Seu Garcia deixou os dois sozinhos na sala e Ricardo fechou a porta.
— Primeira regra: Porta sempre fechada.
— Ah, e existem regras? — ela perguntou sem pensar.
— Claro que existe. — ele se virou para ela. — Eu sei que com o meu tio as coisas são um pouco desorganizadas, mas meu trabalho parte disto: organização. — tirou o copo de café da mão de Verônica. — Obrigado. — ele destampou e sentou-se na cadeira do Seu Garcia.
Verônica só ficou observando. "Sinto que esse homem será uma pedra no meu sapato".
Ricardo experimentou o café e logo fez careta. — Está frio. — estendeu o copo para ela pegar.
— Eu acabei de pegar.
— Está frio. Eu gosto de café quente. Muito quente. Vai buscar outro. — balançou a mão para ela sair.
"Ele só pode estar brincando" — ela o fitou incrédula.
O café ainda estava tão quente que ela sentia nas pontas dos dedos, e na boca deve ser mais quente ainda.
— Vai logo. — balançou a mão novamente e levantou um espelho pequeno que estava em cima da mesa, depois encarou seu reflexo e sorriu.
Ela suspirou fundo e saiu da sala.
O grupo de colegas que trabalham no prédio estava todo reunido no balcão da recepção daquele andar e ansiosos, chamaram ela para se juntar a reunião.
Ela respirou fundo e abriu um sorriso gentil, indo até eles. — Sim?
— Como é o novo chefe?! — o único rapaz do grupo perguntou com os olhos curiosos e todos ficaram atentos ao que ela iria contar.
Ela pensou em alguma palavra que resumisse o que ela viu, sem soar como ofensa.
— Inestimável.
Todos ficaram impressionados, se entreolhando. — Eu disse! — uma das meninas se sentia vencedora.
— Ele é tão lindo... — Rosa, a assistente de um dos chefes, deitou sua cabeça na mão e encarou o teto como uma sonhadora. — Alto, forte, cheiroso, com um terno impecável e aquele olhar 43...
Verônica ouviu isso tudo tentando fingir que debaixo da beleza de seu chefe não havia um mandão como o de agora a pouco.
— Dizem que ele saiu na capa da revista de finanças do mês passado. — outra secretária contou em tom de fofoca. — Assim que meu expediente terminar, vou passar na banca e comprar essa revista. Quero saber tudo sobre o nosso novo chefão.
"Em 2 minutos eu já tenho um péssimo resumo dele" — pensava Verônica, com o olhar estreito.
— O que você vai fazer agora, Verônica?
— Pegar café quente pro Narciso. — ela respondeu de automático e depois de um barulho de admiração dos colegas, ela se tocou que falou demais. — Digo, pro chefe. — sorriu e procurou a lixeira para jogar o copo de café que carregava em sua mão. — Vocês me dão licença? — pediu gentilmente.
— Claro.
— Sim. — eles falavam descoordenadamente e ela entrou no elevador, sorrindo.
Quando as portas se fecharam, só ficou ela.
— Mas que azar do c****e foi esse?! — começou a conversar com seu reflexo. — Esse trabalho era perfeito. Maravilhoso. Porque aquele velhote decidiu se aposentar logo agora?! — Verônica apertou suas mãos forte e começou a chutar a parede.
As portas do elevador se abriram e três homens ficaram assistindo à reação exagerada dela.
Quando ela percebeu, parou, arrumou a postura e sorriu como de costume.
"Ele não tinha um filho? Aquele filho que tem mais 5 crianças? Porque ele não assumiu a empresa?!"
Todos no elevador comentavam sobre o novo chefe e sua primeira impressão.
Parece que todos gostaram dele. Verônica discordava de tudo, ali atrás no elevador. Ela revirava os olhos a cada elogio. Tudo o que ela queria era um chefe que não pegasse no seu pé.
Quando o elevador se abriu e ela saiu para a cafeteria, logo que pediu o café pensou em como levar o bendito quente como uma chama.
— Você pode enrolar em papel alumínio, por favor?
— Sim. — a garçonete assentiu, estranhando o pedido da Secretária Verônica.
A perturbação dela era percebida por todos, porque geralmente ela era uma pessoa muito tranquila.
Ela saiu correndo com o copo de café na mão e entrou no elevador. Em seus pensamentos, quanto mais rápido chegasse na sala do chefe, menos o café esfriaria.
Outras pessoas entraram no elevador e um deles falou diretamente com ela.
— Senhorita, que bom que te encontrei aqui! Daqui a duas horas haverá uma coletiva de imprensa, para apresentar o novo chefe. Prepare tudo. Certo?
— Aham. — ela assentiu desanimada. Cada momento que se passava, a ficha caia. Realmente, Seu Garcia se foi e Ricardo será o novo chefe.
Assim que as portas se abriram, ela saiu correndo com o copo de café enrolado em papel alumínio.
Ele virou a cadeira e fez uma careta do jeito que sua secretária chegou.
— O café. — ela se aproximou da mesa, suspirando e entregou o copo.
— O que é isso? Que papel é esse? — fez careta novamente.
— É para conservar o calor. — ela arrumou a postura. — Você não gosta de café quente?
Ele tirou o papel e abriu o copo, depois experimentou o café e imediatamente afastou a boca, fazendo uma careta. — Tá muito quente!
Ela sorriu. — Então tá do jeito que você gosta.
— Senhor. Aliás, Dr.
— Dr. — ela abriu um sorriso Colgate e pediu licença.
Após sair fechando a porta, ela desmanchou o sorriso e rugiu.
"Estou começando a gostar da ideia da porta fechada". — sentou-se em sua mesa e abriu a agenda. — Vamos a essa coletiva…
[•••]
Verônica deixou tudo impecável para a apresentação do novo chefe.
Estava ela e mais 3 funcionários importantes na comitiva, seu chefe se atrasou e os fotógrafos e repórteres estavam ansiosos por sua entrevista. Um segurança chegou ao lado de Verônica e avisou que o chefe estava esperando-a dentro da empresa.
Ela estranhou, mas foi vê-lo.
Ricardo andava de um lado para o outro, impaciente. Ela fechou a porta da sala, e perguntou o que estava acontecendo.
— Onde estava a minha secretária para arrumar a minha gravata?
"Ele só pode estar brincando, né?"
— Sua gravata está ótima. — ela olhou para o nó.
— Ótima? Chega mais perto. Eu preciso estar impecável, Verbena.
— Verônica. — corrigiu e arrumou o nó da gravata e a gola também. — Pronto, está ótima. — ela se afastou.
Ele andou com o peito inflado até o espelho e sorriu para o seu reflexo. — Impecável. Será que existe algum chefe mais bonito do que eu?
"Que filho da mãe narcisista". — ela cruzou os braços e se encostou na parede, pensando.
— Hein? Existe? — olhou para ela.
— Não. Jamais. — sorriu com muito deboche.
Ele era muito bonito e ela reconhecia isso, mas desaprovava suas falas.
— Você tem muita sorte, Gardênia. — ele garantiu admirado.
"Gardênia?"
— Sou muito sortuda, Dr. — ela concordou, com um sorriso infeliz.