05 - Ganhando
Quando o sol se ergueu Hermione sequer havia pregado os olhos. Ela tentou descansar e dormir, mas, sempre que pensava em fechar os olhos, algo dentro dela a alertava de fazer o contrário, e ela sempre dava ouvidos à sua intuição, porque aprendeu a duras penas que ela dificilmente lhe falhava.
Virou-se de lado na cama olhando para o despertador. Ainda tinha quase uma hora e meia antes de ter que se levantar e se arrumar para o trabalho, entretanto estava ali, com seus olhos bem abertos, seu peito ainda com aquele aperto inexplicável, e com Malfoy em seu pensamento. Porque ele estava no seu pensamento? Era algo que ela não sabia explicar. Havia tentado encontrar todos os motivos plausíveis, justificáveis e razoáveis para que pudesse entender o que estava acontecendo consigo. Nada obteu de suas reflexões além de ainda mais perguntas.
Cansada de tentar fazer seu corpo responder ao cansaço que lhe consumia, ela decidiu se levantar, já que descansar não estava funcionando muito. Tomou uma ducha rápida e vestiu sua calça de ginástica, e um moletom grosso, saindo para a manhã fria e ventosa de Novembro.
Deu algumas voltas pelos quarteirões próximos, no intuito de esquecer todos os seus questionamentos. De parar de tentar entender porque que seu mundo parecia ter dado uma volta completa, trazendo um apanhado de incertezas para sua vida, vida a qual ela sempre tentou manter o mais alinhado possível, desde que perdera muito na Guerra.
Com seus fones estourando uma música alta em seus ouvidos, ela rodou mais um pouco até parar em frente à uma cafeteria. Não era muito amante de café, mas depois de passar a noite em claro, teria que se render a bebida escura para que pudesse dar conta de um dia de trabalho. Era um lugar tranquilo aquele, o cheiro do café exalava desde a calçada e se fazia ainda mais forte dentro do estabelecimento. Tirou os fones e seguiu, até onde havia uma moça, pediu seu café forte sem açúcar e sentou-se no balcão para esperar.
(…)
Quando ela atravessou a porta da sala de Kingsley, alguns minutos mais tarde, atrasada, todos os olhares se voltaram para ela. Hermione Granger atrasada era um fato realmente novo, dentre quatro anos de trabalho no Ministério.
— Desculpem. - pediu e caminhou calmamente, em direção à cadeira vazia que se encontrava ao lado de Harry, tocando a mão dele com carinho antes de virar o rosto na direção do Ministro e dar a ele toda a sua atenção -
— Como eu dizia, Potter teve uma reunião com a nossa nova integrante, a Srta. Granger e os dois entraram em consenso de que deve-se montar uma guarda próximas às chaves de portais mais utilizadas. - disse o Ministro, dando continuidade à reunião - Aqui nesses papéis, existem todos os portais e suas localizações, registrado pelo ministério. - mostrou algumas pastas na cor bege para os presentes na sala - O trabalho de vocês hoje vai ser identificar dentre estes quais são os portais mais usados, de acordo com nossos registros do caso dos tráficos de tronquilhos, para que possamos montar as guarnições.
— Temos um tempo para entregar isso? - quis saber Manforth, se levantando e pegando um das pastas, os outros aurores fizeram o mesmo -
— Quero esses levantamentos até amanhã. - pontuou Kingsley - Na próxima semana já começam as interrogações com os trouxas e as guarnições. - acrescentou -
— Aqueles que tiverem domínio do Legilimênce ficaram comigo para as interrogações, o restante ficará sob supervisão de Hermione nas guardas. - comunicou Harry - Vamos lá pessoal, temos muito trabalho a fazer. - dizendo isso, o moreno dispersou a massa de homens para fora da sala, ficando sozinho com a amiga e o Ministro.
Harry voltou-se a sentar remexendo nos arquivos que havia pego enquanto Hermione debatia com Kingsley sobre como seriam divididos os grupos de Autores.
— Creio que um grupo de três Aurores seja o suficiente para cada local. - opinou a Granger gesticulando - No máximo, acredito que vamos ter que vigiar mais ou menos umas quinze localidades diferentes, e pelo que percebi dos registros, provavelmente serão perto umas das outras. Se tivermos problemas, estaremos perto para ajudar um ao outro. - terminou olhando para o homem que parecia impressionado - O que me diz?
O Ministro lançou um olhar expressivo para Harry e moreno sorriu, erguendo os olhos para eles.
