Assinando contrato

2892 Words
Fui despertada com o barulho estridente do meu despertador, coloquei um travesseiro no rosto numa tentativa falha de abafar o som. - Que droga! – meu tom não era nada amigável. Joguei o travesseiro que estava no meu rosto longe, e desliguei o despertador. Algo me diz que meu dia não vai ser nada agradável, tive uma péssima noite de sono e meu humor não está em seus melhores dias. Me sentei na cama, e peguei meu celular, vendo que já passavam das 9hrs da manhã. Emily não tinha especificado um horário, supostamente eu não estava atrasada. Me levantei com o pouco de coragem que ainda me restava e já fui direto ao banheiro, fazendo a minha higiene matinal, até tomaria um banho se não estivesse com tanta preguiça. Sai de lá direto para o meu guarda roupa, optando por um look simples. Calça jeans rasgadinha, regata e uma jaqueta. Eu não tinha que impressionar ninguém mesmo. Sai do quarto com o celular em mãos, e com uma bolsa pendurada no ombro. Pude ouvir uma cantoria baixa, e já sabia bem de onde vinha, ou melhor, de quem vinha. Assim que coloquei os meus pés na sala, que era dividida da cozinha apenas por uma bancada, o que me permitia ver nitidamente o que acontecia na cozinha da onde estava. Pude observar pela bancada a minha melhor amiga de frente para o fogão mexendo algo em uma frigideira. Ela estava de costas para mim, não tinha notado a minha presença ali. Joguei a bolsa em uma das poltronas, e me sentei na bancada observando ela dançar enquanto cantarolava uma música que eu podia jurar que já tinha ouvido em algum lugar, a conhecendo bem, posso supor com uma certa certeza que é algum tipo de hip-hop. Jen sempre amou esse estilo musical. Seu quadril mexia de acordo com o ritmo da música que ela cantava, talvez ela pense que está arrasando com essa dancinha, mas na verdade está bem engraçada. O que me causaria algumas risadas se eu não estivesse com tanto mau humor. Ela se virou para mim e pude ver que ela deu um leve solavanco para trás, se assustou com a minha presença. O que seria imperceptível se eu não estivesse a observando. Mas ela se sobressaiu bem, e não demorou mais do que alguns segundos para voltar para sua posição normal. - Oh! Faz tempo que está ai? – perguntou enquanto colocava alguns pedaços de bacon fritos em um prato. - Não. Acabei de acordar. - Bom, fiz o café. – ela abriu um sorriso e se inclinou na minha direção por cima do balcão, dando um beijo estalado na minha bochecha. – Tira essa cara ranzinza do rosto, o dia está lindo! Ela se virou e pegou o recipiente com o café, colocando um pouco em uma xicara e me entregou. Bebi um gole sentindo o gosto forte e amargo da cafeína passando pela minha garganta. Torcia mentalmente para que ele me desse forças para encarar o longo dia que viria pela frente. - Estou começando a entender o desespero da minha mãe quando soube que eu moraria sozinha, e não com você. – comentei enquanto tomava mais um gole. Jen me olhou brevemente enquanto mastigava alguns pedaços de bacon, sorrindo fraco assim que engoliu. - É lógico que ela ficou desesperada. Você definitivamente não sabe cuidar de si própria sozinha. É, eu realmente não sabia. Não que eu seja uma pessoa imatura ou infantil, mas é que essa responsabilidade de ser uma adulta sempre me deu um certo desconforto. Eu me sinto melhor se tiver alguém por perto para me auxiliar e tomar as decisões por mim, talvez eu só seja covarde mesmo. Esse foi um dos principais motivos que me fizeram vir morar sozinha, eu sentia que precisava crescer, e já que não consegui fazer isso de uma forma normal, então que seja na marra. Nem preciso citar que minha mãe surtou quando soube que a Jen não me acompanharia nisso, eu disse pra ela que a Jen viria. E mantive isso até o último segundo, quando eu tive a certeza que ela não poderia me impedir, ai contei a verdade. Minha mãe sempre teve essa mania de não confiar muito em mim, de certa forma até entendia ela, mas