Capítulo 4 - Júlia

1622 Words
Segunda-feira, 8 de março   22:55PM   Como assim? O que eu fiz pra merecer isso?! Quando eu disse que não podia piorar, significava que não podia mais piorar. Agora eu tô muito fudida! Os caras que me trouxeram foram embora e me deixaram com esse cara ruivo que me olha como se eu fosse uma extraterrestre. Ele me dá medo e não para de fumar. — Senta aí, vai. — balançou a cabeça na direção do sofá, quando ele já estava sentado. Ele não pediu, ordenou. Sentei com os braços entre os joelhos. — Gostou da minha humilde casa? — perguntou orgulhoso. Dei uma olhada e realmente a casa era um sonho. Nem parece que ela está no meio de uma favela. Porque as faixadas que vi, pelos becos que andei, não são tão carismáticas. Talvez até tenha alguma rua com casas melhores, mas as que vi não chegam aos pés dessa aqui não. Balancei a cabeça afirmando. — Claro que tu deve morar numa mansão maior que essa né? A grana que emprestei ao seu pai foi boa. — sugeriu com um sorrisinho irritante em seus lábios. Como meu pai pôde se envolver com essa gente? Ele sempre foi um cara tranquilo, bem organizado, correto... nunca ninguém diria que ele estava envolvido com... traficantes. E isso agora me fez lembrar do que minha mãe disse. Do m*l pressentimento que ela teve. — Eu quero falar com a minha mãe. — falei tão baixo que foi quase um sussurro. — Claro. — ele olhou pra minha bolsa e apontou. — Pode ligar. Ele é tão perigoso que nem tem medo de que eu ligue pra polícia?! — Eu não tenho medo de nada, amor. Deve ter lido meu pensamento! Socorro! Peguei meu celular e liguei pra minha mãe. O Ruivo mandou deixar no viva-voz. Ela já estava desesperada antes mesmo de eu falar qualquer coisa. — Júlia, onde você está? Você tá bem? Aconteceu alguma coisa? Porque ainda não chegou? Eu tô preocupada. — sua voz estava instável. Já comecei a chorar. — Uns caras me pegaram, mãe...— chorei mais. — eles falaram que o papai tá devendo e eu sou a garantia do p*******o. Como meu pai pôde nos meter nisso? Ela desabou a chorar do outro lado da linha. — Eu sabia! Eu sabia que ía sobrar pra gente! — soluçou no final. — Eu vou chamar a polícia. O Ruivo fez um barulhinho com a boca e quando olhei pra ele, estava balançando o indicador, avisando pra não ligar. — Não pode, mãe. Não adianta. Você tem que falar com o papai, pra ele pagar essa dívida. Fala que eu tô em perigo. Por favor, mãe. — continuei chorando. A essa altura eu não via mais nada. — Eu vou falar, minha princesa. Eu vou falar. Ele tem que resolver isso... Ô minha querida...não deixe que te façam mal... o que eu posso fazer?...será que eles me deixam ficar no seu lugar? Eu vou. Pergunta se eu posso. Olhei para ele, que negou sem pensar duas vezes e acendeu mais um cigarro. — Não mãe, não pode. — engoli o choro. — Fala com o papai. Por favor, manda ele pagar a dívida. — Tá bem. — a voz dela m*l saiu nessa frase. — Fica bem, meu amor. Eu te amo. — Também te amo, mãe. Se cuida, tá? Desliguei o telefone inconformada, enquanto o Ruivo levantou e veio na minha direção. Ele ficou bem encima de mim, com o mesmo olhar de espanto como se eu fosse de outro mundo. — Boa garota. — mexeu nos meus cabelos. — m*l chegou e já tá colaborando... Por isso eu prefiro você aqui do que a sua mãe. Você parece inteligente, esperta e tem potencial. Isso tudo ele observou ouvindo uma simples ligação? A presença dele me deixa com medo. Com muito medo. Ele tem cara de ser aqueles loucos que a qualquer momento saca a arma e atira em quem está na sua frente. Dei dois passos para trás. — Você deve tá cansada... Tenho um quarto pra você...— saiu andando e deu sinal para segui-lo, peguei minhas coisas e o acompanhei, melhorando do choro. — Do lado do meu, para caso você não resista a mim de noite... — começou a subir as escadas enquanto meu estômago revirava. — ...você tem cara de novinha...Quantos anos? — Nunca te falaram que é feio perguntar a idade de uma mulher? Ele se virou com os olhos mais arregalados para mim e enfiou uma das mãos pelos fios dos meus cabelos, segurando firme. Meu coração disparou de medo. — Nunca te falaram que não se afronta um poderoso? Eu respirava rapidamente e ele me encarou prestando atenção na minha respiração. Permaneci calada e logo ele me soltou e voltou a caminhar. Abriu um quarto no segundo andar, e que belo segundo andar, aliás. — Tu fica aqui hoje.       — Hoje? Você vai me deixar ir embora amanhã? — uma faísca de esperança se acendeu em mim. — Não. — respondeu ele, acabando com qualquer esperança que eu tinha. — Mas vai pra faculdade, é claro. O lance do quarto é que a Galega não vai gostar de te ver tão perto de mim. Pois se ela o arrastar para longe de mim, eu agradeço. Mas minha gente, o povo só tem apelido pra cor de cabelo! É Ruivo...Galega... — Ok. — Fique à vontade, Morena. Agora pronto. Até eu tenho apelido de cor de cabelo... Entrei no quarto e tranquei a porta na cara dele, de chave. Minha sorte é que tem um banheiro. Tirei meu tênis e deitei na cama. Eu não sei por quem eu choro. Se choro por meu ex e a traição ou por meu pai ter se metido em mais problemas do que eu imaginava e agora eu sou como a segurança de que ele vai pagar a dívida. Estou no fundo do poço. Eu sinto. Estou lá no fundo, deitada de cara no chão, com chifres na minha cabeça e armas apontadas na minha direção. E eu não posso fazer nada. Pensei em contar para minha amiga Mary, mas imagino que ela irá surtar e mandar até o FBI atrás de mim, o que vai piorar minha situação. Bruno ficou mandando mensagens e me ligando, como se eu fosse ver nada do que ele mandou... i****a. Apaguei suas mensagens sem nem abrir. Aposto que ele apoiou aqueles idiotas me insultando. Bruno sempre foi Maria vai com as outras. Eu odeio estar passando por tudo isso. Odeio. Nunca fiz nada pra merecer essa p***a toda. Não é porque meu pai sempre buscou dar o melhor pra mim, que sou uma patricinha mimada. Longe disso. O meu defeito é confiar nas pessoas, abaixar a cabeça quando alguém zomba ou diz qualquer coisa de mim. Eu queria ser mais forte. Me pouparia de muita coisa. Chorei...chorei... dormi... e quando acordei já era dia. Terça-feira, 9 de março Acordei com mesma roupa da noite anterior, num quarto diferente do meu, parei em frente ao espelho e vi rodelas escuras que pareciam olheiras ao redor dos meus olhos, mas no fim era só a maquiagem borrada. Meus cabelos estão embaraçados e bagunçados...muito bagunçados. Estou o pacote completo do fracasso. Tirei a necessaire da bolsa que levo pra faculdade e removi os restos de maquiagem com o demaquilante. Também escovei os dentes e arrumei o cabelo. Não fui estuprada essa noite e não sei se devo considerar isso como uma vitória ou algo normal que não deveria acontecer mesmo. Saí do quarto com as meias nos pés. Antes de descer as escadas, já avistei um rapaz na cozinha. Ele estava bem concentrado no que fazia no fogão. Mas não é o Ruivo perigoso. Desci as escadas e fui até a cozinha na esperança de encontrar alguma comida que me conforte nessa nova realidade. Eu nem vou fazer escândalos para ir embora, porque sei que não vão adiantar. Só tenho que esperar a ligação da minha mãe dizendo que meu pai vai pagar a dívida e eu vou voltar pra casa. Me aproximei do rapaz rezando para que o que ele estiver mexendo seja comida e não carregando armas...vai saber né... — Oi. Ele virou pra mim assim que ouviu e me olhou de cima a baixo. — Tu é a fudida? É uma boa definição. Não posso negar. Assenti conformada. Pela voz já sei que é gay. Super afeminada e espevitada. Mas é bonitão. — Pablo. Irmão do Ruivo. — estendeu a mão para mim e eu apertei. — Olha! Você não tem apelido de cor de cabelo. — me admirei e sentei na cadeira me sentindo mais confortável. Quem não gosta de gay? Eu amo. — Abafa, porque de vez em quando minha mãe me chama de pentelho. — ficou olhando pra mim sem expressão e depois caiu na gargalhada. Eu também, porque ninguém merece um apelido desses. — Não vou contar pra ninguém. Pode ficar tranquilo. — Meu irmão me deixou de babá de você. — ele colocou a panela na mesa, era ovos mexidos e tinha pão fresco também. — Babá? Você podia me liberar, né? — fiquei esperançosa. — Não precisava ficar de babá... — Não posso querida. Seu pai tem que pagar a dívida e aí você pode ir embora. Droga. — Minha mãe vai falar com ele. — continuei na esperança. — Acho bom, porque quanto mais tempo você passar aqui, mais o meu irmão vai te achar propriedade dele. Eu heim... — Oxe... Ele não tá louco! — Tá sim. Meu irmão é um cara bem s*******o. Apressa o seu pai e cai fora daqui. Agora eu fiquei mais preocupada ainda.    
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