Segunda-feira, 8 de março
22:30PM
Me sinto tão envergonhado de estar participando de uma coisa dessas..., mas pior do que eu estar com uma arma apontada para essa garota, que eu não vou sacar, é a que está pronta pra ser disparada atrás de mim. Se eu não fizer isso, eles vão me matar.
Ela estava nervosa, mas eu estava tremendo mais do que ela.
— Bora, Dona! Num ouviu não?! — Cabeça a apressou apontando outra arma na direção dela.
A garota ligou o carro e começou a sair do estacionamento. Cleitin ligou o GPS e colocou o endereço para onde vamos.
A garota já estava chorando, enquanto eu comecei a ficar mais calmo. Foi menos pior do que achei. Ela não resistiu.
Abaixei a arma para limpar o suor do rosto e respirei mais tranquilo. Eu só quero ir pra casa e esquecer isso tudo. Cabeça ligou pro Ruivo para confirmar que já estamos com a garota. — Ele disse pra levar pra casa dele.
Vixi...
Será que essa garota merece passar por isso?
Tenho minhas dúvidas.
Pelo que vi hoje, ela tá sofrendo pelo que o pai fez..., mas também ninguém sabe se ela estava envolvida. Ela tem vida boa, nem deve se importar com o lugar de onde seu pai andou tirando dinheiro. Pior eu, que sempre fui pobre... Enquanto a vida dela deve ser de altos e baixos, a minha é de baixos e subterrâneos.
A garota dirigia chorando, o que me preocupou, porque é perigoso dirigir meio cego no meio da noite e as lágrimas deixam a visão turva.
— Para de chorar e presta atenção no caminho. — pedi mas soou como uma ordem.
— Para onde vocês estão me levando? — perguntou com voz de choro e passou a mão no rosto, secando as lágrimas.
— Pra conhecer um amigo do seu pai. — o Cabeça respondeu e eu confirmei. Volta e meia ela olha para mim, com medo. Eu me sinto envergonhado, mas estamos no mesmo barco.
— Que amigo? Eu conheço todos os amigos do meu pai e nenhum mora num lugar desse tipo... — começamos a subir a favela e no GPS já estávamos bem perto da parada. Porque até certo ponto os carros sobem, depois é só becos e vielas.
— Cala a boca, p***a! — Cleitin acertou um tabefe na nuca da garota e ela reclamou e voltou a chorar.
— Ô cara! Não bate! — reclamei indignado. — É uma mulher!
— Tô nem aí. É chata, isso sim.
Tem coisas que não dá pra apoiar. Aliás, eu não apoio nada aqui. Só estou seguindo as ordens. — A ordem é levar a garota, não bater nela.
— Tu é chato também.
— Calem as porras das bocas! — Cabeça falou mais alto. — Para ali, garota. Chegamo.
Ela parou no lugar que ele disse e eu desci logo pra acompanhar ela, porque se depender dos outros, ela apanha até chegar no Ruivo.
Segurei seu braço e ela tentou se soltar. Eu apertei. — Colabora, poxa!
— Que foi, Léo? Quer que eu a leve?
A garota olhou pra ele e pra mim. Na certeza de que seria pior nas mãos do Cabeça, ela colaborou comigo. — Deixa que eu levo.
Só assim o Ruivo vê que tô fazendo tudo do jeito que ele quer e adianta o p*******o dessa dívida.
Subimos pelo beco da loirinha e alguns dos caras que trabalham pro Ruivo estavam lá. Claro que eles tiraram com a garota. Toda mulher que cai nas mãos deles está fudida. Destinada a ser mulherzinha deles e fazer o que querem. Eu não duvido o Cabeça não pegar essa Júlia. Com ou sem seu consentimento.
A casa do Ruivo é inconfundível. A melhor casa do morro. Muros altíssimos que não deixam com que ninguém bisbilhote a mansão atrás deles.
Liberaram a gente e entramos no lugar. Arrastei a garota até o Ruivo, que estava com uma falsa loira sentada em seu colo e um cigarro no bico.
— Aqui a garota. — entreguei.
Ele arregalou os olhos e empurrou a falsa loira do seu colo, levantando com eles vidrados na Júlia.
— Ruivo! — A loira reclamou.
Ele tirou o cigarro da boca e expulsou a fumaça, assim como a loira. — Some daqui, Galega.
A mulher saiu reclamando furiosa.
Ele se aproximou mais da Júlia. Sempre vidrado nela. Júlia estava sem chorar, mas assustada.
— Sabe quem eu sou?
Ela balançou a cabeça negando.
Ele segurou o braço dela e passou o indicador pelo relógio de ouro que ela carrega. — Tu só tem esses ouro aqui por minha causa. Seu pai veio atrás de mim, atrás de riqueza comigo... — soltou o braço dela e depois voltou a seu rosto e segurou o pingente da correntinha que ela carrega do pescoço. — Eu emprestei, só que ele tá me deveno... e ele tem que me pagar...fora ou dentro da cadeia...então gatinha, tu é a minha segurança de que ele vai pagar minha grana.
Ela arregalou os olhos mais ainda.
— O que você quer dizer com isso?
— Vai ficar aqui até seu pai me devolver o último centavo que me deve.
Eu conheço essa história...
— Mas eu não tenho culpa do que ele fez! — começou a chorar.
— Tem sim. Ele queria te dar tudo do bom e do melhor... Mas tudo tem um preço BB. Então enxuga as lágrimas e se acostuma. Tu tá com a gente agora.
Ela olhou pra mim como se gritasse por socorro.
É triste, mas eu não posso fazer nada.