sei lá. Ela deveria querer me ver crescendo, não querer que eu trocasse uma mãe por outra, que no caso seria a Jen. Posso estar enganada mas algo me diz que o motivo de eu ser desse jeito tem tudo a ver com a superproteção dos meus queridos pais. - Estou melhorando nisso. - Claro que está! Aos poucos você vai se tornando mais responsável e mais independente. – Jen dizia enquanto tomava seu café. Finalizei o meu, pois eu precisava ir para a People. Me levantei deixando a xícara na pia, e dei um beijo no rosto da Jen. - Está na minha hora, me deseje sorte! Fui até a minha bolsa e a coloquei sobre o ombro. - Boa sorte! – ela disse de boca cheia. Peguei as minhas chaves no pote, que eu mantinha perto da porta, e sai, fechando a porta e indo direto para o elevador. Eu não me sentia nervosa, nem insegura. Só sentia que esse poderia ser um passo importante na minha carreira, mesmo que se tratasse de algo que eu não me sentia bem em fazer. Eu deveria estar feliz, porque agora finalmente poderei pagar todas as minhas contas em dia, vou poder usar o carro em paz, sem ter que me importar com o combustível. E melhor, vou poder comprar algo digno para comer. Qual é! Não aguento mais me alimentar a base de macarrão instantâneo. As portas do elevador se abriram, permitindo a minha saída. Destravei o meu carro e entrei nele, jogando a minha bolsa no banco do passageiro. Liguei o som, coloquei o cinto e dei a partida, saindo dali em minutos. Jen estava certa sobre algo, o dia realmente estava lindo. Não demorei mais que 30 minutos para chegar na People. Estacionei o carro na frente da empresa, já que aparentemente eu não podia colocá-lo no estacionamento subterrâneo, era apenas para funcionários. Nessas horas que agradeço muito por Los Angeles ser bem tranquilo, se fosse como Nova York eu jamais acharia uma vaga disponível em um lugar tão bom. As vezes me pergunto como a Jen aguenta tanto trânsito e tanta movimentação, eu ficaria louca. Sai do meu carro o travando, e olhando bem para o prédio a minha frente. Diversas pessoas entrando e saindo, suspirei e caminhei até a entrada. Diferente da outra vez não havia nenhum segurança por ali, passei pelas secretárias indo direto para um dos elevadores, eu já sabia pra onde estava indo. Por sorte o elevador não encheu muito, apertei o décimo andar e esperei. Seria tão bom se eu tivesse conseguido um trabalho comum aqui na People, minha carreira iria tão longe. Tinha que ser como paparazzi? Tanta coisa que eu poderia fazer aqui e me escolhem para a pior delas. A porta se abriu, interrompendo os meus pensamentos. Sai dali dando de cara com a Dora, que sorriu assim que me viu. - Ela está em sua sala. Apenas assenti e fui em direção a sala da Emily. Eu estava contando cada passo que dava, era evidente, eu não queria estar aqui. De forma alguma. Acho que no fundo eu ainda tinha esperança que algum dos diversos lugares que eu mandei currículo me ligassem e me livrassem dessa furada, mas não foi mesmo dessa vez. Parei em frente a enorme porta e respirei fundo, antes de dar uma leve batida, só para avisar que estava entrando. A abri lentamente e entrei, vendo Emily sentava diante de alguns papéis, segurando uma xícara na altura do seu queixo, e me olhando com uma expressão satisfeita. É, ela havia conseguido exatamente o que queria. - Bom te rever! – foi o que ela disse antes de voltar a sua visão a pilha de papel que havia sobre a sua mesa. Bufei, já me perguntando que merda eu estava prestes a fazer. Aguente firme, você tem contas para pagar. Precisa desse emprego. É o que a minha consciência gritava para mim. Caminhei em passos lentos até a mesa e me sentei a sua frente. Sejam quais forem as ordens que ela me dará, eu sabia bem que levaria o tempo dela. O que pode ser nos próximos segundos, ou daqui uns 30 minutos. Emily era tão previsível que eu não precisei mais do que 3 vezes falando com ela para saber exatamente que tipo de pessoa ela é. Ainda bem que