— Eu lhe disse que ela iria nos ajudar nisso de forma que ninguém mais poderia. - disse o Potter, piscando para o chefe que assentiu alegremente -
— A melhor admissão que já fizemos. - endossou o homem extremamente feliz em sua constatação -
— Por Deus, eu só estou sendo lógica. - ela disse corada -
— Precisávamos de sua lógica, acredite. - disse Ministro. - Você tem carta branca para o que quiser, querida.
— Vocês são uns exagerados. - disse ela, negando com a cabeça, sorrindo envergonhada -
Os dois homens riram gostosamente, vendo a morena ficar tão vermelha quanto a cadeira de couro que o Ministro ocupava. Por mais que o tempo passasse, ela ainda não sabia receber elogios. Ainda sorri abaixando a cabeça, e deixando o rubor se formar em sua pequena face.
— Fugindo um pouco do assunto, Hermione, soube que você dispensou o convite de Richard Greyjoy. - disse o Ministro, maliciosamente. -
Hermione bufou.
— Aquele homem asqueroso! - exclamou ela revirando os olhos em seguida ao se lembrar o quão desagradável havia sido aquele dia - Ele não só me jogou uma cantada podre como quase me disse que eu tinha a obrigação de aceitar seu pedido. - riu desacreditada - Ele deveria ficar feliz de só ter levado um fora. Tive vontade de jogar uma azaração nele.
— Eu adoraria saber o que ele disse… - instigou Harry visivelmente divertido com a situação. -
— Aposto que você adoraria levar a azaração por ele também. - ameaçou maldosamente. -
— Bruxinha perigosa você, hein... - observou o Ministro com satisfação -
Ela deu de ombros e sorriu de lado. Sabia se defender, apenas isso.
De repente, um dos Aurores entrou desesperado na sala, fazendo a mulher e os homens quase pularem em seus lugares, sua respiração estava rasa como se tivesse corrido para salvar-se de algum monstro..
— Capturamos um dos capangas. - soltou tenso e ofegante - Estamos com ele na sala de reuniões. - comunicou -
Harry olhou para a amiga e o chefe e elevou uma sobrancelha. Hermione devolveu seu olhar na mesma intensidade. Já arrumando os cabelos e fazendo um feitiço para que suas coisas se arrumassem.
— Vamos. - disse Harry e saiu apressado, sendo seguido por Kingsley e Hermione -
Chegaram ao andar da sala de reuniões e depararam-se com quase todos os Aurores ali, tentando interrogar o capturado. Hermione se esgueirou entre os homens para chegar à porta da sala, sinceramente, não imaginava que iriam apanhar um deles assim, estava achando fácil demais.
Havia na porta um homem, ele estava todo posudo, impedindo a entrada dos colegas de trabalho na sala. Quando viu Harry sorriu largo, de forma escancarada e presunçosa, notou Hermione.
— Eu que o capturei, senhor. - disse ele, exibido. -
— Muito bem, Jughead - Harry deu tapinhas na costa dele, o parabenizando. -
O homem abriu a porta para Harry, liberando sua passagem e a de Hermione, entrando junto com eles. Na sala, um homem magro e alto, estava sentando, com a cabeça abaixada, quieto demais.
— Quem é ele? - perguntou Harry num canto, sem se deixar ser visto -
— É peixe pequeno senhor, mas vai ter que servir para nos dar informações. - disse Jughead, baixinho -
— Já tentou tirar algo dele?
— Não senhor. - prontificou ele -
— Está na hora então.. - disse Harry Potter, andando até o homem, parando em sua frente, fazendo com que o mesmo lhe olhasse nos olhos -
O interrogatório foi todo acompanhado por Hermione, entrementes ela não disse nada, preferiu apenas ficar observando e guardando todas as informações que ele lhe dera, e haviam sido muitas. Ela estava desconfiada. Ele havia falado tudo o que eles queriam saber e sequer tinha cogitado dificultar a retirada das mesmas, fácil demais. Estranho demais. Ele ser apanhado logo quando a equipe estava montando um plano de ação. Estreitou os olhos para ele e virou-se para Jughead, o Auror que o tinha prendido.
