É claro que eu poderia dizer que a maior parte de todos os problemas seria resolvida se eu simplesmente cortasse Dom da minha vida, mas como eu poderia fazer uma coisa dessas se o tempo que estávamos juntos era o único em que eu me sentia realmente viva de verdade? Como eu poderia me afasta de Dom, sendo que ele era a única parte da minha vida que eu realmente gostava? Obviamente eu não o deixaria, eu não o esqueceria e então, mesmo sabendo que isso era, sem a menor dúvida, a pior ideia possível, eu encontrei uma possível solução: adaptaria a minha rotina para conseguir encontrar com Dom, eu não ia abrir mão daquilo.
Considerando todas as possíveis consequências dos meus atos - divórcio, processo - eu ainda acreditava que chumbo trocado não doía e, se James me traía descaradamente e por anos, eu não era lá a pior pessoa do mundo por estar traindo ele de forma discreta. Tudo bem não era lá o meu melhor argumento, mas estava servindo para mim, eu estava satisfeita em pensar dessa forma e não me sentia nem mesmo um pouco culpada, se é que isso realmente importa para alguém...
Se alguma coisa me consolava, era o fato de que não estava fazendo m*l para ninguém, a não ser para mim mesma. Eu colocava o meu casamento em risco, é verdade, mas no fim das contas, ele não valia de muita coisa quando o marido em questão costumava me trair, me humilhar e o fazia de forma bem descarada. Não conseguia nem mesmo sentir culpa por trair James. Que tipo de pessoa era essa que eu estava me tornando, afinal?
Pensando na minha vida, nos meus filhos e em todas as coisas que eu colocava em risco, sim, eu estava sendo egoísta. Eu amava os meus filhos, mais do que qualquer coisa nesse mundo mas não me julguem, afinal, qual mãe nunca se colocou em uma posição que nem sempre é a mais favorável para ela em prol dos filhos e em algum momento arrependeu-se disso? Qual foi a mulher que largou a carreira e a vida que havia sonhado para si, na intenção de viver um sonho, um conto de fadas, com o seu marido perfeito e decepcionou-se, no fim das contas?
Eu costurava estrelinhas prateadas cheias de glitter na saia de balé branca, antiga de Elle, para montar a fantasia de estrelinha para uma apresentação na escola, alguma coisa como concerto de primavera, que aconteceria no fim de março. O pequeno Jimmy dormia tranquilo no sofá da sala, Ellie assistia TV e Ben ainda estava no banho, eu ouvia o chuveiro no andar de cima. Eu havia feito aquelas escolhas, cada uma delas. Eu mesma havia escolhido voltar para a casa dos meus pais, nos subúrbios, eu quis viver naquele lugar eu só não imaginei o tamanho do pacote completo no qual eu estava me metendo, eu nunca imaginei que eu encontraria com Dominic Delaney logo de cara, eu nunca imaginei que eu me colocaria naquela situação...
- Mãe? - Elle me encara com certa impaciência.
- Sim, querida? - pergunto.
- Tá tudo bem? - ela pergunta.
- Sim, por que é que não estaria? - eu digo.
- Você tá esquisitona - ela ri.
- Eu estou distraída - eu a corrijo - acho que estou um pouco cansada...
- Teve um dia difícil? - ela pergunta com um sorriso tão lindo e meigo que meus olhos encheram-se de lágrimas.
- É impossível ter um dia difícil com filhos tão lindos e perfeitos - eu respondo.
- Está zangada com o papai? - ela franze a testa.
- Acho que um pouquinho sim - eu confesso - mas isso não é um problema, certo? Tudo vai ficar bem.
Benjamin aparece, os cabelos molhados e o sorriso fácil, ele era o mais parecido comigo, fisicamente. Tínhamos os mesmos olhos, os mesmo cabelos. e a mesma forma de enxergar o mundo: sob a melhor perspectiva que conseguíamos. Talvez fosse por isso que sempre que eu estivesse um pouco perdida, eu gostasse de passar um tempo com o meu filho mais velho, afinal, assim eu conseguia me aproximar de mim mesma:
- Ouvi alguma coisa sobre filhos lindos e perfeitos - ele se senta entre eu e Elle - eu acabei de chegar.
Rimos daquilo, era uma mania engraçada de Benjamin fazer de conta que era um menino convencido e cheio de si, mas na verdade, ele era bem tímido, e as suas brincadeiras sempre se resumiam aos momentos em que o seu pai não estava em casa, como se o pai não fosse aprovar a sua postura. Eu mesma acabei, nesse exato momento, percebendo que eu costumava ser bem mais legal com as crianças e comigo mesma, quando James não estava em casa e muito provavelmente isso era um problema.
Acabei, antes mesmo de colocar as crianças na cama, por decidir que todos nós precisávamos conversar sobre nossa relação com James e porque é que mudávamos tanto de acordo com a sua presença esporádica. Quando por fim eu acomodei as crianças, coloquei as roupas para lavar, tirei os pratos da lava louças, arrumei as almofadas do sofá da sala e organizei as coisas para o café da manhã e os lanches do dia seguinte. Só eu e Deus sabíamos a quantidade absurda de coisas que uma dona de casa normal tinha para fazer então, qualquer "adiantamento" de um dia para o outro, formava um saldo positivo de tempo a ser aproveitado com coisas que eu gostava ou que importavam um pouco mais do que intermináveis e tediosas tarefas domésticas.
Terminei de costurar as estrelinhas, apesar de já ser bem tarde, enquanto assisti alguns episódios de uma série policial que eu costumava assistir com James. Havíamos maratonado duas temporadas logo que casamos e acompanhamos mais duas e depois, acho que nós dois nos perdemos um do outro e assistir filmes e séries deixou de ser o nosso passatempo favorito afinal, qual é a graça de se assistir televisão quando podemos simplesmente brigar e discutir por intermináveis horas? Eu mesma ri daquilo, apesar de não ser exatamente engraçado e sim extremamente triste e solitário.
"Você sempre está triste e solitária, Mel" - a voz de Dominic vinha de perto da lareira, onde ele estava sentado, com um copo de Whisky na mão - "Sabe que se estivesse comigo, eu nunca te deixaria triste, eu te faria feliz e estaria ao seu lado, Mel, eu sempre estaria ao seu lado".
E ai, eu acordei. Sim, mais um sonho estranho...