Júlia
Como eu pude acreditar que ele aceitaria isso, sendo que ele já havia dito que não?
Eu sou tão iludida.
Ele foi embora sem me dar chances para entrar num acordo. Ele simplesmente seguiu aquilo que já havia prometido. Eu fiquei só e ele se afastou de mim, como queria.
Eu devo o culpar por ser tão radical? Seria hipocrisia. Eu sou tanto quanto ele. Tomei a decisão mais radical para me vingar do cara que acabou com o meu psicológico e também tomei a decisão mais radical para tirar os meus pais da cadeia.
Somos dois teimosos. Eu não deveria sofrer por causa disso. Deveria aceitar e entender que se for pra ser a gente, será.
— Ai meu Deus... para de chorar, menina! — Felipe andava de um lado para o outro no meu quarto, enquanto eu chorava, abraçada as minhas pernas.
Eu não consigo ser fria com relação a isso.
— Eu sei que deveria aceitar e entender a decisão dele. Mas eu não consigo. — sequei meu rosto, soluçando.
— Ele vai voltar se gostar de você de verdade. Escuta o que eu tô te falando. Eu era o cara mais frio que todo mundo já viu e depois da Gabi, me tornei um retardado apaixonado. Esse seu nerd já é retardado e apaixonado por você, então ele vai voltar rapidinho.
Nossa, como ele fala merda até tentando consolar alguém.
A vontade de chorar continuou.
— O que você quer que eu faça, hein? — perguntou cansado. —
Quer que eu traga esse nerd de volta? Eu não garanto os danos.
— Não! Tá doido?! Se ele quisesse vier, ele viria. — enxuguei meu rosto novamente e engoli o choro.
— Então me diz alguma coisa que eu possa fazer... Eu não sou de fazer caridade, então agiliza, antes que eu desista.
— Sua bondade é visível. — mostrei os dentes num sorriso amarelo e logo pensei em algo fútil que me distraia. — Sei lá... um mac...— fiz beicinho. Eu tô economizando dinheiro e faz um tempão que não como um desses.
— Burguesa safada. — ele descruzou os braços e jogou uma almofada que estava encima da poltrona, no chão, depois sentou na poltrona. — Vai lavar o rosto, que eu vou te levar pra minha casa. No caminho a gente passa no drive thru.
— O que eu vou fazer na sua casa? — levantei da cama.
— Vai ter companhia. Lá tem a Gabi, a Manu, a minha filha... tem a Cami, que tá passando por uma situação parecida com a sua... Você vai estar em boa companhia e não vai ficar aqui, ouvindo essas músicas melancólicas. Desliga isso. — fez careta. — Eu nem tava triste e já tô ficando.
— Isso se chama empatia. — peguei o celular e desliguei a música, depois fui pro banheiro.
— Empatia. — ele ficou rindo, conversando sozinho.
Eu nem sei quem o chamou aqui e porque ele tem uma cópia da chave da nossa casa?
Enxerido.
Lavei o meu rosto e passei o protetor com base, um lip tint e arrumei o cabelo com um frufru.
Não é porque eu tô sofrendo, que vou andar feia.
— Deus me livre, a minha filha crescer mimada igual a você... — ele continuou falando sozinho. Sozinho, porque eu tô ouvindo, mas nem vou dar a ousadia de responder a seus comentários absurdos. A filha dele vai ser pior do que eu. Criada por ele... espero o pior.
Saí do banheiro pensando aonde devo ter deixado o meu tênis branco.
Ele estava mexendo no celular, cantando uma música de homem cafajeste. — Ô se prepara que hoje a noite eu vou pro rolê, vou botar pra torar... cê vai beber, vai chorar, vai ligar...
— Tá me ajudando muito, Felipe. — encontrei meu tênis debaixo da cama.
— Vai pra minha casa de baby-doll? Não né? Tu não tá louca. — me encarou assustado.
— Óbvio que não!
Merda, eu tinha esquecido de trocar de roupa...
Peguei o que vi pela frente. Um short de napa, preto, curto e uma blusa de tricô, vermelha. Entrei no banheiro e me troquei.
— Merda, agora nem combina mais com meu tênis... — pensei em voz alta e com o celular no bolso, saí a procura do conturno. Eu não tenho mais para onde sair, então tenho que usar meus sapatos em qualquer ocasião. Até pra comprar pão.
