O dia amanhceu frio, congelante. E eu não sabia muito bem como é que eu tinha passado a noite, mas depois de tantos sonhos, pesadelos e coisas bizarras, eu finalmente estava agradecida por saber que ao menos, estar acordada naquele momento, era minimamente normal. Com tudo o que estava acontecendo, eu estava com medo de me distrair e esquecer de alguma coisa importante - como um dos itens que James havia solicitando ou então o lanche ou almoço de uma das crianças - e por esse motivo, eu desci antes mesmo de acordar os pequenos, para arrumar as lancheiras em paz e silêncio, só para garantir.
- Bom dia - a Sra. Delaney disse acenando na janela da cozinha, vestida em seu adorável chambre felpudo cor de marsala - tudo bem, Mel?
- Sra. Delaney - eu respondo um pouco surpresa - tudo bem sim e com você? Me deixe abrir a porta...
Atravessei a bancada para receber ela na porta dos fundos. Era um costuma bem antigo entre as nossas famílias, ir chegando sem muito aviso e entrar pela porta dos fundos, quase nunca usávamos a porta de frente - assim como Dom ignorava a existência do portão e sempre estava pulando as cercas.
- Eu estou bem - ela responde já entrando - que frio, menina... - ela me abraça - passou bem a noite?
- Sim, eu passei sim - respondo, mesmo que ache estranho a pergunta.
- Dom me disse que você não estava muito bem - ela diz confusa.
- Claro - eu sorrio - mas eu melhorei, acho que era só uma crise de enxaqueca - eu minto - eu tenho tido umas terríveis...
- Que triste saber disso - ela suspira - mas veja - ela estica a mão em minha direção, com um pacote de papel - trouxe cookies fresquinhos para você e as crianças.
- Ah, muito obrigada - agradeço contente - não precisava se incomodar com isso.
- Sabe que para mim, sempre é um prazer estar por perto de vocês - ela confessa.
- O prazer é nosso de ter você por perto - eu agradeço e a abraço - e então? Tudo certo?
- Ah, sim - ela sorri - eu só estava um pouco preocupada, queria saber se estava se sentindo melhor...
- Estou sim - eu respondo - não precisa se preocupar.
- Sabe que estou aqui, caso precise de qualquer coisa, não sabe? - ela sorri.
- Eu sei sim - digo agradecida e ela logo se despede e sai, dizendo ter muito o que fazer.
Se eu me senti m*l de mentir sobre meu estado para a Sra. Delaney? Aquilo foi uma verdadeira tortura, eu adorava, não, pra ser sincera, eu amava aquela mulher! Como eu poderia me sentir bem tendo um segredo tão grande escondido dela? Não era o tipo de coisa que eu gostava de fazer e ainda menos quando a pessoa para a qual eu mentia era alguém de tão bom coração como ela. Dom também tinha culpa nisso, afinal, eu não estivera m*l, em nenhum momento, ele havia mentido para dar uma desculpa para ir até a minha casa e eu precisei sustentar a mentira dele, não que isso me isentasse das culpas, é óbvio, mas fazia com que eu me sentisse, ao menos, um pouco melhor.
Mesmo com a distração, acho que eu cumpri o papel de mãe de maneira bem satisfatória: todos os pequenos tomaram café da manhã nutritivo, com cereais integrais, frutas e leite e depois, pegaram suas lancheiras com almoços bem pensados: iscas de frango grelhadas, salada de folhas verdes, tomates cereja, queijo branco e algumas frutas para a sobremesa. Claro que eu era uma mãe relativamente boa, inclui alguns cookies caseiros da Sra. Delaney em todas as lancheiras além do suco - o maldito suco industrializado que eu odiava colocar na lancheira dos meus filhos.
Com todos prontos, tirei o carro da garagem e segui para a escola dos maiores e depois, o jardim de infância do Jimmy. Claro que eu perdi algum tempo nessa peregrinação mas, voltei para casa às oito horas me sentindo, ao menos um pouquinho, realizada. Mais uma rodada de louças na lavadora, mais algumas roupas na pilha de roupas para passar e voilá, eu tomaria um banho e sairia, fingindo não ter mais nada para fazer, para passear e encontrar o meu marido na cidade. Se eu pensasse bem, James era o marido que toda a mulher quer - ao menos a grande maioria delas - fica bastante tempo fora, não incomoda muito e paga as contas. Claro que, todos os que veem a situação de fora, não enxergam as humilhações e nem mesmo o meu sentimento de eterna solidão, mesmo estando ao lado dele, então, fica fácil de admirar.
Eu estava bem indecisa sobre o que vestir. Não sabia se James estava em um bom dia ou se apenas me criticaria, independente do que eu acabasse decidindo, mas eu me esforcei, ao menos, se houvesse uma chuva de críticas, eu saberia que a minha parte eu havia feito, eu havia tentado. Vesti uma wet legging preta bem básica, botas de salto alto que iam até um pouco acima dos joelhos em preto verniz, bolsa combinando, uma cashemeere marsala e um trench coat preto, com um capuz com pele de coelhos. Eu sabia que estava bonita, se James não gostasse, era bem um problema dele.
Queria sair cedo para poder passear um pouco pelas lojas, fazer umas comprinhas e somente depois, encontrar com o meu marido. Ao menos eu podia tentar me distrair um pouco das coisas que estavam me atormentando - e muito - ou seja, Dominic e o que havia acontecido entre nós - que não poderia ter acontecido. Eu também estava um pouco chateada com o fato de que Dom não havia telefonado e nem enviado mensagens depois que saíra da minha casa na noite anterior. Não sei o que eu realmente esperava que fosse acontecer, Dom grudado em mim? Vinte e quatro horas por dia? Bem, esse era, provavelmente, o sonho de muitas jovens naquele lugar.