia esperar ele que estivesse sempre disposto e disponível para mim, e aquilo doía mais do que estar sendo enganada e traída: a dor de saber que não tem com quem contar.                 Adormeci depois de um tempo – não sei exatamente quanto – mas quando eu acordei, passavam das duas da tarde. Eu estava com fome. Levantei e encarei a minha imagem refletida no espelho: estava h******l. Entrei para a banheira e lá eu fiquei por longos minutos. O banho me fez bem. Desci e liguei a cafeteira, enquanto encarei meu celular: não queria falar com ninguém.                 Bebi um café parada em pé, ao lado da bancada e logo sai para buscar hamburguer e batatas frita em algum lugar perto de casa. Rodei um pouco até encontrar um lugar aberto, eu não o conhecia, mas fiz meu pedido e aguardei pacientemente. Voltar para casa, comi sentada no sofá, assistindo televisão. Voltei a dormir e no fim, passei o meu feriado de ano novo assim: cada vez que passava por um dos espelhos eu ria da minha própria desgraça e murmurava ‘feliz ano novo’, para logo depois, seguir meu caminho – para o quarto ou para o sofá.                 Eu me sentia péssima e triste. Não atendi telefone, não atendi a porta... Estava me sentindo humilhada. Era como se o meu orgulho e minha dignidade fossem outras das tanta coisas que em algum momento eu havia deixado para trás.  
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