Ele estava fora do meu quarto, porém, perto dele. Peguei os sapatos e voltei pro quarto.
— Ei, cadê aquela sua amiga, hein?
— Ela tá viajando. Só volta na próxima semana. — sentei na cama e comecei a calçá-los.
— Ah, sim. — continuou no vício do celular.
Passei um pouco de perfume e acertei um tapa no joelho do segurança. — Bora.
— Inferno. — ele segurou o celular e levantou. — Se o meu celular tivesse caído, você ia ver.
Não ía ver nada.
Segui na frente e ignorei sua ameaça.
— Já que você tem uma chave, feche a porta. — desengrenei e fui direto para o carro. Eu preciso esquecer a dor de cabeça que o Léo tem me dado. Espero que ele esteja arrependido e me procure logo.
Caramba, e se ele vier me procurar e não me encontrar? Eu não deveria ir.
— Viu um fantasma? — Felipe me encarou, depois de fechar o portão e destravou o carro.
— Só tava pensando uma coisa. — abri a porta do carro. — E se ele vier atrás de mim e não me encontrar?
— Ele não virá atrás de você. Deve estar por aí, com os amigos. Bebendo ou sei lá o quê. — entrou no carro.
Derrubou por terra a minha esperança.
Será? O Léo não é assim.
Entrei no carro com esse sentimento de confusão na minha cabeça.
Felipe dirigiu até o Drive-thru e ao invés de fazer o pedido dentro do carro, ele estacionou do outro lado,
— Você é burro ou oque?! — o encarei impaciente. — Tinha que parar do outro lado!
— Vamos entrar. — abriu a porta do carro, com uma cara de quem vai aprontar.
— Eu vou esperar aqui, então. — cruzei os braços.
— Não. — ele contornou o carro e abriu a porta. — Você vai comigo.
— Desnecessário. Eu não vou comer aí. — tirei o cinto indignada. Eu só quero sofrer sozinha. Não quero que ninguém me veja com cara de choro. — O que foi? Você não quer levar pra sua filha?
— Não fico dando essas coisas pra minha filha. Vou levar pra Gabi. — balançou a mão, me apressando.
— Desnecessário. — saí do carro e deixei que ele fechasse a porta.
Fui logo atrás dele e entramos na lanchonete. m*l passei o olho pelo lugar e já reconheci um rosto, no meio de um grupo de pessoas, na terceira mesa depois da porta.
Era o Léo e uma galera da faculdade.
Cutuquei o Felipe e sussurrei. — O Léo tá aqui.
Ele ainda não tinha me visto.
— Eu não te disse que ele estaria fazendo qualquer coisa, menos sofrendo por você? — reafirmou Felipe, com um sorriso zombador nos lábios.
Eu sou mesmo uma iludida. Ainda fiquei o dia todo chorando.
— Eu tô com cara de quem chorou o dia inteiro?
— Não com esse reboco todo que tu colocou. — Felipe respondeu, antes de ir direto para o balcão. O segui, tentando ignorar que meu namorado, se é que ele ainda me considera, está ali.
Será que eu passei tanto protetor em base que fiquei mesmo rebocada? As vezes é difícil acreditar no que o Felipe diz. Ele implica muito comigo.
Escolhi o meu lanche e me abracei a meu corpo.
— Vamos esperar sentados. — ele segurou meu cotovelo.
— No carro. — sugeri.
— Ali. — ele apontou bem para a mesa ao lado da que o Léo e o grupo estavam sentados.
O que esse i****a tá tentando fazer? Me deixar pior do que já me sinto?
Ele me arrastou e quando passamos pela mesa do grupo, o Léo olhou pra mim e depois para o Felipe.
Meu coração ficou apertado. Eu não queria que ele estivesse m*l comigo.
Sentei de costas para o Léo e o Felipe sentou do outro lado e ficou mexendo no celular.
O lanche sempre sai rápido nessa lanchonete. Espero que hoje seja assim, também, para que eu vá embora logo.
Porque as coisas continuam dando tão errado na minha vida? Eu achei que era só me livrar do meu grande problema, que tudo se resolveria.
Meu celular vibrou e o tirei do bolso, para ver o que poderia ser. O Léo está tão perto de mim, que sinto o seu perfume.
Era uma mensagem dele.
[Léo — Vá ao banheiro].
O que ele quer?