Capítulo 2 - Antonella

1206 Words
Quando eu penso que minha vida está indo para frente, eu retorno dez passos pra trás, como é difícil viver nesse mundo sem ter ninguém. Eu me chamo Antonella, sou orfã, minha mãe morreu ao me dar a luz e meu pai nunca conheci, fiquei em um abrigo até completar dezoito anos, depois disso tive que sair de lá, pois existem outras crianças necessitando de amparo e infelizmente minha idade já permitia que eu me virasse sozinha e cá estou eu, me virando.  Moro em um cômodo só que é um quarto e cozinha juntos, a única divisão desse cômodo é o banheiro, no momento é o que eu posso pagar e para mim está de bom tamanho.  Me dediquei muito em estudar enquanto estava no abrigo e quando fiz dezoito anos consegui uma bolsa de estudos, curso fisioterapia há dois anos, mas não tem sido fácil arrumar um emprego para me sustentar, não estou conseguindo nem mesmo um estágio remunerado.  Já passei muita dificuldade, já fiquei dias sem ter o que comer, sei muito bem como é a dor da fome, mas acredito que a dor maior é a que carrego na alma por ser sozinha. Fico pensando porque minha vida é assim? Porque tem que ser assim? Será que serei sempre sozinha? São perguntas que ficam sem respostas, não sei o que o destino me reserva, mas oro todos os dias para que sejam coisas boas, estou calejada de tanto sofrimento. Sinto falta de uma mãe que nunca conheci, como eu queria tê-la por perto para me acalentar nas horas difíceis ou até mesmo meu pai, queria apenas ter alguém para ser abrigo e para ter um abrigo. Nesses dois anos conheci uma amiga que me deu aulas de dança e pole dance e atualmente eu trabalho com isso, faço alguns b***s nas academias de dança, mas está muito difícil conseguir outro extra depois que fui dispensada do último serviço.  Eles queriam uma pessoa que trabalhasse em tempo integral e infelizmente por conta da minha faculdade eu não consigo, sei que preciso muito de um emprego, mas eu não queria largar meus estudos, eu quero ter um futuro. Estou a caminho de uma entrevista em uma academia aqui perto da faculdade, uma professora da faculdade que me indicou e eu estou muito esperançosa, se Deus quiser, vai dar tudo certo. Eu preciso muito que dê certo, meu Deus, como eu preciso. Já orei tanto, já pedi tanto, mas tanto, que eu acredito que Deus está enjoado de me ouvir clamando por essa vaga. Entro na academia com o pé direito, não sou supersticiosa, mas nesse momento vale tudo. — Oi, sou Antonella, vim fazer o processo seletivo para professora de dança — Informo a recepcionista. — Ah, oi Antonella, tentei contato no seu celular, mas a chamada não estava completando. — Ah — Fico até sem palavras. Como vou explicar para ela que meu número está bloqueado por falta de p*******o? Melhor deixar pra lá isso.  — Estava me ligando por algum motivo especial? Era sobre o que? — Pergunto curiosa. — Infelizmente a vaga foi preenchida. Como se ela tivesse me jogado um balde de água fria me desmancho em desânimo.  — Mas eu fui indicada para vaga e me informaram que era para estar aqui hoje para o processo seletivo — Digo decepcionada. — Eu sei e sinto muito, mas infelizmente recebemos outra indicação e optamos por ficar com ela. O que eu falei? E voltamos a dar dez passos para trás novamente ou melhor vinte, porque os dez eu já havia dado.  Porque a vida tem que ser tão dura comigo? Não consigo entender. — Tudo bem, obrigada — Agradeço e saio dali triste e decepcionada. Seguro a vontade de chorar, não vou desanimar, não vou desistir agora. — Olá moça — Um homem estranho, mas bem vestido me cumprimenta quando estou saindo da academia. — Olá — Respondo por educação e continuo andando, não vou parar para falar com um estranho. — Eu ouvi você falando com a recepcionista. Sou um dos sócios dessa academia e tenho outras redes. No momento estou precisando muito de uma professora, podemos fazer um processo seletivo? — Olho para ele desconfiada — Desculpe não me apresentar, me chamo Mark, aqui estão algumas fotos dos meus trabalhos — Percebendo minha desconfiança, ele me mostra algumas fotos no celular e parece ser um trabalho bem sério. — E essa vaga é para onde? — Pergunto. — Podemos ir ali no café da esquina e conversarmos um pouco? Acredito que será melhor, assim posso te apresentar mais um pouco do meu trabalho e falar sobre meus projetos — Café? Não tenho dinheiro nem para voltar de condução, penso comigo — Eu p**o o café, vamos — Ele deve ter percebido que não tenho dinheiro, minha roupa diz muito sobre mim. Ainda bem que recebo algumas doações de roupas da igreja, tudo muito simples, mas é o que eu posso, então para mim está ótimo. Sou extremamente grata por isso. — Tudo bem, vamos — Não tenho nada a perder mesmo, não custa nada conversar, né? Ele pede dois cafés e dois brownies e eu agradeço mentalmente por isso, estou faminta. Enquanto aguardamos o garçom trazer o pedido ele conversa comigo sobre seus projetos. Me conta que tem várias academias espalhadas pelo mundo e me pergunta se eu tenho o projeto de tornar essa dança como algo profissional na minha vida. Confesso para ele que faço isso porque é o que eu sei e porque preciso de dinheiro. Ele pede para ver alguns trabalhos que tenho, tiro meu celular surradinho da bolsa e mostro alguns vídeos que tenho salvos. — Sei que não dá para ver muito bem — Meu celular é pequeno e está bem quebrado. — Sem problemas, é o suficiente, eu consegui ver bastante coisa, seus movimentos são excelentes e você é muito bonita, será o ideal para o que eu procuro — O que minha beleza tem haver com ser professora? Eu em. — Podemos ir até o escritório, você assina alguns papéis e pode começar amanhã mesmo. O escritório fica aqui pertinho, podemos ir caminhando e conversando sobre seu novo emprego, o que você acha? Estou até com medo, está muito fácil para ser verdade, está muito fácil para ser comigo. Penso por um tempo se aceito ou não. Eu preciso muito, mas fico com medo, sei lá, essas coisas fáceis nunca acontecem comigo. Não posso ser tão negativa comigo mesmo, tenho que aproveitar as oportunidades, talvez eu nem encontre outra tão fácil como essa. — E então? — Ele pergunta. — Tenho certeza que você não vai se arrepender. — Tudo bem, vamos lá — Por fim, decidi aceitar. Não tenho muita opção mesmo. Vamos caminhando até o escritório dele, é perto daqui, ainda bem, porque eu não ia querer entrar em um carro com um desconhecido. Chegamos no local e eu percebo que não tem ninguém, tudo muito deserto. — Estamos no lugar certo? — Pergunto com medo. Eu o olho desconfiada e ele continua me encarando antes de responder. — Estamos sim Antonella — Ele sorri para mim, sinto uma pancada na cabeça e tudo se apaga na minha frente.
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