tenho o dom da observação. Foquei os meus olhos em sua sala, observando mais atentamente os detalhes que antes haviam passado despercebidos por mim, no outro dia que estive aqui estava nervosa demais para reparar em qualquer coisa que fosse. Suas paredes estavam cercadas de capas e mais capas emolduradas da People, poderia supor que foram as edições que mais venderam, já que só tinha as pessoas mais famosas ali. Eles deveriam ganhar muito com essas revistas. O que de fato era estranho, já que estamos na era da internet, como as pessoas ainda podem gastar seu dinheiro em revistas? Provavelmente eles devem ter uma versão online, nunca pesquisei, mas deve existir. - Acho que esses papéis podem esperar. Achei que não fosse notar isso. Obviamente que eles podem esperar. Qual é! Só quero sair dessa sala logo, Emily ainda me assusta. Ela apoiou a xícara na mesa e me olhou atenta. - Você está muito calada. – comentou. Foi ai que me dei conta que não tinha falado nada desde que pisei nessa sala. - Só quero saber o que tenho que fazer. - Oh! Claro. – ela disse animada. O que me causou uma certa náusea. – Vamos aos tópicos, em hipótese alguma você deve pisar nesse prédio, a não ser que eu mande vir. – Isso não era lá muito surpreendente já que ela não queria seu nome ligado as imagens que eu faria, porquê gostaria de preservar a sua amizade com as celebridades. Que amizade! – Toda a nossa comunicação será feita por e-mail. Então todas as fotos que tirar serão mandadas por lá. – assenti, concordando com tudo que era dito. – O seu salário será depositado na sua conta todos os meses. Inicialmente, pensei nesse valor. – ela esticou um papel em minha direção. O peguei me surpreendendo bastante com a quantidade de 0 que haviam ali, era muito dinheiro. - Acha que está bom? – ela estava realmente preocupada. Quanto ela ganha pra sequer pensar que isso é pouco? - Sim, pro começo está ótimo. – tentei soar indiferente. Não podia deixar que ela soubesse que pra mim aquilo era muito dinheiro. - Ótimo! – ela relaxou os ombros. – Pra não ficar muito complicado para você, já que não tem experiência nenhuma nisso, vamos focar em apenas uma celebridade por vez. Minha confusão era nítida. - Como assim? – franzi o cenho. - Ao invés de você passar o dia inteiro atrás de qualquer celebridade que esteja fora de casa. Eu vou te dar um nome, e você terá que focar apenas nessa pessoa. Acha que uma semana em cada uma é um prazo bom? – Eu não sei, mas parecia muito que ela estava forçando a barra para parecer uma chefe boazinha. Sabemos bem que ela não se importa com o que eu acho e que ela não se encaixa nada nesse papel. - Tanto faz. – dei de ombros. Não fazia diferença para mim, no final das contas, quem vai decidir é ela mesmo. Vou me poupar disso. - Acho melhor ser no seu tempo, pelo menos no inicio. – Parecia que ela estava tendo um diálogo consigo mesma. – Certo? - Certo! - E por último, mas não menos importante, as pessoas não podem sonhar que você trabalha diretamente para mim, ok? Portanto, não comente isso com ninguém. - Não estava pensando em dizer nada disso por ai mesmo. – dei de ombros, enquanto via ela me entregando um papel. - Preciso que assine. – ela colocou uma caneta a minha frente. Era um contrato, li meio por cima. Deveria ser aqueles contratos de trabalho, normal. Assinei e entreguei a ela. Emily não conseguia conter a sua animação. Ela se levantou e abriu uma das gavetas que haviam em sua mesa, apenas a segui com o olhar vendo ela tirar dali uma câmera, a melhor da atualidade. - Seu equipamento de trabalho. – ela me entregou, junto de uma capa. Meus olhos brilhavam ao encarar o objeto a minha frente, meu sonho de consumo era ter uma dessa. Ela fotogravava em alta qualidade, eu teria que vender meus dois rins para poder comprar uma dessa. E acho que ainda assim não teria dinheiro suficiente. - Essa câmera é incrível! – peguei ela na mão, admirando cada detalhe. - Eu sei. – ela se sentou