— Como foi que você o capturou? - perguntou, avaliativa -
— Ah, não foi difícil, Srta Granger. - respondeu ele, simplesmente -
— Vejo que não. - concordou ela - Já que vê-se que ele se deixou ser pego, mas eu quero saber é como você” o pegou…
— Eu estava num bar bem frequentado por meliantes como ele, lá no Beco diagonal.. - começou - Ele entrou no bar como qualquer outro cliente, mas começou a oferecer algo para os que estavam bebendo. Me aproximei e vi ser um tronquilho. - disse o homem e jogou seu olhar em direção ao homem preso sendo interrogado - Ele contava que participava de um esquema grande, mas que seu chefe precisava se desfazer de alguns tronquilhos porque o Ministério estava de olhos. Eu apenas saquei minha varinha e o estuporei, trouxe-o pra cá depois disso… - deu de ombros -
— E o que você estava fazendo lá? - perguntou Hermione, alinhando os fatos na sua cabeça, para que tudo pudesse fazer mais sentido -
— Eu costumo pagar por informantes para o Ministério. Sabe, já fui um deles um dia.
A morena acenou positivamente e voltou a mirar no amigo que se encaminhava para perto deles.
Harry aproximou-se deles, havia um vislumbre de um sorriso em seu rosto. E seus olhos verdes estavam iluminados.
— Pode levá-lo lá para as celas de baixo, pra ele aguardar o julgamento. - Potter falou para Jughead e o homem foi buscar o prisioneiro.
Quando ele passou por Harry e Hermione, esbarrando na mesma, seus olhos de um tom de castanhos bem escuros lhe miraram de um jeito muito intenso. Quase como uma ameaça muda para a mulher. Ele se afastou e Hermione engoliu em seco, tentando assimilar o que tinha acontecido ali.
— Ele nos deu tudo, Mione. - sussurrou Harry que estava animado - Tudo. - enfatizou - Agora só precisamos seguir essas informações e pegar o cara.
— Não sei não, Harry. - discordou ela - É muito conveniente para nós prendermos um integrante dessa quadrilha logo agora. - comentou receosa, tocando o queixo, pensativa.
Harry não deu muita importância a desconfiança da amiga.
— Exatamente, Hermione. Conveniente! Com certeza Jughead merece uma promoção..
— Harry, me escuta! - pediu Hermione impaciente, tocando em ambos os ombros do amigo, quase sacudindo-o - Você não vê? Está fácil demais! - argumentou -
— Fácil? Nós estávamos a uns bons dois meses atrás deles, Mi. - ele murmurou, tocando com o dedo indicador no seu óculos, levantando até que se arrumasse em seus olhos claros - Se você acha que foi fácil você está indiscutivelmente equivocada. - sentenciou o Potter irredutível - Bem, eu preciso falar com Shacklebolt. Você vem? - perguntou o moreno mudando descaradamente de assunto.
Hermione murchou os ombros, insatisfeita.
— Quando você me escutar vai ser tarde demais. - avisou suspirando pesadamente - Vou almoçar.
Girou nos calcanhares e saiu dali, antes que desse uns tapas em Harry para fazê-lo enxergar que caso fácil nunca fez bom Auror.
. . . . . .
Hermione estava lendo os levantamentos que Kingsley distribuíra de manhã a pelo menos quatro horas sem descanso, desde que voltara do almoço decidira que o melhor era estudar ainda mais o caso, já que, pelo visto, sua opinião em relação à parte prática da coisa havia sido totalmente descartada mais cedo. Era tão irônica a ambiguidade da vida! Pela manhã, havia sido endeusada por sua mente brilhante. Todavia, em questão de minutos, tudo o que restara para ela tinha sido voltar a sua sala para não ser autoritária com seu amigo, ou ser rude com ele. Ele era o chefe, afinal. Não culpava Harry por isso, por estar super animado com as informações cedidas, ele apenas queria se livrar de algo que estava-o incomodando e lhe rendendo noites sem dormir à algum tempo. Ela esperava mesmo que tudo fosse apenas uma bênção de Merlin, porque se não fosse, bem, eles estavam enrascados.
Seus olhos pesaram um pouco devido ao tempo em que estava naquela sala, piscou lentamente para focar a visão que havia se distorcido pelo evidente cansaço de uma noite em claro e um dia tenso. Nesse piscar de olhos ela acabou caindo no sono.
— Feche os olhos. - ele sussurrou em seus ouvidos, sua boca fria e sua voz grave e arrastada lhe invadindo e assustando-a. Fazendo-a pular no lugar.
Ela virou levando as mãos até o peito, sentindo seu coração batendo num ritmo irregular, dançando pelo susto que levara. Ele sorriu largamente, puxando o cachecol dela que estava caído para o lado, enrolando corretamente no pescoço da mesma.
