As Faces De Caroline

Papo de irmão

Heitor e Mel foram o caminho todo decidindo que filme que assistiriam. Eu fiquei apenas calada assistindo. Sabe aquela sensação boa de ver sua filha sorrir depois de tantos dias chorando? Eu sentia agora. Acho que faria qualquer coisa para manter sempre esse sorriso no rosto de Mel, mas eu sei que não será assim por muito tempo e isso, me deixava ainda mais preocupada.

— O que você estava pensando? — Heitor perguntou assim que entramos no apartamento, Mel já havia corrido para contar a novidade para Letícia. — Parece está com a cabeça nas nuvens.

— Vamos deixar minhas preocupações para amanhã, por hoje, quero apenas aproveitar aquele sorriso da Mel. Você já pediu a pizza? — Mudei de assunto. Não vou deixar estragar aquele dia.

— Isso é sério? — Letícia surgiu na sala olhando para nós dois parecendo completamente chocada.

— Você vai deixar Mel entrar na nossa família oficialmente? Eu vou ser realmente titia dela? Mentira, não é? — Letícia tinha um sorriso enorme no rosto. Acho que a família já havia adotado a Mel antes mesmo de Heitor propor.

— Sim. Agora você vai ser oficialmente tia dela. E eu serei pai! — Heitor abraçou a irmã animado. Fotografei aquela cena. Marieta tinha que ver isso quando acordar.

— Irmão, essa é a melhor decisão que você já tomou em toda sua vida. — Letícia estava chorando.

— Eu sei. — Heitor respondeu acariciando a cabeça de Mel. — Vou pedir pizza, quer escolher o sabor?

— Desde que não seja atum, qualquer um estou aceitando. E como está a vovó? Tiveram notícias dela? — Letícia perguntou para Heitor.

— Está do mesmo jeito. Os médicos estão fazendo novos exames. Deve passar um bom tempo desacordada, mas parece está se recuperando. — Heitor explicou enquanto mexia no celular.

— Vem, Mel. Enquanto a pizza não chega, vamos tomar um banho e trocar de roupa. — Levei Mel para tomar banho. Tínhamos passado o dia batendo perna por aí.

Enquanto estava no quarto, escolhendo uma roupa para Mel tomar banho, pude ouvir a conversa de Letícia e Heitor.

— Me desculpa pelo que eu disse antes. Carol me deu o sermão da minha vida. Foi como uma t**a na cara. Todos esses anos guardei um rancor desnecessário. Talvez para mascarar minha própria culpa de não ter coragem de fugir como você fez. Lembro que um dia você disse que compreendia as dificuldades que Carol passava, no dia achei um absurdo, isso tem anos. Agora me dei conta que assim como ela, você foi uma adolescente sozinho tendo várias responsabilidades. Mesmo assim, não deixou de mandar dinheiro para casa uma única vez. Me desculpa de verdade, por tudo que joguei em você todos esses anos. Eu acho que precisava de um chega para lá da patricinha. — Letícia desabafou. Não pude deixar de sorrir. Finalmente, depois de tantos anos, fizeram as pazes.

— Não precisa se desculpar, você era uma criança na época. Teve que passar por muito na nossa casa, onde deveríamos nos sentir protegidos, sentiamos medo. Eu não fiquei nenhuma vez chateado com o que disse, foi sua forma de lidar com tudo aquilo, mas Lê, deveria procurar terapia. Sem julgamento ou crítica. Depois de tudo que passamos, ainda em nossa infância, algo quebrou em nós dois. Eu comecei a fazer depois da Mel. Isso me ajudou a perceber muita coisa. Deveria fazer também. Se a gente não se recupera das nossas feridas, não podemos avançar. Todo medo que você tem da vida e de todos, só será superado quando se curar. — Heitor estava fazendo terapia? Desde quando? Ele sempre me surpreende.

— Você está certo. A sua terapeuta já disse algo sobre seu desapego a mulheres e relacionamentos? A razão para você não querer se envolver amorosamente com ninguém. Se dizem quem te amam, você corre para bem longe. Se você conseguir curar sua alma cafajeste, terei esperança na minha cura dos meus medos. — Letícia brincou.

— Acho que isso é algo mais difícil de superar, mas eu me apeguei a algo. Alguém que me fez querer voltar. Um sentimento que me faz acreditar. Eu tenho a Mel agora. — Heitor explicou para sua irmã.

— Pensei que ia falar sobre Carol, ela é a única mulher que você mantém por perto. Todas as outras você usa e joga fora. Acho que nunca ficou com alguém mais de uma vez. Bom, talvez por isso você chame ela de amiga. Para ter uma desculpa para não se afastar dela jamais. Você não notou ainda, mas há muitas razões que te fazem voltar agora. E não é apenas a Mel. — Letícia disse para o irmão.

— Carol é apenas a mãe da Mel. Somos bons amigos porque ela respeita meu espaço e limites. Sabe que ela não fica se jogando para mim. Carol é diferente. Não pensa besteira. Ela é minha família. — Heitor respondeu sua irmã. Aquilo me deixou com o coração mexido. Eu não o amava, nem queria nada mais com ele, mas não posso negar que senti como uma espécie de rejeição.

— Vamos para o banho, minha filha? — Acho que já ouvi mais do que deveria.

Tomei banho junto com a Mel, saímos do quarto para sala usando baby doll idênticos. O apartamento só tinha cheiro de pizza. Mel correu na mesma hora para mesa. Letícia deu um beijo na bochecha de Mel se despedindo e veio em minha direção.

— Você e meu irmão são dois bobos. Espero que percebam o que estão perdendo antes que seja tarde demais. Boa noite! Espero que tenham uma belíssima noite do cinema. — Letícia se virou indo para o quarto.

Comi a pizza em silêncio, fiquei pensando no que Letícia quis dizer com aquilo. Quando terminamos de comer, fui fazer a pipoca, enquanto Mel e Heitor escolhiam o filme. Quando estava colocando manteiga na pipoca, senti Heitor me abraçando pelas costas.

— O que está fazendo? — Perguntei confusa olhando ao redor, com medo de Mel ou Letícia aparecerem.

— Não sei. Deu vontade de te abraçar. Vim ajudar a levar a pipoca e os sucos. — Heitor respondeu sem me olhar.

Quando voltamos para o quarto, a Mel estava deitada no meio da cama, com um sorriso enorme estampado no rosto. Parecia que tinha ganhando presente de Natal. Era reconfortante e um enorme alivio para mim.

— Hoje eu vou dormir com minha mamãe e meu papai, pela primeira vez na vida. Vamos dormir os três abraçados. — Mel gritou abraçada com o urso que Heitor havia dado para ela.