novamente. – Posso dizer com qual celebridade eu quero que comece? – Não poderia ser tão r**m. - Sim, pode falar. – meu sorriso estava aberto de orelha a orelha. Era a primeira vez em alguns meses que me sentia verdadeiramente feliz. - Quero que comece com o Justin Bieber. Meu sorriso se desmanchou aos poucos. Ela só pode estar brincando, né? Não conheço muito o cara, mas não precisa ser uma expert sobre ele para saber o quanto ele odeia paparazzi’s. Eu sabia que a bondade da Emily tinha um porquê, e agora ele ficou bem claro, ela sabia bem o inferno que ia ser para perseguir esse cara. E pior, sabia que eu não conseguiria nada além do que os outros conseguem, meras imagens dele comendo em algum lugar. - J-Justin? – não pude controlar a falha da minha voz ao pronunciar o nome dele. – Sério? Tanta gente e tinha que ser logo ele? - O Justin é incrível! Você vai adorá-lo. – Lógico que vou, principalmente depois que ele me mandar a merda, ou talvez passar por cima de mim com o carro. – Ele é um cara simpático e bem humorado. – Claro que é, com quem ele permite que invada seu espaço. Não com uma merda de paparazzi que fica tirando fotos suas sem seu consentimento. Qualquer ser humano nesse universo sabe o quanto esse cara não suporta que invadam seu espaço, que é o oposto do que os paparazzi’s fazem. São pouquíssimas vezes que ele leva isso numa boa, pelo menos nas vezes em que vi noticias sobre ele. Eu realmente não o acompanho, não faço ideia de quem ele seja, tirando as polêmicas que existem com o seu nome, claro. - Emily, ele não gosta nada de paparazzi. - E qual celebridade gosta? Ok, nenhuma. Ponto importante. - Justin está numa fase nova em sua vida. Ele está bem calmo e tranquilo, apesar que, não quero ver ele assim nas fotos em que você vai tirar. É óbvio que ela não quer. Afinal, quem vai querer saber de um Justin que está andando distraidamente na rua, sem causar nenhuma polêmica. - Onde quer chegar? - Eu vou precisar que você o irrite um pouco. – É exatamente por isso que eu não gostaria de começar com ele. O cara é uma bomba relógio. - Eu não posso fazer isso, você sabe. - Só assim teremos excelentes fotos! Ele precisa estar brigando, xingando, ou fazendo qualquer coisa desse tipo nas fotos que você me entregar. - Deixa eu ver se eu entendi, você quer que eu o irrite, tire uma foto, pra depois vocês difamarem ele em alguma matéria, inventando algum motivo para ele sair como o vilão? - Exatamente isso. Fico feliz que tenha acompanhado meu raciocínio. Tá vendo porque eu não queria fazer parte disso? É doentio. Ela quer ganhar dinheiro em cima de uma mentira. - Eu não posso fazer parte disso. Não posso prejudicar alguém assim. - Bem, você pode. Afinal, assinou um contrato. É lógico, o contrato. - E dai? Você não pode me manter aqui. - Tem certeza? – seu olhar era desafiador. – Veja bem, Lucy. Seu sindico foi claro quando disse que tinha uma pessoa interessada em seu apartamento, certo? – Como ela sabia disso? – Pois bem, eu tenho certeza que ele não medirá esforços para te despejar de lá caso você não pague os futuros alugueis. Afinal, essa pessoa está muito interessada nesse apartamento, ela pagaria a quantia que fosse por ele. – ela deu ênfase na palavra pessoa, e deu um sorriso irônico. Ok, eu entendi a onde ela estava querendo chegar. A pessoa no caso, era ela. Ela havia ido atrás do meu sindico e dito que tinha interesse no apartamento. Foi só uma jogada para me fazer aceitar o emprego. - Eu te disse que você não tinha escolhas, Lucy. E bom, não costumo mentir. Eu não sei a onde tinha me enfiado, mas de uma coisa eu sabia, era tarde demais para virar as costas e desistir. O salário alto, a câmera boa. Ia sair bem caro para mim, afinal de contas. E iria custar mais uma mentira criada sobre um famoso qualquer. E a troco de quê? De dinheiro, obviamente. Eu estava oficialmente fazendo parte da sujeira do mundo da imprensa.
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