Capítulo 2

1247 Words
- Pelo amor de Deus, faz essa menina parar, não aguento mais esse berreiro todo aqui dentro de casa, é só choro choro choro, não aguento mais, preciso esvaziar a cabeça, tô vazando pro bar do seu Zé que ganho muito mais. A situação dentro da minha casa está ficando insustentável. Nunca que eu ia imaginar quando fiquei grávida que as coisas iam piorar desse jeito. Ele até que aceitou bem, muito bem por sinal, mas depois que recebemos a notícia que a nossa pequena Ísis nasceu com LLA (Leucemia Linfoide Aguda), a nossa vida nunca mais foi a mesma. Nem sei pronunciar esse nome direito, só sei que ela tem e o problema é que bichinha chora o dia inteirinho procurando aconchego no meu colo. Eu tinha decidido lutar, tinha mesmo, mas o negócio está difícil, eu estou perdendo meu marido, minha família por causa de um negócio que nem é minha culpa. Não sei que peça Deus está tentando me pregar, mas eu estou a ponto de desistir, na verdade, acho que desisti faz tempo, só não quero admitir. O médico até disse que a gente teve sorte, mas que p***a de sorte ele acha que a gente teve. A menina chora o dia inteirinho acabando com meu juízo e o Guilherme reclama na mesma proporção. Pelo amor de Deu, sorte? Só se for na casa do caráleo. Hoje o dia tá osso, o Gui já acordou me enchendo o saco e levou o esporro da vida. Já não basta eu ter que ficar aqui sozinha o dia inteiro tendo que dar conta de tudo porque ele é o tal homem da casa e não pode fazer nada para me ajudar, deixar a roupa lavada, casa limpa, comida feita e ainda por cima, ficar com a Ísis pra lá e pra cá pendurada em mim e ele ainda querendo carinho, ah, me poupe. Homem da casa da mãe dele só se for, porque aqui, o dinheiro m*l chega e quando chega, ele pega o pouco que tem e foge para o bar do seu Zé falando que não aguenta mais escutar o choro da bebê. Mais uma consulta e as coisas estão piorando. O doutor falou que ela precisa de um doador de medula porque nem eu e nem o Guilherme temos a p***a da compatibilidade de tecidos. Nem sei o que isso significa, só sei que eu não posso salvar a vida da minha filha. A gente vai precisar esperar o maravilhoso Sistema Único de Saúde procurar em todo o Brasil alguém que tenha pena da gente para poder salvar ela. Volto pra casa sem ter um rumo, eu não aguento mais, preciso sair daqui, ir embora, isso tudo é muito para minha cabeça. Nunca, jamais que pensei que eu aqui, com meus lindos 20 aninhos, estaria presa dentro de casa, sem poder ir nos bailes da vida só por casa de um casamento m*l feito e de uma criança doente, eu simplesmente não aguento mais. - Não dá Joana, eu tô pensando em levar ela lá pras freiras, pode ser que elas consigam ajudar essa menina porque eu, sinceramente, já nem aguento mais olhar pra cara dela. - Como assim? Você só pode tá ficando louca Janete. Foi você que correu atrás do Gui o tempo todo, sabia que o hobe dele era comer p**a, mas quis mesmo assim, e quando consegue, quer jogar tudo pro ar? - Eu queria ele sim, mas trabalhando, sem bebida e com um filho saudável. Essa menina só chora e eu não aguento mais olhar pra cara daquele médico e escutar ele dizer que não encontrou nada e que vou ter que esperar mais ainda, ah não, eu vou levar ela pras freiras e ser feliz minha filha, isso não é crime nenhum, é lutar pela felicidade e eu estou prontinha pra isso viu. - Nete, pelo amor de Deus, não faz isso, olha, me dá ela, eu cuido dela pra você, mas não dá ela pras freiras não amiga. - E você acha que o grandão vai querer uma criança que chora o dia inteirinho amiga? Você que teve sorte, casou com o sub do morro, tem vida boa, um filho que não te dá trabalho, isso sim que é vidão? - Vidão? Cê não sabe da missa a metade, a grama do vizinho nem sempre é tão verdinha assim viu. A fila de p**a aumenta todo o dia. - Não importa Jô, pelo menos você não tem esses estorvos na vida. Quer saber, tá bom, eu dou ela pra você, vou arrumar minha vida e quando tiver tudo certo pra eu largar aquele traste e seguir meu rumo, eu te aviso. Beijos. Felicidade tem nome e se chama Janete fora daqui. Não vou perder meu tempo jamais, eu quero mais é viver e viver feliz em outro lugar. Se aquele desgraçado quer passar a vida na porta do bar o problema é dele, eu quero mais é que ele se f**a. Depois de 3 dias, olha eu aqui fazendo minhas malas e deixando tudo prontinho pra levar as coisas da minha pequena pra casa da Jô. Ela até que é bonitinha, vou sentir falta dela, é minha filha caramba, mas não dá mais, não achei que fosse tão difícil, na verdade eu achei que ia conseguir um doador muito rápido. É isso que eles querem que a gente acredite, que tudo vai passar, que ela vai crescer e viver como uma pessoa normal, mas eu simplesmente não consigo mais. Se as pessoas ainda acham que Deus não existe eu lhes digo, você acha que qualquer um aceitaria cuidar da filha de outra pessoa, mesmo que fosse da melhor amiga e ainda mais doente? Jamais minha filha, jamais, fui eu que tive a sorte de receber um carinho de Deus e vou agarrar com as duas mãos. - O que você pensa que está fazendo? Porra, aquele traste tinha que chegar justo agora? - Ah, agora você pergunta? Agora você se preocupa? Me enxergou foi? - Como assim Nete, o que você pensa que está fazendo? Quando foi que eu não te enxerguei? Tá louca? - Louca? Louca eu tava quando corri atrás de um traste igual a você. Quando aceitei vir aqui pra sua goma pra ser chamada de sua fiel. Quando tive uma filha com você que mais chora e fica grudada no meu peito do que qualquer outra coisa. Eu quero viver meu filho, eu quero ser feliz, e vou ser, mas fora daqui. - Você não vai fazer isso, só vai deixar de ser minha mulher quando EU não quiser mais, ESCUTOU SUA p**a? - Eu quero ver quem vai ser o macho que vai conseguir me segurar aqui, essa eu quero ver. - Então eu vou te mostrar. Sabe aquelas surras bem dadas, mas aquelas bem dadas? Pois é, ele não teve dó, nem um pinguinho de dó, mas o que mais doeu foi ver a coitada da criança sendo arremessada no chão. Ele queria matar nossa cria e ele ia, só não contou com o Grandão aparecendo com um fuzil apontado pra cabeça dele e disparando 3 vezes só pra ter certeza que o defunto não levantava mais. Foi triste? Foi. Não pelo Gui, não por mim, mas pela bebê. Tadinha, ela ficou bem machucadinha e nem assim eu desisti, não, eu não aguentava mais. Fui pra rodoviária e embarquei pra minha nova vida, uma vida longe daquele maldito morro.
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