Sentimentos explosivos

1235 Words
Fecharam a cortina da janela que estávamos assistindo tudo que acontecia lá dentro. Ficamos em silêncio do lado de fora sem saber de nada. Não era minha primeira vez passando por nada daquilo, mas todas às vezes, o sentimento de impotência e desespero que tomava conta de mim era o mesmo. Quando senti as lágrimas rolando no meu rosto, senti o toque suave de Heitor limpando o meu rosto. — Vamos. Ela vai ficar bem. — Heitor disse tentando me consolar, quando deveria ser eu que deveria consolar ele, mas quanto mais eu pensava em Marieta sofrendo e correndo risco de vida, mais preocupada eu ficava com a situação. Heitor segurou a minha mão, me puxou para longe de lá. Saiu abrindo todos os quartos que passavamos, olhando um por um como se estivesse procurando por algo. Talvez o seu juízo, algo que ele jamais teve, mas é crente que perdeu em algum lugar. Por fim, encontramos um quarto vazio. Assim que passamos pela porta, Heitor fechou. Olhei para ele surpresa. Não fazia a mínima ideia do que ele estava pensando em fazer. — O que está fazendo? — Tínhamos tanto para lidar, não fazia sentido ficar naquele quarto tão distante dos médicos. Assim não conseguiriamos informações sobre o que estava acontecendo. Marieta e Letícia precisavam de nós dois. — Eu preciso dormir. Você precisa dormir. Achei um quarto vazio para tirar uma soneca. À noite quero me divertir com a minha filha. Vem. Vamos descansar um pouco. Não se preocupe. Não há mais nada que possamos fazer além de esperar. Sabe que estamos de braços atados em relação a Marieta, temos que deixar nas mãos de Deus e Letícia, não precisa de ajuda. — Heitor me puxou até uma das camas, tirou o tênis e subiu nela. Acenando com a mão me chamando. — O que foi? Tem medo de não resistir a mim? Sabe que não será a primeira vez. — Você disse que não falaríamos sobre isso. Que o que aconteceu seria esquecido. — Respondi surpresa, fazia um bom tempo que tinha acontecido, mas ele não havia tocado no assunto depois. Fingimos que nunca aconteceu nada. — Deixa de ser boba, estamos apenas nós dois. Ninguém está ouvindo. Continuarei guardando seu segredo. Sou seu melhor amigo, não é? — Heitor me puxou para cama, me abraçou de conchinha por trás. — Você precisa relaxar. Parece um vulcão prestes a explodir. Precisamos ficar recarregados para lidar com tudo que está acontecendo da melhor forma. Vamos dormir e quando acordar comer, como seres humanos normais. — Posso te fazer uma pergunta que não tem nenhuma relação com nada disso? Eu sempre fiquei confusa sobre a sua relação com a sua irmã. Ela parece guardar um sentimento negativo em relação a você. No início, pensei que era apenas uma coisa de irmãos para irritar um ao outro, mas vendo hoje, tive certeza que há algo mais. — Tinha pior momento que esse para trazer a minha dúvida à tona? Não tinha, mas depois do que ouvi Letícia gritar, não podia ignorar. Eu queria saber o que havia acontecido e entender melhor a dinâmica daqueles dois. — Ah! Pensei que você já soubesse. Está convivendo com a minha família há tanto tempo, bem que você não é do tipo que se mete nas questões dos outros e vovó não é de falar do que sente ou acontece. Bom, sabe que tenho uma relação r**m com o meu pai, não é? — Heitor parecia despreocupado com a conversa, o que me deixou aliviada. Não queria interrogar ele e nem deixar desconfortável naquela situação. — Sim, na verdade, acredito que ninguém tem uma boa relação boa com o seu pai. Nunca encontrei com ele, mas tanto Marieta como Letícia, costumam falar de forma negativa sobre essa pessoa, mas nunca entraram em detalhes sobre do que se trata e porque não gostam dele.— Tentei explicar sem parecer uma fofoqueira, mas já sendo. — Você está certa. Ninguém gosta de alguém como o meu pai. Ele é o pior tipo de cara que se tem. Desrespeitoso, frio, violento e não vive sem bebida. O que é um combo perfeito para desgraça. Bom, a raiva de Letícia vem daí. Assim que pude fui embora, não aguentei mais aquele lugar. Não é fácil ver a sua mãe apanhando de um cara por nada. Alguém que deveria proteger ela, mas machuca. Tentei impedir algumas vezes, acabamos parando na delegacia. A minha mãe nunca ouve ninguém. Mesmo que a gente converse, ela não quer deixar o meu pai. Como uma forma de manter todo mundo fora da delegacia, a minha mãe sugeriu que eu saísse de casa quando completei os meus 16 anos. Letícia pensa que eu fugi e deixei ela para trás, mas na verdade, fui convidado educadamente para me retirar, para não causar desconforto para o rei que vive com a minha mãe. E como alternativa, consegui uma bolsa de estudos para estudar fora do pais.— Heitor explicou, queria ver o seu rosto, ao falar de algo tão doloroso, acabei me virando, deixando nossos rostos coladinhos. Os nossos olhos se encontraram, podia ver a tristeza em seu olhar, mesmo que o tom da sua voz seja de indiferença, há dor está estampada nos seus olhos. Acariciei o seu rosto com carinho, mas esqueci de quem era ele. Senti a sua mão acariciando a minha cintura. — Se vai tentar me consolar pela família terrível que tenho, terá que ser pelada. Já adianto. — Heitor sussurou no meu ouvido, me fazendo arrepiar com seu toque inesperado. — Esse tipo de coisa não se fala para os melhores amigos. — Respondi cruzando meus braços. — Somos melhores amigos diferenciados. Houve um upgrade na nossa amizade faz um tempo. Ou será que tem medo de se apaixonar por mim? — Heitor sempre vinha com essa história. Ele definitivamente tinha medo do amor. — Nenhum um pouco, mas apenas não estou com cabeça para isso. Aprendi a encarar os meus problemas de frente, não fugir deles. Então, vamos levantar dessa cama e lidar com tudo isso. Precisamos levar Marieta para um hospital melhor e Letícia para casa. Entendeu? Eu sei que você está com medo e tentando não pensar nisso, mas é necessário. — Levantei da cama. Não era momento para nada disso. Heitor estava buscando uma fuga e eu não seria ela. — E o que acha que eu posso fazer nessa situação? Não tenho dinheiro para um hospital melhor. Nem ajudar na transferência. Muito menos para pagar uma especialista para minha avó. Sequer posso levar Letícia para casa, porque não tenho carro. Ela também não ficaria feliz com minha presença. Eu vim aqui, sinto que não posso fazer nada e sou um grande problema. Consegue entender que não estou fugindo, mas não posso ser de ajuda alguma? Entende, Caroline? Eu queria mesmo poder ajudar qualquer uma delas, mas não posso. Eu não deveria ter vindo. — Heitor explodiu. Talvez desde o começo ele tenha guardado todo esse sentimento. — Não faz diferença alguma se eu estou aqui ou lá. Era melhor ter enviado o valor da passagem que gastei para vir. Seria de mais utilidade. O que eu podia fazer? Havia realmente algo que eu poderia dizer naquela situação? Apenas abracei ele. Senti suas lágrimas caindo. Com toda certeza Heitor estava com medo de perder sua avó. Como não percebi isso antes?
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