— Porque você vive fazendo isso? - perguntou intrigada, os olhos castanhos estreitos para ele, em desconfiança -
— O quê, cobrindo você? - ele insinuou, a malícia e a diversão brilhando em seus olhos azuis intensos. -
— Me assustando… - ela corrigiu, sorrindo de lado, piscando os cílios longos para ele -
Ele nada respondeu, puxou-a para mais perto, alisando cada lado do rosto dela, carinhoso como ele só era com ela.
Os olhares que ambos trocavam eram intensos e falavam por si só, como um reencontro de almas distintas, finalmente juntas. Era algo sob o qual ela não tinha controle, porque tinha vindo para destruir todos os planos pré-moldados que ela já tinha criado para sua vida. Ele abaixou-se o suficiente para que pudesse beijá-la minimamente, forçando-a a querer mais.
— Feche os olhos. - ele pediu perto de seus lábios, roçando as peles finas dos mesmos, provocativo -
— Para quê? - questionou. Tudo o que ela queria fazer era o oposto, era ficar encarando aqueles cinzas para ver se descobria o que tinha ali, que a mantinha daquela maneira… Entregue. -
— Apenas faça! - paciência não era uma qualidade que acompanhava o gene Malfoy, ela sabia. -
Ela sorriu largamente, envolvendo os braços em volta do pescoço dele e lhe deu um selinho, fechando os olhos em seguida, como ele havia pedido.
Ela sentiu quando ele pegou sua mão direita e depositou um beijo na costa da mesma, o roçar da boca fina e macia em sua pele lhe causava arrepios arrebatadores.
Um ruído de correntes chegou aos ouvidos dela poucos segundos depois, e então, havia algo no seu pulso. Algo frio, algo leve, algo dele.
— Abra-os, agora. -
Ela fez sem questionamentos dessa vez, olhando depressa para o braço, vendo, brilhante e encantadora, uma pequena e simples pulseira. Levantou os olhos para ele, com uma sobrancelha arqueada, questionadora.
— Eu sei que tudo pode ruir a qualquer momento, Hermione. - a voz dele estava quebrada, algo acontecia, e ele não olhava nos olhos dela. Logo ele, que sempre intimidou apenas com olhos, se via assim, fugindo do contato visual -
— Malfoy, o que tá acontecendo? - sua voz era um sussurro incerto, pois ela não sabia o que esperar da resposta -
— Você gostou? - ele mexia na pulseira dela, distraído -
— Malfoy? - ela chamou, receosa -
— Tem um pingente aí, você viu? - desconversou, procurando a pequena bolinha branca e bonita, estava nervoso, era nítido. -
— Draco? - ela colocou as mãos no rosto dele e obrigou-o a olhá-la nos olhos -
— Por favor, sem perguntas. - ele sussurrou apertando os olhos forte - Já está sendo difícil o suficiente sem ter que pensar…
— Fala comigo, me diz o que tá acontecendo… - pediu, um aperto no peito de repente, e um medo inexplicável, sua intuição feminina apitando insistentemente -
— Eu não posso. - ele quase gemeu, suspirando pesado, a mandíbula tensa e os lábios comprimidos. -
— Por favor… - sussurrou baixinho, acariciando o rosto pálido e bonito vendo-o lutar contra seus próprios demônios. -
Ele abriu os olhos e sem ela ter a chance de perceber, trouxe-a para seus braços, para onde ele podia sentí-la quente e pequena. Afagou os cabelos cheios e rebeldes dela, deixando que o cheiro amendoado dos cachos exalasse no ar, apertando cada vez mais contra seu corpo, quase fundindo-se com a castanha.
Naquela proximidade imposta por ele, ela pôde sentir o coração dele pulsar lento, quebrado, despedaçado por algum motivo, e ela só sentia que algo estava por vir, e que talvez, estivesse a vir para eles. Largou um suspiro carregado de hesitação e olhou para cima, para ele que mirava para a frente, quieto e imerso em suas próprias questões e tormentos. Suspirou profundamente e enterrou-se ainda mais no peito dele. De alguma forma sabia que ele não ia dar respostas a ela, não naquele momento. Talvez ele precisasse de tempo, precisasse se sentir seguro para poder falar.
— Ela me lembra serenidade, eu amei. - ela contou se referindo à pulseira, quase como se fosse um segredo e era, um segredo só deles, pra sempre. -
Ele sorriu de uma forma tão aberta que ela quase desmanchou em seus braços. A abraçou ainda mais forte e beijou sua testa, agradecido.
— Eu amo você, Hermione.
Ela abriu os olhos, atordoada.
Alguns sentimentos são como a gravidade. Você pode sentir-los sem saber como funcionam. Ela não sabia. Nem entendia. E estava sentindo, até demais.